22 | agora | últimas palavras

Começar do início
                                    

— A Lisbon deixou — esclarece.

O que não deixa tudo mais digesto.

Seus olhos castanhos estreitam-se curiosos em minha direção, com várias perguntas passando por suas írises negras, mas os lábios calados pelo café do mesmo tom.

Um baque seco e audível some com as perguntas e encoraja minha mão a arrancar o envelope branco da sua e enfiar no bolso do casaco de lã sobre meus ombros.

— Acho que nosso pai acordou — dou voz ao obvio.

Isobel revira os olhos com um sorriso divertido nos lábios.

— Vou perturba-lo enquanto você termina o café — decreta.

Me deixando sozinha com aquele que queimava em meu bolso e minha mente.

***

Jogo meu corpo sobre a velha cama de solteiro. Soltando todo o peso do mundo sobre os meus ombros que forçam meu corpo mais para baixo, assim que meus dedos gélidos agarram o envelope branco entre as mãos.

Lennon

Meu nome está gravado em frente do papel branco. Meu nome está gravado com uma letra cursiva que conhecia. Era meu nome. Meu maldito nome que reverbera na minha mente com a voz de uma pessoa que fazia meu coração doer, partir-se em mil.

Era a letra dele.

Meu corpo finalmente chega ao chão. A cama agora apoia minhas costas, de uma forma nada aconchegante. Nada seria aconchegante naquele momento. Talvez algum lugar do passado.

Em um passado sem erros, medos e covardias.

Meu coração se aperta. Os olhos queimam. As lágrimas nublam minha visam e trancam minha traqueia. Meu coração retumba assim que meus dedos tocam a aba do envelope. Espio sem vontade para dentro, revirando meu estômago quase vazio.

Uma chave.

Uma pequena e prateada chave.

Meus dedos gélidos tocam o metal quente. Meu coração para. Sopro o ar sem força pelos meus lábios.

Era a chave da nossa casa

Aquela constatação quase morre no meu peito, que grita em plenos pulmões para parar por ali.

Parte de mim não queria saber de mais. Aquilo era suficiente. Aquilo podia significar tudo. Aquilo podia significar nada.

Eu não sabia o que queria que significasse.

Eu não queria aquilo.

Argo o ar pelos lábios trêmulos, sem vontade arranco o papel de dentro. São três folhas dobradas em três partes. Quase surda pelo retumbar do meu coração que queima minhas bochechas as desdobro.

Um papel pequeno cai sobre o meu colo.

Reconheço a caligrafia em poucas palavras e linhas.

Entre os dedos posiciono o pequeno bilhete na altura dos meus olhos.

Non, je ne regrette rien

Quero que seja livre, para voltar para mim, quando estiver pronta.

Leve o tempo que for.

Sempre terá um lar te esperando para voltar.

Eu sou o seu lar.

Não esqueça

Linhas de água rolam sobre minha bochecha, deixando um sabor amargo em minha língua. Minha garganta se fecha. Meu coração se aperta. E tudo que queria. E tudo o que não queria, estava naquele bilhete.

Sempre sua Garota [✓]Onde histórias criam vida. Descubra agora