Sempre sua Garota [✓]

By ars_amanda

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🏆 OBRA VENCEDORA DO WATTYS 2021🏆 A vida de Lennon Clarke tomou um rumo inesperado ao ser traída por seu fut... More

SEMPRE SUA GAROTA
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prólogo
parte única| sua garota
01| antes | ele
02| agora | não volte
04| agora | lar doce lar
05| antes | elas
06 | agora | feridas
07 | antes | quase
08 | agora | medos
09 | antes | idiota
10 | agora | em queda
11 | antes | aposte em nós
12 | agora | minta por amor
13 | antes | sem arrependimentos
14 | agora | as coisas que ignoramos
15 | antes | estamos bem
16 | agora | em colisão
17 | antes | estou bem
18 | agora | vida nova
19 | antes | não estou bem
20 | agora | verdades nunca ditas
21 | antes |é melhor assim
22 | agora | últimas palavras

03| antes | nós e mais dois

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By ars_amanda

BOSTON, USA
COMEÇO DA PRIMAVERA

Dois meses duas semanas e cinco dias

Era o tempo que estava solteira. Era o tempo desde que tinha sido presa. Era o tempo exato – bom não tão exato assim – que tinha me livrado de Todd. O safado me procurou depois, na verdade ele me procurou durante umas três semanas depois de tudo.

Porém eu estava irredutível, enquanto tudo era um caos, principalmente porque a mãe dele tinha pagado por parte do casamento e não o queria ver cancelado. Além de que quase que meu pai acabou preso na primeira vez, depois de tudo, quando cruzou com Todd.

Não sei como, mas eu e Isobel, minha irmã única e mais nova, conseguimos segura-lo para que uma tragédia não acontecesse e mais um Clarke acabasse atrás das grades.

Mas por fim a calmaria chegou na minha vida. Bom em partes, porque Lisbon começou a me perturbar para dar a volta por cima. E nossa ideia de volta por cima era diferente.

Enquanto que para mim: era ficar bem, bonita, focar no trabalho e nos meus sonhos.

Para ela: era arrumar um homem, aquela teoria de que um amor cura o outro.

Mas pensando bem, não tinha que curar nenhum outro amor, já tinha esquecido Todd na primeira semana após todo o acontecido. Era incrível, eu ia me casar com o cara, e o superei mais rápido do que qualquer coisa, acho que tinha sofrido mais na infância com a morte do Pintado – meu cachorro, uma mistura de raças – do que com o fim daquele casamento.

E lá estava eu, em um encontro expresse, segundo Lisbon: a forma fácil e rápido de conhecer vários homens de uma só vez, sem ter que ligar no dia seguinte.

Meus olhos vagam pelo ambiente com paredes de tijolo amostra, alguns detalhes em madeira, outros em metal, flores brancas estrategicamente posicionadas, pares de mesas organizadas em um retângulo perfeito.

Incomodada ajeito o crachá de papel com meu nome escrito em caneta preta, somente suspenso por um colchete que o prendia no fino tecido da camiseta de seda, que estava enfiado dentro da saia que envolvia meu quadril.

A mulher do meu lado parecia inquieta, seu pescoço estava igual ao de uma girafa analisando todos os seres do sexo masculino – que propositalmente ou não – estavam do lado oposto do salão.

Aquilo até parecia um baile de colegial: meninos e meninas de lados opostos.

— Já vi dois caras bonitos — os lábios de Lisbon sopram, aquela informação, próximo da minha orelha.

Acompanho seu olhar, encontrando um homem alto, loiro, bronzeado, com um sorriso de modelo.

Bonito demais

Penso comigo. Afinal, homem bonito demais requer trabalho, cuidado, atenção, ciúme controlado, pernas depiladas todos os dias, salto alto o dia inteiro, maquiagem intacta.

Não

Vago o olhar, esbarrando com um cara comum, cabelos castanhos, barba por fazer, sorriso gentil, corpo normal – nem musculoso demais, nem magrelo demais.

Talvez

Pondero.

— Amiga — aquele chamado me arranca da minha minuciosa análise, enquanto a mão magrela, mas de dedos largos da mulher de cabelos e olhos castanhos, pele clara e um ar imponente, agarra meus ombros, inclinando sutilmente sua cabeça para que nossos olhos chegassem a uma conexão única — Mente aberta, ás vezes o conteúdo é melhor que a capa.

Reviro os olhos.

— Não sou novata nisso Lis — a recordo.

Seus olhos me encaram desconfiada, enquanto seus dedos se afastam do meu ombro.

Lisbon Taner, advogada, minha melhor amiga desde sempre, desde sempre mesmo, pois fizemos o jardim de infância juntas, o primário e o colegial, apenas nos separamos na faculdade, enquanto ela foi para Yale, eu me mandei para a França estudar culinária. Mas dizer que nos falávamos todos os dias era eufemismo.

— Vamos começar — eloquentemente uma mulher alta, cabelos negros e lisos, em um perfeito tailleur preto e alinhado com suas medidas corporais, segurando uma prancheta em mãos anuncia.

Ao seu lado direito estava uma jovem, certamente sua assistente, com uma roupa quase idêntica a sua, enquanto do seu lado esquerdo um homem grande, alto, musculoso, com o cabelo preso em um coque, sustentava uma máquina fotográfica em mãos, captando imagem de diferenciados ângulos.

— Vai funcionar da seguinte forma, a cada cinco minutos meu relógio vai apitar — ela volta a falar, e logo aponta para o marcador de tempo solitário em uma pequena mesa — As mulheres permaneceram sentadas, enquanto os homens circulam o salão e vocês se conhecem — suas mãos se chocam uma contra a outra produzindo um barulho audível e proposital — Mulheres ocupem seus lugares.

Os lábios de Lisbon tocam minha bochecha, enquanto seus olhos ansiosos me encaram animados.

— Boa sorte amiga — murmura animada, caminhando em direção a uma das mesas.

A acompanho e sento em uma mesa quase na frente da dela. O tampo preto, liso e vazio da mesa é um convite a discrição. Meu corpo se aloja na cadeira pouco confortável de encosto reto, enquanto que a cadeira diante de mim permanece vazia, de soslaio percebo os homens praticamente se organizando em uma fila.

Apoio minhas mãos pálidas, levemente suadas sobre o tampo, enquanto meus polegares se chocam ansiosos, apenas com os murmúrios masculinos preenchendo o som. Preguiçosamente vago o olhar pelo lugar.

Não vai começar?

Penso, buscando a mulher alta e de tailleur, vagando por cada pedaço daquele salão, finalmente meus olhos se chocam com sua figura imponente, a dela e a de um homem, que segurava um pequeno bloco de notas em mãos, uma caneta em outra, trajava um jeans comum, um camisa cor mostarda e óculos em armação preta.

Estreito os olhos.

Não pode ser

Não, não, não.

Encaro, continuo encarando, o homem vira e passeia o olhar pelo salão e finalmente encontra os meus. Desvio o olhar para o mais longe possível, duvido que tenha sido discreta, apoio meu cotovelo sobre o tampo preto, enquanto meus dedos coçam minha têmpora disfarçadamente para ocultar minha bela face.

É ele. O cara da cadeia

O cara que pagou a minha fiança, que me deixou um bilhete e um número de telefone que fique encarando, encarando, encarando, mas não disquei, não por desinteresse, porque pelo incrível que pareça, aquele desconhecido tinha me ajudado a apagar Todd.

— Vamos começar — animada a mulher de tailleur anuncia.

Solto o ar aliviada, discretamente giro o pescoço na direção em que ela estava a segundos atrás.

Nada

Não encontro nada, caminho mais um pouco, giro na cadeira, apoio meu braço no encosto atrás de mim, apenas encontro o fotografo ocupado em captar imagens daquele circo amoroso.

— Você não me ligou — aquela acusação vem de uma voz tão próxima.

Giro em direção a cadeira vazia em frente a mim, que não está mais tão vazia. Porque lá está ele, lá está Avery ocupando o acento destinado a algum desconhecido interessante.

Meus lábios maneiam atônitos e mudos. Enquanto ele confortavelmente desliza suas mãos sobre o tampo, me encarando através do acessório que era novo para mim, seus óculos de armação redondas e pretas.

Aqueles óculos lhe davam um ar de seriedade atraente, perigosamente atraente.

Maneio negativamente a cabeça para soltar aquele pensamento da minha mente.

— Avery — uma voz feminina nos alcança — O que você está fazendo?

Estico o pescoço para encontrar a mulher de tailleur ao lado de um homem gorducho, cabelo bem aparado, sorriso tímido, mãos escondidas nos bolsos da frente da sua calça jeans, como um aluno ao lado da diretora.

Encaro o homem diante de mim, que não se abala, sutilmente seus ombros dançam.

— Vivendo a experiência de um encontro expresse — em um tom confortável ele responde — Afinal como vou escrever sobre isso, dizer para os meus leitores que dá certo, que eles podem encontrar o amor da sua vida em um tipo de encontro desses, sem viver a experiência.

Meus olhos se voltam para a mulher empertigada ao nosso lado, pela primeira – desde que cheguei naquele lugar – ela parece abalada. Suas pálpebras abrem e fecham mais do que o normal.

— Você tem razão — ela estampa um sorriso forçado em seus lábios — Josh — sua mão pousa no ombro do homem ao seu lado — Vou colocar você com outra parceira, enquanto a você — seus olhos se voltam para o homem diante de mim, ela rabisca algo em sua prancheta e logo estende um papel na direção dele com um alfinete — Coloque isso.

Avery sorri, aquele mesmo sorriso fácil que tinha conhecido a meses atrás, sob a supervisão da mulher ao nosso lado, ele posiciona o papel em frente ao bolso da sua camisa e enfia o alfinete, ele a encara, pisca em sua direção.

Ela se limita a assentir, antes de se afastar um pouco desconfortável.

— O que você está fazendo? — me inclino sobre a mesa, sussurrando aquelas palavras em sua direção.

Ele se inclina sobre a mesa, suas mãos deslizam sobre o tampo e – propositalmente ou não – a ponta da unha do seu dedo indicar roça na pele do meu dedo. Instintivamente puxo minhas mãos em direção ao meu corpo, não por repelir seu toque, mas mais por surpresa.

— Você não me ligou — sussurra.

Me recosto na cadeira.

— Perdi seu número — minto, vergonhosamente minto.

Sua pálpebra do olho direito fica tremula, enquanto seus olhos se estreitam, formando um vinco no meio da sua testa.

— Você está mentindo — me acusa sutilmente.

Entreabro os lábios indignada. Elevo a mão no ar, mas logo fecho meu punho e o recolho sobre meu colo.

— Não tem como você saber— argumento.

Seus lábios delineiam um sorriso, era um sorriso diferente, não aquele fácil, mas uma expressão de soberba, de convencimento.

— Por que não me ligou? — questiona.

— Achei que não era sério seu bilhete — dou de ombros, proferindo uma meia verdade.

Agora é a sua vez de seus lábios se entreabrirem, seus cenhos se inclinarem para baixo indignados, enquanto sua cabeça maneia negativamente.

— Quem garante que você iria lembrar de uma maluca presa na cela ao lado da sua? — dou de ombros — Meses depois.

Ele sorri, se inclina um pouco mais sobre a mesa, mas sem levantar seu corpo da cadeira, umedece seus lábios, quase os comprimindo entre os dentes.

— E como esquecer a mulher mais incrível que já cruzou o meu caminho? — ele se afasta o suficiente para suas costas tocarem a cadeira — Só se fosse um idiota.

Uma suave risada resfolega em minhas narinas com a simples menção daquela palavra: idiota.

— Vamos começar — aquela voz feminina esquecida invade a nossa atmosfera — Vocês têm cinco minutos — suas cordas vocais se detêm — A partir de agora — e como se desse a largada de algo, ela anuncia.

Os olhos de Avery se arregalam, seu corpo se reclina sobre a mesa, enquanto brevemente seus olhos encaram os ponteiros do relógio de caixa metálica e pulseira de couro marrom que envolve seu pulso.

— Prazer, sou John Avery, mas pode me chamar de Avery, todo mundo me chama assim, porque o nome do meu pai também era John então era mais fácil me chamar pelo sobrenome e na escola e faculdade tinham muitos Johns na lista de chamada — ele desembesta a falar, suas palavras saem rápidas e eloquentes, enquanto suas pulmões parecem prender o ar — Sou

— O que você está fazendo? — questiono no primeiro suspiro que ele dá entre seu discurso.

Ele olha sobre os ombros o relógio solitário na mesa logo atrás.

— Temos apenas cinco minutos — recorda — Esse vai ser o encontro mais rápido da minha vida — uma risada resfolega entre seus lábios, enquanto suas narinas se expandem ao sugar o ar.

Meus lábios se entreabrem, mas sua mão aberta se interpõe entre nós em um claro sinal para me calar.

— Sou jornalista, atualmente estou focado em um projeto pessoal com mais dois amigos, um deles é o cara estranho atrás da máquina fotográfica ali — ele aponta para o homem barbudo, que inclusive já tinha notado antes, circulando no meio do retângulo enquanto fotografava os casais — Temos uma revista masculina, por enquanto é online, mas um dia vai estar em todas as bancas, mas não se preocupe você nunca vai lê-la, pois é de homem para homem — ele solta o ar entre os lábios, enquanto suas mãos gesticulam junto com seus lábios, apenas o suficiente para voltar a tragar oxigênio pelas narinas — E você não vai querer saber como manter uma ereção, se vestir para um encontro com uma mulher, manter dois celulares ou fingir que cozinha bem — seus olhos desviam dos meus apenas para fitar o acessório em seu pulso, voltando logo a me encarar — Há dois meses conheci uma garota que não tirei mais da cabeça, sério, jamais imaginei que iria me encantar por uma presidiária, mas me encantei, paguei sua fiança, dei meu número para ela e acabei atendendo umas vinte ligações de telemarketing por dia na esperança de ser ela — seus lábios sopram o ar — Sua vez.

Quanta informação.

Minhas pálpebras abrem e fecham algumas vezes, mais do que o permitido, não que não estivesse prestando atenção, mas era tanta informação que minha mente não sabia como processar:

1. Jornalista

2. Tem uma revista masculina

3. Ereção? Ops, informação desnecessária

4. Ele se encantou por mim

5. Ele realmente esperou que eu ligasse.

6. Vinte ligações de telemarketing por dia?

— Rápido — sua ordem interrompe minha lista mental.

Dou de ombros, jogando as mãos espalmadas para cima no ar

— O que você quer que eu diga?

Seus olhos se reviram, enquanto seus dedos ansiosos tamborilam sobre a mesa.

—Se apresente.

Sopro o ar por entre os lábios, girando os olhos dentro da orbe, olho para cima em busca de filtrar informações.

Droga

Resmungo mentalmente, afinal como se apresenta para alguém? O que é informação necessária ou inútil?

— Sou Lennon Clarke , sou subchefe de um bistrô pequeno no centro, o Leminski — contorço os lábios — Tenho uma irmã mais nova, mas estou aqui hoje com minha melhor amiga — aponto para a mulher sentada na mesa atrás de mim, sem girar o pescoço, apenas observo Avery se inclinar suavemente para o lado para fita-la — Quase me casei a três meses atrás, mas fui traída pelo meu noivo, agora estou aqui curtindo a vida e solteira.

