Touching Paradise • Beauany

By abeaushine_

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Any era uma adolescente extrovertida e cheia de alegria até o pior acontecer. Quando perde sua mãe em um terr... More

Elenco + playlist
The lake
Beautiful smiles
Going back to our lives
First on the list
Aquarium of the Pacific
Old and new friends
Just friends
Shoulder to cry
Good night, Any!
Plans for the saturday
City of Angels x Twilight
It's a crazy party
Friendly advice
No powers
Tedious but interesting
Nervous
Nostalgic day
Feelings
Enlightening conversations
She drives me crazy
Twins day
Theories
I miss you
Like the sky
Screams, hugs and tears (1/3)
Not everything is as it seems (2/3)
Bad dream (3/3)
Caution
A small wager
Dinner invitation
You're not the only one
Revelations
Ups and downs
Trying
Sofya's party
I'm not crazy
Sensations (+16)
Decisions
The truth (parte 1)
The truth (parte 2)
Did I screw it up?
Shiv being Shiv

Know better

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By abeaushine_

13.10.2019 - 16:30
Los Angeles, California

Any Gabrielly

— Gabrielly, Josh acabou de chegar. Você está pronta? — Shivani aparece na porta do quarto.

— Quase. — aviso, borrifando meu perfume. Ela se encosta no batente e cruza os braços. — Pode dizer a ele que já desço? Só preciso do batom agora. — deixo o frasco em seu devido lugar. Em seguida pego um batom vermelho na necessaire deixada sobre a cama.

— Não acha que é melhor usar um gloss levinho? — diz, observando minha escolha. — Se usar algo forte assim e vocês ficarem de amassos durante o filme, vão sair da sala feito dois palhaços no fim e não vai ter ninguém para avisar. — ela arqueia as sobrancelhas.

Penso um pouco sobre a sugestão. Não acho que me agarrar seja o que Josh pretende fazer no escuro do cinema, porém nunca se sabe. Eu é que não vou me opor caso aconteça. Julgando ser melhor prevenir do que remediar, decido ouvir o conselho. Volto a mexer na necessaire, pegando um gloss translúcido de morango, que só comprei pelo cheirinho da fruta e o sabor levemente adocicado.

— Melhor? — mostro o tubo rosa claro.

— Melhor. — ela ri. — Vou avisar que você está indo e que ele já pode chamar o Uber.

— Obrigada! — grito ao vê-la sair.

Paro em frente ao espelho e espalho uma camada moderada de gloss pelos lábios, sorrindo por estar em paz com minha irmã outra vez. Odeio quando brigamos, ainda mais por motivos fúteis. Ainda bem que ela reconheceu seu erro e veio me procurar logo após sua conversa com Bailey.

Depois que me fechei no quarto, os dois passaram quase uma hora inteira na sala. Só Deus sabe o quanto precisei me segurar para manter distância e respeitar sua privacidade enquanto minha fofoqueira interior estava louca para ouvir cada detalhe da conversa. Para meu alívio, apenas dez minutos após Bailey ir embora, Shivani bateu em minha porta e pediu para entrar. Obviamente, eu cedi.

Flashback on

— Você já deve imaginar por que estou aqui, então acho que não preciso enrolar. — ela disse, sentando-se aos pés da minha cama. Sentei-me na cabeceira, fingindo mexer em algo no celular. — Any, será que pode me perdoar pelo que fiz ontem?

— Você fez muitas coisas. Pode ser mais específica? — abri o Instagram e comecei a rolar o feed distraidamente.

— Ah, para. Você sabe do que estou falando.

— Está pedindo perdão por ter convidado Bailey e Krystian para o luau, enquanto nosso combinado era que só amigos próximos participariam? Ou por ter me taxado de fura olho na frente de todo mundo, mesmo vendo que eu estava com o Josh? — deixei o celular sobre a mesa de cabeceira e finalmente direcionei meu olhar a ela. — Você também pode estar pedindo perdão por simplesmente ter sumido na noite sozinha com o Lamar e não ter atendido nenhuma das minhas ligações, enquanto eu morria de preocupação. — cruzei os braços. — Sabia que o Josh passou praticamente a noite em claro comigo por sua causa?

— Caramba, você não vai facilitar, não é? — Shiv revirou os olhos antes de engatinhar sobre a cama para se encostar na cabeceira, ao meu lado.

— E desde quando você facilita as coisas para mim, Shivani? — devolvi. Ela respirou fundo, provavelmente em busca de um pouco de paciência.

— Quero que me perdoe por tudo, ok? Eu não devia ter feito nenhuma das três coisas. — disse, abraçando um dos meus travesseiros. — Mas não me arrependo totalmente de duas delas. Se eu tivesse convidado só nossos amigos próximos, como você queria, Josh não teria ido e, consequentemente, vocês ainda estariam sem se falar. E quanto a "sumir" na noite — ela fez aspas com os dedos —, bem... isso me permitiu repensar certas coisas. Mesmo assim peço perdão. Não queria preocupar ninguém, mas você sabe como eu sou. — me olhou, insegura.

— Claro que eu sei. Quando está com raiva, você explode e sai dizendo o que quer, sem se importar que suas palavras possam ferir quem está a sua volta. Depois pede desculpas, como se isso simplesmente apagasse o que fez.

— Resumindo: eu sou um ser humano horrível. — choramingou, apoiando a cabeça sobre o travesseiro em seu colo.

— Você não é um ser humano horrível, Shiv. — suspirei. — Só precisa aprender a medir as palavras e a ser menos impulsiva.

— Se eu prometer que farei isso de agora em diante você aceita minhas desculpas? Sério, estou arrependida! Principalmente por ter te ofendido. Eu sei que você jamais daria mole para o Bailey. Fui estupida. — ela franziu levemente os lábios e o cenho, quase uma réplica de cachorro abandonado. — O que me diz?

Fingi avaliar minhas unhas por alguns instantes apenas pelo prazer de torturá-la um pouco e testar seu real arrependimento. Quando Shiv começou a se mexer, impaciente por minha demora, decidi dar fim a sua agonia. Por mais magoada que estivesse, eu a perdoaria como sempre. Mas um charminho é fundamental...

— Só te perdoo se me contar o que você e Lamar ficaram fazendo a madrugada toda juntos. — ergui o queixo, tentando persuadi-la. — Ah, e também quero saber sobre a sua conversa com Bailey. É pegar ou largar!

— Nossa, que coisa feia! — ela estreitou os olhos para mim enquanto ajeitava a postura. — Isso é chantagem.

— Ok, então não me conte nada. Assim a gente não se entende e não me sentirei obrigada a te contar sobre o que rolou entre mim e Josh noite passada. — dei de ombros, ouvindo-a bufar.

Levou apenas dez segundos até que a morena cedesse.

— Tudo bem, curiosa. Eu conto tudo.

Flashback off

E assim passamos o resto da manhã, parando apenas para o almoço, quando papai voltou da pesca. Não nego, meu queixo quase caiu quando Shiv contou sobre o que tem acontecido entre ela e meu melhor amigo. Até onde eu soube, os dois ainda não se envolveram realmente, mas só o fato de terem passado a noite inteira na praia — apenas conversando, segundo a própria — já é bastante significativo.

O que ela contou sobre Bailey também me surpreendeu. Ele não só pediu desculpas caso tenha lhe dado falsas esperanças, como também explicou que anteriormente estava focado em mim, mas que estava desistindo por estar cansado de não receber a menor condição. Os minutos restantes que os dois passaram juntos serviram para conversas paralelas, incluindo a forma como Gaya lida com estranhos e o trabalho que adiamos mesmo sem a menor necessidade.

Fiquei feliz por minha irmã e eu termos nos entendido, intrigada por sua aproximação com Lamar e satisfeita por Bailey ter colocado os pingos nos is ao conversarem, mas o que mais me alegrou, sem sombra de duvidas, foi ouvir da própria Shiv que não correria mais atrás do garoto. Saber que ela não se colocaria mais em risco em nome de algo tão incerto foi a melhor notícia para mim.

Dou uma ultima olhada em minha silhueta no espelho. Ao aprovar o look composto por uma blusa ombro a ombro amarela, short jeans e tênis brancos, pego minha pequena bolsa preta sobre a cama e saio do quarto. Desço as escadas apressadamente, ajeitando minha gargantilha de estrelas. Quando chego à sala, vejo Josh no sofá. Seu corpo levemente inclinado para frente para brincar com Gaya. Shivani encontra-se no outro sofá, usando o controle remoto da TV para zapear por canais aleatórios.

