Apreciados A Ascendência do T...

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Morrer não é uma alternativa. Em um futuro distópico seis pessoas completamente distintas e desconhecidas aco... More

NOTA
EPÍGRAFE
DEDICATÓRIA
SEM SURPRESAS
SOB NENHUM FINAL
TODAS AS LUZES
HISTÓRIAS DE TERROR
AS NOSSAS DECISÕES
A HUMANIDADE QUE NOS RESTA
A BRISA DA ESPERANÇA
O COMEÇO DOS JOGOS
A ASCENDÊNCIA DO TRAIDOR
O DIA DE AMANHÃ
OS NOSSOS MEDOS
QUEM NÓS SOMOS
A VERDADE
BARRINHA DE CEREAL
DEPOIS DA MANSÃO
ELE
TODOS NÓS TEMOS QUE ESTAR MORTOS
A COBRA DO ADÃO E EVA
NÃO VEREMOS O SOL NASCER DE NOVO
MARIANA
OS OUTROS
AGRADECIMENTO

SER HUMANO

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By autormatheusramos

MEUS OLHOS SE ABREM. Uma luz branca, forte e radiante me aconchega. Estou deitada, imóvel, em cima de uma maca cirúrgica dentro de uma sala pequena. Alguns fios, ligados a maquinas, estão espalhados pelo meu corpo, cravados na minha pele. Sinto uma pontada aguda no final da minha cabeça e os corvos da mansão voltam a me atormentar, mas dessa vez eu sei que é apenas trauma do meu psicológico. Meus membros formigam e é bom conseguir senti-los novamente.

Me esforço para ficar sentada a fim de ter uma visão mais ampla de tudo o que está acontecendo ao meu redor. Estou num quarto, todas as suas paredes possuí um tom claro, ele quase não tem mobília, a maior parte dos objetos são equipamentos clínicos. Vejo uma enorme janela a minha direita, com uma cortina impedindo minha visão para além desse cômodo. Minha tíbia, que não pertencia mais ao meu corpo, está de volta, como se fosse uma ilusão. Mexo-a e ela acompanha minhas ordens, perfeitamente, como se nada de terrível tivesse lhe acontecido. Estou saciada, sinto uma grande disposição e não parece que eu já estive entre a vida e a morte em algum momento da minha vida.

Isso me preocupa, mas antes de conseguir me questionar sobre qualquer coisa escuto vários passos vindo em minha direção, é estranho escutar isso depois de tanto tempo. Saber que vou encontrar e falar com outras pessoas faz meu coração pulsar aceleradamente, não sei que reação tomar, mais uma vez estou a mercê do meu destino. Planejo meu discurso perfeito na cabeça e como vou denunciar tudo o que eu passei dentro da mansão, quando eles adentram a sala.

–Meus parabéns! Você conseguiu. – ele diz com espontaneidade. Usa um jaleco formal e parece ser bem velho. Carrega um óculo pesado no rosto, uma barba bem cuidada com alguns fios brancos e o seu cabelo preto está bem arrumado no topo da sua cabeça, seus olhos são fortes e sua expressão é cansada. Sua idade é revelada pelo seu semblante. Ele veio acompanhado de dois outros soldados que vestem uma armadura de cor vinho forte camuflada e capacetes cobrindo seus rostos.

Não consigo entender o que está acontecendo e nem quem são eles, mas não tenho uma boa impressão sobre tudo isso, principalmente por causa do tom usado para falar comigo. Os soldados seguram uma pistola que está em seus coldres e automaticamente tento buscar a minha, mas ela não está mais lá. Apenas nesse momento percebo que estou trajando um vestido folgado e fino e isso me faz sentir vergonha.

–Talvez você tenha algumas perguntas. – ele continua e escreve num bloco de notas que trouxe consigo. –Irei responder todas elas!

Presto atenção no que ele veste, em como fala e em todos os detalhes possíveis. Também presto atenção em quem ele trouxe consigo e é extremamente estranho eu nunca ter visto algo parecido com isso antes. São intimidadores.

–Onde eu estou? – minha voz saí falhada, como se eu não falasse a algum tempo.

–Oh! Eu já ia esquecendo. Seja bem vinda a Castelo Branco! – ele responde isso com veemência, mas para mim isso não significa nada.

–Quem são vocês? Preciso relatar um problema... – começo.

–Meu nome é Vicente e sou o criador e fundador da Mansão. – um ódio consome todo o meu ser, mas não deixo transparecer. –Você é a única sobrevivente desse ano. – cerro o punho e quase saio quebrando tudo. Avançaria em cima dele e o mataria com minhas próprias mãos, mas não teria chances desarmada e com esses dois soldados do seu lado. Fecho meus olhos por alguns segundos e engulo toda a minha fúria. –Quero deixar claro que estamos muito felizes por você!

Davi, Katarina, Thaís, Nícolas... todas essas vidas perdidas para que eu me encontrasse aqui, pronta para denunciar tudo, e sou recebida com essa recepção de vencedora. Eu não venci nada, não mereço esse mérito.

–O que vocês são? Uma empresa? – pergunto encarando o símbolo do veado com uma máscara de gás estampada na roupa dos três. E lembrando da nossa principal dúvida.

–Eu não chamaria assim. – ele responde com um sorriso no final da boca. –Somos como uma família. Uma grande família. – sinto nojo.

–Por que fizeram isso com a gente? – essa pergunta estava entalada na minha garganta e eu não poderia esperar mais um segundo para fazê-la.

–Existe vários motivos. Mas o principal deles é que precisamos de você. – ele conta.

–Precisam de mim?! Eu vi pessoas morrerem, eu vi minha amiga levar um tiro e o corpo do Davi estirado sem vida no chão, eu compactuei com o lixamento de um inocente e acreditei na mentira de um monstro. Como você simplesmente diz que existe vários motivos para isso? – estou gritando e chorando nesse momento. –Tudo que passamos lá dentro foi para alimentar o seu joguinho sujo, você chega a ser pior que José!

–Eu entendo o seu lado e posso afirmar que tudo vai ser esclarecido ao longo dos dias. Mas posso adiantar que a S.E.S.H. ou popularmente conhecida como A Mansão é o único meio possível e existente de fazer Inteligências Orgânicas, como você, conseguir se encaixar no novo conjunto populacional da Terra. – ele arruma o óculo no nariz.

Meus órgãos entram em transe, sinto um leve enjoou e minha garganta se fecha com as palavras ditas que para mim surge como uma facada no peito. É inconcebível.

–Você disse que eu sou... – nem eu consigo acreditar na pergunta que estou fazendo, chega a ser engraçado de tão absurda que é essa afirmação.

–Não é a denominação adequada para se usar, mas é a mais aceita. Você é uma 0089B, projetada aqui mesmo na cidade. Eu sou principal responsável!

–Você só está brincando com a minha cara. Eu tenho uma mãe, uma irmã, tenho uma família... eu não sou uma Inteligência, ou seja lá o que você acha que eu sou.

–Nada disso é real. Assim que vocês são criados implantamos narrativas em suas programações, imagens, áudios, sentimentos... Deixamos o mais fiel possível para que usem isso como motivação pessoal. – a forma calma e didática que ele relata as coisas me dá nos nervos.

Não posso confiar em nada do que é dito. Ele continua com seus joguinhos viscerais, não vai funcionar de novo, eu não vou deixar. Meu ódio só aumenta a cada segundo.

–Por que você só consegue se lembrar da sua mãe e da sua irmã? E o resto da sua família? De quem você lembra? – nunca me questionei isso antes, nunca parei para pensar sobre quando estava vivendo dentro da mansão e agora que faço só recebo o vazio e o nada. –Não criamos algo tão extenso, apenas o necessário. Você não consegue encontrar nada nas suas lembranças porque o que você está procurando não existe.

Lagrimas pesadas continuam descendo pelo meu rosto quando descubro que ele tem toda razão. Não existe mais nada além delas.

–Assim que acordam vocês sentem que perderam uma parte da memória, momentos de alguns dias atrás, talvez semanas, isso também é programado, vocês esquecem porque queremos. Precisamos fazer vocês focarem no presente, no objetivo. Você não viveu nada do que lembra! A primeira vez na vida que abriu os olhos foi dentro da mansão, só a partir dali você começou a construir quem realmente é.

Não é fácil aceitar tudo isso, minha cabeça está a mil e não sei no que confiar, no que me segurar. Lembro da minha mãe me ajudando a preparar um lindo bolo de aniversário, mas não consigo lembrar dela me colocando para dormir quando criança e nem da minha irmã me acompanhando no parquinho. Não consigo levar minhas memorias para fora de algumas lembranças especificas.

–Você está mentindo! – não quero acreditar. –Você não sabe de nada!

Ele libera novamente o seu sorriso irônico, e eu juro que quero espancá-lo.

–Você, minha querida, que não sabe de nada. Seu mundo estava recluso em: apenas fugir das paredes da Mansão, mas agora que está fora precisa se reeducar e descobrir um universo do qual você nem consegue imaginar a imensidão!

Encaro seus olhos, não quero esquecer deles nunca. Respiro fundo tentando me manter em mim e criando um plano interno para conseguir sair por cima dessa conversa. Minha vida continua correndo perigo, mas dessa vez de uma forma diferente, agora tenho total liberdade e sou dona das minhas próprias decisões, tenho que jogar junto com ele e no final ser mais esperta.

–Você disse que eu sou uma Inteligência Orgânica, o que isso significa? O que mais eu preciso saber? – preciso coletar todas as informações possíveis.

–Nossa história foi marcada por uma grande conflagração. Os Homo Sapiens foram drasticamente extintos do planeta e os que sobraram tiveram que, de alguma forma, conservar as ideias humanas em algum mecanismo idêntico a eles. Algo que pudesse ser controlado e contido, para que o passado seja sempre visto como um aprendizado. – ele responde com precisão e escolhe as melhores palavras para usar. –A antiga espécie humana que habitava essa terra incrível era confusa, incompreensível e irracional. Destruíram tudo o que foi dado a ela. Criamos vocês para serem o contrário disso. Todos vocês são práticos, decididos e lógicos. Alguns chegam a possuir elementos evoluídos. Você e todos que estão lá fora são os principais rostos do futuro.

–Você sempre fala no plural, existe mais como eu fora daqui? – não quero ser persuadida tão fácil, mas tudo o que ele fala de algum modo me interessa e me deixa admirada.

–Claro que sim. Milhões iguais a você, Davi, Nícolas, José, Katarina e Thaís. Usamos os mesmos seis moldes todos os anos dentro da Mansão, os que sobrevivem, como você, são inseridos na sociedade para começarem suas vidas e ajudar a nova humanidade a crescer e multiplicar!

Um completo absurdo. Lembro dos rostos dos cinco, os verei novamente quando sair daqui?

Não eles, mas uma réplica imunda, proibida e imoral. Por um segundo desejo voltar para a cabana e continuar deitada no beliche para sempre, na minha paz interna. O que encontro aqui fora são resquício de uma crueldade sem tamanho, tortura da pior da espécie. Estar morta parece ser uma ótima opção agora! Desejo.

–Você falou de Homo sapiens, o que eles são? – continuo minha entrevista.

–Como já havia dito, era uma classe humana, diferente da sua, mas com todas as características físicas iguais. Todos Homo sapiens são seres humanos, mas nem todos seres humanos são Homo Sapiens e essa descoberta nos levou a criar algo maior, mais magnifico e eficiente. Algo que pode prosperar. – ele faz uma pausa. –Eu não vejo a hora de te levar lá fora, ver sua reação perante toda a magnitude que conseguimos conquistar. Castelo Branco é a maior cidade sustentável graças a pessoas como você. Guerreiras, destemidas, suficientes, sobreviventes...

Não me importo nem um pouco com o que ele diz. Preciso escapar desse quarto, preciso fugir, ir para bem longe de toda essa maluquice. Mas também quero matá-lo, quero vingar todas as mortes que presenciei e o principal responsável por elas está bem aqui na minha frente e me sinto inútil por não conseguir fazer nada.

–Quantas cidades existem? – pergunto e minha voz quase revela a minha fúria.

–Na América existem duas, mas são cinco ao total. Todas trabalhando de forma desenvolvida e visionária para o bem comum.

–O que é América? – tenho medo da resposta. Nesse momento existe eu contra Vicente e dois soldados super armados, mas quando eu sair desse quarto, quando eu encarar o mundo lá fora, será eu contra quantas pessoas?

–América é um dos três únicos continentes que conseguiram se reerguer, são extensões de terras emersas, limitadas por mares e oceanos. Nossa cidade é a segunda maior em relação populacional, se tiver sorte poderá visitar todas as outras. – ele fala com tom satisfeito e aclamado, com orgulho de tudo o que pode anunciar.

Eu sinto o inverso, sinto medo, insegurança, raiva, tristeza, repulsão e decepção. Me sinto cada vez mais confusa e não consigo controlar minha mente e minhas emoções. Quero mais respostas, quero mais esclarecimentos, quero me sentir viva novamente. Devo confiar no meu corpo? E no meu cérebro? Vicente consegue me controlar? Quero socar algo, quero ver meu sangue escorrendo pela minha pele, quero sentir dor. Tudo o que sempre acreditei não passa de uma mentira, tudo o que eu usava como guia na verdade nunca existiu. Eu nunca tive uma história, uma família, eu nunca fui amada e protegida, eu nunca fui de verdade.

Sim, eu fui. Nisso ele tem razão. Tudo o que eu vivi dentro da mansão, todas as coisas que senti, que eu acreditei, tudo ao qual eu me apeguei me fazem ser quem eu realmente sou agora. Todos os laços que eu criei lá dentro me moldaram e vão continuar me moldando. Davi e Katarina eram reais, foram as primeiras pessoas que marcaram minha vida e eu sempre vou continuar por eles. Os dois, assim como Thaís e Nícolas, me ensinaram e me acompanharam a ser capaz, a ser quem eu sou agora e a partir disso eu vou evoluir, me aprimorar e enfim desenvolver minha própria história.

–Doutor, sua reunião começa em poucos minutos. – um dos soldados fala e eu consigo ouvir perfeitamente o timbre de José vindo dele e eu sei que é uma das réplicas que o Vicente comentou.

–Minha querida, eu sei que é difícil absorver todos esses turbilhões de informações. Aproveite para descansar e repor suas energias, será importante. – ele volta a sorrir e deixa a sala junto com os outros dois soldados que possivelmente são réplicas de José.

É duro admitir, mas sinto um pouco de glória em saber que consegui escapar da mansão. A sensação de estar fora é deliciosa e desopressora, consigo até respirar melhor e é como se um enorme peso tivesse saído das minhas costas. Mas isso não me impede de lembrar de cada segundo que passei dentro daquele lugar perverso, de todos que morreram e de todo o sofrimento que fui obrigada a sentir e eu juro que irei me vingar, eu prometo colocar abaixo toda essa merda.

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