- Adrien! - grito pelo barulho do chuveiro. O desligo em seguida. - Você não colocou roupa pra mim aqui.
- Se enrola na toalha, vou colocar na frente da porta. - Ele grita de volta.
Saio do chuveiro quente passando um pouco de frio. Me enrolo na toalha branca como ele disse e aguardo alguns segundos até ele dar dois toques na porta avisando que as roupas estão ali.
Ando pelo banheiro abafado pelo vapor e abro uma frestinha da porta, enfiando a minha mão por ela. Pego do chão o pequeno monte de roupa e fecho novamente a porta.
Estava tentando lembrar se eu havia deixado roupa ali no passado também, mas nunca houve necessidade porque eu sempre lembrava de trazer e levar para casa depois. Adrien confirma isso com as roupas que ele deixou para mim no chão. Uma camiseta, uma cueca e um moletom dele.
Visto as roupas e dou risada ao perceber que o apelido besta que ele deu para mim há semanas é verdade. Comparado a ele, eu tenho mesmo meio metro.
- Serviu? - Ele pergunta atrás da porta.
Olho no espelho confirmando mesmo sem necessidade porque obviamente não serviu. A camiseta estava pouco acima da metade das minhas coxas enquanto o moletom quase chegava no joelho. A camiseta escorria pelos meus ombros e a cada cinco segundos eu tinha que colocar um dos lados de volta.
- Mais ou menos.
Recolho as minhas roupas de antes de eu entrar no banho e pego uma escova de cabelo dentro do armário embaixo da pia. Abro a porta com dificuldade com as roupas em uma sacolinha.
- Sua porta é muito pesada. - Reclamo.
A porta quase bate, mas a seguro com os pés descalços antes que faça um estrondo. Ele ri ao ver que realmente as roupas não serviram em mim.
Adrien está sentado na cama com o gato, agora com nome, deitado no seu peito.
- Ele é lindo. - Comento apaixonada pelo meu presente.
Vou até a cama quase dando pulos por felicidade. Deixo a minha sacola embaixo da cama e sento delicadamente nela para não acordar Plagg.
Penteio o cabelo os observando e recebo os olhos de Adrien em mim também. Brigo internamente comigo por ter lavado o cabelo, pois ele ficaria ressecado sem creme sem enxágue.
- Vem cá. - Adrien estende um dos braços que estava servindo de apoio para a sua cabeça.
Depois de pentear o cabelo deito no seu braço sentindo conforto conforme me aconchego nele.
Eu estou em negação.
Quer dizer, acredito que para estar em negação você tem que estar sentindo algo e negar isso. Mas, no meu caso, eu não estou sentindo isso e meu cérebro do nada fala "nossa, mas poderia sentir, né?" ou "certeza?" e eu entro em negação disso. Eu nego os pensamentos que são enviados a mim por mim mesma, me deixando em negação.
Durante o resto do dia, antes de estarmos aqui agora deitados, foi do mesmo jeito que estava sendo. Só que comigo nessa negação falsa para não ficar paranóica e acabar estragando tudo como sempre faço. Ignorei os pensamentos. Eu estava ignorando até agora, mas ficar com ele assim está me desnorteando.
Eu não estou conseguindo separar carinho, amor e saudade de todo o resto. Balanço a cabeça, rindo da minha idiotice. Quando eu for embora, tudo isso vai passar e eu vou ver que foi só confusão momentânea ou TPM.
- O que foi? - Adrien diz divertido.
- Hum? - Levanto a cabeça.
- Você chacoalhou e depois riu - ele se mexe na cama. - O que te fez rir?
Ih, não sou boa no improviso. Plagg acorda de repente, pula da cama e vai brincar em um cantinho, aproveitando a luz da lua que iluminava o quarto.
- Hum, eu... - me concentro para não enrolar as palavras. - Eu estava pensando besteira. Ri de onde minha cabeça estava indo.
- Para onde estava indo?
- Para um lugar nada realista e completamente abstrato.