— Oi! — chamo a atenção. Os olhos azuis pousam sobre mim no mesmo instante.

— Any, oi! — Josh se levanta e vem em minha direção. Ele me puxa para um abraço que me arrepia inteira só por inspirar seu delicioso perfume e sentir seu corpo colado ao meu. Em seguida, recebo um beijo no rosto. — Você está linda. — diz, afastando-se minimamente.

— Você também. — respondo, incapaz de conter um sorriso ao reparar a camiseta branca, o jeans claro e os tênis também brancos, como os meus. Clean como sempre. — Quanto tempo até nosso carro chegar? — pergunto. Ele confere o celular.

— Dois minutos.

— Certo, então é melhor esperarmos lá fora. — aponto a direção da saída. — Shiv, estamos indo. Se o papai perguntar por mim, avisa que saí?

— Ele já foi para a delegacia, não vai perguntar. Mas relaxa, se ligar, eu aviso. — ela diz, ainda mudando os canais. — Bom filme para vocês, caso realmente assistam!

— Shivani Paliwal! — repreendo ao ouvir uma risada escapar pelos lábios maldosos e balanço a cabeça em negativa. — É óbvio que vamos assistir.

— Ok. — ironiza. — Divirtam-se!

— Nós vamos. — mando um beijo no ar para ela. Josh acena brevemente antes de ser guiado para fora da casa. Paramos na varanda enquanto tranco a porta. 

— Vocês parecem bem melhores que ontem. É bom saber que se acertaram. — o garoto comenta ao meu lado.

— Sim, é ótimo. — guardo as chaves na bolsa e me coloco de frente para ele. — Você tinha razão. Nós só precisávamos de um tempo.

— Funciona na maioria dos casos.

— Sabe que no fim das contas a ceninha do Bailey serviu para algo? Pelo menos agora a Shiv desistiu dele. Não preciso mais me preocupar com isso.

— E quanto a ele? Desistiu de você?

— Foi o que eu soube. — respondo ao lembrar-me de mais cedo, quando May finalmente pareceu entender que jamais ficará comigo. — E mesmo que não tivesse, nós nunca teríamos nada. Aquele cara não faz meu tipo.

— Claro que não, você tem um fraco por vampiros. — ele brinca, diminuindo a distância entre nós. — Ah, e por rapazes loiros, de olhos azuis também. — Josh pousa as mãos em minha cintura, sorrindo de lado. As iris oceânicas fitando-me com intensidade.

— Principalmente por loiros de olhos azuis. — murmuro, sorrindo de volta, totalmente envolvida em seu magnetismo.

Meu olhar recai sobre os lábios rosados e umedeço os meus ao vê-lo se inclinar um pouco, a fim de anular o espaço restante entre nós. Porém, antes que aconteça, o som de uma buzina chama nossa atenção. O motorista acaba de chegar. Sorrimos um para o outro e, meio a contragosto, voltamos a nos afastar. Então caminhamos pelo gramado até o carro prata em frente à calçada.

Nosso trajeto até o cinema leva cerca de dez minutos, tempo esse que passo trocando mensagens com Lamar e Sofya em nosso ressuscitado grupo, enquanto o senhor na condução do veículo conversa sobre algo a que não me atento com Josh. Depois de pagar a corrida, seguimos para a fila da bilheteria a fim de providenciar nossas entradas.

— Você ainda não me disse o que vamos assistir. — comento ao me dar conta. Há cinco pessoas a nossa frente. — Que filme escolheu?

— Hm, eu não sabia ao certo, então pedi ajuda ao Noah. Ele sugeriu Angry Birds 2, o que acha? — ele me observa atentamente.

— Me trouxe aqui para vermos um filme infantil? É sério? — tento me manter impassível, mas não consigo. A vontade de rir é maior. Rio ainda mais ao ver as bochechas do garoto a minha frente corando de forma adorável. Fofo!

— Foi uma escolha aleatória. Nós podemos ver outra coisa. — sugere, claramente sem jeito. Não contenho o impulso de emoldurar seu rosto em minhas mãos e roubar um selinho. Encontro um sorriso tímido quando me afasto.

— Acho melhor vermos algo mais adulto. — observo alguns cartazes a nossa volta, com a programação das sessões que começam em quinze minutos. Vejamos: Predadores Assassinos, The Goldfinch, Gemini Man, Joker... — Que tal esse? — aponto o cartaz estampado por Joaquin Phoenix. — É um dos lançamentos mais aguardados do ano.

— Ok... — diz, pensativo, analisando a imagem. — Tudo bem para mim.

— Ok! Joker então.

Depois de comprarmos os ingressos, deixo Josh responsável por pegar a pipoca e vou direto para a sala encontrar nossos lugares. Felizmente a sessão não está tão cheia, tanto pelo horário quanto pelo fato do filme estar em exibição há mais de uma semana. Meu acompanhante se junta a mim minutos mais tarde, logo quando o ultimo dos trailers começa.

— Aqui está. — ele me entrega o pote de tamanho médio e deixa os refrigerantes no porta-copos. — Comprei desse tamanho porque pretendo te levar para comer depois daqui, tudo bem?

— Tudo. — apoio o cotovelo no braço da poltrona a fim de me aproximar. Josh faz o mesmo, inclinando-se para falar mais baixo.

— Soube de uma ótima lanchonete aqui perto. Podemos ir até lá.

— Estou disposta a ir em qualquer lugar que tenha uma boa batata frita. — pego um punhado de pipoca e levo à boca.

Não demora até que o filme comece, então passamos a nos atentar exclusivamente à enorme tela. Diferente do que pensei, a história me prende logo de início devido ao enredo singular. É tão sombria, envolvente e intrigante que apenas mergulho na trama. Só volto a notar o mundo a minha volta quando, muito tempo depois, Josh parece sonolento. Ele se espreguiça ao meu lado, pousando o braço em meus ombros por fim. Aproveito a oportunidade para me aconchegar, deixando a cabeça na curva de seu pescoço.

— Não está gostando? — sussurro para que ele seja o único a ouvir.

— Estou, é um ótimo filme. — responde no mesmo tom.

— Pensei que estivesse ficando entediado.

— Ao seu lado? Nunca. — a mão livre envolve a minha e a leva aos lábios em seguida. Sorrio ao receber um beijo casto.

Retribuo o carinho ao virar meu rosto em sua direção, bem onde estou. Passo o nariz suavemente em seu pescoço, inspirando mais fundo ao sentir o perfume que tanto gosto. Percebo Josh se enrijecer ante minha respiração em sua pele, o que me leva a ter ideias pouco apropriadas para o lugar em que estamos e que eu adoraria por em prática, porém, decido afastá-las da minha mente. Ainda é cedo para certas intimidades. Não quero assustá-lo. Falsamente resignada, apenas deixo um beijo leve no local antes de me aconchegar novamente em seu corpo e voltar minha atenção ao filme.

— Incrível! Não tenho outros adjetivos para descrever Joker. É apenas incrível. O Oscar vem, tenho certeza! — exclamo ao deixarmos o cinema.

Caminhamos lado a lado pela calçada, rumo à lanchonete mais próxima. Assim podemos desfrutar um pouco mais da companhia um do outro antes de voltarmos para casa.

— Quem é Oscar? — Josh pergunta, parecendo realmente confuso.

— Está brincando? — o encaro com incredulidade. Todos conhecem o prêmio mais importante do cinema mundial.

— Óbvio. — ele dá risada, estendendo a mão para segurar a minha. Entrelaço nossos dedos tão naturalmente, que parece ser algo que fazemos com frequência. — Todos conhecem o prêmio mais importante do cinema mundial.

— Foi o que pensei. — sorrio. — Enfim, eu amei. Acho que meu pai vai amar também. Não posso me esquecer de sugerir que ele assista quando tiver uma folga.

— O Sr Paliwal trabalha muito, não é?

— Sim, mas sempre encontra um tempo para ficar comigo e com a Shiv. — explico. — Eu gosto disso. — ele assente.

— Isso é bom. Vocês formam uma linda família, aliás. 

— É, não posso negar que temos uma ótima relação. Sempre tivemos, na verdade. Sou grata por esse aspecto não ter se alterado apesar dos pesares.

— Está se referindo ao que houve? Com a sua mãe, quero dizer. — questiona ao me olhar.