Minhas palavras saem tranquilas e sem pressa. Me fazendo perceber que seria impossível conhecer alguém em cinco minutos, aquilo definitivamente era loucura.

— E foi presa, conheceu um cara fantástico e não ligou para ele — ele complementa minha história.

Meus lábios se curvam suavemente, enquanto balanço meu dedo indicador em sua direção, em um claro sinal de que ele tinha se recordado da melhor parte da minha trágica odisseia.

— Primeiro encontro? — suas palavras são rápidas e aceleradas.

Maneio negativamente a cabeça.

— Acho que o quinto.

Nem me lembrava mais, apenas recordava que tinha conhecido

1. Peter: professor de filosofia que quase me fez dormir.

2. Bryan: chato, só falava em esportes.

3. Mason: bonitinho, perfeito, certinho, cheiroso, mas, mas não tinha me interessado o suficiente para ligar.

4. Carl: amigo de uma amiga, conheci em um churrasco de quintal, papo legal, mas ainda não era o cara certo.

— E não me ligou? — o homem diante de mim me censura, me fitando sobre a armação dos seus óculos.

Minha língua umedece meus lábios para dar uma resposta, uma um sonoro toque, quase me lembrando o de um timer de cozinha, ecoa pelo ambiente, calando todos os murmurinhos.

— Troquem — ordena a mulher.

— Bosta — aquelas palavras resfolegam nos dentes de Avery.

Suas mãos se espalmam na mesa, enquanto seus joelhos afastam a cadeira, me fazendo recordar que ele era alto. Contudo antes de se afastar, ele se reclina, perigosamente ele se aproxima, aquilo inquieta cada partícula do meu interior, seu aroma adocicado pinica em minhas narinas, enquanto uma onda de calor – que não sei de onde sai – sobe pelo meu corpo, até minhas bochechas.

Suas sucessões de atos foram rápidas, mas consigo captar tudo em câmera lenta.

— Vamos fugir daqui? — aquelas palavras quentes resfolegam na cartilagem da minha orelha.

Não sabia se era uma pergunta, um pedido ou uma ordem. Nem tive tempo de descobrir, apenas fitei mais uma vez seus olhos de avelã, antes dele se afastar, dar mais passos do que deveria e alojar seu corpo na cadeira da mesa em minha frente.

—Prazer, Dean — aquele timbre masculino diferente rouba minha atenção.

Obrigando meus olhos a fitarem a desconhecida figura masculina sentada diante de mim: um homem que deveria ter quase a minha idade, olhos castanhos, cabelos negros, rosto bem depilado, lábios finos e trêmulos. Atraente. Meus dedos tocam sua pele, mas meus olhos fujões correm para sobre os ombros dele, mais precisamente para os olhos cor de avelã.

Eles me fitam ansiosos, observo a mulher em sua frente: loira, cabelos cacheados e magra. É somente o que consigo ver de uma pessoa que está de costas para mim.

Será que ele prefere as loiras? Castanhos? Ou morenas?

Por que não perguntei.

Aquela dúvida me assombra.

— E você? — aquele chamado me arrebata.

Fujo dos olhos de avelã, encontrando dois pares de olhos castanhos ansiosos e curiosos, deixando obvio que uma pergunta tinha pairado no ar e eu não tinha percebido.

É agora ou nunca Lennon

Penso, buscando os pares de avelã, que dançam em direção a saída daquele lugar, quase movimentando a cabeça junto, ele parecia ansioso e convidativo.

Se arrisque

Encaro o homem diante de mim, apoio as mãos na beirada da mesa e empurro com os joelhos a cadeira que sustenta meu corpo.

— Desculpa — murmuro — Preciso ir.

Olho sobre os ombros, encontro os olhos castanhos e confusos de Lisbon, sutilmente e sem dizer nada, apenas balanço minha mão em sua direção, me despedindo sem explicação qualquer.

