Ela está sorrindo.
Ela e esse sorriso está iluminando tudo. Ela também está amenizando o clima de antes. Ela está transformando tudo e eu me sinto bem por ter escolhido esse lugar, e por ter pedido a ajuda de Jack é claro, tenho que admitir que sem ele eu teria ficado perdido.
Encontros não são a minha praia. Eram desnecessários na verdade. Eu era direto e raramente tinha paciência para enrolação por mais que um dia. Até porque, eu não queria uma noite de amor, confissões e café da manhã. O que eu queria era apenas sexo. Ironicamente, aqui estava eu em um "encontro" com a luz mais brilhante de toda a minha vida. Sendo bem sincero a única, Jack era mais um idiota. Que estava sempre ao meu lado, ainda sim um idiota. Tão ruim quanto eu. Por isso nós dávamos tão bem e viramos melhores amigos.
Eu prefiria encarar hoje como uma boa ação. Deixar uma garota como Liana passar o aniversário em branco era quase como deixar de respirar. Eu não podia deixar passar assim sem fazer algo. Era uma obrigação da qual eu não sabia bem porque havia se tornando uma.
A garçonete deixou nossos pedidos na mesa e se retirou. Não deixei de reparar que o seu olhar se prendeu em mim por mais tempo que o normal, e eu simplesmente a ignorei.
Hoje, ninguém era mais importante que Liana. Garota nenhuma importava, só ela.
- O que achou? - Perguntei. Querendo uma confirmação sobre o que ela realmente estava achando sobre o lugar. Os seus olhos brilhavam e eu queria tomar a sua boca nesse momento, para saber como seria e saber se haveria algo de diferente quando isso acontecesse. E se o brilho por alguma razão continuaria ali.
O seu rosto de boneca se virou em direção ao local, seus olhos percorreram mais uma vez cada perímetro da lanchonete até o palco e descendo para as demais mesas e todos que as ocupavam. Estava bastante frequentado.
- Eu gostei, é divertido. - os olhos dela param em duas garotas cantando no palco quando a palavra "divertido" deixa sua boca. Eu ri concordando.
- Aqui é um bom lugar. - murmurei pegando algumas batatas do meu lanche. Tínhamos pedido um combo, Liana tentou dividir a conta a todo custo e eu simplesmente a ignorei depois que disse "não" umas dez vezes.
Eu queria fazer tudo. Até pagar a conta.
- Você costuma vir aqui? - Ela perguntou, dando uma mordida no hambúrguer dela e enfiando algumas batatas logo depois. Eu pensei um pouco na pergunta dela.
- Eu costumava. Na época que me mudei, depois, passei a frequentar lugares menos...pacíficos. - Penso nas festas pesadas. Penso nos shows. Penso nos jogos que eu participava vez o outra quando estava sem nada de interessante para fazer. Penso nas garotas. Penso em muitos dos outros lugares nada tranquilos como esta lanchonete, e apesar de adorar frequentar eles e esquecer de tudo da minha vida lá, não sinto orgulho.
Eram ambientes que pessoas vazias -ou quase todas- procuravam para ocupar um espaço de merda que nada, e ninguém conseguia ocupar, era uma fuga. Eu não me orgulhava desses lugares, mas, continuava a frequenta-los porque eram as únicas coisas que eu gostava de fazer. As festas de fraternidades também estavam nesse bolo, mas, elas eram festas comuns comparadas a outros lugares nos quais frequentei.
- Eu posso ter uma noção...- ela se calou pensativa, e deu mais uma mordida no seu hambúrguer.
Comemos em silêncio durante um certo tempo. Até que eu me lembrei de que não sabia qual era a sua casa na rua onde a busquei.
- Você mora sozinha? -
A minha pergunta fez ela parar de comer. O hambúrguer parou no ar e a sua expressão ficou séria e pensativa, cheguei a pensar que ela tinha entendido errado ou alguma coisa do tipo. Até que ela me respondeu.
- É...mas meu pai mora na mesma cidade que eu. - Ela enfiou as batatas nos molhos de seus pequenos potes e as mordeu, seguido pelo hambúrguer acabando com ele de uma vez.
Franzi o cenho, que tipo de pai simplesmente ignoraria o aniversário da própria filha?
- Ele não fez nada? - Perguntei, mesmo que estivesse cruzando uma grande linha eu precisava saber. Eu tinha apenas meu pai e nós raramente falamos um com o outro, as únicas pessoas que eu tinha uma relação eram meus avós por parte de mãe, mas eles não estavam mais aqui para manteremos essa ligação.
- Ele não é do tipo que faz algo. Na verdade ele nem liga. - ela encolheu os ombros e tomou um longo gole da sua coca-cola.
A serenidade na voz dela me causou dor. Havia tanta tranquilidade que era como se ela falasse isso várias e várias vezes, como se já estivesse conformada que o seu pai aparentemente não se importava com o aniversário da própria filha. Como se tivesse aceitado e não a incomodasse mais.
- Ele não lembrou?
- Podemos deixar essa conversa para outra hora? Não quero falar sobre isso hoje, por favor. - Me senti culpado.
Eu não estava acostumado em dialogar com garotas sobre as suas vidas, os seus problemas, os seus sonhos e as suas angústias. Eu apenas as tocava, beijava, fazia dezenas de coisas prazerosas que envolviam sexo e muito além. Mas conversa, nunca. Eu detestava conversar porque eu nunca queria nada além de sexo. E como consequência eu ultrapassava algumas linhas que levam tempo para se ultrapassar quando se conversa com uma. Fazia muito tempo que eu não conversava dessa maneira com uma garota. Para ser sincero, eu nunca conversei como uma garota como estava fazendo com Liana. Era a primeira vez.
Passo a mão pela cabeça e sem saber o que fazer, seguro a mão livre dela. Esse gesto surpreende ela, não mais do que eu. Aliso sua mão sentindo a sua pele na minha, o máximo que consegui até agora.
Os olhos dela se prenderam nos meus e ali, havia hesitação.
- Desculpe, não quis te magoar. - Os cantos da boca dela subiram em um lindo sorriso sutil.
- Não me magoou. Está tudo bem. - O dedão dela se mexeu, achei que ela fosse retribuir o gesto que eu fazia na costa de sua mão mas ela não fez, e eu vi o receio que ela tinha de retribuir porque afinal era eu e a minha reputação ruim. Talvez ela até estivesse pensando se isso fazia parte do meu jogo ou sei lá mais o quê.
- Então...a comida está aprovada? - Perguntei, olhando as nossas mãos. Ela deslizou a dela para as batatas e eu sorri pegando as minhas batatas.
- Definitavamente - murmurou ela enfiando mais algumas batatas no molho sorrindo radiante. Eu sorri ainda mais orgulhoso por ter escolhido este lugar, e por Jack ajudar claro, claro. Ele iria jogar isso na minha cara pelo resto da vida.
- Espero que guarde o estômago para a sobremesa.
- Tem espaço suficiente. - Ela deu três batidinhas na barriga levemente exposta.
- Ótimo! - Assim que terminamos de comer, chamei a garçonete e pedi dois açaís de tigela com tudo incluso.
- Eu sinceramente não me lembro quando foi a última vez em que eu tomei um açaí. - Liana disse no instante em que garçonete colocou a tigela na sua frente e na minha. Agradecemos e ela se retirou, eu sorri.
- Bom, este é o melhor que eu já provei até hoje. - Peguei a colher e enfiei uma colherada na boca assim como Liana, que gemeu em aprovação limpando o canto da boca logo em seguida. Eu sorri de canto.
Liana estava parecendo uma criança, os olhos brilhavam de pura alegria enquanto ela levava a colher cheia de açaí e tudo o que tinha sido colado em cima até a boca. E eu percebi a sorte que eu estava tendo por estar com ela, Deus, sem dúvida ela estava sendo a garota mais incrível que eu já conhecera.
Seria um privilégio ter ela comigo pelas próximas semanas. Mesmo que eu vá deixa-la depois de conseguir o que quero.
- Isso é muito bom. - Ela murmurou mexendo a colher na tigela, estendi a mão e com o polegar limpei o canto de sua boca, nossos olhares se encontraram e a pele dela esquentou em resposta ao meu dedão deslizando pelo rosto dela.
Devagar, ela mordeu seu lábio inferior, fechei o punho irritado por mais uma falta de ar, ela iria me enlouquecer.
- Que bom que gostou. - Recolhi a minha mão antes que eu fizesse algo que acabaria chamando muita atenção e me traria um grande prejuízo, apesar de tudo valer a pena.
Enchi a minha colher e olhei ao redor enquanto levava ela até a boca.
Conversamos sobre coisas banais enquanto terminamos com o açaí, ela não queria entrar em assuntos sérios e eu muito menos. Prefiria que continuássemos assim, eu não gostava de contar sobre minha vida para garotas, em geral elas não mantiam isso para si, contavam para a amiga que contava para outra amiga e logo todos estavam sabendo de algo que deveria ficar apenas entre eu e ela.
Claro que existem caras que também são uns imbecis. Ambos lados erravam e eu prefiria me reservar, já me conheciam e tinham rumores demais sobre mim e a minha reputação. Eu não precisava de mais.
Apesar de Liana não parecer nada internamente e externamente com as garotas que eu já saí e tive, eu não estava sendo sincero e o meu objetivo com ela era apenas um: a ter.
Não poderia passar disso. Não iria.