Josh usa um tom receoso, certamente por saber que está entrando em um assunto delicado para mim. Tento me conter, porém é impossível não demonstrar o quanto uma simples referência à ela me afeta. Agora um pouco menos, mas ainda afeta.

— Sim. — respondo simplesmente.

— Como ela era? — ouço sua voz antes que eu consiga mudar de assunto.

Vacilo um pouco, fitando os carros na rua para ganhar tempo. É a primeira vez que me fazem essa pergunta. A ultima vez que ouvi algo minimamente parecido, foi quando me questionaram com um "Any, como é sua mãe?". Ouvir uma sentença tão semelhante, mas simultaneamente tão discrepante devido à alteração no tempo verbal, tem um peso. Josh quer saber como ela era, no passado. Dói.

Apesar do que se passa em minha mente, respiro fundo e dou a ele uma resposta decente.

— Ela era linda, carinhosa, engraçada, inteligente. — volto a olhar seu rosto. — Nós nos desentendíamos às vezes, mas ela nunca deixou de ser minha maior referência. Éramos muito próximas, não só como mãe e filha, mas também como amigas. — suspiro, sentindo uma emoção incomum. Uma nostalgia dolorosa, porém reconfortante, como se falar dela em voz alta pudesse trazer algum consolo. Com um sorriso agridoce, prossigo: — Dona Priscila era simplesmente a pessoa mais importante para mim. A mulher mais incrível do mundo. — passo a encarar meus pés em movimento, pelas divisões da calçada.

— Eu lamento, Sky. Sinto muito que tenham se separado. — Josh me envolve pelos ombros e beija minha testa. Meu peito fica ligeiramente aquecido, não só pelo gesto, mas também pelo uso do apelido que ele carinhosamente me deu. Continuamos a andar assim, abraçados.

— Também sinto. Todos os dias. É uma pena que ela tenha ido tão cedo, ainda mais naquela circunstância. Minha mãe partiu furiosa comigo, algo que nunca vou superar. — engulo em seco. O loiro me aperta um pouco mais contra si.

— Não diga isso. Tenho certeza de que independente do que tenha acontecido, ela não está mais brava.

— Como sabe? — diminuo o ritmo de nossos passos conforme nos aproximamos da entrada da lanchonete.

— Bem, ela era sua mãe. Não tenho duvidas de que te amava mais que a própria vida.

— Amava, mas algumas das ultimas palavras que ouviu de mim foram "Eu odeio a forma que você se esforça para destruir a minha vida". — comprimo os lábios e pisco algumas vezes ao sentir os olhos arderem. Droga! Não posso chorar agora... — Enfim, será que podemos mudar de assunto?

— Tem certeza? — finalmente paramos. Entretanto, ao invés de entrar no estabelecimento, ficamos frente a frente, na calçada. — Não acha que se abrir com alguém possa te ajudar a lidar com as sensações ruins?

— Talvez, mas não em um encontro. — mostro um meio sorriso, torcendo para que ele entenda. Não é o melhor momento. — Estarmos juntos tem sido muito agradável. Prefiro que continue assim.

— É claro, me desculpe. Eu não quis ser invasivo.

— Tudo bem, falamos disso depois. Algo me diz que vai ser bom me abrir com você. Ao menos é o que sinto. — volto a segurar sua mão. Ele assente. — Será que podemos entrar agora? — indico a porta do Carl's Jr. com a cabeça. — Estou ansiosa pelas batatas fritas.

— Sim, vamos lá. — Josh sorri, guiando-me para dentro.

A lanchonete está lotada, o que a princípio parece ser um problema, mas damos sorte. No momento em que cruzamos a porta, um grupo de meninas desocupa uma das mesas. Peço a Josh que guarde o lugar para nós enquanto vou ao caixa fazer nossos pedidos, então depois de me dizer o que quer comer, ele se dirige até ela.

Aguardando minha vez no atendimento, observo o garoto ao longe. Ele parece brincar com os vidros de molho, porém, logo se dá conta da atenção recebida e seus olhos encontram os meus. Mostro um pequeno sorriso, ao qual ele retribui, e na mesma hora algo perpassa minha mente. A lembrança de que ainda sabemos pouco sobre o outro, eu ainda menos que ele. É quando uma ideia me ocorre. Após falar com o atendente, sigo rumo a nossa mesa, decidida a fazê-lo contar mais sobre sua vida.