Caminho em direção a mesa em minha frente, encontrando Avery praticamente em pé. Ele não diz nada, apenas o calor da sua pele envolve minha mão, enquanto me guia em direção a porta, ambos ignorando alguns murmúrios femininos que deixamos para trás.

— Isso é loucura — resmungo mais para mim mesma do que para os ouvidos do homem que me guiava para fora.

O sopro quente da primavera de Boston nos envolve e o barulho do intenso trafego entope nossos ouvidos, as pessoas passam por nós ignorando nossa fuga, enquanto sou guiada sem rumo, não tão sem rumo assim, porque meus passos se detêm, juntamente com os de Avery em frente a uma moto, mais especificamente uma Harley-Davidson, não que conhecia de motos, mas o slogan da marca estava timbrado na lateral da lataria preta reluzente.

— Toma — ele me estende um capacete preto, com uma viseira enorme que mais parecia a fantasia de algum bicho gigante.

— Estou de saia — recordo, torcendo os lábios e olhando para a minha vestimenta inferior.

Seu olhar acompanha o meu, seus ombros dançam em desdém, enquanto sua mão empurra o objeto em minha direção.

— Eu prometo não olhar — suas palavras são sinceras.

Ele enfia o capacete em sua cabeça, prende logo abaixo do seu queixo. Encaro sobre os ombros a porta pela qual tinha escapado a segundos atrás, considerando uma volta, que seria estupida.

Meu pai já dizia: Lennon, quem está na chuva é para se molhar.

Que seja

Mais ágil que eu, Avery agarra o objeto das minhas mãos e encaixa na minha cabeça, dando um tapinha no topo, como se fosse necessário para entrar. Seus olhos não me encaram, mas seu rosto se aproxima do meu, encarando o fecho logo abaixo do meu queixo, que gentilmente ele prende.

— Pronto — nossos olhares se cruzam.

Habilmente ele me dá as costas e monta o seu cavalo motorizado e moderno, estendendo sua mão para o lado, minha pele toca a sua pela terceira vez naquele dia – não que esteja contando – mas ele é quente, perigosamente quente. Me equilibro na bota de salto, passando uma perna sobre a moto e me posicionando logo atrás dele. Me sento sobre o couro.

— Se segura — ele olha sobre os ombros, antes de tirar os óculos, suspende-lo na camisa, abaixar o visor e roncar o motor fortemente.

Encaro suas largas costas, sem saber onde enfiar minhas mãos. Poderia abraça-lo, mas não temos intimidade para isso. Poderia não toca-lo, mas certamente seria difícil me equilibrar, giro o pescoço e procuro algum apoio atrás de mim, mas nada.

Elevo minhas mãos perdidas no ar, ele arranca, praticamente minhas mãos repousam em seus ombros, enquanto passamos pelos carros parados no trânsito de Boston.

Ele acelera, pressiono meus dedos em seus ombros em busca de manter meu corpo estável. Meu joelho toca o jeans da sua calça, enquanto meu pé permanece confortável no apoio. O vento passa pelo meu corpo, trazendo uma sensação de liberdade.

Relaxo. Pela primeira vez em meses me sinto relaxada ao lado de um estranho. Por um momento esqueço os problemas, o passado, os encontros frustrados, o trabalho, tudo. 

O Back Bay Fens é lindo em qualquer época do ano, mas a primavera é especial, as flores o torna especial. Sentada sobre uma das mesas e com os pés apoiados sobre o banco, observo as pessoas passeando despreocupadas.

— O melhor lanche de Boston — o homem de cabelos castanhos e desgrenhados anuncia ao se aproximar com algo envolto em um papel — E que você não vai comer.

Seu corpo se acomoda ao lado do meu.

Por que falei que estava sem fome?

Resmungo mentalmente, enquanto observo ele desenrolar um belo sanduiche de rosbife do papel manteiga, maionese escorria pela beirada e os pedaços de carne apetitosa estavam amostra.

— Então — ele murmura, ignorando o fato de estar paquerando seu sanduiche — A quanto tempo é chefe de cozinha? — ele questiona, dando uma mordida larga no pedaço de pão, carne, queijo e molho.

Desvio o olhar, preferindo encarar o pacifico lago diante de mim. Enquanto minha mente organiza a resposta para aquela pergunta.

— Sempre cozinhei com a minha mãe — flashes de um passado distante florescem em minha mente — Então quando chegou a hora de decidir sobre o meu futuro, pareceu lógico fazer o que amava.

O encaro, ele mastiga, certamente a segunda ou terceira mordida, apenas podia afirmar que o pão baquete estava diminuindo.

— Ela deve ter orgulho de você — ele engole a comida.

Curvo os lábios melancolicamente. Expelindo o ar pelas narinas, diante daquela recordação.

— Ela morreu quando tinha doze anos — revelo.

Seus olhos se entristecem, mas não por compaixão. Ele me encara de uma forma diferente, não com pena, mas como se me entendesse e compartilhasse aquela dor ou algo parecido.

— Ela teria orgulho — seus lábios se curvam, sem mostrar os dentes — Você está fazendo algo de bom que ela te deixou.

Curvo os lábios, chegando a conclusão de que nunca tinha pensado daquela forma, mas era uma forma linda de se ver as coisas.

— E você? — encontro seus olhos avelã, enquanto ele dá mais uma mordida no sanduiche que diminuía de tamanho — Por que virou jornalista?

Ele mastiga, desvia o olhar, em seus lábios resplandece um sorriso divertido.

— Para encher o saco dos outros — revela em um tom eloquente — É divertido — ele gira a cabeça, as pontas dos nossos narizes quase se roçam.

— Imagino — compartilho seu sorriso — E não vai ter problema por ter largado o seu amigo lá, sozinho?

Ele dá de ombros, maneando negativamente a cabeça.

— O Sommers se vira bem sem mim — seu olhar repousa sobre mim — Enquanto que a senhorita tem que parar de paquerar meu sanduíche, porque estou começando a ficar ciúmes.

Desvio o olhar para o outro lado do lago de água escura e profunda.

Do sanduíche ou de mim?

Aquele questionamento passa pela minha mente. Enquanto sinto cada fibra dos meus músculos relaxados, meu coração sentia-se inquieto, mas feliz, e um reboliço se formava na boca do meu estômago, certamente deveria ser fome.

Mas não podia negar, estar com John Avery era agradável, as preocupações fugiam, ele parecia tão diferente de mim, mas tão certo.

— Ciúmes de você — aquela lufada pinica na cartilagem da minha orelha, enquanto um calafrio percorre meu corpo — Afinal um pedaço de pão vai tocar seus lábios antes dos meus.

Não vira, não vira, não vira.

Ordeno mentalmente, controlando os músculos dos meus lábios para não sorrirem melosamente, enquanto minha mão livre coça a pele abaixo do meu cabelo, na altura do pescoço.

— Acho que preciso ir trabalhar — anuncio.

Precisando mais fugir do que iniciar o próximo turno do Leminski. Silêncio. Ele não reage a aquele anúncio. E acabo fazendo tudo o que eu não queria fazer, me virar, quase esbarrando no pedaço de pão que envolvia a carne.

— Não antes de comer — ele anuncia, segurando a metade restante do sanduíche em minha direção.

Meus olhos pulam da face sorridente do homem ao meu lado para a comida em suas mãos. Suavemente ele insinua o sanduíche em minha direção, em uma insistência silenciosa. Não sei porque, não resisto, levando minhas mãos até as dele, nossas peles se roçam, minha mão praticamente envolve a sua, me fazendo ter a certeza que o reboliço embaixo das minhas costelas não era fome, mas outra coisa, porém mesmo assim mordisco um delicioso pedaço de pão com carne.

Seus olhos sorriem. Finalmente soltando o papel manteiga e acabando com nosso momentâneo contato.

