Por muito tempo desejei acordar ao lado de Haiti e perceber que fizemos as pazes. Que conversamos e que resolvemos tudo.
So que não foi exatamente isso o que aconteceu. Sexo não vai resolver nossos problemas, nem o forte preconceito que ele sente a meu respeito.
Levanto da cama sem olhar para ele. Junto algumas roupas em uma bolsa, me visto e sigo para o quarto das crianças.
Alita, minha filha mais velha, está acordada, olhando pela janela. Ela têm pernas compridas e um sorriso tão lindo. Seus cabelos cacheados me lembram minha melhor amiga e o fato de ela estar me esperando.
Me lembra que meu sonho está me esperando. O sonho de viver naquela Floresta. De descobrir quem exatamente eu sou com esses poderes.
- Papai? - ela pergunta, olhando para a bolsa na minha mão.
Me aproximo e a abraço.
- Tudo o que é meu agora é sua responsabilidade. Cuide de seus irmãos. Seja feliz.
Beijo sua testa.
- Achei que ia ficar. - ela sussurra, deixando cair as lágrimas.
- Eu preciso ir. Leve seus irmãos pra me ver quando quiser, mas não posso continuar aqui.
Seus braços magros me envolvem. Ela soluça.
- Vamos sentir sua falta. - ela sussurra entre os soluços.
Por um momento sinto minha vontade fraquejar.
- Eu também, filha.
Solto seu corpo e beijo o rosto de cada uma das crianças deitadas em suas camas. Pego a bolsa e sigo para a porta sem olhar para trás.
Não posso hesitar. Passei muito tempo adiando meu sonho, vivendo aqui como se outra vida não existisse lá fora. Como se essa vida não me chamasse.
Já aos pés da montanha, olho para trás uma última vez, para me despedir. Para levar uma última lembrança.
O Xiador me viu crescer e encontrar a felicidade em pequenos atos. A encontrar pais carinhosos que me deram mais do que eu merecia. Aliatra, minha amiga fiel e complicada. Haiti. O amor mais dolorido e mais doce. E cada criança que tirei das ruas.
Olho para a Montanha que não me parece assustadora como pensei no passado.
Estou indo buscar quem eu sou de verdade. E não vou me permitir falhar.