Tudo começa na detenção

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Eu odeio dragões.

São criaturas detestáveis. Possuem uma pele escamosa, quase cinco metros de altura, cospem fogo pela boca e não possuem senso de humor algum.

Eu precisei correr, a criatura gigante estava no meu encalço, podia sentir o calor de seu bafo fedorento na minha nuca. O hálito parecia uma nuvem de pimenta que fazia os meus olhos arderem. Ele parecia não gostar nem um pouco de mim. Talvez tenha sido por eu o ter chamado de lagartixa gigante ― não entendo, lagartixas são adoráveis. É claro que também pode ser por causa da ferida em sua perna deixada pela lâmina da minha espada. Como eu disse, dragões não possuem senso de humor.

A perseguição nos levou até um bosque com árvores grandes e coloridas, onde diversos animais selvagens corriam livremente. Flores de todas as cores e perfumes decoravam aquele lindo lugar ― se não fosse pelo gigante escamoso, eu provavelmente teria parado para admirar aquela maravilha da natureza. Parecia um sonho, mas que, aos poucos , se tornava um pesadelo. Por onde o dragão passava, ele deixava um rastro de destruição e caos.

Eu podia ver um vilarejo logo à frente; se eu conseguisse chegar até lá, talvez alguém pudesse me ajudar. Entretanto, o monstro deixaria aquela humilde vila em ruinas. Eu precisava agir imediatamente. O monstro diminuiu o passo e consegui ganhar uma distância razoável. Aproveitando a oportunidade, subi em uma das árvores o mais depressa que pude, e quando o dragão se aproximou, saltei sobre ele.

Sem hesitar, enterrei minha espada em suas costas.

Urrghh! ― urrou de dor o monstro, sacudindo igual a um touro de montaria.

Juro que, de início, parecia uma boa ideia saltar em cima de um dragão de cinco metros de altura e perfurá-lo com uma pequena espada. Droga, que ideia mais estúpida! ― pensei.

Não consegui me segurar por muito tempo, entre um solavanco e outro, acabei me soltando e caindo.

Mesmo parecendo óbvio, devo dizer: não repitam isso em casa, cair daquela altura não é nada agradável. Senti algumas costelas fraturadas e minha perna esquerda parecia ter quebrado na queda. Com muita dificuldade, consegui me arrastar até a base de uma árvore. A dor era insuportável, parecia que eu tinha descido por um escorregador de lâminas e caído em uma piscina com álcool. O dragão se aproximava a passos largos, eu estava encurralado e não conseguia mais me mover.

Parando em minha frente, ele bufou soltando uma fumaça por suas ventas. Por fim, abriu a boca fedorenta repleta de dentes afiados. Eu esperava, no mínimo, uma rajada de fogo e minha morte certa.Mas para minha surpresa, ele começou a falar com uma voz feminina incrivelmente familiar.

Sr. Turner? Sr. Turner? ...

― M-mas o que-e? A lagartixa gigante sabe falar? ― perguntei incrédulo.

Ouvi muitas risadas, o dragão desapareceu, o bosque sumiu e tudo ficou escuro.Abri os meus olhos e a Sra. Figgs estava me encarando, com os braços cruzados e uma cara fechada, provavelmente pelo que eu acabei de falar.

― Sr. Turner, dormindo na sala de aula novamente e ainda por cima me ofende?A Sra. Figgs era minha professora de matemática. Era uma velha baixinha e nervosa, usava sempre o mesmo vestido na altura das canelas com um blazer amarelado por cima. Tinha cabelos brancos, sempre presos, usava óculos fundo de garrafa e cheirava a naftalina. Os outros alunos comentavam que esse cheiro, na verdade, era de algum tipo de droga ilícita que a professora contrabandeava na escola ― mas eu me negava a acreditar nisso, para mim era naftalina mesmo.

― De-esculpe, Sra. Figgs... eu estava sonhando com um dragão.

Todos na sala riram novamente, a professora ficou vermelha de raiva.― Dorme na sala de aula, me chama de lagartixa e agora de dragão, Sr. Turner? ― disse ela bufando; faltou apenas sair fumaça de suas ventas... digo, nariz.

Oliver Turner e os caçadores de dragões - A chama sagradaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora