Prólogo

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Se você não está com medo, você não está se arriscando, e se você não está se arriscando, então o que você está fazendo?

Dedicado à Vinicius Rocha.

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Quem quer que ache fácil trabalhar numa revista de fofoca, está errado.

Redondamente errado.

Viver para escrever sobre a vida dos outros é insanamente entediante. Ainda mais quando os fatos escritos são algo como "Brad Pitt é visto comento rosquinhas em restaurante em Greenwich Village". Bem, seria um pouco menos entediante se escrevêssemos sobre o Brad Pitt. Mas não, não. Sempre estamos escrevendo sobre um atorzinho qualquer que irá estrelar o novo filme de um diretorzinho qualquer. É bem chato e, bem, entediante, como eu já disse.

Mas um dia as coisas agitaram.

Sempre tem algum dia que agita, e acho que é por isso que nunca larguei esse emprego. Ah, é claro. Por isso e pelo fato de eu não saber mais o que fazer da vida. Este tem sido meu emprego desde meus dezoito anos, e não consigo me imaginar fazendo outra coisa. É realmente péssimo quando nos acomodamos com algo.

Bem, lá estava eu, sentada em minha mesa pesquisando as últimas notícias sobre o badalado mundo dos famosos, quando Brenda, a minha colega tão-entediada-quanto-eu arrastou a cadeira giratória com rodinhas nos pés dela até a minha - que não tinha rodinhas.

- Acabei de chegar da sala de café. - ela cochichou, e então percebi que ela segurava um copo grande de cappuccino.

- Eu agradeceria se tivesse me trazido um. - respondi um pouco magoada. Parte era drama, parte era verdade. Eu mataria por um cappuccino quente.

- Esse não é o ponto. - ela balançou a cabeça rapidamente - eu traria um se não tivesse voltado correndo para falar com você.

- Se você veio para falar comigo, por que não trouxe logo meu café?

- Ellen, quer parar com isso? - Eu ri. - Sei muito bem o que está tentando armar... Deixe-me terminar logo.

Assenti, sinalizando para ela continuar.

- Bem... eu estava lá, pegando nosso café, quando Victor, aquele garoto da copiadora, chegou lá dizendo que Carla, a secretária do chefe - ela apontou para cima quando pronunciou "chefe" - disse que estamos num período péssimo para o mercado de revistas e os carinhas lá em cima estão pensando em cortar gastos.

Congelei. Todos sabem o que significa cortar gastos. Significa cortar não só os gastos, mas o pescoço de alguns funcionários, também.

- E foi por isso que eu não trouxe seu café. - ela deu de ombros, como se isso justificasse tudo. Não justifica.

- Eu perdoo. Dessa vez. - fitei os olhos de Brenda como se a ameaçasse. - Mas tudo bem... por que você ficou tão abalada? - respirei com dificuldade - tenho certeza que nós não seremos despedidas. - eu disse, mas não tinha muita convicção. Minha voz quase não saiu.

- É o que eu espero...

Nesse momento Jenny entrou na sala, caminhando como se tivesse ventiladores ao seu redor, balançando a cabeça de um lado para o outro fazendo seus cabelos voarem. Era um pouco ridículo, mas Jenny era uma ótima pessoa. Depois que esquecemos a história de vida dela, sim, ela é uma ótima pessoa. Ela aproximou-se da minha mesa e cochichou no ouvido de Brenda, alto o suficiente para eu ouvir:

- Desse jeito você não será mantida aqui após o corte de gastos, Brenda.

Brenda fez uma careta e olhou para Jenny.

- E onde você estava até agora?

- Obtendo informações.

- E o que mais você soube? - perguntei, esquecendo completamente minhas pesquisas e virando-me para Jenny e Brenda. Desse jeito formamos um triângulo no meio da nossa sala.

- Bem... soube que a revista está quase sendo extinta. Deram mais um ano para nos reerguermos, se não... - ela fez um sinal cortando o próprio pescoço.

Arregalei os olhos.

- Não é... possível. Acabar com a revista? Mas e todos nós? - eu quase gritei. Jenny deu de ombros. Brenda estava paralisada ao meu lado, e quando a toquei, percebi que ela estava mais gelada do quê um cadáver. - Eu não posso perder meu emprego.

- Bem... então cuide-se. A nossa sessão é a mais prejudicada e pode perder metade dos funcionários.

- O quê? - dessa vez eu gritei. Olhei em volta e todos estava com as cabeças viradas para nosso pequeno círculo/triângulo. Sorri sem graça e baixei a cabeça. - não posso perder meu emprego.

- Nem eu! Muito menos eu! Ellen - Brenda virou-se para mim com os olhos marejados, então sussurrou - não posso perder meu emprego.

Eu estava abalada, sim, mas não seria capaz de choramingar no meio da redação. Jenny mandou-nos ir até o banheiro e eu segui com Brenda segurando meu braço. Ela estava muito aluída. Assim que entramos no banheiro me certifiquei de que não havia mais ninguém lá, então entreguei alguns pedaços de lenços para Brenda e esperei ela começar a falar.

Ela balançava a cabeça sem parar, de um lado para o outro, como se o chão estivesse abrindo sob seus pés. Encostei na porta - para que ninguém mais entrasse - e cruzei os braços. Eu estava disposta a esperar Brenda se acalmar e começar a falar, mas ela não desembuchava, então pressionei.

- Anda, Brenda! O que está te abalando tanto?

Ela me olhou como um cachorrinho abandonado e falou, pausadamente:

- Ellen... eu estou... grávida! - ela soluçou enquanto eu digeria a notícia. - E não... Marcus não está mais comigo. Terminamos uma semana atrás, quando eu nem sabia da gravidez.

Levei a mão à testa, sentindo-me um pouco zonza. Agora eu entendia a aflição de Brenda. Se eu havia ficado perplexa e insegura, imagino ela.

Não. Nós não podemos de forma alguma perder esse emprego.


As Listas de Ellen [versão wattpad]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora