A Ilha do Tesouro (1883)

By ClassicosLP

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Obra do escocês Robert Louis Stevenson. More

PARTE UM - O velho pirata
I - O velho lobo-do-mar no Almirante Benbow
II - O "Cão Negro" aparece e desaparece
III - A mancha negra
IV - O baú do marujo
V - O fim do cego
VI - Os papéis do capitão
PARTE DOIS - O cozinheiro de bordo
VII - Indo para Bristol
VIII - Na Taberna da Luneta
IX - Armas e munição
X - A viagem
XI - O que ouvi no barril das maçãs
XII - Conselho de guerra
PARTE TRÊS - Minha aventura em terra
XIII - Como a minha aventura em terra começou
XIV - O primeiro golpe
XV - O homem da ilha
PARTE QUATRO - A paliçada
XVI - O doutor continua a narrativa: como o navio foi abandonado
XVII - O doutor continua a narrativa: a última viagem do bote
XVIII - Continua a narrativa do doutor: fim do primeiro dia de luta
XIX - Narração resumida de Jim Hawkins: a defesa da paliçada
XX - A embaixada de Silver
XXI - O ataque
PARTE CINCO - Minha aventura no mar
XXII - Como iniciei minha aventura no mar
XXIII - A maré baixa
XXIV - A viagem do coracle
XXV - Ataco a bandeira negra
XXVI - Israel Hands
XXVII - "Reales!"
PARTE SEIS - Capitão Silver
XXVIII - No acampamento inimigo
XXIX - Novamente a mancha negra
XXXI - Caça ao tesouro - as indicações de Flint
XXXII - A caça ao tesouro - uma voz vinda das árvores
XXXIII - A queda de um chefe
XXXIV - Enfim...

XXX - Palavra de honra

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By ClassicosLP

Fui despertado – ou melhor, todos fomos despertados, porque vi o próprio sentinela sacudindo-se no lugar em que caíra, junto à porta – por uma voz clara e vigorosa, que nos chamava da orla do bosque.

— Olá, pessoal! — bradava. — O doutor está aqui!

Era o doutor. E embora eu me sentisse alegre por ouvi-lo, minha alegria não era completa. Era com embaraço que recordava a minha desobediência e má conduta; e, ao verificar até onde ela me conduzira, ao ver os companheiros e os perigos que me rodeavam, senti vergonha de encará-lo.

Ele devia ter levantado ainda em plena madrugada, já que o dia mal despontara. Quando corri a uma das aberturas e olhei para fora, vi-o de pé como vira Silver certa vez, envolto até o joelho pela neblina que brotava da terra.

— O senhor, doutor?! Muito bom-dia! — exclamou Silver, que logo se pôs de pé, em uma radiante disposição de espírito. — Bem disposto e madrugador, como sempre. Diz o ditado: Deus ajuda quem madruga. George, mexa-se, rapaz, e ajude o dr. Livesey a subir a paliçada. Tudo vai bem, doutor, e os seus doentes sentem-se todos bem dispostos.

Falando assim, erguia-se no topo da encosta, com a muleta sob o braço e uma mão encostada à cabana, era bem o velho John, na voz, nas maneiras, na expressão.

— E aqui também temos uma grande surpresa para o senhor — continuou. — Temos aqui um pequeno forasteiro. He, he! Um novo hóspede e pensionista, doutor, que me parece forte e bem saudável. Dormiu como pedra, toda a noite, ao lado de John aqui, voltados um para o outro.

Nesse momento, o dr. Livesey tinha transposto a paliçada e estava muito próximo do cozinheiro. Percebi que sua voz se alterava ao dizer:

— Não é o Jim, não?

— Pois é o próprio! — respondeu Silver.

O doutor parou, como se não pudesse falar, e por alguns segundos pareceu não poder dar um passo.

— Bem, bem! — disse por fim. — Primeiro o dever e depois o prazer, como você mesmo diz, Silver. Deixe-me ver esses doentes.

Um momento depois entrava na cabana, e, olhando-me com alguma severidade, iniciou sua tarefa com os doentes. Não parecia preocupado, apesar de não ignorar que a sua vida, no meio daqueles traidores demoníacos estaria por um fio; no entanto, tagarelava com um e com outro, como se estivesse fazendo uma visita qualquer a uma pacífica família inglesa. Creio que essa atitude encontrava eco naqueles homens, pois comportavam-se com ele como se nada tivesse ocorrido, como se ele ainda fosse o médico de bordo, e eles, honestos e fiéis marinheiros.

— Vai indo muito bem, meu amigo — disse ao homem da cabeça enfaixada. — Pode gabar-se de ter escapado de uma boa; deve ter a cabeça dura como ferro. Pois bem, George, como vai isso? Está com uma cor linda, sem dúvida, mas esse fígado não deve estar lá grande coisa. Tem tomado o remédio? Ele tem tomado o remédio, rapazes?

— Tem, sim, senhor — respondeu Morgan.

— Porque, enfim, vejam bem, já que sou médico de rebeldes, ou médico de prisão, como prefiro chamar — disse o dr. Livesey com a mais agradável das maneiras —, é para mim questão de honra não perder nem um homem para o rei George (que Deus o abençoe!) e... para a forca.

Os bandidos se entreolharam, mas engoliram a ironia sem nada responder.

— Dick não se sente bem, doutor — disse um.

— Você também? — respondeu o médico. — Então venha cá, Dick, e deixe-me ver a língua. Ora! Seria de admirar se assim não fosse! Essa língua mete medo. Outra febre.

— Aí está — sentenciou Morgan — é nisso que dá rasgar Bíblias...

— É nisso que dá vocês serem uns asnos chapados — replicou o doutor — e não terem senso bastante para diferenciar o ar puro do envenenado e os locais secos dos covis infectos e pestilentos. O mais provável, se bem que isso talvez não passe de uma opinião minha, é vocês não conseguirem se livrar da malária. Mas quiseram acampar no meio de um pântano, não quiseram? Só o que me espanta é você, Silver; pois é menos idiota do que todos os que aqui estão, mas parece não ter a menor noção de regras de higiene.

E depois de ter medicado todos e de todos terem recebido as suas prescrições com uma humildade verdadeiramente cômica, mais como meninos de asilo do que como rebeldes e piratas manchados de sangue, prosseguiu:

— Muito bem, por hoje é o bastante. E agora gostaria de ter uma conversa com este mocinho aqui.

E, afetuosamente, fez um sinal com a cabeça na minha direção.

George Merry estava à porta, cuspindo qualquer medicamento de gosto amargo; mas tão logo ouviu as primeiras palavras do doutor, voltou-se furioso e gritou:

— Não! — E soltou uma praga.

Silver bateu no barril com a mão espalmada.

— Silêncio! — rugiu e olhou em torno, impositivo como um leão. — Doutor — retomou, no seu tom habitual —, estava pensando justamente nisso, pois sei da afeição que tem pelo pequeno. Estamos todos humildemente gratos ao senhor por sua amabilidade, e, como vê, temos confiança no senhor e tomamos as drogas que nos dá como se fossem a melhor bebida. Penso que o velho Silver aqui encontrou um meio de agradar todo mundo. Hawkins, quer me dar a sua palavra de honra, como jovem cavalheiro – pois você é um jovem cavalheiro, embora de origem humilde – quer me dar a sua palavra de honra de que não me trairá?

De boa vontade, dei a minha palavra.

— Então, doutor — pronunciou Silver —, o senhor deve passar para fora da paliçada, e, estando lá, levo o garoto. Ele ficará do lado de dentro. Acho que podem conversar por entre as estacas. Muito bom-dia, senhor doutor, e os nossos respeitos ao lorde e ao capitão Smollett.

Assim que o doutor abandonou a cabana, explodiram exclamações de desaprovação de todos os lados, que nem mesmo o olhar fulminante de Silver pôde conter. Silver era acusado de fazer jogo duplo, de procurar fazer uma paz voltada só para ele e de sacrificar os interesses de seus cúmplices e vítimas. Aliás, era exatamente o que estava fazendo. Isso era tão evidente para mim que nem sabia como ele conseguia reduzir-lhes a ira. Mas ele era duas vezes mais homem do que qualquer um ali, e a sua vitória da noite anterior lhe proporcionara uma enorme ascendência. Chamava-os de doidos e cretinos, afirmava que era necessário que eu falasse com o doutor, passava-lhes o mapa em frente aos olhos e perguntava-lhes se queriam romper a trégua bem no dia do recomeço da caça ao tesouro.

— Não, raios! — gritava. — Romperemos a trégua quando a ocasião for propícia; mas até lá continuarei enrolando o doutor, nem que para isso tenha de lhe engraxar as botas com aguardente!

Em seguida, ordenou que atiçassem a fogueira que se apagara lá fora e foi coxeando, apoiado à muleta. Com a mão no meu ombro, deixou-os desnorteados e emudecidos com tanta verborragia; mas não estavam convencidos.

— Devagar, pequeno, devagar — ia dizendo. — Eles podem atirar-se a nós num piscar de olhos se acharem que estamos apertando o passo.

Cautelosamente, pois, atravessamos a areia, na direção em que o doutor nos aguardava do outro lado da paliçada, e, logo que chegamos a uma distância em que podíamos conversar, Silver, parou.

— Fique atento a tudo o que o garoto vai lhe dizer, doutor — disse ele. Ele lhe contará como lhe salvei a vida e como fui deposto por causa disso, pode acreditar. Sabe, doutor, quando um homem se coloca tão perto da tormenta quanto eu, brincando com a vida, como se fosse o último suspiro de seu corpo, deve concordar que merece, pelo menos, uma palavra de atenção, não concorda? Peço-lhe que se lembre bem de que agora já não se trata só da minha vida, mas a deste garoto também está em jogo; e o doutor, gentil e piedoso que é, vai falar-me com estima e dar-me um pouco de esperança!

Silver tornara-se outro homem, desde que ali chegara, e dera as costas aos amigos e à cabana; parecia ter as faces abatidas e a voz trêmula, como se previsse a morte.

— Que é isso, John, está com medo? — perguntou o dr. Livesey.

— Não sou covarde, doutor, nem nunca o fui! — e deu um estalo com os dedos. — E se fosse, não o diria. Mas confessolhe francamente que sinto arrepios quando penso na forca. O senhor é realmente bom e honesto como nunca vi! Não pode se esquecer do bem que fiz, assim como não se esquece do mal, eu sei. Agora vou-me embora, veja bem, e deixo-o sozinho com o Jim. E também isso o senhor levará em conta, já que me custou muito esforço!

Com estas palavras, recuou alguns passos, até pôr-se fora do alcance de nossa voz. Depois sentou-se em um toco de árvore e começou a assobiar; de vez em quando voltava-se e lançava olhares ora a mim e ao dr. Livesey, ora a seus comparsas insubordinados, que andavam de um lado para o outro da cabana, para a fogueira – ocupados em acendê-la novamente –, e da fogueira para a cabana, de onde traziam carne de porco e pão para fazer o almoço.

— Então, Jim — disse o doutor com tristeza —, aqui está você. O que você semeia, também isso colherá. Deus sabe que, de todo o coração, não penso em censurá-lo; mas, quer goste, quer não, tenho de lhe dizer: enquanto o capitão Smollett esteve com saúde, nunca se atreveu a fugir... Tão logo você o viu doente, sem poder impedi-lo... Por Deus, Jim! Foi simplesmente covarde!

Confesso que, ao ouvi-lo, comecei a chorar.

— Doutor — supliquei —, por favor, poupe-me! Já me censurei demais por isso; já paguei pelo que fiz e estaria morto a esta hora se Silver não tivesse ficado do meu lado. E acredite, doutor, posso morrer, e atrevo-me a dizer que o mereço, mas o que temo é a tortura. Se me torturarem...

— Jim — interrompeu-me o médico com a voz completamente alterada, — Jim, isso eu não posso suportar. Salte aqui para fora e vamos correr!

— Mas, doutor — respondi, – dei a minha palavra.

— Eu sei, e como sei — respondeu. — Agora nada podemos fazer, Jim. Eu carregarei tudo nos ombros, meu rapaz, seja o que for, censuras e vergonhas, mas aqui não o deixarei ficar. Salte! Um pulo e estará fora daqui, e nos poremos a correr como gazelas.

— Não — disse eu. — Sabe muito bem que o senhor jamais o faria; nem o senhor, nem o lorde, nem o capitão; e tampouco eu o farei. Silver confiou em mim; dei a minha palavra e volto para junto dele. Mas o senhor não me deixou terminar... Se me torturarem, posso deixar escapar uma palavra a respeito do local onde o navio está; porque eu o procurei, em parte por acaso e em parte por temeridade, e ele está na baía do norte, na margem sul, um pouco além da arrebentação. Está posicionado de maneira a se elevar, na subida da maré.

— O navio! — exclamou.

Descrevi-lhe sucintamente minhas aventuras, ele ouviu tudo em silêncio.

— Há em tudo isso uma espécie de predestinação — observou quando terminei. — A cada passo é você quem nos salva a vida. Acha que, por acaso, deixamos que perca a sua? Seria uma recompensa bem triste, meu pequeno. Você descobriu a conspiração; encontrou Ben Gunn, que é de todos os seus feitos o melhor que praticou, ainda que viva cem anos. Oh, por Júpiter! Falando agora de Ben Gunn! É mesmo o diabo em figura de gente.

E, elevando a voz, chamou:

— Silver! Silver! Vou fazer-lhe uma advertência — prosseguiu quando o cozinheiro se aproximou. — Não se apresse em sair em busca do tesouro.

— Pois sim, senhor, mas farei o possível para encontrá-lo — replicou Silver. — Queira desculpar, mas será a única maneira de salvar a sua vida e a deste rapaz, acredite.

— Bem, Silver — respondeu o médico —, já que é assim, vou um pouco mais longe: quando o encontrar, tome cuidado.

— Doutor — disse Silver —, falando de homem para homem, o que me diz de nada adianta. O que pretende, por que abandonou a cabana, por que me deu o mapa? Não consigo imaginar. E, no entanto, aceitei de olhos fechados o que me ofereceu, sem receber sequer uma palavra de esperança! Mas isto agora já é demais. Se não me disser o que pensa fazer... abandono o leme.

— Não! — disse o doutor, pensativo —, não tenho o direito de lhe dizer mais nada. O segredo não é só meu, Silver, você bem sabe; do contrário, dou-lhe a minha palavra de que o contaria. Mas vou o mais longe que posso, avançando um pouco... E agora, ou estou muito enganado, ou o capitão ficará furioso comigo. Para começar, dou-lhe uma esperança: se ambos escaparmos com vida desta toca de lobos, farei tudo o que puder para salvá-lo, juro.

A fisionomia de Silver estava radiante.

— Acho que, ainda que fosse minha mãe, não poderia dizerme mais! — exclamou.

— Muito bem. Essa é a minha primeira concessão — prosseguiu o médico. — A segunda é uma advertência: mantenha o pequeno sempre junto de si, e, quando precisar de auxílio, peça-o. Estou pronto a esforçar-me por consegui-lo, e isso lhe será uma prova de que não falo à toa. Adeus, Jim.

E o dr. Livesey apertou a minha mão por entre a paliçada, fez um sinal com a cabeça a Silver, e afastou-se rapidamente pelo bosque.

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