Despreocupado, Avery gira suas nádegas sobre a madeira, repousando sua cabeça no meu colo. Quero pestanejar, juro que quero, mas minha boca está cheia e meus dentes ocupados na tarefa de triturar para impedir o toque da sua cabeça sobre o couro da minha saia.

Ele me observa. Eu o ignoro e continuo a comer.

— Você é abusado — comento, obrigando meus olhos a focarem na paisagem a minha frente.

— E você é linda daqui debaixo — ele estala a língua no céu da boca, chamando a atenção dos meus olhos — Não se preocupe, eu não sou nenhum lobo mau.

Afasto meu olhar do dele. Uma risada resfólega por entre minhas narinas, enquanto termino de digerir o último pedaço do delicioso sanduíche, saciando meu estômago, amasso o papel entre meus dedos e o apoio na mesa ao meu lado.

Aperto meus dedos contra a madeira do meu lado, contendo a vontade de abrir caminho por entre as madeixas repousadas no meu colo. Aquele homem era tão invasivo, tão audacioso, que despertava uma curiosidade em meu interior.

— Você me assusta — escapa por entre meus lábios aquelas palavras.

Sinto sua cabeça se remexer sobre minha saia e seu olhar queimar em minha direção. Abaixo o globo ocular, mas não a cabeça, sem conseguir analisar com exatidão sua expressão.

— Por que? — aquela pergunta vem em minha direção.

Dou de ombros, entreabrindo os lábios apenas para deixar escapar o ar.

— Você é intenso — dou voz as reflexões que passam pela minha mente — E me faz fazer coisas que jamais teria feito antes.

Silêncio.

Ele não rebate minhas palavras prontamente, talvez uma provocação, ou apenas falta de palavras que tentam meu olhar a baixarem para encontrar seu sorriso fácil.

— Isso é a vida Lennon Clarke — Avery impulsiona seu corpo para frente, empertigando seu corpo ao meu lado, roça nossos ombros.

Não consigo ignorar suas avelãs queimando na lateral do meu rosto, mas são as pontas dos seus dedos tateando meu queixo que queimam em minha pele e no meu interior. Com delicadeza, quase como um suave incentivo, seus dedos viram meu rosto, me obrigando a encara-lo.

— Oi — ele murmura, como se acabássemos de nós conhecer ou nos reencontrar, seus dentes mordiscam seu lábio inferior, enquanto a ponta do seu dedo indicador desenha uma linha curvilínea na extensão do meu nariz — Apenas aproveitei.

Um tremor passeia pelo meu corpo, enquanto o músculo alojado no meu peito galopa. Seu ombro empurra o meu de forma gentil, sua cabeça não cansada repousa sua testa na minha e suas avelãs invasivas fazem algo queimar no meu interior, roubando o pouco oxigênio que tinha em um ambiente aberto.

Inapropriadamente meus olhos passeiam em direção aos seus lábios entreabertos e rodeados por uma barba rala. Comprimo as pontas dos meus dedos contra a madeira, tentando amortecer a necessidade de acariciar aqueles curtos pelos.

As rajadas de ar quente de suas narinas resfólegam contra a minha pele, enquanto meus lábios formigam, como se necessitassem de algo, como se necessitasse provar algo.

Provar os lábios daquele homem, quase um desconhecido

Subitamente todas aquelas sensações desaparecem, ficando um vazio em cada centelha do meu corpo. Meus olhos piscam mais vezes do que deveriam, apenas para conseguir captar a abrupta separação dos nossos corpos e identificar o homem de cabelos castanhos e abusado em pé diante de mim, com a mão estendida em minha direção.

— Você disse que tinha que trabalhar — e uma mentira que não deveria ser lembrada quebra todo um momento. 

Gostaram ?
Gostaria de dedicar a esse capítulo a uma leitora especial lobodiana
Obrigado por tanta carinho.

Estou disponível nas redes sociais, minhas contas são:

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