Minha resposta o faz pensar.
- Eu queria ir para um lugar abstrato. - Adrien diz por fim.
- Não para o mesmo que o meu, acredito.
- Como seria o seu? - Ele está curioso.
- O meu irrealista que eu estava pensando agora a pouco ou o meu de verdade?
- Qual você quiser contar.
- Meu mundo abstrato seria geométrico - desenho com o dedo em seu peito. - Com referências em cada parte da tela, pintado por uma variedade de artistas.
- Como seria o meu? - Ele suspira.
- O seu seria feito por linhas e ondas tempestuosas, sem seguir um caminho reto. Pintado por apenas um artista e não teria várias referências. Seu quadro, seu mundo, seria a referência.
Ele sorri, imaginando de olhos fechados.
- Como eu te encontraria então? - seu dedo se junta ao meu, desenhando em seu peito. - Se nossos mundos são divergentes, como eu te encontraria?
- Você está em todas as minhas referências.
- Você é a minha referência.
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Fomos jantar na grande mesa uma hora depois. Gabriel estava mesmo agindo como um pai, pois, dessa vez, quem veio avisar que a comida estava pronta foi ele e não algum funcionário.
Descemos e paramos ao ouvir risadas vindas da cozinha. De Gabriel e Nathalie.
Franzo as sobrancelhas para Adrien.
De meia nos pés não fazíamos tanto barulho, mas mesmo assim andamos mais devagar, querendo ver o que estava acontecendo sem que percebessem nossa presença.
Gabriel está vestindo um avental que era para ser branco. Ao invés disso, está com manchas vermelhas de molho de tomate e algumas outras amarelas, rosas e laranjas que eu não consigo identificar. Ele segurava uma frigideira com pimentões coloridos e cebola, tentando mexer - sem usar uma colher - sem derrubar.
Nathalie ria da tentativa falha dele, já que pedaços de pimentão se encontravam no chão. Plagg seguiu a gente sorrateiramente e roubou os cubinhos coloridos do chão, achando o gosto diferente com a careta que fez. Provando que é um gato forte sem frescura, depois de passar a primeira impressão, roubou mais vários que continuavam caindo.
- Adrien! - Nathalie se surpreende e arruma a postura assustada quando nota Plagg ali. - E Marinette!
- Oi - cumprimento sem graça depois de esperar Adrien dizer alguma coisa e ele não falar nada. - Querem ajuda? Acho que estão queimando.
- Ah! - Gabriel desliga o fogo. - Faz muito tempo desde que cozinhei pela última vez, estou tendo bastante dificuldade.
- Onde estão os cozinheiros? - Adrien finalmente diz alguma coisa. Eu continuo meio sem graça.
- Eu... - ele tosse. - Eu os dispensei por uns dias. Eles e todos os outros funcionários.
- Certo. - Adrien instiga o pai a continuar.
Gabriel olha para mim como se estivesse querendo pedir ajuda. Entendo imediatamente o assunto. Afirmo com a cabeça, dizendo sem palavras que é ele que tem que fazer isso.
- Por que vocês três não vão para a mesa de jantar? - falo fingindo que tive a melhor ideia possível. - Eu termino aqui e levo para a mesa.
Gabriel agradece com o olhar por eu ter dado mais alguns segundos para ele pensar no que dizer.
Os três vão para a mesa e eu tento consertar as comidas sem muito sucesso porque também não sei cozinhar. Apenas doces. E nem sempre eles dão certo.
Faço duas viagens para levar as panelas até a sala de jantar e nas duas há um silêncio constrangedor. Gabriel gesticula para eu sentar com eles quando eu estava indo embora para dar privacidade. Ele e Nathalie estão sentados lado a lado e eu faço o mesmo com Adrien, nunca gostei de sentar na frente das pessoas.
- Filho - Gabriel o chama sem ser pelo nome e os olhos de Adrien brilham em espectativa. É tão lindo ver o amor que ele sente pelo pai. - Nathalie e eu estamos... - Ele cora e tosse mais uma vez. - juntos. Namorando.
Se Adrien estava feliz antes, agora eu não conseguia nem descrever.
- Ela vai morar com a gente? - Ele irradiava alegria.
- Bem, nós estávamos pensando - começa Nathalie. -, já que eu já praticamente moro aqui. Esperamos que não tenha problema para você.
- Não, nenhum! - Adrien diz incrédulo que finalmente vai ter a sua família.
- Quisemos aproveitar que a Marinette está aqui para deixar esse assunto mais fácil para vocês também - Gabriel parece que vai ter um infarto de vergonha. É fofo ver que ele se preocupa em fazer a tarefa que a mãe dele ia fazer por ser mais aberta. - Se vocês quiserem nos contar alguma coisa.
Mesmo que ele tenha me convidado para sentar ali com eles durante essa conversa íntima e mesmo que a pergunta indireta seja sobre mim também, não me sinto no lugar de responder.
- Ah, nós não, hum... - Adrien cora que nem o pai fez. - Não tem nada.
- Não? - Ele pergunta.
Adrien toca em minha perna por debaixo da mesa e eu entendo. Quase rio, os dois são bem parecidos em manias ou pequenas características.
Percebo que Gabriel está mais uma vez pedindo desculpas. Agora, muito mais significativa do que por palavras: ele está pedindo desculpas por meio de seus atos. Ele quer conquistar seu filho sem nada por trás disso. Contradiz um pouco com a entrevista dada, mas Gabriel aproveita as situações para deixar seu sobrenome na boca do povo. Ele também nunca soube que eu não quero conquistar tudo assim, aproveitando a fama de seu filho.
- Nós não estamos juntos, senhor Agreste - nego. - Parabéns pelo relacionamento. - Acrescento.
Jantamos conversando de maneira leve e calma, mas com a voz dos três transbordando paz.
Mas desde que falei aquilo, uma dor vem dentro de mim e eu não consigo entender de primeira. Se é tudo besteira da minha cabeça, como que dizer isso doeu?
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- Você tem noção? - Adrien se controla para não gritar quando fecha a porta do quarto.
- Você tem uma madastra!
- Eu tenho uma madastra! - ele sorri. - Além de que não é só uma madastra, é a Nathalie. Eu a amo como mãe já faz tempo, agora oficializou e ela é mesmo como uma mãe para mim.
- Gabriel estava tão nervoso - gargalho. - Como eles não enxergam a vontade que você tem desde sempre em tê-la como parte da família?
- Eu não sei, mas agora eu tenho. - Ele cai na cama ainda sorrindo.
Eu não saberia dizer se ele ia conseguir dormir de tão empolgado que está. Fiquei feliz demais por vê-lo assim, a ausência de uma família estava acabando com ele.
Conversamos mais sobre isso e ele vai tomar outro banho quente para relaxar e diminuir um pouco a euforia.
Deito na cama quase cochilando ouvindo o barulho de água cair. Sinto ele passando por cima da mim para deitar do lado da parede tentando não me acordar. Como eu estava em um sono muito leve, abri os olhos.
Não conversamos, só ficamos assim. Ele do lado esquerdo, na parede, deitado com calça, meias e uma camiseta branca que deixava seu cabelo ainda mais loiro. Ele está deitado virado para mim, com o braço esquerdo atrás da cabeça.
Eu estou do lado direito da cama, sem parede. Como eu me mexo muito dormindo, não duvidava de que talvez eu acordasse no chão na manhã seguinte. Não desviamos o olhar por um bom tempo, até que o sono falou mais alto. Adrien me puxa para cima dele, fazendo de seu corpo um travesseiro para mim enquanto ele me abraçava. Encaixo o meu rosto no encontro de seu ombro com o seu pescoço, sentindo o cheiro de seu perfume.
E é assim que a nossa noite acaba.
Com ele extremamente feliz fazendo cafuné no meu cabelo e eu extremamente feliz por ele, o abraçando de volta.