Capítulo 2

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Não sei quanto tempo passou.

Ouvi meu celular tocar, mas estava presa demais em pensamentos para me preocupar com isso. Ou com qualquer coisa. O corpo que ainda abraçava estava frio, sem respiração. O corpo da pessoa que mais amei em toda a minha vida. O corpo da única pessoa que me deu amor. O que me restava agora? O que seria de mim?

Minutos ou horas depois, me puxaram para trás e levaram minha mãe embora. Simples assim. Entraram correndo no banheiro, colocaram seu corpo em cima da maca, o cobriram e partiram. Pessoas sem rosto levaram minha mãe para longe de mim, e tudo o que pude fazer foi observar. Com braços fortes ao meu redor, vi a felicidade indo embora. Agora era definitivo. Ela havia me abandonado.

Os mesmos braços fortes me ergueram quando perceberam que eu não andaria. Não queria ser levada dali, só queria que me deixassem em paz. Por mim, deitaria onde seu corpo estava jogado alguns minutos atrás, usaria a mesma faca que usou. Encontraria minha mãe novamente. Só que não tinha controle de mais nada. Fui deixada na cama, como se não passasse de outro corpo sem vida.

Ao meu lado estava Jim, o tigre que ganhei dela quando tinha quatro anos. Lembro o dia em que fiquei admirando-o na loja, implorando para que ela comprasse. Mas tudo o que respondia era: "você não pode ter tudo o que quer na vida. Nós já compramos muita coisa hoje". Sim, eu podia ter tudo o que queria. Ganhei aquele tigre assim que chegamos em casa, provando que seu coração era imenso, já que tinha comprado quando me distraí no parque.

Podia ter tudo o que queria. Queria que ela estivesse aqui, por que não posso ter isso também? Como ela foi capaz de fazer isso com si mesma? Comigo?

Meu celular voltou a tocar, e percebi que ele agora estava no quarto, do meu lado na cama. O relógio dizia que passaram apenas seis horas do instante em que tudo mudou. Só isso? Parecia uma vida inteira.

Levantei meio cambaleante e peguei o celular insistente. Nove chamadas perdidas. Duas da Lorel, que provavelmente estava me esperando para sair. Apaguei suas ligações sem retorná-las.

As outras sete chamadas eram de um número desconhecido, que voltou a ligar enquanto verificava se havia alguma mensagem. Deveria ser meu pai. Só poderia ser ele, já que ainda não havia aparecido para ver como eu estava. Aposto que estava lidando com todo o processo do hospital e o que mais é preciso quando isso acontece. Eu não entendia dessas coisas, o máximo que já perdi na vida foi um peixe, que pulou do aquário dois dias após ser colocado lá. Matou-se, exatamente como ela havia feito.

– Alo? – Atendi, esperançosa.

– Er... Oi, Paloma? – Perguntou uma voz desconhecida.

– Sou eu. – Respondi, sentindo a esperança escorrer de mim pela segunda vez no dia.

Não era meu pai. Ele ainda não havia aparecido.

– Eu liguei para conversar... Você sabe. Nós combinamos, mas você não atendeu, então fiquei preocupado. Eu sei que está tarde demais, mas eu fiquei preocupado, pois você não deve ir dormir cedo, então imaginei que tivesse acontecido algo...

Parei de prestar atenção no que a voz falava alguns segundos depois de começar a gaguejar.

– Eu preciso desligar. – Respondi, cortando-o. – Desculpa. – Acrescentei, apenas por costume.

Só uma coisa conseguia ocupar a minha mente.

Saí do quarto à procura do meu pai. Eram duas da manhã e a casa estava completamente escura. Foi a primeira vez que percebi que não gostava do escuro. Não existem coisas boas nele, pelo menos não enquanto estava sozinha. Acendi a luz por cada cômodo que passei, evitando ao máximo olhar na direção do banheiro.

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