— Quero propor um jogo. — anuncio, deslizando pelo banco vermelho e acolchoado, de frente para Josh.

— Que jogo? — ele pergunta com aparente curiosidade.

— De perguntas e respostas. Quase como verdade ou desafio, mas usando só a verdade. Ah, e nós dois responderemos as mesmas questões. — assisto o garoto se remexer em seu assento.

—  E se eu não me sentir confortável para responder alguma delas?

— Bem, nesse caso, podemos simplesmente passar para a próxima, mas o ideal é que nos esforcemos. O que me diz? — tento soar persuasiva. Ele parece hesitante, mas concorda.

— Ok, vamos jogar. — o loiro ajeita a postura. Em seguida, apoia os braços sobre a mesa, inclinando-se um pouco para frente.

— Está bem. — sorrio, imitando seu gesto e penso um pouco antes de fazer a primeira pergunta. — Então, Joshua, qual era o nome do seu primeiro bicho de estimação?

— Hm, pode parecer estranho, mas eu nunca tive um. Quer dizer, nunca tive cachorros, gatos ou peixinhos dourados, como as pessoas normalmente tem. Deixe-me ver como explicar sem que pareça ofensivo. — ele franze os lábios discretamente, enquanto aparenta escolher as palavras. — O meu pai, bem... ele possui uma vasta criação, a qual trata como parte da família.

— Ele é fazendeiro? — me interesso.

— Algo semelhante. — o rosto de contrai em uma careta fofa.

— Então o seu pai tem um grande rebanho, mas é tão apegado que o enxerga como sua prole?

— Exatamente!

— E que tipo de rebanho ele tem? Bois, porcos, ovelhas, cavalos...?

— Ovelhas! Muitas delas. — ele sorri. — Ele sempre confiou suas ovelhas a mim e aos meus irmãos para que cuidássemos. Sabe, nenhuma delas era minha de fato, mas quando ele me entregava, eu passava a guiá-las e protegê-las da melhor forma possível.

— Ok, então me diga o nome da sua primeira ovelha.

— Era um carneiro. Seu nome era Abel.

— Como o irmão de Caim? — dou risada.

— Exatamente como o irmão de Caim. — Josh assente, um tanto nostálgico. — Também tínhamos um carneiro com esse nome, aliás.

— E todos os animais do rebanho tinham nomes bíblicos? — pergunto, achando graça.

— Por um tempo, sim. Hoje, não mais. Agora temos ovelhas com nomes de políticos, atletas e até divas pop. Beyoncé e Ariana são algumas das favoritas do meu pai, inclusive. — há um sorriso divertido em seus lábios. Não consigo conter a gargalhada.

— Josh! Não acredito! — trago as mãos ao rosto, sentindo-o esquentar de tanto rir.

— Mas é verdade, pode acreditar. — o garoto se deixa contagiar por minha risada. — Enfim, sua vez.

Demoro bons segundos até me recompor. Somente quando estou totalmente recuperada do ataque de risos é que respondo a pergunta. Entretanto, ainda estou sorrindo.

— Meu primeiro bichinho foi um hamster chamado Stuart. Escolhi esse nome por causa do filme Stuart Little. — apoio o rosto na mão direita e o cotovelo sobre a mesa. — Eu devia ter uns cinco ou seis anos e estava louca por um cachorro, mas coloquei na cabeça que tinha que ser um daqueles grandes, como a Gaya, e meus pais se negaram a me dar, porque ainda era pequena demais. Sabiam que eu não daria conta de cuidar e eles também não, por causa do trabalho que exerciam fora de casa, com suas profissões, e dentro com duas garotinhas pouco comportadas.

— Então o Sr e a Sra Paliwal pensaram que um ratinho seria a melhor opção para entreter a pequena Any? — Josh segura minha mão livre, erguendo-a no ar e enlaçando nossos dedos. Elas se balançam lentamente, de um lado para o outro.

— Isso aí! Funcionou por um tempo. Só não foi tão legal quando o Stuart morreu, dois anos depois. Fiquei arrasada.

— Posso imaginar. — ele diz, compreensivo.

— Lanches da mesa nove! — a jovem garçonete anuncia ao se aproximar.

