18.

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— Já falamos sobre o vestido? — Catarina perguntou.

— Já. Vocês compraram em Milão — revirei os olhos.

— E sobre os pombos?

— Também. Vinte pombos vão voar pelo salão assim que vocês se beijarem.

— E...?

— São pombos adestrados que não irão cagar no clima mega-romântico do casamento.

— Não fale "cagar" enquanto estivermos almoçando — meu pai repreendeu.

— Eu preferiria que não conversássemos, mas a sua noiva está forçando a barra.

Catarina respirou fundo enquanto cortava o pudim com o garfo. Por um instante, me senti mal. Anotei mentalmente para pedir desculpas depois, quando meu pai não estivesse ocupando a mesma mesa que nós dois.

Já não me lembrava direito como eram as refeições em minha casa depois de meses no São Dimas. Os pratos eram servidos sobre uma mesa grande demais para nós três, embora fizéssemos questão de ocupá-la inteira: meu pai e Catarina nas pontas e eu no centro. Estávamos no último andar do casarão, as paredes de vidro mostravam tanto os prédios da cidade quanto o campo gramado e a piscina da casa. O pudim de leite condensado enfeitava o centro da mesa, com calda escorrendo pelas beiradas.

— Mal consigo acreditar que o casamento é amanhã — Catarina tentou puxar assunto novamente, hesitando ao cortar mais um pedaço do pudim.

— Falando nisso — depositei o garfo ao lado do prato limpo, enxugando a boca com um guardanapo — Posso levar uma amiga? — Catarina e meu pai responderam "Claro!" e "Jamais", respectivamente, ao mesmo tempo. — Por que não? — ignorei a resposta de Catarina que, mais uma vez, voltou seus sentimentos para o pudim.

— Porque você não tem amigas.

— Obrigado! — bufei — Mas eu tenho, sim. Eu a conheci no colégio e o nome dela é Maia Campos.

— Tenho a impressão que já ouvi este nome — Catarina ergueu as sobrancelhas.

— Você quer levar uma de suas amiguinhas do reformatório? — meu pai contraiu os lábios ao dizer a última palavra. Ele, ocupado com o smartphone, sequer notara que havia um pudim no centro da mesa.

— Por que você não a convida para o jantar? — Catarina propôs — Será nosso último jantar em família antes do casamento!

— Ótima ideia — sorri. Satisfeita, a noiva de meu pai engoliu o pudim sem que ele parecesse travar na garganta — Sabe, Catarina... Acho que vocês duas podem se tornar ótimas amigas.

Levantei da cadeira e desci as escadas, carregando meu prato, talheres e o olhar desconfiado de meu pai.

* * *

Escutei meu pai falando com uma das cozinheiras para que caprichasse no jantar porque receberíamos uma convidada. Não deixei de sorrir enquanto ela respondia "Sim, senhor". Eu e Maia nos encontramos várias vezes durante a semana, e eu expliquei toda a situação: minha madrasta grávida tinha um relacionamento às escuras com meu primo presidiário — quando ela perguntou o porquê da prisão de Lucas, pedi que conversássemos sobre isso em outro momento. Também disse que eu tinha uma dívida com meu primo e, se o filho fosse de Lucas, não era justo que ela casasse com meu pai.

Não foi difícil convencer Maia a me ajudar a impedir o casamento. Aquela garota gostava de situações arriscadas e problemáticas; toparia a situação mesmo que meu pai e Catarina fossem um casal perfeito. Aliás, ela sente tanto prazer ao se arriscar que, durante a semana, nós transamos duas vezes na despensa do Starbucks enquanto Jeremias a acobertava atendendo os clientes. Confesso que me peguei sorrindo algumas vezes ao sentir cheiro de café pela manhã.

A Última Gravata VermelhaWhere stories live. Discover now