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- júlia
- Quando eu era criança, eu aprendi os planetas - Adrien falou. Havíamos voltado para a posição que estávamos na cama antes, ambos deitados olhando pela janela. - Sei a ordem até hoje e fiquei muito surpreso quando descobri que não é algo que as pessoas sabem normalmente.
- Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter, Saturno, Urano e Netuno - canto baixinho. - Nunca lembro se Plutão é um planeta ou não, então não incluo.
- A Kagami não sabe os planetas, mas sabe as luas deles. Todos os nomes, as ordens - ele ri, fazendo um som nasal. - Tem uma lua que se chama Ariel, sabia?
- É a única que eu lembro, por causa da sereia.
- Só por isso que eu lembro também. Mas não a Kagami. Ela sabe cada movimento, cada palavra antes de dizer.
Continuo olhando fixamente para o reflexo da lua no rio. A correnteza seguia seu caminho, levando qualquer folha que caísse no rio e desaparecendo em questão de segundos. O assunto não é mais planetas.
- Eu quis acreditar que gostava dela, o problema é que eu sabia que não e mesmo assim segui em frente.
- Você não me precisa me contar isso - o interrompo. - Foi só aquilo, eu te aconselhei, aconselhei ela, e deu no que deu.
- No que deu?
- Não sei. - Respondo.
- A vi falando com você hoje, logo depois que você saiu da sala atrás do teatro arrumada para ir pra festa. Eu achei que você sabia.
- Ela me disse algumas coisas, sim. Confesso que não entendi a maioria, mas pelo que parece, vocês não estão mais juntos.
- Nunca estivemos - ele explica. - Nunca aconteceu nada além de um quase beijo.
- Ela desistiu?
- Não, eu amarelei.
- Você que não beijou? - Penso em bater levemente nele depois de quase gritar a pergunta.
Kagami é A mulher, honesta, sabe o que quer e é linda. É decidida e não combina de jeito algum com alguém tão incapaz de tomar decisões. É, talvez tenha sido melhor ele não ter beijado mesmo.
- Eu não podia ficar com ela! Porque não seria nada, só um beijo mesmo e não condizia com a situação. Ela quer alguém, namorar, ter uma vida. Eu não sei nem se devo casar ou comprar uma bicicleta.
Eu fiz uma cara de interrogação.
- Olha, não é como você e o Luka - ele usa de exemplo. - No grupo, logo depois de saber que ele tinha interesse em você, você perguntou se estaria iludindo ele. A Juleka disse que não, então você foi em frente. Se eu tivesse perguntado para alguém, a resposta com certeza seria sim.
Ele está certo, não tinha como ela deixar mais claro para o Adrien o que ela queria.
- E você enrolou ela esse tempo todo por quê?
- Porque eu achava que era isso. A última vez que eu gostei de alguém mesmo já faz tempo, não lembrava se era assim e fui perceber tarde demais que se eu não tinha certeza, era porque não era.
- Faz tempo que você gostou de alguém de verdade? - Estranhei.
- Gostar gostar, não. A última vez foi há pouco tempo, mas me apaixonar sim. - Ele diz naturalmente.
- É tão anormal falar disso com você. - Deixo escapar.
- Não acho. A gente era assim antes - ele fala como se estivesse acostumado. - E o Luka?
Adrien vira para mim.
- Ah, não deu em nada - faço uma careta. - Foi bom o beijo e ele é um amigo incrível, mas nada além disso.
- Eu vi vocês dois naquele dia.
- Eu reparei. Me senti mal por um tempo depois, não sabia como você se sentiria com relação àquilo.
- Eu? - Ele franze a sobrancelha.
- É, você estava olhando pra lá e umas horas atrás você deu em cima dele no grupo. Não sabia se era sério ou não e eu não lembrava a sua sexualidade.
- Hétero.
- Então por que... - Sou interrompida pelo meu telefone.
Pego o celular e me assusto com a claridade. O quarto estava com a luz apagada, a única coisa que iluminava o cômodo era a lua.
- Oi, Alya - atendo, fazendo o som alto parar. - Eu estou bem sim, no meu quarto. Com quem eu estou? Com ninguém. Não, Alya, não fui sequestrada, eu estou bem, sério. Não, não menti pra você sobre com quem eu estou.
Adrien pergunta com os olhos.
- É a Alya - tampo o telefone. - Ela acha que eu estou sendo forçada a dizer que estou sozinha para não levantar suspeitas caso eu esteja sendo sequestrada.
- Deixa eu falar com ela. - Ele pede.
- O quê? - mexo a cabeça em negação. - Não.
Ele estende a mão, pedindo pelo celular. Entrego relutante.
- Oi, Alya, tudo bem? É o Adrien - ele fica alguns segundos em silêncio, a voz de Alya soa pelos buraquinhos de som de forma ininteligível. - Sim, ela está comigo. Hmm, sim, no quarto dela. Não se preocupa, eu levo ela pra casa. Ok, tchau.
Ele desliga a chamada de voz e me devolve o celular.
- Você só falou isso e ela se deu por vencida?
- É, ela gosta de mim.
- Ela gosta mais de mim e eu não teria conseguido assim tão rápido.
- Dois anos, Marinette. Está mais que na hora, ela sabe disso.
- Estamos conversando, Adrien, apenas isso - sento na cama. - Não vá pensando que eu te perdoei e entendo os seus motivos, porque até agora você não falou nem um.
- Eu também sofri, Marinette. Você acha que eu realmente quis me afastar de você?
- E o que você queria que eu pensasse? Que estava infeliz e miserável por uma escolha sua?
- Que eu não queria ter feito isso! - Adrien exclama. - Você era minha melhor amiga, isso não vai embora de um dia pro outro.
- Mas foi embora em dois anos.
- Não para mim. - Ele diz sem piscar.
Fico sem saber o que falar por um momento. Não foi embora para mim também.
A gente pode ter parado de conversar e só brigar, mas a saudade fica guardada, escondida dentro do peito.
- Fala logo o motivo. - Suspiro exalando dois anos de dor e saudade.
- Eu precisava. Pelo meu pai.
Quando ele solta essas palavras, eu prevejo o que ele vai falar. Óbvio que a culpa é do pai dele, e não do Adrien. O garoto de 15 anos que eu conheci não se enquadrava de modo algum com as atitudes que ele tomou nas semanas seguintes. Parecia que tinha virado outra pessoa e ele foi ficando cada vez mais distante, mas não antes de me tratar diferente.
- Nós estávamos aparecendo nos sites de fofoca, fotos eram tiradas todas as vezes que a gente saía - Adrien sentou corretamente na cama, apoiando as costas na parede. - Meu pai estava apostando tudo na minha relação com a Kagami, que na época não passava de conhecidos. Mas aí começamos a fazer esgrima juntos, dançar juntos. Ele achou que nós dois daríamos mais matérias que você e eu.
- Porque eu não queria dar entrevistas. - Concluo.
- É, e eu admiro você por isso - ele parece estar tão mal quanto eu relembrando o passado. - Você quer conquistar sua carreira sozinha, por mérito seu, não por ser amiga de uma pessoa que já nasceu com a vida ganha e com a profissão escolhida.
- Eu...
- Eu sei que se eu tivesse te contado você deixaria isso de lado e faria o que o meu pai queria. Você daria entrevistas, faria fotos e até com a parte do namoro falso que meu pai estava planejando você concordaria. Mas eu não queria, não desse jeito. Você merece tudo o que deseja e eu quero que você conquiste isso.
- Você deveria ter me falado.
- Você é teimosa pra caramba, Marinette. Eu acabaria te magoando mais do que magoei.
- Nós podíamos ter continuado amigos, sem saberem.
- Não seria suficiente - ele dá um sorriso triste. - Você sabe disso.
- Por que voltar agora? - Ainda não entendo o que está acontecendo.
- Deixei de fazer o que ele queria. Você e eu estávamos indo de mal a pior, cada vez que eu tentava me reaproximar de você eu conseguia dificultar a situação. Decidi andar, parar de ficar estagnado no mesmo lugar. Não adiantou, é claro.
- E por que não?
- Porque ainda faltava você. - Adrien fixa seus olhos em mim.
Ele está disposto a responder todas as minhas dúvidas, a me dar todas as explicações que eu preciso ouvir. E eu não posso mais ficar brava com ele, nem tenho como. Não foi culpa dele tudo o que aconteceu entre nós, mas foi culpa minha o que a nossa relação se tornou.
Adrien teve que mudar sua personalidade para se afastar de mim. Eu fiquei tão irritada com a mudança abrupta que respondi da mesma forma, com frases afiadas na ponta da língua. Eu não sentia ódio dele. Toda vez que falava que sim, era mentira. Nunca consegui deixar de gostar dele.
Como se eu acordasse, verifico as horas. Duas da manhã. Isso me coloca de volta no lugar que eu estou.
- Você quer descer? - Adrien questiona.
- Deveríamos. - Digo sem muita vontade. A conversa estava no mínimo esclarecedora.
- Vamos, então.
Ele pega as nossas coisas pelo quarto e eu arrumo a cama. Fomos andando e falando sobre bobeiras até a música ficar mais cada vez mais alta. Passamos o resto da festa rindo, dançando e conversando por meio de gritos devido ao som.
Tínhamos quinze anos novamente.