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A chegada de Mimosa não passou despercebida por Aparecida, que morria de ciúmes cada vez que ouvia falar no nome da nova sinhá. Em segredo, pôs-se a observar a esposa de seu amado, tomando por conta de seus passos e alimentando por ela um ressentimento cada vez maior, principalmente quando a via perto de Dalva.

Um dia, Aparecida foi postar-se na entrada da fazenda, e quando Euclides entrou a cavalo, ela se atravessou na frente do animal, que quase a atropelou. O cavalo relinchou e deu um pinote, mas Euclides conseguiu controlá-lo.

- Ficou maluca, Aparecida? - ralhou ele. - quer se matar?
- Aí de mim, sinhô Euclides, que vivo a dor da tristeza desde que você partiu - ele sentiu um certo constrangimento, mas não disse nada. - primeiro tiram minha filha, e agora tenho que conviver  com aquela portuguesa esnobe que você tomou como esposa.
- Olhe como fala, insolente! - esbravejou ele, ameaçando-a com o chicote do cavalo. - Mimosa é minha esposa, e você, uma escrava. Apenas uma escrava. Ponha isso na sua cabeça.

Aparecida se encolheu aterrorizada e contrapôs entre soluços:
- Perdoe, sinhô, não falei por mal. Mas a situação não é justa. Dalva tem tudo o que quer, ao passo que Sebastiana... 

- A menina nasceu defeituosa e puxou aos negros. O que você queria? 

- Sua mãe podia se interessar por ela também. 

- Minha mãe? não seja louca, menina. Dalva é como nós, pode se passar por branca. Mas Sebastiana é... repulsiva. 

Ele fez uma careta de nojo, e Aparecida objetou com tristeza:

- Mas ela também é sua filha. 

- Não, não é. Sebastiana. assim como você, é propriedade do barão de Valverde. Vocês são coisas, objetos, no máximo, animais. Não podem querer mais do que recebem. 

- Quando se deitou comigo, o sinhô não pensava assim. 

- Isso é diferente. Deitar-me com você não lhe dá o direito de se julgar uma igual. O direito é meu de usá-la como bem quiser. Só que agora sou um homem casado e não me interesso mais por negrinhas. 

Euclides empurrou Aparecida com o pé, afastando-a do flanco do cavalo, e partiu em disparada na direção da fazenda, deixando-a aos prantos no meio da estrada. Queria se conformar, mas não conseguia. Não era justo que suas duas meninas tivessem sorte tão distintas. Sebastiana era muito ligada a ela, mas Dalva sequer sabia de sua existência. Aquilo, porém, era tolerável, porque a filha estava sendo bem tratada pela sinhá Ismália. Com Mimosa era diferente. Ela era uma intrusa e, não fosse a sua presença ali, talvez o sinhô Euclides a procurasse de novo. 

Mas nao era apenas Aparecida quem se queixava da situação, que também não agradava Ismália. A mae de Euclides ficava aborrecida com a intromissão de Aparecida, pois percebia os olhares da escrava para os donos da casa, como se estivesse a lhes cobrar alguma coisa. 

- Aparecida está se tornando um problema - comentou Ismália com o marido. - vive cercando a casa grande com aquela sua filha aleijada. 

- Eu bem que avisei que essas duas ainda iam dar problema. 

- Estou preocupada. E se aparecida contar a verdade a Dalva? já imaginou o choque que a menina vai levar? criada feito uma princesa e descobre que tem sangue de negro? 

- Se ela fizer isso, corto-lhe a língua e depois a amarro no tronco. 

- Mas o estrago já estará feito e será irreversível. Dalva não pode, em hipótese alguma, descobrir a verdade. 

- Não vai descobrir. 

- Não as quero mais perto de nós. Depois que Euclides voltou, Aparecida vive a persegui-lo. Soube até que tentou fazer intrigas com Mimosa. 

Gêmeas - Não se separa o que a vida juntouWhere stories live. Discover now