Capítulo Doze

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RAFAEL MONTEIRO

Depois que Elena foi embora, meus pais foram para o quarto e deixaram toda a louça para mim.  Lavei, sequei e guardei tudo. Ainda estava irritado com meu pai e com Elena, mesmo sabendo que ela não tinha culpa de nada, não conseguia deixar de sentir raiva dela. Sabia que estava escolhendo um alvo fácil para descontar minhas frustrações e ignorar a verdadeira causa. Porém, está sendo muito difícil aceitar que uma desconhecida teve tudo que sempre desejei do meu pai, que eu, filho dele, não conheço nada dele.

Porra, eu não sabia que ele tinha tanto apego e histórias sobre as tatuagens.

Como podemos ser tão afastados um do outro ao ponto de eu não conhecer os eventos marcantes de sua vida que o levaram a eternizar na pele as memórias. Dezessete anos morando com meu pai e só descobri sobre as tatuagens por causa de Elena, como pode a minha mãe nunca ter tocado nesse assunto. Me sinto como um impostor dentro da minha própria casa.  

Pego o caderno de desenho e arranco o desenho da cobra, minha vontade é de rasgar em mil pedaços, botar fogo no papel e depois jogar as cinzas no lixo. Contudo, fazer isso seria muita estupidez, por isso guardo o desenho dentro do caderno e vou tomar banho.

A água quente escorre pela minha cabeça e desce pelas minhas costas, relaxando os músculos resetados e doloridos por causa da tensão. A água leva quase toda a raiva que senti pela noite, com a mente limpa percebo que fui rude com minha mãe e Elena sem motivo, ambas só queriam me ajudar e eu fui um babaca às tratando mal.

Desligo o registro e começo a me secar. Com a toalha em volta da cintura saio do banheiro e dou de cara com meu pai, sentado na minha cama e olhando meu caderno de desenhos. Minha primeira reação é paralisar, estranhar tê-lo no meu quarto e segunda é querer tirar o caderno de suas mãos, mas não faço. Fico parado, encostado na porta do banheiro, sem saber o que fazer. Pego uma boxer azul marinho e uma calça de moletom no guarda-roupa e volto para o banheiro. Enrolo o máximo possível, depois de visto, com os dentes escovados e o cabelo penteado, saio do banheiro.

Sento na cama, ao lado do meu pai, ficamos um silêncio desconfortável. Ele deixa o caderno de lado e volta-se para mim. Espero ele dizer alguma coisa, mas as palavras não saem, então ficamos os dois sentados um do lado do outro. Ele se levanta e vai em direção da porta, sufoco o sentimento de decepção.

— Fico feliz que esteja melhorando em física e agradeça Elena mais uma vez pela disponibilidade dela, por mim.

Assenti com um movimento de cabeça.

— Desenhos bonitos.

E com isso, ele sai do quarto.  

Me deixando sem saber o que sentir.

*

Minha mãe viajou cedo para o Rio de Janeiro, ela ia ser uma das palestrantes em um congresso de Medicina e meu pai foi levá-la ao aeroporto e ainda não tinha voltado. Sem nada para fazer, passava pelos canais da televisão, mas nada prendia minha atenção.  

Mateus tinha viajado para o sítio dos avós do seu pai, Clara e Lúcia iam fazer trilha com os pais de Lúcia e eu fiquei sozinho em casa e sem ninguém para sair.

Peguei o celular e entrei no Instagram, fico olhando os stories dos meus amigos e vendo-os aproveitando seus dias enquanto eu estou largado em casa. O próximo storie é de Nabim, ele filma Renan e Elena em uma guerra de água na piscina que reconheço ficar na casa de Elena. Todos estão tendo dias legais e eu estou me afundando em autopiedade. Irritado, deixo o celular de lado e resolvo ligar a televisão, escolho um canal aleatório sem prestar atenção no que está passando.

A física entre nós [CONCLUÍDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora