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Estou sentada há duas horas na poltrona da sala de estar. A lareira está quentinha e meu chocolate-quente já esfriou. Me perdi enquanto lia meu livro: orgulho e preconceito, observando os flocos de neve caindo no vidro das enormes janelas do castelo.

Mamãe e papai estão em uma "super-convenção" de reinos, onde você precisa ficar sentado durante 7 horas INTEIRAS, só para ver as propostas de caridade dos reinos rivais, que competem em um jogo estranho chamado: Batalha de Cambridge.

A Batalha de Cambridge consiste em 50 jogadores de reinos diferentes, que competem para ver quem consegue o trono do primogênito. No caso, eu.
Cambridge é o nosso reino. Frio, silencioso, mas muito invejado.
A maioria dos reis e rainhas não vêem a hora de seus filhos mais velhos assumirem o nosso trono. Por isso, fizemos um super-jogo para ver qual deles consegue ganhar.
Meu irmão é o vencedor desde que os jogos foram criados, há 2 anos atrás.

Agora você deve estar se perguntando:
Por que eu não estou competindo se eu sou a mais velha?
Muito simples, eu não quero.

Me chamo Raven Martin: amante dos livros, guerreira em segredo e irmã mais velha do garoto mais cínico do mundo.
Meu irmão Rowan, tem 17 anos (idade que todos já podem se inscrever para a competição), eu tenho 19. Com 20 anos, o ganhador assume o trono.
Meus pais sempre quiseram que eu participasse, afinal, eles são reis assassinos.

Nascidos de uma linhagem enorme, os assasinos do Vale Leste, cresceram sendo treinados para matarem todos que o rei ordenasse. Meus pais eram os assassinos particulares dos pais deles. Sendo assim, a linhagem continua para os meus filhos, para os filhos dos meus filhos e assim em diante... muita informação né? Eu sei.

Sou treinada à matar qualquer pessoa desde os meus 8 anos.
Qualquer golpe, qualquer arma, com todas as táticas possíveis.
Desenvolvi uma habilidade extremamente estranha de observar demais tudo e todos. Por isso já consigo entender o que preciso fazer para matar alguém, apenas olhando para o alvo.

Rowan precisa ganhar o torneio mais duas vezes para assumir o trono, é uma regra.
Apenas reis com 20 anos.
Não gosto de competir pois detesto que as pessoas saibam demais sobre mim.
Apenas minha mãe, meu pai e Rowan sabem do meu "poder", se é que podemos chamar assim..

Há 9 anos atrás, estávamos eu e o treinador Harry no campo treinando. Continuei dando golpes nele.. de repente, senti o peso do corpo do homem sobre mim.
O afastei de mim e o vi, caído morto, completamente congelado.

Sem uma gota de sangue sequer, apenas gelo.

Vi o gelo saindo das minhas mãos. Foi quando gritei e fiquei parada ali, petrificada, congelada, vendo o homem morto.
Ele era um homem bom, um ótimo treinador, embora tivesse me furado mais de 20 vezes com uma adaga.

Meus pais chegaram e me tiraram dali. Passei à usar um par de luvas pretas à partir dos meus 10 anos.
Nunca aprimorei o poder, nunca o extraí.
Continuei treinando nos campos, mas sempre com as luvas.

Eu odeio isso.

Não posso abraçar sem essas luvas idiotas, nem comer, muito menos tocar alguém ou qualquer objeto.
Não lembro mais como é sentir a pele de alguém.
Nunca me apaixonei, nem me frustrei. Além de nunca estar interessada, creio que ninguém gostaria de suportar a minha personalidade extremamente detalhista e individualista.
Sempre fui normal.
Aqui estou eu existindo: uma peça neutra em um quebra-cabeça totalmente detalhado e em ordem.

Rowan está em batalha. Os reinos de Whitecost e Vanderburg entraram em conflito há duas semanas. Motivo: desviaram 50 toneladas de ouro para um navio pirata. Sendo assim, os dois reinos querem o ouro, mas como não sabem dividir, batalham por ele.
Só Rowan para se meter nessas besteiras...

Mamãe e papai voltam amanhã. Fico aqui sozinha nesse castelo vazio desde sempre, eu e meus livros.
Nunca tive amigos, meus avós moram bem distante daqui e nunca nem tive um namorado.
Pode parecer triste, mas eu gosto muito do silêncio. Posso ir à biblioteca quando eu quiser, tocar piano, treinar sozinha.. entre várias outras coisas que eu tenho o prazer de não ter uma companhia.

Fechei meu livro e fui até meu quarto.
Vesti uma regata, uma calça justa e calcei meus coturnos pretos.
Quem me visse e não soubesse que sou uma assassina em treinamento, pensaria que estou de luto... contando também que meus cabelos pretos enormes, não ajudam nem um pouco na parte visual.

Tenho a pele extremamente pálida, olhos azuis cinzentos e meu cabelo vai até o fim das minhas costas.
Meu corpo não é tão forte, mas está meramente em forma.

Após me vestir, peguei minhas adagas, as coloquei em compartimentos escondidos na minha roupa, amarrei meu cabelo em um rabo de cavalo e fui até a sala de treinamento.
Chegando lá, dei de cara com o treinador Hale e começamos à lutar.
Acertei os braços dele, ele me fez cair no chão e enfiou uma adaga na minha coxa.
Sim, coisas assim sempre acontecem.

Após o treinamento, fui me limpar no meu quarto, tomei um banho e enfaixei minha perna. Então a senhorita Rosa entrou sem nem bater na porta, me entregando uma carta estranha.
Era de Rowan.

"Olá irmãzinha.
Já gostaria de pedir desculpas por colocar você nessa, mas estou completamente quebrado da batalha. Terei que ficar em repouso por alguns meses.
Estou indo para Cambridge para ficar com você, mamãe e papai, mas preciso que me faça um favor:
um rapaz veio até aqui, avisando que eu preciso me recuperar para os jogos (que são daqui dois meses). Como eu levarei mais do que dois meses, você terá que jogar por mim, afinal, você é a mais velha.
Sei que nunca foi da sua vontade, mas isso é pelo nosso reino e pelo trono.
Vá Raven, pela nossa família.

- com amor, Rowan"

Fiquei sem chão.
Não sabia o que pensar, como agir..
Minha vontade era de socar a cara de Rowan se ele aparecesse, mas fiquei tranquila.

Jantei, me arrumei e fui dormir.
Amanhã mamãe e papai vão chegar, resolveremos essa situação juntamente de Rowan e tudo vai ocorrer bem, de acordo com o planejado.

Mas não era bem assim...

AS CRÔNICAS DE MARTIN: A princesa perdidaOnde histórias criam vida. Descubra agora