Mostro no celular a Justiça. A mulher tem os olhos vendados, em uma mão carrega a balança e na outra uma espada, e atrás dela tem um escudo. 

— Quero na coxa. 

Marcos passa o desenho para o papel, adicionando alguns detalhes. Deito no que parece uma maca médica e ergo o vestido no alto da coxa. Ao escutar o som da máquina sendo ligada, uma excitação corre pelo meu corpo. 

Como eu amo o som. 

Marcos passa a gilete na minha coxa esquerda e logo em seguida esteriliza o local. 

— Pronta? — concordo e sinto a primeira picada. 

A agulha rasga a minha pele, inserindo tinta. Marcos conta sobre o andar do estúdio e do namoro com Vitor, outro tatuador. 

— Eu amo ele de verdade, princesa, mas trabalhar o dia todo junto é demais. 

— Vou dar uma olhada nos desenhos, já venho. 

Rafael sai da sala e vai para o saguão. Ele não ficou muito confortável vendo minha pele sendo tatuada. 

— Seu namorado ou ficante da vez? 

— Sinceramente, não sei. 

— Mas transar sabe né.

Rio para não chorar.  Não respondo Marcos, apenas insinuo um sorriso, por mais que seja meu amigo, não somos tão íntimos e não me sinto confortável para falar sobre isso com ele.

— E os vestibulares? Ainda focada no ITA? 

— Sim, o vestibular está chegando. 

— Tá preocupada? 

Ser uma "pequena gênia" como diz o Rafael, não é algo que saio divulgando por aí. A maioria das pessoas acham que estou querendo ser superior, homens em sua maioria. Então evito o assunto e sigo com as minhas teorias e fórmulas. 

— Não muito. — opto pela resposta mais aceitável. 

— Eu ainda acho loucura você fazer engenharia aeroespacial, com seu rosto podia ser modelo. 

Outro motivo por não entrar nesse assunto, são falas iguais a essa. Meu pai já me levou para assistir um ensaio fotográfico, o fotógrafo pediu umas fotos minhas. Odiei. Sei que meu pai gostaria de ver mais traços dele em mim, mas, para sua tristeza, desenhos, tecidos e fotos não fazem parte das minhas habilidades ou gostos. 

O assunto morre ali. Relaxo na maca, feliz por não ter que falar sobre a minha carreira. Marcos termina a tatuagem, passa uma pomada para ajudar na cicatrização e envolve com um plástico. Levanto-me e paro na frente do espelho, admirando minha mais nova tatuagem. Os traços são bonitos e finos. 

— Ficou perfeita! 

Saímos da sala. Ao chegar no saguão vejo Rafael conversando com Patrícia, a tatuadora de Heitor, ele parece mostrar alguma para ela. Sem dar muita importância, vou pagar a tatuagem. 

Do outro lado do balcão está Ítalo, um dos donos do estúdio.

— Oi Elena. 

— Oi. — Sem querer me estender muito, entrego o cartão para ele. 

— Como está? — Ítalo demora para digitar o valor na maquininha, atrasando a minha ida.

— Vou bem e a você? — respondo sem muita vontade. 

— Bem. — Ele me estende a maquininha e eu digito a senha do cartão. Estendo-a de volta para ele. Ítalo coloca as mãos sobre as minhas e diz: — Quando vamos sair? Você só me enrola. 

Ainda com as mãos presas, respondo: — O fato de te "enrolar" deveria dizer alguma coisa. 

Ele solta as minhas mãos e diz: — Doeu, Elena. 

Dou de ombros, a intenção foi essa.  

Com a tatuagem paga, me despeço de Ítalo e dou um abraço em Marcos.

Do lado de fora, Heitor digita no celular. 

— Mandando foto da tatuagem para a abraçadora de árvores? 

— Você tá ficando com seu aluno. Quem é o mais antiético? 

Ai. 

— Joga na cara mesmo. 

— "Ain, ele é só um colega" — Heitor fala, imitando a minha voz — Os meus colegas não enfiavam a língua na minha garganta. 

Ergo a sobrancelha, ao notar minha expressão, Heitor completa: — Alguns sim. 

— Deixa eu ver a tatuagem. 

Heitor estica o braço direito para mim, uma índia com pintura vermelha no alto das bochechas e uma cabeça de lobo sobre os cabeça pinta seu antebraço. 

— Ficou foda! 

— A sua. 

Levanto o vestido com cuidado, uma vez que estamos na rua e sujeitos aos olhares de qualquer um. 

— Ficou do caralho! 

Confiro as horas. Passa das 19:30 e preciso deixar Rafael em casa. Como se soubesse que estou pensando nele, Rafael sai do estúdio e para do meu lado, passando o braço pela minha cintura. 

— Já vamos? 

Concordo. Heitor decide ir no banco de trás. Sentado ao meu lado, Rafael deixa a mão na minha perna. Sua palma esquenta a minha pele, disparando as lembranças da tarde. 

A sensação da sua boca nos meus peitos, mordendo e chupando, a mão entre as minhas pernas, acariciando. 

Porra, Heitor. 

Vamos o caminho inteiro assim. Heitor e Rafael conversam durante todo o trajeto. Quando estaciono na frente da sua casa não sei bem como me despedir. Meu irmão nota a minha expressão, volta o olhar para a rua.

Rafael e eu nos beijamos. Sua mão faz carinho na minha coxa, aperto seus cabelos, puxando-o mais para mim. 

Com um pigarrear Heitor quebra o clima, revirando os olhos, Rafael me dá um último selinho e saí. 

Vejo-o entrando em casa, quando a porta fecha, engato para sair. 

— Tá rendida mesmo. 

Ergo o dedo do meio para Heitor, passando para o banco da frente, liga o rádio.

Por mais que tente negar, estou, completamente, rendida.

A física entre nós [CONCLUÍDO]Where stories live. Discover now