Nunca Mais Serei o Mesmo

By DolphinDiLuna

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Esse é um pequeno conto inspirado no episódio 15x18 da série Supernatural e todo o impacto que teve para os f... More

Nunca Mais Serei o Mesmo

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By DolphinDiLuna

O celular continuava o toque insistente. Ele deveria atender Sam, avisá-lo que estava vivo. Riu amargo com esse pensamento, ele estava mesmo vivo? Não se sentia assim. Ele era carne, ossos, lágrimas e sangue. Mas vivo? Não. Viver tinha acabado de adquirir outra dimensão. A questão é que ele já havia morrido tantas vezes que perdera a conta, mas pela primeira vez sabia o que era morrer de fato, essa morte que as pessoas falam, a morte em vida.

Quantas pessoas importantes foram tombando pelo caminho?

Sua mente regressou para a lembrança da mãe em chamas no teto. Mesmo que ele não estivesse no quarto naquele dia, o pai havia contado com tantos detalhes, em uma noite de bebedeira, que ele não precisava ter visto com os olhos, sua mente tratara de enxergar muito além do que ele gostaria de ver.

Depois o pai. Aquele pai obcecado em matar o maldito demônio que tinha dado fim a sua amada esposa. O pai que criou os filhos para salvar pessoas, caçar coisas, o negócio da família. O pai que era ausente por amar demais.

E Ellen e Jo. Pamela, Bob, Kevin, Charlie. E tantos outros. Tantos...

E novamente o pai e a mãe.

E Sam. Todas as vezes que perdera o irmão um pedaço dele morria junto. Sam que continuava ligando sem parar.

- Sam, estou bem.

- Dean! O que houve? Por que você demorou tanto para atender?

- Desculpe, Sammy. Está tudo bem? Estão todos bem?

Ouviu o som do irmão engolindo seco, aqueles poucos segundos pairavam sobre eles como uma espada afiada. Dean sabia, ele sempre sabia.

- Sammy?

- Dean, todos se foram, todos. Charlie, Bob e até mesmo Donna. Somos apenas eu e Jack.

A voz do irmão soou fraca. Sam que se dedicou tanto para proteger todos, mesmo com o peso da perda de Eileen em seus ombros. Ele queria abraçá-lo. Queria poder voltar no tempo quando o carregava em seus pequenos braços de menino e o embalava prometendo protegê-lo de todo o mal. "Cuide do seu irmão, Dean" fora a principal tarefa que o pai lhe dera, e ele, como um bom soldado, nunca se desviara de sua missão. Cuidar de Sam, protegê-lo, era o que lhe dava forças para levantar todas as manhãs.

- Sammy, volte para casa.

- Dean, está tudo bem? O que aconteceu com Billie?

- Billie está morta. Apenas pegue Jack e voltem logo para casa.

- Está bem, Dean.

Deixou o celular de lado e levou novamente as mãos ao rosto. Ele não conseguira dizer toda a verdade para Sam, porque contar o que havia acontecido era ter que encarar a realidade, e ainda não estava preparado para se despedir.

O silêncio na masmorra o sufocava, mas não tinha forças para sair dali. Talvez não quisesse. Em algum lugar no seu coração uma frágil chama de esperança resistia. Olhou para a parede aguardando que o buraco negro regurgitasse o que havia lhe tirado.

"Irritei tanto um antigo ser cósmico que ele me enviou de volta."

Lembrava dessas palavras como se tivessem sido ditas ontem. Se agarrava a elas desesperado. Mas no fundo ele sabia, sabia que O Vazio não abriria mão novamente.

Por que ele não disse a verdade? Por que?

Por que havia empurrado para algum canto obscuro de si, não se permitindo sequer pensar?

Por que não tinha se dado o direito de acreditar que poderia ser amado, ser feliz?

Toda aquela fúria que pesava em seu peito desde a infância, aquela raiva que achava ser o que o definia.

"Tudo o que você já fez, o bom e o ruim, você fez por amor."

Ainda agora não conseguia se ver dessa forma, porque isso significava que sempre fora um covarde por não ter lutado para assumir o que sentia.

Covarde. Ele tinha sido covarde até o fim. E agora pagava o preço por ter tido medo de dizer as mesmas palavras que recebera.

A dor no peito aumentou. Ele precisava sair de lá, precisava respirar. Tremendo, usando a parede como apoio, se levantou lentamente. Os primeiros passos foram vacilantes. Conseguiu alcançar a cadeira no meio da sala, segurou-a em busca de algo sólido para mantê-lo de pé até sentir que poderia andar sem medo de cair.

Quando enfim alcançou a porta, não resistiu e olhou mais uma vez para trás. Aquela chama em seu peito tinha acabado de se apagar. A dor aumentou esmagando seu coração.

"Você me fez mudar, Dean... Eu te amo."

Atirou-se para fora fugindo das lembranças, a mão na boca sufocando o soluço.

Não queria mais ser aquilo. Não queria mais ser o Dean que tomava para si todas as responsabilidades e reprimia qualquer sentimento que seus inimigos pudessem usar contra ele. Estava cansado de ser forte, de tentar ser invencível.

Ouviu Sam o chamando. Ele precisava do irmão, precisava que dessa vez os papéis fossem trocados e Sam cuidasse dele, o protegesse da dor.

- Sammy.

Sua voz tão fraca, tão distante do trovejar de sempre.

- Sammy, Sammy!

Chegou a biblioteca cambaleante. O irmão estava ao lado da grande mesa do saguão.

- Sammy, por favor.

Sam andou apressado em sua direção seguido de perto por Jack. Seus olhos assustados estavam preenchidos de preocupação. Ali, no centro da biblioteca, os dois ficaram frente a frente.

Ele não aguentava mais, tudo a seu redor girava. Ele via Cass em cada canto daquele lugar. Cass o abraçando quando se encontraram depois de Chuck e Amara terem partido. Cass sentado ao seu lado em um dos poucos momentos de paz, celebrando a vida de Jack.

Cass, sorrindo entre lágrimas, dizendo adeus para nunca mais voltar.

- Ele se foi, Sammy.

Enfim as pesadas lágrimas romperam a barreira e ele foi ao chão. O peso da derrota envergava seu corpo. Socava o peito em penitência.

Sam não sabia o que tinha acontecido, mas suspeitava que tivesse haver com a ausência de Castiel. Ajoelhou-se em frente ao irmão puxando-o para seus braços. Ele sempre temeu que aquele dia chegasse, o dia que Dean aceitasse os próprios sentimentos, mas que Cass não estivesse lá para recebê-los.

- Ele se foi, Sammy, se foi. E eu não disse. Eu não disse, Sammy.

- Ponha tudo para fora, Dean, não guarde mais.

As palavras do irmão eram a permissão para ser aquele Dean que Castiel havia enxergado e amado.

- CASS!

O grito dolorido rasgou seu peito.

Jack olhava seus pais sofrendo e se sentia impotente por não poder fazer nada. Tudo o que ele queria era trazer Cass de volta como fizera uma vez, mas não tinha mais poderes. Não tinha mais Castiel. Seu pai havia morrido.

A força com que o nome do anjo foi dito naquele lugar repleto de magia, teve o poder de transcender as paredes e ressoar para além daquele plano. No céu, os anjos choraram a perda de mais um deles. Castiel fora amigo e também inimigo, para no fim ser só mais uma marionete nas mãos de deus.

No inferno, Rowena parou em meio a uma risada lasciva. Seus olhos marejaram. O anjo, no final das contas, também se tornara seu menino.

Mas foi Chuck quem foi transpassado por aquela lança de dor. Ele, que em sua arrogância desprezou suas próprias criações, que brincou com suas vidas, sentia agora a agonia de uma forma tão violenta que o surpreendeu. Em sua mente a voz de Amara, repleta de amargura, profetizou:

- Irmão, você pode mentir para si mesmo o quanto quiser. Mas a verdade é que você perdeu seu filho mais leal, aquele que te amava tanto, aquele que você maldosamente desdenhou. E eu sei que isso te machuca. Nós sentimos a dor de Dean. E enquanto existirmos, carregaremos essa dor como lembrança do quão vil podemos ser.

Chuck voltou seus olhos em direção a Dean e por um momento vacilou em seu firme propósito de destruir tudo. O peso da solidão como lembrete das suas escolhas. Sentado em seu mítico trono, era a imagem de um deus derrotado.

Na biblioteca, Dean chorava abraçado ao irmão, seu rosto afundado no peito de Sam. Era triste ver que eles haviam trocado de lugar, Sammy o embalava como um dia Dean fizera com ele.

- Dean, você precisa falar, você não pode mais guardar todo esse sentimento com você.

A dor, como se fosse fogo, subiu por sua garganta e enfim foi libertada.

- Cass, você é a única coisa que quero ter, minha verdadeira felicidade. Cass, eu te amo...

Palavras podem transformar. Palavras curam.

No Vazio, onde anjos e demônios repousam por toda eternidade sonhando seu passado, Castiel, em seu sono sereno, sonha com as palavras que tanto desejava ouvir. Seus lábios se curvam em um sorriso afável, enquanto uma lágrima escapa de seus olhos adormecidos.

- Eu sempre soube, Dean...

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Escrevi esse conto alguns dias depois do episódio ir ao ar, ouvindo "I Will Never Be The Same" (que inclusive virou o título para esta história) da Melissa Etheridge, porque essa música, para mim, é a síntese do que aconteceu com esses dois. Foram, como têm sido desde então, dias de tristeza e ansiedade. A pergunta que o fandom continua se perguntando: É mesmo o fim de Castiel? A série tornou Destiel canon para fazer isso, matá-lo logo em seguida? 

Como fã, principalmente como fã de Destiel, mantenho a esperança do retorno do nosso querido anjo no último episódio, para enfim encontrar a felicidade ao lado do homem que ama. Porque definitivamente esses dois merecem muito ser felizes depois de tudo o que passaram.

Para quem quiser ouvir a música, deixo aqui o vídeo. Apreciem a voz de uma das maiores roqueiras de todos os tempos.

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