De forma simpática, ela deixa os hambúrgueres, batatas e refrigerantes sobre a mesa e, após ouvir nossos agradecimentos, volta a se afastar. Solto-me de Josh para poder segurar meu sanduíche com ambas as mãos.

— Sua vez de perguntar. — dou a primeira mordida. O garoto a minha frente come algumas batatas antes de se manifestar.

— Diga-me, que profissão pretende seguir?

— Essa é uma boa pergunta. — constato. — Felizmente, tenho algum tempo antes da faculdade, porque ainda não me decidi, mas acho que estou mais propensa a cursar medicina veterinária. Eu amo os animais. Adoraria fazer mais por eles. E você?

— Gosto de qualquer área que envolva cuidado e proteção, então me identifico com os médicos, bombeiros, policiais como o seu pai.

— A sua obsessão por roupas brancas me leva a crer que escolheria a medicina sem pensar duas vezes. — brinco. Ele dá risada.

— Você gosta mesmo de implicar com elas, não é?

— Não é implicância, eu até gosto. É algo seu! — tomo um gole da bebida. — Costumava ser dos seus amigos também, quando começaram a frequentar a ESLA, mas tenho notado que aos poucos, os estilos estão se modificando. Com Noah e Sabina tem sido mais evidente.

— É, eles gostam de experimentar coisas diferentes.

— Nada contra o seu estilo, mas talvez você também devesse experimentar. — pego uma batata frita e coloco um pouco de ketchup antes de comê-la.

— Ok, dona Any Gabrielly! Já entendi. — ele revira os olhos de um jeito bem humorado, fazendo-me rir outra vez. Minha mente volta a reforçar o quanto estarmos juntos me faz bem. — Vamos lá, próxima pergunta.

— Quando é seu aniversário? Dessa vez não preciso responder, porque você já sabe o meu, porém, ainda não sei o seu.

— Segundo os meus documentos, é no dia trinta e um de março. — ele diz, com seu jeitinho "Joshua" de ser.

Talvez eu nunca entenda algumas de suas escolhas lexicais. Às vezes é como se ele se escondesse atrás de meias verdades. Mesmo assim, decido ignorar a questão. Pode ser coisa da minha cabeça.

— Vou me lembrar disso. — pego outra batata. — Próxima pergunta.

— Hm, deixe-me pensar. — ele morde o sanduíche. Ideias rondam sua mente enquanto mastiga. — Se pudesse realizar um único desejo, qual seria?

— Só um? — ele assente. — Por que não três, como o gênio da lampada? — reclamo.

— Apenas um, Any. — reforça. — Ah, e não pode ser nada que altere o passado.

— Certo. Sendo assim, não tenho muito o que pensar. É uma questão simples para mim. Meu desejo seria encontrar minha mãe uma ultima vez, para pedir perdão e me despedir direito. Acho que nada me faria mais feliz. — dou um meio sorriso, mesmo sabendo que acabo de descrever um desejo impossível. Josh não diz nada dessa vez, apenas me observa com um brilho diferente nos olhos. Decido prosseguir com o jogo. — E o seu? Qual seria?

— Escolher.

— Escolher? — encaro-o com o cenho franzido, confusa pela resposta.

— Meu futuro. Gostaria de ter algum poder sobre ele.

— Mas você tem. — endireito-me no assento. — Ninguém tem o controle de tudo, é claro, só que cada um de nós tem seu livre arbítrio. Todo mundo tem não só o poder, como também o direito de escolha. Não são elas as responsáveis pelo que chamamos de futuro? — volto a comer o hambúrguer.

Josh fica sério de repente, seu olhar fica distante. Sua quietude é tanta, que por um momento pergunto-me se falei algo errado. Quando seus olhos finalmente voltam a mim, gentis como sempre, deduzo que sua breve introspecção não passou de um instante reflexivo. Sinto-me aliviada por isso.

— Talvez esteja certa. — ele diz.

— Só talvez? Meu bem, eu...

Interrompo minha fala ao ouvir um toque de celular. Antes que eu abra a bolsa para verificar se o som estridente vem do meu aparelho, Josh retira o seu do bolso da calça. Ouço um pedido de licença, ao qual assinto, antes que ele se retire da mesa para atender a ligação. Aproveito o tempo sozinha para dedicar toda minha atenção ao cone de batatas fritas, que aliás estão deliciosas. Elas estão perto da metade quando o loiro retorna, cerca de dois minutos depois. Ao invés de se sentar, ele fica de pé ao meu lado.

