SCOTLAND

By GabbxGuccx

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Harry é um escocês rabugento que se redescobre após entrar no universo de possibilidades que é o BDSM. E não... More

Prólogo
Capítulo I

Capítulo 2

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By GabbxGuccx

Diga-me como acham que Harry vai descobrir que Louis é um Dom.

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Ignorar Louis se mostrou uma tarefa bem fácil e Harry estava grato por isso - e decepcionado, para ser sincero consigo mesmo. Por um segundo, entre os flertes e os sorrisos charmosos, cogitou a ideia de que havia algo lá.

Aparentemente não. Pelo menos, não que valesse um minuto do dia daquele estúpido britânico. 

Entre orientar Camila em sua tese, preparar e corrigir provas do fim de semestre e tentar convencer a mãe que maconha não resultavam em boa coisa na casa do cinquenta anos para cima, o escocês pegava a si mesmo checando o celular. Esperando, ansioso como um adolescente apaixonado, um sinal de vida de Louis. O silêncio e ausência dele contribuía ao aumento estratosférico do mau humor do escocês - para terror total dos alunos - e sua rabugice tinha sido testada das mais diversas formas no curto período de duas semanas. Vezes demais para ser seguro riscar um fósforo ao lado do professor sem temer que ele pegasse fogo.

Não ter assassinado alguém no campus já era algo pelo qual comemorar - por maior que fosse o desejo de Harry de fazer picadinho de Zayn. De preferência com as mãos. Teria se contentado em dar nele uma boa e velha surra estilo colegial, se por acaso o delegado de Saint Andrews não fosse Liam Payne e não houvesse risco de passar a noite no xilindró.

Harry fechou os olhos e apertou a ponta dos dedos no canto das pálpebras, gemendo internamente em frustração.

O universo conspira em prol da minha desgraça - só pode.

O sinal tocou indicando o fim da última aula do dia e um suspiro coletivo foi compartilhado entre os alunos e professor. Todos parecidos com zumbis do The Walking Dead - a partir da sexta temporada, onde pareciam mais deteriorados - o auge do desgaste acadêmico.

Harry se pôs de pé ao lado da porta, recolhendo as provas enquanto resmungava a ladainha sobre um bom fim de semana. No fundo, todos sabiam que universitários não tem bons fins de semana - ou entram em coma induzido pelo cansaço ou se entupiam de drogas energéticas para continuar estudando. Era difícil não se compadecer quando sabia como era estar no lugar deles, Harry sabia e os admirava pelo perseverança. De verdade. Um a um eles saíram, murmurando entre si, discutindo sobre a prova que os sugou completamente o cérebro e o quão perto estavam da formatura - agora, tudo era questão de tempo até alcançarem o tão almejado diploma e poderem desfrutar da satisfação de ter concluído mais uma etapa com sucesso.

Com o peito inchado de orgulho, tal como um pai pelos filhos, Harry guardou as provas sabendo que, apesar de todos os defeitos, havia feito algo de bom para aquelas pessoas e por sua causa jamais iriam esquecer de nada que os ensinou, ou dele próprio.

— Você parece feliz demais para alguém com uma montanha de trabalho por fazer.

Harry deixou a cabeça pender para trás, olhos fechados com força. Não crendo que o dia poderia ficar pior, mas o dia sempre poderia ficar pior.

— E o que diabos você tem a ver com isso, Payne? — Retorquiu sem dar-se o trabalho de olhá-lo. — Aliás, por que trouxe sua carcaça podre até minha sala? O que quer?

Zayn emitiu um ruído ofendido.

— Não seja tão rude, Harry. O que foi que eu te fiz?

— Quer uma lista por ordem alfabética ou cronológica?

— Não precisa ficar na defensiva desse jeito. Por favor, somos amigos, vamos ao menos manter a classe. — Ele diz, sorrindo ladinho. — Somos vizinhos e colegas de trabalho também. Uma hora vai ter que deixar essa mágoa ir. Seguir com sua vida - superar. Todo esse rancor guardado não faz bem para a pele e você não está ficando mais novo. —  Zayn apontou, sentando-se na primeira fileira de cadeiras onde apoiou o tornozelo no joelho, mordiscando as unhas. — Talvez seja por isso que é tão mau humorado. Te falta vida social. Contato com pessoas. Por que não se inscreve para representar a universidade na palestra anual de Historia da Arte em Florença? Talvez seja escolhido e a Galleria Degli Uffizi é deslumbrante - Liam me levou lá na nossa lua de mel.

Harry forçou uma risada, finalmente entendendo o motivo por trás da visita inesperada de Zayn. Transpassando a alça da bolsa no tórax, girou sobre os calcanhares para encarar o ex de sobrancelhas arqueadas.

— Você é inacreditável, sabia? Um espécime raro do ser humano.

Zayn sorriu convencido passando a mão nos cabelos, a aliança de casamento reluzindo a luz da sala vazia.

— Obrigado. 

— Isso, com certeza, não foi um elogio sua cobra venenosa. — Grunhiu, permitindo a raiva vir à tona, — Acha que não sei o que está fazendo? Pensa que Camila não me contou suas tentativas frustradas de roubá-la de mim e assumir a orientação da tese dela? Está tão preocupado em não ser escolhido como o representante da universidade na palestra em Florença que se deu ao trabalho de vir até aqui tentar me derrubar?

O divertimento cedeu espaço a irritação e Zayn se retesou na cadeira, as feições cobertas por uma máscara de raiva soberba.

— Eu não perderia meu tempo me preocupando com você. — Cuspiu entre dentes. — Além disso, o representante é sorteado durante o último conselho dos professores. Todos sabem disso.

— Não. Não são. — Harry sorri, girando nos calcanhares para encara-lo. — Nós dois sabemos que o Reitor é quem escolhe o representante com base na melhor tese apresentada no fim do semestre. Não existe sorteio algum e é por isso que vem tentando tirar Camila de mim, porque ela é a melhor aluna do curso, mas não vai conseguir, Payne. Você não vai tirar mais nada de mim. — Quando Zayn abre a boca para retrucar Harry o corta; — Aceite sua derrota com honra e fique feliz por mim - amigos ficam felizes com a conquista dos outros, e somos amigos, não somos? — O provoca, adorando o gosto agridoce das palavras em sua língua. — Tente seguir com sua vida - superar, deixar a mágoa ir. Não quer ter rugas antes dos quarenta, quer? Duvido que Liam iria gostar.

— Seu filha da mãe, — Grunhiu, os punhos apertados encima das coxas. — Não ouse falar do meu marido ou falar comigo nesse tom!

O escocês da um passo ameaçador para frente; — Ou o quê?

Um assobio alto e repentino fez ambos os ex noivos pularem de susto - arrancados bruscamente da bolha de conflito - buscando a fonte do som com caras assustadas.

Parada na porta da sala, vestida de preto dos pés a cabeça, Lauren Jauregui os olhava com a boca aberta em espanto.

— Uau! Isso sim — Ela gesticulou empolgada com as mãos, — que é tensão! Dá para cortar com uma faca, caramba, Hollywood está perdendo sem vocês dois! Deu para sentir a força do ódio saindo de vocês - foi fantástico! Sério, nota dez pela atuação.

— Amor! Menos, por favor? — Uma voz suave a repreende baixinho e logo Camila surge ao lado da esposa, vermelha como um tomate. Elas discutem aos sussurros por longos segundos e Lauren deixa os ombros caírem com um suspiro, concordando. Camila volta a olhar Harry com um sorriso tenso, constrangida.  — Desculpe a interrupção, senhor Payne, professor Styles. Eu esqueci meu celular na sala. Posso ir pegá-lo?

Encabulado, Styles deu-lhe um aceno de cabeça; — À vontade.

Enquanto ela corre para pegar o celular, Lauren oscila o olhar penetrante entre Harry e Zayn tentando emendar os fios soltos, quase se podia ver as engrenagens girando em sua mente.

Por um breve momento o escocês se recorda do olhar de Louis - aqueles dois oceanos profundos cheios de contradições e promessas implícitas que não vê pessoalmente há mais de quinze dias. E sente falta dele. É hipócrita de sua parte, ele assume - ainda mais depois de ter dado bolo no jantar combinado, sem dar explicações - querer que Louis vá para ele, mas Harry não pode deixar de notar semelhanças de comportamento entre Lauren e Louis e tentar buscar mais informações com base nisso.

Eles seriam parentes? Amigos? Ou as semelhanças eram irrelevantes? 

Sua linha de raciocínio é rompida quando Zayn se levanta raspando a cadeira no chão. O guincho agudo dando início a outra enxaqueca.

— Não tive o prazer de me apresentar antes, — Ele contorna Harry, oferecendo a mão para Lauren com um sorrindo cortês. — Sou Zayn Payne, coordenador da Associação de Arte. Sua esposa é uma de nossas melhores alunas. Um verdadeiro trunfo para a Universidade.

— Lauren Jauregui. — Ela aperta firme a mão dele, balançando uma vez e a segurando por um instante, o analisando. — Seu nome não me é estranho, — Lauren estala a língua no seu da boca. — Payne.

Os olhos de Zayn brilham diante a perspectiva de poder se gabar do marido.

— Deve ter conhecido meu marido, Liam Payne. — Ergue a mão e balança os dedos, a aliança reluzindo. —  Ele é o delegado da cidade.

— Ah, sim. — Lauren diz, franzindo as sobrancelhas perfeitas a medida que seus olhos escurecem e o entendimento a atinge. — Seu marido é o policial babaca que me multou doze vezes nos últimos quatro meses e foi me intimar na minha própria casa por fazer muito barulho e perturbar os vizinhos que eu não tenho, certo? Ele é realmente um cara muito legal.

Harry mordeu o lábio para sufocar a risada que tenta romper sua garganta, os ombros tremendo com o esforço. Ele assiste com óbvia satisfação a pose soberba de Zayn murchar como um balão de gás hélio furado. Ele recolhe a mão, ainda pasmo, e finaliza a conversa murmurando uma despedida antes de sumir porta a fora como um raio.

Camila retorna saltitando do fundo da sala, balançando o celular no alto com um sorriso de orelha a orelha - alheia ao desenrolar da situação estranhamente cômica.

— Encontrei! Estava debaixo da cadeira. Devo ter deixado cair.

— Perfeito, querida. Venha aqui. — As feições de Lauren suavizam e ela acaricia o rosto da esposa, depositando um beijo carinhoso em sua bochecha. Os olhos brilhando com amor — Que tal uns drinks no Louis antes de irmos para casa?

A simples menção do nome do britânico deixa Harry tenso até o último fio de cabelo, mas ele disfarça mexendo no compartimento fronta da bolsa de couro.

Então eles se conhecem.

— Parece ótimo, — Camila responde sorrindo. — Niall disse que experimentou o uísque búlgaro e é tão bom quanto o irlandês.

— Sabe que não deve confiar no que Niall fala, ainda mais quando é sobre bebidas.— Ela diz, acariciando desinteressada a coleira de couro branco no pescoço da esposa. — O que acha de se juntar a nós Styles? — Lauren se dirige a ele, pegando-o de surpresa. — Uma bebida antes de encerrar um dia longo de trabalho? Meu amigo é dono do melhor bar da cidade.

O escocês encolhe os ombros, pego despreparado. Orientar Camila estreitou laços entre eles, apesar de Lauren continuar deixando-o com um pé atrás. A mulher tinha uma aura poderosa que o assustava. Assim, largou a primeira desculpa razoável em que pode pensar.

— Adoraria, mas não seria profissional da minha parte beber com uma aluna, principalmente minha orientada. Talvez depois da formatura. — Sorri de leve e faz um gesto para a porta. — Primeiro as damas.

Nenhuma das mulheres insiste, movendo-se juntas para o estacionamento sem mais perguntas - reclusas em seu universo particular. Harry as perde de vista dobrando o corredor e repete a si mesmo que é melhor evitar um certo bar para sua própria segurança.

A Senhora Murphy, assim como esperado, ainda trabalhava em seu escritório quando chegou para entregar o relatório das atividades e encerrar o expediente.

— Professor Styles, — Ela o olha por cima dos óculos redondos, —  Chegou um pacote para o senhor. É da sua irmã.

— Gemma nunca aprende. — Murmura , e mais alto complementa. — Está no escaninho?

— Oh, não. É grande demais, está debaixo do aparador.

Seguindo as orientações dela, Harry se despede com a caixa nos braços, maquinando um modo de levá-la na bicicleta sem acidentes no percurso. Não caberia na cesta e duvidava ser capaz de manter o controle da bicicleta com ela equilibrada no guidão - o jeito era voltar para casa andando e torcer para o clima colaborar. 

O céu coberto por uma longa, densa e escura camada de nuvens prometia chuva - e das feias. As estações estavam mudando, o que significava chuva em abundância e as folhas alaranjadas do outono dando lugar a galhos de árvore nus e ventos frios. Muito, muito frio. Harry treme só de pensar no clima gélido sem limites que se instalaria nas verdejantes terras escocesas dali a pouco - ventos cortantes e incômodos congelando seus ossos e o obrigando a trocar os kilts por calças de lã com forro duplo.

O desânimo foi impossível de evitar.

Louis, por outro lado, estava empolgado com o inverno. Para amenizar o frio, tanto moradores locais como turistas, recorriam ao álcool - o que tinha de sobra nos armazéns e no caminhão que conduzia de volta a Saint Andrews depois de um dia cheio de encontros e reuniões com importantes produtores de uísque aos arredores de Speyside - uma trilha onde se reunia as mais importantes e históricas destilarias da bebida do país.

De seus compromissos a cumprir possuindo parte da Harviestoun Brewery Industries, a sua favorita era tratar diretamente com associados e fornecedores. Louis gostava de participar de cada etapa da produção - da colheita dos ingredientes ao processo de destilação até finalmente servir a bebida pronta para o cliente no balcão do bar. Característica está que Ken Brooker, CEO e sócio majoritário, apreciava e muito no seu protegido. E apesar de ser o invasor nas Terras Altas, Louis tinha carisma, simpatia e dava-se extremamente bem com os todos escoceses.

Bom, quase todos os escoceses. Pensa, sorrindo ao afivelando o cinto.

As estradas estavam vazias na volta a cidade. O nevoeiro somado ao dilúvio caindo do céu escuro tornava o sofá de casa dez vezes mais convidativo e Louis conduzia com cuidado redobrado, ansioso para chegar ileso em casa e se enrolar num cobertor de frente à lareira com uma xícara de chá quente.

Murtagh e Angus haviam se oferecido para acompanhá-lo, mas os dispensou dando-lhes o dia de folga. Ambos tinham família - esposa, filhos e netos - e mereciam um agrado tendo trabalhado sem pausa na construção e depois na abertura do bar. Saber que os tinha ao seu lado já era de grande valia a Louis. Não era necessário provar lealdade nenhuma.

Cantarolando com o rádio, apoiou o cotovelo na janela e a cabeça na mão, os pensamentos longe.

Mesmo sem querer, Harry tomava conta de sua mente nas horas mais improváveis. Tudo o levava de volta ao escocês rabugento. Sua teimosia o excitava, mas era a mente rápida e esperta dele que o deixava louco. E os kilts - malditos kilts - que atraíam sua atenção para as belas pernas do escocês como mariposas à luz - Tomlinson tentava não olhar, mas eram missões fracassadas. Harry não o queria e deixou sua decisão bem clara ao sumir sem dar explicações. E Louis o deixaria em paz, não se tornaria um maluco stalker porque foi rejeitado.

Avisá-lo por mensagem seria a coisa educada a se fazer e totalmente aceitável se não fizer também. Harry não era obrigado a nada - o que não o impedia de chorar suas mágoas a Niall e lamentar pelo pé na bunda tomado. 

Sexo casual não ajudaria - parou de tentar quando se deu conta que restringia sua busca a morenos altos vestindo kilt, de olhos verdes ferozes e uma língua afiada. 

Para esquecer o escocês, Louis dedicou mais tempo em seus hobbies pessoais; Camila disse que para comemorar sua formatura queria voar e Lauren, como sua Dona devota e apaixonada, pediu a ele aulas de bondage com cordas específicas. Resistentes e maleáveis o bastante para manter Camila suspensa com segurança - voando, como ela disse. Então, no tempo livre, Tomlinson ensinava a amiga Domme a arte milenar do shibari.

E se Tomlinson fantasiava em amarrar alguém, sozinho em sua cama à noite, o problema era dele - vinte e dois centímetros de problema duro e latejante. 

Aumentando a luz dos faróis, Louis diminuiu a velocidade do caminhão de quarenta para vinte quilômetros por hora, o chiar agudo do rádio o içando das fantasias sujas direto para o cenário mais inesperado da semana; um estranho coberto de lama balançando os braços acima da cabeça no meio da rua e debaixo do maior temporal.

A chuva e o nevoeiro dificultavam a identificação da pessoa lamacenta, e por precaução, Louis escondeu a Wilson Combat 1911 no quadril da calça jeans antes de saltar fora do caminhão, rezando para que aquilo não fosse um assalto ou pior.

— Ah graças á Deus! — O estranho deixou os braços cair com alegria, mancando ao caminhar. — Achei que iria passar direto como os outros!

Louis franziu a testa, reconhecendo na hora a voz rouca e lenta.

— Harry?!

— Louis?!

*

*

*

*

— Eu não vou para o hospital!

— Não estou te dando escolha.

— Eu. Não. Vou. — Disse em pausas, como se falasse com uma criança. — Você não manda em mim e eu não vou para a porcaria do hospital!

— É óbvio que vai, você caiu de um barranco Harry, pelo amor de Deus! — Louis grunhiu, ouvindo-o praguejar em gaélico. — Você pode ter hemorragia interna, um osso quebrado ou sei lá mais o que.

O escocês rolou os olhos e cruzou os braços, carrancudo.

— Eu estou bem senhor Tomlinson. Eu cai, levantei e pronto - isso não é o fim do mundo.

— Sua falta de cuidado consigo mesmo me fascina. — Louis aumenta a pressão no volante, o nó dos dedos brancos. — Nós vamos para o hospital. Você precisa de cuidados médicos.

— Será que o álcool afetou sua capacidade auditiva? — Cuspiu, encolhendo-se com a pontada de dor nas costelas - o que aumentou sua raiva. — O pior machucado que devo ter são arranhões nos joelhos. Vire esse volante, não preciso de nada além de ir para casa senhor Tomlinson.

— Então voltamos a estaca zero? — Louis parou no sinal vermelho, virando para olhá-lo. — Se me chamar de senhor te faz sentir melhor - ok, mas não pense que porque me chama assim está criando uma barreira entre nós. Eu me preocupo com você.

— Não tenho a mínima ideia do que está falando.

— Eu já entendi que não está interessado em mim Harry, e não vou forçar nada. — Observando-o pelo canto do olho viu a honestidade em seus olhos azuis, tal como sua voz. O sinal abriu e Louis voltou a dirigir com um suspiro.  — Mas nós podemos ser amigos, se você quiser.

— Só quero que me leve para casa, por favor. — Ele escorou a testa suja na janela, exausto e com dor, e baixou a voz num sussurro. — Já sofri decepções de mais por uma vida, não preciso de outra adição a lista. 

Louis abriu a boca para responder, mas pensou melhor e retrocedeu. Seguindo o resto do caminho em silêncio - o coração em fragalhos por ter encontrado Harry naquele estado, sozinho e machucado no relento.

Largado a própria sorte. 

— Espere aqui. — Disse a ele, pulando para fora da cabine do caminhão.

Harry o seguiu com os olhos para dentro da farmácia, aproveitando o tempo sozinho para enxugar as lágrimas de dor e constrangimento do rosto coberto de lama e se recompor. O universo realmente parecia conspirar em prol da desgraça dele. Começou com Zayn o importunando, depois a chuva no caminho para casa e, para finalizar com chave de ouro, o deslizamento de terra que causou sua queda no barranco.

Tudo ajudava.

E de todos os habitantes de Saint Andrews, tinha que ser Louis a parar e o oferecer ajuda. A única pessoa que não queria que o visse naquele estado - a única cuja opinião importava.

O karma realmente era uma vadia.

Louis retornou da farmácia com três sacolas cheias, ensopado e tremendo. Nenhum dos dois tentou puxar conversa conforme avançavam através do temporal, presos em suas divagações pessoais. Enrolado numa bola, Harry apertou o cobertor que Louis lhe dera, fechou os olhos e desejou nunca ter saído da cama naquela manhã.

Quando o caminhão para pela terceira vez, Harry finalmente olha ao redor e se manifesta.

— Essa não é minha casa.

— Não. — Louis escancarou a porta do passageiro e passou um braço debaixo de seus joelhos e outro nas costas, pegando-o no colo. — É a minha.

Harry enroscou o braço em seu pescoço, cavando sua nuca com as unhas.

— Me põe no chão.

— Você está machucado.

— Problema meu. Me põe no chão, agora.

— Não.

— Eu vou te bater! Me põe no chão, eu quero ir para casa!

Louis riu com amargura.

— E como pretende ir para casa, rastejando? Mau consegue andar, pare de ser teimoso e me deixe cuidar de você.

Harry rangeu os dentes.

— Eu não sou criança.

— Está agindo como uma. — Desta vez Harry rasgou a pele de sua nuca com as unhas, xingando-o em gaélico. Louis ignorou o ardor e seus protestos, apertando-o a ponto de dor quando se debateu. — Pare de lutar Harry. — Ordenou, a voz dura e autoritária. — Eu vou cuidar de você e se quiser ir para casa depois - eu te levo. Sem discussão. Mas hoje não vou te deixar sozinha de maneira nenhuma. Lide com isso.

Com um equilíbrio de causar inveja, o britânico se apoiou na parede e, usando o pé, baixou a maçaneta da porta, chutando-a aberta.  O calor os deu boas vindas, as luzes acendendo-se gradativamente, revelando pouco do interior da casa.

Louis o colocou sentado sobre uma otomana no quarto - aparentemente dele pela cama bagunçada, os livros no criado mudo e as fotos na parede, e se ocupou no banheiro. Pôs a banheira para encher, empilhou toalhas na bancada e sumiu no closet atrás de roupas limpas. Uma trilha de lama, turfa e água demarcando cada passo dele. Harry olhou para as manchas de sujeira que ele mesmo fizera no estofado então para si mesmo, afastando o cobertor para olhar o estrago da queda.

Styles não tinha andado mais que um quilômetro quando a chuva passou a ser um problema real - somando a bicicleta e a caixa de Gemma na equação foi fácil pisar em falso, escorregar na lama e descer rolando pelo barranco.

Quando conseguiu levantar, encontrou a bicicleta torcida num oito e a caixa de Gemma completamente amassada e rasgada, aquela altura não importava mais se a água da chuva fosse estragar o presente, seja lá o que fosse - Harry só queria sentar e chorar. Chorar de raiva, de dor, de vergonha. Chorar todas as lágrimas presas dentro dele nos últimos anos - mas, como fez tantas vezes antes, engoliu o choro, levantou com machucados, dor e tudo mais e procurou o caminho de volta a estrada pensando em pedir ajuda a alguém, e se desse sorte, uma carona. 

Não tinha chegado tão longe para morrer de hipotermia na encosta de um barranco qualquer. Lhe restava alguma dignidade na barra do kilt.

— Harry? O banho está pronto. — Louis chamou pela segunda vez. Agachando-se na frente dele, preocupado, — Já fizemos isso uma vez, podemos fazer de novo, — Ele tentou suavizar o clima sorrindo. — Se me lembro bem você estava muito mais empolgado em tirar minhas roupas, o que mudou? Não quer mais meu corpo nu?

Harry não pode conter o riso - gemendo de dor com o ato. As mãos cobrindo as costelas.

— Você é um idiota.

— Um idiota que te faz rir. — Ele diz, ajudando-o a tirar os sapatos e as meias imundas. — Está usando roupa íntima professor? Ouvi dizer que os escoceses não usam e não quero te deixar desconfortável.

Ele bufou, empurrando para longe suas mãos.

— Vocês ingleses imaginam coisas demais sobre o meu país. Deve ter algo que estimula a imaginação nesse chá que vocês bebem sem parar. — Resmungou, ocultando a vergonha com mau humor, — Eu consigo tirar minhas próprias roupas, obrigado.

— Suponho que também consiga tomar banho sozinho, então?

— Com certeza não vamos tomar banho juntos.

Dessa vez foi Louis quem riu, tirando o suéter e a camiseta pelo pescoço num só puxão, exibindo sem pudor o corpo aos olhos arregalados do escocês.

— Vou tomar banho no quarto de hóspedes. Me chame quando estiver pronto que vou cuidar dos seus ferimentos.

— Virou médico agora? — Perguntou irônico, torcendo as mãos no colo e evitando olhar diretamente seu corpo seminu. — Pensei que só servia bebidas e paquerasse seus clientes.

— Só os que vestem kilt e rolam barranco abaixo no meio de uma tempestade. — Provocou, chutando os sapatos fora e abrindo a fivela o cinto. — Estes são meus favoritos.

— Que fetish exótico senhor Tomlinson.

Louis se aproximou a passos lentos e decididos, a expressão tornando-se séria, os olhos faiscando com uma emoção que Harry não reconhecia. Ele atirou o cinto na otomana e com as duas mãos aninhou seu rosto, curvando-se perto o suficiente para que Harry pudesse sentir o cheiro de uísque e o calor de sua pele nua. Mais perto e com menos roupas do que qualquer outro ser vivo jamais esteve dele. Harry podia ouvir a pulsação louca do próprio coração ecoar nos ouvidos, os lábios secos e a saliva se acumulando na boca.

Ele iria ter um derrame se Louis o beijasse ali.

Puta merda, Louis iria beijá-lo ali, naquele estado deplorável?

— Me escute bem porque não vou repetir, — Murmurou, a calma dele deixando Harry ainda mais nervoso. — Você vai tomar banho e depois que estiver limpo e aquecido vai me mostrar onde se machucou. Eu vou cuidar dos ferimentos e então vamos comer alguma coisa antes de dormir.

— Você disse que me levaria...

— Para sua casa, sim. Se quiser. Depois. — Louis o cortou, a voz inalterada, olhar firme no dele. — Mas agora você vai tomar banho, eu vou cuidar dos seus ferimentos, vamos comer e dormir. Hoje foi um dia estressante e você está cansado. Amanhã conversamos sobre o que aconteceu e se ainda quiser ir embora - eu te levo. Balance a cabeça se me entendeu. — Harry o fez, agindo por impulso, e recebeu um sorriso satisfeito em troca. — Ótimo, vá tomar banho antes que a água esfrie. Vou estar aqui quando você voltar.

Seis palavras.

Com aquelas seis palavras - Vou estar aqui quando você voltar. - Louis carbonizou o restante das barreiras de proteção que Harry continuava tentando refazer entre eles. Reduzindo-as a pó até sobrar só Harry, tão machucado por dentro quanto por fora. 

Você não vai tirar mais nada de mim.

A frase dita a Zayn no ápice da raiva se encaixava ali com perfeição. Harry não devia deixar seu passado interferir tanto no presente. Não devia punir um pelos erros do outro - ou por sua mágoa pessoal. Tinha que superar. Passou da hora de superar. E talvez arriscar um pouco. Tentar coisas novas - com pessoas novas. Mas devagar. Uma passo de cada vez. Louis sugeriu uma amizade. Território seguro, neutro. Poderiam começar dali. Ir devagarzinho, sem pressão. 

Sem a fome que parecia queimar no fundo dos olhos de Louis cada vez que se encontravam - sedutora e insaciável.

*

— Ai! — Harry grunhiu, puxando o pé por reflexo. 

— Eu falei que iria arder. — Louis o relembrou, limpando as feridas com algodão e iodo.

— Falar não muda o fato disso arder como o inferno. — Responde ríspido. Acertando a coxa de Louis com o pé. — E tire esse sorriso estúpido da cara.

— Estou te ajudando e é assim que me agradece, me agredindo?

— Você está é rindo da minha desgraça. — Acusa, mordendo o lábio. — Já está acabando?

— Quase.

Quando todos os cortes foram limpos e a preocupação de Louis quanto sua saúde fora sanada - ele se inclinou no sofá da sala, pegou algo na mesinha de centro e o ofereceu para Harry com um sorriso maroto.

— Você foi um bom menino, merece um pirulito.

O escocês arqueou as sobrancelhas para ele.

— Jura?

Louis balançou o pirulito perto do seu nariz.

— Eu sei que você quer.

— Eu vou te bater. — Ameaçou.

O sorriso dele se alargou á medida que seus olhos azuis faíscavam.

— Tente.

A campainha tocou naquele instante, dando fim a competição de "quem pisca primeiro" e Louis jogou o pirulito no sofá, correndo para a porta falando sobre pizza para o jantar. Harry aproveitou sua ausência para testar o tornozelo dolorido, esfregando a sola do pé no tapete felpudo - criando coragem para apoiar o peso nele e se aproximar da lareira cripitando.

Os porta retratos equilibrados no beiral de pedras lisas chamaram sua atenção. Uma sucessão de fotos da infância de Louis até os dias atuais.

— A morena bonita é a minha mãe, Johannah.

Harry se virou para encontrar Louis debruçado na caixa aberta da pizza, retirando tudo o que era verde da massa e o transferindo para uma vasilha.

De repente, ele se recorda de um detalhe importante - dinheiro. E pergunta bruscamente;

— Quanto eu te devo?

— Não entendi. — Louis permaneceu compenetrado na tarefa de retirar todo e qualquer verde da pizza. — Do que está falando?

Harry coloca o porta retrato de volta e manca para perto do britânico - caindo sentado ao lado dele.

— Acabei de me lembrar que nunca te paguei pelo que consumi no bar aquele dia - e hoje você gastou mais uma bolada de dinheiro comigo; na farmácia e agora com comida. — Explica usando o tom mais suave e humilde que tem. — Seria mais fácil de calcular se colocarmos no papel. Não vou me importar se quiser cobrar juros.

— Que tipo de pessoa você acha que eu sou, professor? — De pé com a vasilha, Louis o encara de cima, ofendido. — Não se cobra por ajudar alguém.

— Não gosto de estar em dívida com ninguém. — Esclarece depressa.

— Não está em dívida comigo. — Louis deixa a vasilha na ilha da cozinha e pega dois copos e um jarro de suco da geladeira. — Gosta de suco de abacaxi com menta?

Harry se torce no sofá para o acompanhar.

— Sim, estou em dívida com você e sim, gosto de suco de abacaxi. Você pode, por favor, me deixar pagar o que te devo?

— Em todos os meus anos como garçom eu nunca vi alguém tão determinado quanto você a saudar uma dívida num bar - principalmente quando o dono não tem problema em deixá-la passar em branco.

Harry aceitou o copo de suco oferecido, feliz que Louis sentou a uma distância segura.

— É questão de honra. — Disse, bebendo goles generosos do suco. De repente com sede o suficiente para beber água do mar. — Se não vai aceitar meu dinheiro, como posso te pagar?

— Você sabe jogar golf? — Harry o fitou confuso, mas acenou. Louis prosseguiu; — Todo ano a Harviestoun promove um final de semana de festa para alavancar fundos para a caridade. Este ano é em Inverness e Ken quer que eu seja um dos anfitriões. — Curvando-se, ele alcança a caixa da pizza e a coloca entre eles. Mordendo um pedaço generoso, ele mastiga e engole antes de continuar. — O problema é que os nossos sócios mais antigos, e mais valiosos, são escoceses do tipo que adoram discutir negócios jogando golf - e é aí que mora o problema.

— Uhm, — Harry murmura, a boca cheia. — Então, você quer que eu te ensine golf para pagar minha dívida? Seria como fazer escambo, então? Trocar um por outro?

Louis encolheu os ombros, partindo para o segundo pedaço de pizza. — É uma forma de pagamento.

O escocês analisou seu perfil por um instante. As chamas advindas da lareira reluzindo como ouro no azul de seus olhos, a pele bronzeada, tão rara naquele lugar, parecia sedosa como as roupas que vestia. Louis lambeu os lábios, resgatando resquícios da pizza e Harry acompanhou com desejo o caminho que sua língua percorreu. A boca entreaberta, a respiração e o ritmo cardíaco se elevando com a luxúria de seus devaneios.

Calor se espalhou por ele - as coxas pressionadas juntas enquanto devorava Louis com os olhos. O desnudando ali mesmo, no sofá. Dando a si o deleite de apreciar aquele peito nu mais uma vez. Um vislumbre do paraíso em que nunca esteve.

Louis o pegou olhando. Sorrindo ladinho, ele limpou o canto da boca com o dedão antes de envolve-lo com os lábios e o chupar devagar.

— Delicioso. — Gemeu com o sabor, mordendo o lábio. — Você está bem professor? Está suando.

Harry ruborizou, constrangido.

— Sim. — Tomou o restante do suco e abraçou uma almofada, colocando-a no colo. Gesticulando com a mão, nervoso. — Vamos comparar nossas agendas e combinar os horários. Precisamos de uma cronograma, um lugar para treinar e os apetrechos - você tem tacos de golf?

— Tenho tacos, mas não de golf. — Harry apertou mais forte a almofada, engolindo seco pelo que imaginou. Louis sorriu. — Podemos ir às compras juntos. Dinheiro não é o problema.

O escocês bufou com desdém fingido.

— Ok, Warren Buffett. Você é quem manda.

O rosto de Louis se transformou quando o ouviu e Harry não conseguiu mais o encarar - seus olhos verdes descendo, o queixo tocando o peito numa reação involuntária e incoerente de submissão.

Harry quase gemeu com o toque suave em seu queixo segundos mais tarde. Louis fazendo-o retornar a posição anterior, a ponta dos dedos deslizando por sua mandíbula até ter a palma da mão embalando sua bochecha com carinho. Louis afastou a caixa de pizza e foi para mais perto, a lateral da coxa tocando os joelhos dobrados de Harry.

— Nunca mais, — Sussurrou, — Desvie o olhar de mim. Seus olhos são os mais bonitos que já vi na vida. Não me tire prazer de olhar para eles, entendeu?

De modo quase imperceptível Harry acenou, temendo afastar-se do toque dele caso fizesse movimentos bruscos. Respirando pela boca, focou o olhar pesado de desejo num ponto específico, seus lábios. Inclinando-se em sua direção lentamente, oscilando entre os olhos azuis e a boca tentadora Harry pousou a mão na coxa de Louis para apoio. Levado a ele como metal ao ímã - impossível de não sucumbir a atração.

— Por favor, — Implorou, mesmo não tendo certeza de pelo que. O corpo formigava ansioso e ávido por mais. Fechando os olhos, colocou a mão sobre a de Louis em seu rosto, entrelaçando seus dedos juntos. — Eu não sei - não sei o que é isso, mas...

— Mas... — Louis disse, incentivou-o. Os lábios resvalando contra aos do escocês. — Diga-me.

— Amigos não devem querer beijar um ao outro. — Prosseguiu baixinho, escorregando a mão pelo braço de Louis, agarrando-lhe a camisa e o puxando para si. — E eu quero tanto te beijar. Desde o dia em que o conheci. — Confessou numa onda repentina de coragem, abrindo os olhos para o encarar cheio de cobiça. — Descobrir se seus lábios tem sabor de uísque. Se são macios como parecem.

— Tenho uma boa notícia para você, professor, — Louis mordeu seu lábio inferior, sugando entre os dentes e deleitando-se internamente com seu gemido. — Não somos amigos.

*

*

*

*

Desculpem-me qualquer erro e me digam se encontrarem algum, ok?

Gostaram?

Espero que sim, beijos e até o próximo!

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