Sábado à Noite

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EDUARDA NUNCA foi uma garota lá muito estudiosa. Passou a vida inteira na escola apenas sendo aprovada na base da 'decoreba', sempre com a nota mínima necessária para não ser reprovada no fim do ano. E agora, aos 18 anos, prestes a se formar não parecia que seria diferente.

Apesar de não ser uma aluna exemplar, também não era uma pessoa maldosa. Não tinha muita motivação para os estudos, é verdade, achava que a escola era uma verdadeira prisão e cada vez se sentia menos à vontade com relação a isto, mas sempre foi bem comportada, tinha um círculo de amizades em que era bem quista pelas outras meninas, raramente se metia em polêmica e mantinha um relacionamento exemplar com praticamente todos a seu redor. E sempre foi, logicamente, uma boa filha. Tinha um zelo pela casa, como toda boa moça, nunca se negava a auxiliar a mãe nas tarefas e era praticamente babá de seu irmãozinho João Pedro desde que ele nasceu. Namorado? Duas ou três vezes ficara de beijos com um colega de escola, nada mais do que isto.
Seus pais ficaram realmente surpresos quando ela ganhou uma suspensão por agredir uma amiga na sala de aula, e mais ainda pela briga ter sido por um motivo tão fútil: Elisa, sua colega desde o jardim, a chamara de 'loira aguada', o que foi o suficiente para que Duda a sentenciasse com socos e puxões de cabelo em plena aula de sociologia. Ela nunca fizera o estilo rebelde, e isto aumentou a decepção de seus pais.

Mas não havia sido só isto que Duda fizera naquele ano. A briga com a amiga fora apenas a ponta do iceberg. Desde que voltara das férias ela estava completamente diferente: já havia discutido com o professor de química, batido boca com o motorista do ônibus escolar, riscado a classe de um colega que puxou a alça de seu soutien, fazendo com que o garoto fosse suspenso e tivesse que reparar o dano que, segundo a escola, ele cometera e humilhado a merendeira que pôs frango em seu prato quando ela havia pedido gado.
Nem mesmo ela sabia direito o que estava a atormentando, não havia um foco ou um motivo real para sua irritabilidade, já que os problemas comuns como TPM, paixonites, provas escolares, futilidades e afins
eram recorrentes ano após ano e ela nunca se sentira assim antes. E para piorar, Elisa estaria de aniversário no sábado, e já a havia convidado, mas, com tudo que ocorreu, Eduarda não teria coragem de comparecer à festa, e mesmo que fosse suficientemente cara-de-pau, seus pais a haviam colocado de castigo, e ela, como boa garota, aceitou-o sabendo que fora merecido, já que ela jamais havia discutido com os pais. Não com SEUS pais! Naquele sábado tudo o que a loirinha de olhos verdes iria fazer era apenas jantar e dormir.

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- Deixa de besteira Duda, quantas vezes já não brigaram e fizeram as pazes?-esbravejava Carol, amiga de Duda e Elisa, ao telefone
- Já disse Carol, meus pais não deixam! E mesmo que deixassem eu não iria, ela sabe que ando estressada e que não precisa muito para me tirar a calma, devia ter evitado!
- Para com isto Duda, vai virar criança depois de velha?!
- Tchau Carol, boa festa, se entupa de brigadeiro e engorde ainda mais! E FODAM-SE TODAS VOCÊS!
- Que isto Dud...
Eduarda desligara na cara da amiga, e antes mesmo que seu celular bloqueasse o teclado, lágrimas escorreram por sua face, e um triste pensamento invadia sua mente: estava ficando insana, e acabaria sem ninguém. Precisava cuidar disto e, mesmo contra a vontade, iria buscar ajuda profissional. Estava cansade de brigar com todos, e já não havia condições de contornar ou fingir que o problema não existia. Mas isto apenas na segunda, já que agora, às 19 horas de sábado, não haveria qualquer possibilidade de auxílio.

Tratou logo de secar o rosto, mas não em tempo suficiente para que sua mãe entrasse no quarto e visse os olhos da filha.
- Pode chorar a vontade, enquanto não aprender a ser gente você não sai para lado nenhum!
- Cala a boca! Você não sabe o que acontece comigo! NINGUÉM SABE!
- Ah, agora vai gritar com sua mãe, é?! E o que se passa com você que eu não sei, mocinha?! Está usando drogas?!
Sem se dar ao trabalho de responder, Eduarda apenas levantou-se e empurrou sua mãe para fora do quarto, batendo a porta em seguida, com um forte estrondo.
- Mal educada! -gritou a mãe- Assim que agradece por tudo que tem, sua ingrata?!
Mas Duda não conseguiu responder. Ela sequer ouvira claramente as palavras da mãe, pois quando a expulsara do quarto se sentara no chão, de costas para a porta, com a cabeça entre os joelhos e chorara copiosamente, como há tempos não se lembrava de tê-lo feito.

Contos do De La Cruz 18+Where stories live. Discover now