Capítulo 4

4.7K 528 48
                                    

"Agora, todos os pássaros fugiram
A dor apenas me deixa assustado
Perdendo tudo que já conheci."
- Atlantis

AURORA DELANEY

Estar em um avião que em breve pousaria em uma cidade completamente diferente do onde você vivia é, no mínimo, apavorante.

Mas, por algum motivo, não liguei para os medos que costumavam me aterrorizar em situações como essa.

Passei a viagem tão perdida em pensamentos sobre o assassinato de meu pai que quase tive um susto quando uma voz soou pelos passageiros, avisando que iriam desembarcar em minutos.

Olhei pela janela, o céu escuro me observando de volta. Estava de noite, mas consegui identificar ali mais estrelas do que quando me deitava ao lado do meu pai, no gramado de casa, em Houston.

De repente uma onda de tristeza abraçou minhas costas, fazendo com que a sensação de perda só tomasse ainda mais cor. Como uma mancha no pano de mesa que não tem como disfarçar.

Eu não queria chorar, não ali bem no meio do avião. Precisava chegar até a hospedagem, então teria tempo de extravasar meus sentimentos quando estivesse sozinha.

Mas então percebi que era mais forte do que parecia. E redemoinhos de culpa me atingiram, o que resultou em um encolher de ombros e um nó em minha garganta.

Não tive coragem de ver meu pai no caixão, deitado sem vida. Logo depois de o enterrarem, algumas pessoas deram suas condolências para a família, mas eu estava tão indisposta para aquilo que preferi aguardar minha mãe dentro do carro.

Agora estávamos em Oakland, e pelo pequeno vidro pude vislumbrar várias luzes amarelas, iluminando a cidade.

Parecia com certeza bem menor que Houston, mas o que chamou minha atenção de repente foram as penumbras acinzentadas nos arredores.

Eram quase convidativas, atraindo os passageiros a atravessarem aquela névoa e encontrar o que as aguardava do outro lado.

Suspirei, deixando de lado a vista da cidade. Depois de alguns minutos o barulho do avião pousando soou, e os passageiros foram direcionados para a saída.

As botas de Julie ressoavam contra o piso quando nós duas chegamos ao térreo. Eu teria estremecido com o vento gelado, caso não estivesse vestida com roupas de lã macia e quente.

Minhas bochechas provavelmente estavam rosadas àquela altura, por conta da friagem úmida. Olhei em volta, e percebi que de fato havia muita névoa serpenteando pelas ruas. 

Me perguntei se toda aquela neblina servia como escudo para as mentiras da noite, e quis rir, porque parecia coincidência demais para mim. A cidade parecia ser o lugar perfeito para encobrir um caso horrendo, e era exatamente por isso que eu e  minha mãe estávamos ali.

— Vamos. Eu já chamei um táxi. — disse Julie, caminhando para fora do aeroporto de Oakland. — Vamos ficar em um hotel, pelo menos por enquanto.

Pensei em questioná-la, mas no fundo já suspeitava da verdade. Meu pai era quem tinha negócios na família, então o dinheiro era administrado por ele.

Sabia que a herança dos Delaney era generosa, mas não ao ponto de terem a mesma vida de antes.

Uma hora o dinheiro iria acabar, e analisando todos os gastos que tinham ao levar uma vida confortável em Houston era óbvio ser muito mais fácil a mudança para um lugar mais afastado e modesto.

Deusa das Sombras Where stories live. Discover now