— Desculpe por isso, Any, mas precisaremos terminar nosso encontro mais cedo.

— Por quê? Algum problema? — pergunto ao ver seu rosto ainda mais pálido que de costume. Ele parece nervoso e isso me preocupa.

— Era o Noah no telefone. Ainda não sei exatamente o que houve, mas meu amigo voltou a se meter em encrenca. — ele suspira pesadamente. — Está na delegacia.

— O quê? Ele foi preso? — meus olhos se arregalam. O que esse garoto aprontou?

— É o que parece. Preciso ir até lá para saber mais sobre o ocorrido, ver como posso ajudar. Se importa se eu te levar para casa agora? — a mão direita percorre os fios loiros, deixando-os ligeiramente desgrenhados.

— Claro que não, imagina. Vamos logo! — me levanto no mesmo instante.

Recolho minha bolsa e as sobras de nossos lanches um tanto desajeitada, envolvendo-os em todos os guardanapos possíveis. Afasto-me da mesa em seguida, com Josh ao meu lado. Antes de sairmos definitivamente do estabelecimento, pedimos uma sacola para viagem e pagamos a conta.

— Em qual DP Noah está? — questiono, já do lado de fora, enquanto peço um carro para nós pelo aplicativo do celular.

Rampart Station. Pelo menos não é longe de casa.

— É onde o meu pai trabalha. Ele deve estar lá nesse exato momento, aliás. — penso em voz alta. — Eu vou com você, Josh.

— Não! De jeito nenhum! — ele se apressa em dizer.

— Por que não? Talvez eu possa ajudar. — coloco-me a sua frente. — Caso Noah não tenha feito algo grave, pode ser que eu convença meu pai a liberá-lo sem grandes complicações.

— Agradeço a sua disposição, linda. Sério, significa muito. Mas não vou permitir que nosso encontro termine em uma delegacia, independente das circunstâncias. — sua mão toca suavemente o meu rosto. — Ainda nem sabemos em que tipo de problema aquele cabeça oca se meteu. Não quero te envolver nisso.

— Mas Josh...

— Por favor, não vamos discutir. Essa é uma questão que preciso resolver sozinho, está bem? — ele me encara. As orbes azuis implorando para que eu não persista na ideia. Acabo murchando na hora, inconformada pela recusa. Eu adoraria ser útil. — Sky? Você entende, não é? — insiste.

— Ok, eu entendo. — respondo, desanimada.

— Desculpe. Não queria que a noite acabasse assim. — braços firmes me levam de encontro ao seu corpo. Deixo a sacola deslizar em meu antebraço a fim de envolvê-lo também. Desta forma, nos revestimos num abraço aconchegante.

Josh beija meu ombro esquerdo, como se reforçasse o pedido de desculpas, e então move o rosto mais para o lado, mergulhando-o em meus cabelos, mais especificamente nas mechas soltas entre minha orelha e pescoço. Ele inspira profundamente, como se quisesse guardar meu cheiro ou algo assim. Meu peito se aquece no mesmo instante.

— Tudo bem, de verdade. — digo, apesar do desejo de permanecer ao seu lado por mais tempo. É uma pena que assuntos mais urgentes necessitem de atenção agora. — Só peço que me mantenha informada. Eu gosto do Noah.

— Claro, farei isso. — ele volta a se erguer para fitar meu rosto.

Encaro seus lábios, sedenta por um beijo longo e meio arrependida por não tê-lo atacado no cinema. Se soubesse que não teríamos tanto tempo agora, eu com certeza o teria feito. Josh sorri um pouco, como se lesse meus pensamentos, e inclina-se lentamente em minha direção, mas por ironia do destino, o som de uma buzina infernal nos interrompe pela segunda vez no dia. Solto um grunhido em frustração ao mesmo tempo em que o garoto se afasta e anuncia:

— Acho que esse é o nosso Uber.

Checo rapidamente o celular em busca da confirmação e ao encontrá-la, comunico:

— Sim, é esse.

 Sem tempo a perder, nos dirigimos ao veículo que me deixará em casa antes que Josh parta ao socorro de seu amigo.

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