Capítulo 1

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"Facilmente eles vêm, facilmente eles vão
Eu pulo do trem, eu desembarco sozinha
Eu nunca cresci, isso está ficando tão velho."
The Archer

AURORA DELANEY

Em alguma situação hipotética, se alguém parasse para me perguntar o que eu mais gosto de fazer, seja no meu tempo livre ou não, sem sombra de dúvidas haveria um espaço de dois segundos, então inconscientemente eu abriria um sorriso alegre e espontâneo, e minha resposta seguinte seria:

— Patinação no gelo.

Amor e obsessão andavam lado a lado quando se tratava de deslizar sobre o gelo, desafiando a maneira perigosa com que os patins se deslocavam uma vez inseridos dentro da pista artística.

Meu primeiro contato com esse esporte foi quando eu era criança. Me recordo facilmente de assistir um novo programa de patinação no gelo, onde vários patinadores profissionais competiam em um estádio muito famoso, na Rússia.

Nunca havia me interessado de fato por qualquer outra prática física antes disso, por mais que meus pais tenham diversas vezes tentado, sem sucesso, me inserir em algum meio esportivo.

Ballet, ginástica, voleibol, handebol. Nenhum deles despertava sensações fortes o bastante para me fazer enxergar a vida de uma perspectiva ainda melhor.

Então, quando eu, uma pequena garotinha de cinco anos, pedi ansiosamente aos meus pais por aulas de patinação no gelo, minha família se surpreendeu.

Primeiro, por eu ser uma criança ainda. E segundo, pela escolha do esporte.

Na minha família todos, ou pelo menos a maioria, tinham dinheiro. E esse valor monetário era fruto de algum meio pretigioso.

Atletismo, empresários, donos de grandes negócios.

Era normal que nós, os filhos, tivéssemos de começar a aprender algo desde muito novos.

Podia ser estranho e fora de contexto para várias pessoas, inclusive para mim, mas em Houston isso significava levar uma vida aceitável.

Aprender cursos estrangeiros, viajar para fora do país, até cursar um curso extremamente concorrido.

A responsabilidade e a pressão eram esmagadoras, para se dizer no mínimo.

Porém, mesmo com toda minha resistência aos esportes anteriores, felizmente, eles não se opuseram aos meus desejos repentinos, e logo comecei a aprender aulas de patinação artística no gelo.

Não demorou muito tempo para eu me apaixonar pela doce sensação de adrenalina assim que pisava dentro do chão frio e deslizante. O ar mais gélido, que parecia acariar os pelos da minha nuca. A maneira sútil com que os patins batiam contra o gelo, rasgando o frio cortante em saltos quádruplos.

Porém, uma vez que eu era filha única, toda a rigidez e pressão psicológica dos meus pais, em especial de minha mãe, caiu malditamente apenas sobre mim.

Com minhas notas sempre acima de oito e meio, raras faltas na escola, e jantares em família todas as noites às 20 horas em ponto, era praticamente fácil para alguém deduzir que eu tinha a vida perfeita.

Entretanto, a sensação de estar sendo outra pessoa apenas para agradar a todos à minha volta era tão presente quanto o meu medo pelo futuro.

Medo de falhar. Medo de não conseguir atingir as expectativas de outras pessoas.

E para alguém que temia o próximo, seria estranho uma garota querer fazer algo justamente imprevisível.

"Você pode se machucar", "E se você acabar caindo e se lesionando?", "Isso é muito perigoso", me disseram. Mas, pela primeira vez na minha vida, me mantive firme mesmo com todos os receios e dúvidas.

Deusa das Sombras Where stories live. Discover now