Quando cai a última folha ✓

By Carolmtana

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"O destino é inalterável, o rumo é certeiro. Por outro lado, temos o livre arbítrio para alterar o modo como... More

Sobre Folhas e Playlists
Capas e Concursos
Dedicatória
00. Prólogo
01. Vazio
02. Glacial
03. Guardião
04. Poder de Escolha
06. Presente
07. Ajuda
08. Taiga
09. Ivaar e Valquíria
10. Reencontro
11. Os Planos
12. Família
13. Ressignificar
14. Luzes do Norte
15. Equinócio
Epílogo
Obrigada!
Quando a Última Palavra é Dita - Epígrafe
Sobre Últimas Palavras
Prólogo
01. Surpresas
02. Despedida
03. Pedido
04. Conversa
Epílogo
Notas Finais
De volta à ativa!

05. Perdão

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By Carolmtana

ǫᴜᴀɴᴅᴏ ᴀ chamada de vídeo se iniciou, eu não imaginei que ficaria tão mexida. A imagem da minha mãe, de alguém que aparentava ter chorado por dias, estava estampada no meu computador.

Ela ainda tinha o mesmo brilho nos olhos de que me lembrava e o cabelo cor de fogo, única característica marcante que eu não tinha puxado dela. Valquíria começou a falar, trazendo-me à realidade.

— Kaira, eu.. Eu fiquei sabendo pelo seu avô que você está aí há quase um mês e meio já. — uma fungada — Mas eu só descobri o que aconteceu com Ruan ontem quando voltei de viagem, por uma amiga em comum nossa.

Ela inspirou fundo, os olhos reluzindo de repente. Controlei o nó que surgiu em minha garganta.

Confesso que ver Valquíria naquele estado de desolação me acalmou um pouco por saber que, mesmo tendo ido embora, ela ainda se importava com meu pai. E, para estar ligando, colocando a cara à tapa daquela forma, importava-se comigo também.

Mesmo assim não era muito fácil, porém, eu entendia o que a fez partir. Eu não fui um bebê planejado, meus pais já estavam juntos há três anos quando resolvi aparecer e minha mãe tinha apenas 22.

Valquíria estava no último semestre da faculdade, seus sonhos sendo colocados em modo de espera. Pelo lado do meu pai, ele já era formado em medicina e estava no início da residência de cirurgia geral, mas não tornou as coisas tão mais fáceis.

Depois de enxugar algumas lágrimas, ela falou:

— E eu nem imagino o que está se passando pela sua cabeça agora, mas muitas coisas cruzaram a minha. — um suspiro — Aí não tem muitas oportunidades, e talvez você queira seguir algum sonho, como eu um dia quis.

Sorri um pouco. Eu sabia ao que ela se referia.

Meu pai dizia que Valquíria tinha um espírito aventureiro, queria conhecer vários países e não negava o mundo que a chamava a plenos pulmões.

Isso se iniciou quando meus avós se opuseram ao fato dela ir morar sozinha na capital durante o último ano do ensino médio para conseguir ingressar em uma boa faculdade. Eles brigaram e Valquíria foi embora sem olhar para trás.

Esse rancor parecia perdurar por um tempo. No entanto, foi graças ao meu pai que ela voltou a ter contato mais direto com a família, que também a apoiou no período da gravidez.

Seu sonho era ser uma fotógrafa de pontos turísticos, viajando e fazendo o que mais amava. Hoje era essa sua função, mas antes acontece que Valquíria só conseguiu trabalhar em eventos. Ela aguentou isso até eu completar quatro anos.

Então, quando o chamado do mundo ficou alto demais para os ouvidos dela ignorarem, ela foi.

Essa era uma das poucas memórias que eu tinha dela. Era verão, meu pai estava dormindo, e eu acordei com a porta do meu quarto sendo aberta. Valquíria se aproximou e me abraçou apertado, pedindo desculpas e chorando. Ela partiu naquela noite.

A partir daí, eu só conversava com ela por ligações, até que nem meu pai aguentou manter a situação daquela forma, os dois discutiram feio e decidiram seguir sem manter contato.

Nenhum dos dois tentou reverter a situação ao longo dos anos.

— Quero dizer... Eu finalmente percebi o quanto estava afogada nesse arrependimento, porque eu de verdade achei que seria melhor para você e Ruan que eu ficasse longe. Eu já os tinha machucado, não tinha como apagar isso.

Foi minha vez de sentir meus olhos lacrimejarem. Meu pai a havia perdoado há muito tempo, mas as lembranças ainda ardiam.

— Você podia ter tentado. — não aguentei e cortei sua fala, minha voz saindo embargada.

Valquíria ficou muda, mais lágrimas surgindo. Ela parecia lutar para falar alguma coisa, mas não conseguia, então só assentiu até conseguir se recompor.

— Eu realmente deveria ter tentado, Kaira. Porque toda essa situação me mostrou que ficar longe de você, minha filha e do restante da minha família, me transformou em um ser humano vazio. A única coisa mais viva em mim era a esperança de um dia conversar com você e Ruan sobre tudo, mas agora, ele se foi.

Exalei ruidosamente, sentindo as lágrimas rolarem por minhas bochechas. O nó em minha garganta me sufocou, permitindo-me apenas ouvir o que Valquíria falava. Ela me olhou diretamente, como se estivesse decidida.

— O ponto que quero chegar é se você gostaria de tentar fazer nós duas funcionarmos? — arregalei os olhos. Minha mãe pareceu perceber a surpresa, pois começou a discursar muito rápido — Sabe, sobre a faculdade, se você quiser vir morar comigo, já que eu moro na capital Fiori atualmente e aqui tem melhores oportunidades para qualquer coisa que você queira fazer, eu estarei de braços abertos e..

— Valquíria. — chamei, mas ela ergueu a mão de leve pedindo para que eu esperasse um pouquinho. Ela precisava falar o que estava entalado.

— Isso tudo que falei decai sobre uma pergunta só. — mais duas lágrimas escorreram pelo rosto dela — Você me perdoaria, Kaira?

O nó em minha garganta se desfez, e todo o choro que eu estava segurando, tanto pela minha briga com Hazard mais cedo quanto pela novidade de ter minha mãe entrando em contato comigo, saíram de uma vez. Algo na forma que Valquíria fez a pergunta me pegou de surpresa e me trouxe um alívio tremendo.

Nos últimos tempos, além do meu avô, eu sentia que eu nunca teria mais ninguém da minha família por perto. Antes da morte do meu pai, eu não prestava muita atenção na ausência de Valquíria e tentava ignorar o que aquilo me causava.

Porém, quando ele se foi, tudo o que eu queria era o colo de alguém que o havia amado tanto quanto eu, que sentisse a falta dele como eu sentiria. Apesar das atitudes da minha mãe, eu reconhecia que ela o amou sim, mas como a vida era feita de escolhas, ela fez uma que a afastou de nós.

E enfim, era a minha vez de escolher consertar isso ou não.

— Valquíria. — comecei, enxugando as lágrimas.

— Me chame de Val, por favor.

— Certo, Val. — sorri um pouco — Meu pai te perdoou há muito tempo, saiba disso. — ela assentiu, tensa — E eu te digo que eu entendo o seu ponto de vista. Nada justifica o que você fez meu pai passar, mas eu compreendo os seus motivos, por isso.. — respirei fundo. Eu estava prestes a me libertar de algo que eu nunca soube que pesara tanto — Eu te perdoo sim, Val.

Pude ver a expressão da minha mãe relaxar,  tanto que ela começou a rir e chorar ao mesmo tempo. Eu acabei ficando do mesmo jeito e se seguiram uns bons cinco minutos até que conseguíssemos retomar a conversa.

— Kaira?

— Oi?

— O que eu disse sobre vir morar comigo é real, está bem? Sinta-se à vontade para decidir.

Assenti com um sorriso. Foi um leve alívio saber que minha mãe morava na Ilha das Flores, na principal cidade dela inclusive. Significava que ela não estava tão longe assim.

— Vou pensar com carinho. Mas, Val, posso te pedir um favor?

— O que quiser.

— Mesmo que eu não vá morar com você, vamos recomeçar do zero juntas, por favor.

Val assentiu veementemente.

— Eu nunca mais vou te deixar sozinha, Kaira.

— Espero que isso seja uma promessa.

— Pergunte ao seu avô, eu não faço promessas que não irei cumprir. Inclusive, eu vou arrumar um jeito de te visitar nas próximas semanas, temos muito o que colocar em dia.

— Sim, mas Val, só mais uma coisa.

— Pode falar.

— Você pode me chamar de Kai.

Eu sorri abertamente, mas estranhei o fato de mais lágrimas terem surgido nos olhos da minha mãe.

— Você sabe o motivo por trás do seu nome?

— Meu pai só sabia que significava "pura", ele dizia que você não explicou muito o motivo da escolha. Mas ele gostava muito do meu nome.

Val concordou.

— Eu descobri que você seria uma menina com cinco meses de gestação, e mesmo no dia do parto nenhum nome parecia soar bonito o bastante. Então, quando você nasceu e a enfermeira te colocou nos meus braços, me veio esse nome na cabeça.

— Por que exatamente?

— Você era a coisa mais pura que eu já havia visto. Tinha chegado nesse mundo sem nenhum paradigma, nada impedindo seus sonhos, apenas boas expectativas. E por isso eu digo que vou cumprir a promessa, Kai, porque você é o maior tesouro que a vida me deu e eu não dei valor até agora. Eu não vou cometer o mesmo erro duas vezes.

Eu consegui sentir apenas conforto. Porque, do fundo do meu coração, eu sentia que Valquíria falava a verdade.

Os dias correram e aquela semana chegou ao fim. Desde a conversa com Valquíria, o tópico de faculdade estava cruzando minha mente, mas nada muito definido. A parte boa é que agora eu tinha uma opção mais confortável, já que com a morte de papai eu não consideraria morar sozinha tão cedo.

Fora isso, estava sendo um domingo preguiçoso. Eu não havia me atrevido a ir até a floresta nos últimos cinco dias, desde minha briga com Hazard. Eu também não havia visto os gêmeos, então tinha assumido que os pais deles ficariam por mais tempo, mas essa ideia foi quebrada quando eu ouvi algo se chocando na janela do meu quarto.

Assustada, olhei para o vidro e uma bola de neve se chocou contra ele. Surpresa, aproximei-me e vi Snow e Flake sorrindo para mim lá de baixo. Sem Haz.

Senti uma pontada no peito, mas sorri mesmo assim. Agasalhei-me e fui para a porta dos fundos, sendo surpreendida por Ivaar pegando um copo de água na cozinha.

— Onde vai?

— Vou dar uma caminhada, logo estou de volta.

Ele assentiu, parecendo incomodado com alguma coisa. Franzi o cenho e me aproximei dele,  se eu não perguntasse, era capaz de ele conviver com qualquer coisa que o incomodasse até o fim de seus dias.

— O que foi? Sentindo saudades da vó?

Ele suspirou e negou com a cabeça.

— Você pensa em se mudar com sua mãe, Kai?

Então, era aquilo? Sorri docemente e o abracei, sentindo o cheiro de madeira e shampoo que exalava dele.

— Eu estou pensando, mas acho muito difícil isso acontecer. Eu gosto daqui. Além do mais, mesmo que eu me mude, nunca vou deixar de te ver, vovô. Muito menos de conversar com você.

Ivaar retribuiu o abraçou e beijou o topo da minha cabeça. Ficamos assim até que ouvi o vento batendo contra a porta dos fundos, uivando. Segurei uma risada pela impaciência de Flake.

— Eu volto pro jantar.

— Está bem. Se cuida, Kai.

— Pode deixar, vovô.

Sorri para ele mais uma vez e passei pela porta, encontrando um mundo branco lá fora. Isso não era um problema para os gêmeos, que corriam um atrás do outro e se divertiam como se não estivesse frio demais.

— Oi, Kai! — Flake disse, se jogando em cima de mim para um abraço. Eu cambaleei, quase caindo, mas ri e o abracei de volta.

— Olá! — virei-me para Snow — Oi pra você também, espírito da neve.

— Oi, Kai. — ela sorriu, mas deu uma de suas habituais cotoveladas no irmão, fazendo-o se soltar de mim — Licença, Flake, porque é a minha vez.

Ela também me abraçou, mas o momento de saudações não durou muito e eu não quis perguntar o motivo de eles estarem ali sem seu guarda-costas. Os gêmeos só me contaram que seus pais haviam voltado à tarefa de espalhar o inverno mundo afora, isso enquanto me arrastavam para o meio da floresta, já induzindo uma brincadeira de esconde-esconde.

Não era muito justo brincar com espíritos da natureza, já que eles me achavam rapidamente. No entanto, a situação se tornou menos favorável ainda, pois eu já estava com a pontuação bem longe da vitória e ainda tive de procurá-los.

Nessa hora, decidi apenas por seguir meus instintos. Em algum momento da minha saga, achei ter ouvido um barulho a alguns metros a frente, por isso caminhei o mais silenciosamente que pude naquela direção.

Vou achar vocês, seus danadinhos!, pensei, já sentindo um gostinho mínimo de vitória na boca. Porém, a energia que começou a tomar conta de mim a cada passo que eu dava quebrou completamente minha atitude brincalhona.

Tentei seguir na direção oposta à energia, pois definitivamente não parecia algo que eu deveria saber de onde vinha. Mas eu estava dividida, e a parte que queria ver o que era ganhou.

Me permiti ser guiada e logo avistei algo laranja em meio aos outros pinheiros. Imaginando saber do que se tratava, acelerei o passo, já me esquecendo que os gêmeos poderiam começar a ficar preocupados com minha ausência.

De fato, era a árvore que Snow e Flake haviam me mostrado. Ela estranhamente estava com menos folhas de âmbar do que antes, e os galhos de metal pareciam mais escuros. Mesmo assim, ela continuava linda.

Hesitante, eu me aproximei e apoiei as mãos em seu tronco, absorvendo a energia que agora esbravejava em minhas veias. Parecia pedir socorro, não que eu soubesse explicar como cheguei àquela conclusão.

— Você é uma humana muito curiosa, não?

Uma voz feminina soou atrás de mim, parecendo carregar veneno em suas palavras. Cada célula do meu corpo vibrou com aquela presença, que não se parecia nem um pouco com a bondade que a de Hazard carregava.

Por algum motivo, eu só conseguia pensar no quanto estava lascada.

Esse foi o capítulo! O que vocês acharam da Valquíria? Eu particularmente gosto muito dela, apesar de tudo que ela causou. Inclusive, como uma pequena curiosidade, escolhi esse nome porque significa para ela porque significa "aquela que escolhe os que vão morrer". Na minha interpretação, a Val fez escolha que "mataram" a presença daqueles que ela amava em sua vida, e isso é um peso que ela carrega.

Bom, além disso, tivemos também uma aparição no fim do capítulo. Quem vocês acham que pode ser? 

As respostas virão no capítulo "Presente", que é o de sexta-feira. Até lá!

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