Lucas no Mundo dos Contos

Da Luque_Aqui

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Essa antologia de contos traz uma variedade de histórias de diferentes gêneros, com o objetivo de reunir em u... Altro

INTRODUÇÃO
01 - Véu Negro
02 - Asas e Escamas
03 - Romaria
04 - Uma Dança
05 - Rei Vermelho
06 - Papai Noel
07 - A Grande Ceia
08 - Sempre Neve

09 - Mirtes

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Da Luque_Aqui

Mirtes era uma garota diferente das outras, não digo pela aparência e sim pelo passado. Sofreu inúmeras violências quando criança, principalmente pelo seu pai, que lhe espancara várias vezes por dia. Motivos? Não queria ter tido uma menina, já que para ele mulher não servia para tráfico de drogas. E sua mãe lhe tratava com indiferença o que era muito pior. Viciados em drogas, nunca se importaram com Mirtes e isso a levou ao seu primeiro assassinato.

A garota usou seu poder sombrio para causar sofrimento em ambos, ela só queria mostrar a dor que sentia, mas cada momento que usava seu dom, sua fome crescia.

"Eles gritaram muito, cada vez que eu torcia seus membros. Só que não consegui parar, os gritos deles eram prazerosos para mim, gostei de ver seus corpos virarem do avesso, foi o dia mais alegre da minha vida."

Após a morte do pais, Mirtes foi morar em um internato de garotas, onde ficou longos anos, já que ninguém queria adotar uma garota estranha com um passado sombrio.

Foram anos difíceis, sem amigos ou alguém em quem confiar. Vivia sozinha e passava longas horas do dia conversando com seu urso de pelúcia. As crianças diziam que ele dava risadas durante a noite.

Aos dezesseis anos, Mirtes já sabia mais que qualquer outra criança, e nem frequentava mais as aulas do internato. As freiras não insistiam para ela ir, pois tinham medo da garota. Ela era independente, mas sempre se segurava para não usar seus poderes sombrios. Todos a temiam e isso a deixava em paz com seus pensamentos turbulentos.

Alguns anos mais tarde, houve um baile no internato, onde foram convidados garotos órfãos de outras instituições, com objetivo de promover união entre os internos, pensando em futuros casais independentes.

O baile tinha tudo para correr bem, mas ninguém havia convidado a Mirtes para participar e quando ela desceu vestida de preto atraindo a atenção de todos, foi o maior fiasco para todas as garotas. Mesmo sendo do mal, a garota era deslumbrante, cabelos tom noite, pele alva como leite. Tinha postura delicada e, ao passar pelos garotos dos outros internatos, era observada.

As meninas a odiaram ainda mais naquele dia, e foi então que Mirtes matou novamente.

"Eu fiquei entediada com todos eles me olhando, simplesmente matei todos, a música de fundo, com os gritos de horror, foi o que me motivou a matar mais, alimentei meu demônio naquele dia, uma das cenas que mais gostei foi ver um dos garotos chorando, como garotinha, quando atravessei minha mão em seu estômago."

Esgotada de usar seu poder, Mirtes caiu no sono e seu corpo inerte foi levado para um sanatório, onde passou a maior parte de sua vida, sendo drogada e examinada, todos queriam entender a origem do seu poder e isso levou embora a pouca sanidade da jovem mulher.

Foram torturas, e mais torturas, cortes, injeções entre outros exames, mas nada foi comprovado e nem descoberto, os poderes da garota eram de origem desconhecida e isso levou os cientistas a trancá-la. Por mais que fosse poderosa, seu corpo era frágil e não conseguia usar seus poderes por conta das medicações.

Mirtes morreu sozinha algum tempo depois em uma cela fria. Seu corpo padeceu de fome durante dias, mas ninguém apareceu para verificar, só descobriram que estava morta, quando o cheiro podre já subia pelos andares superiores do laboratório.

A garota que perdeu toda sua juventude dentro de um sanatório, se tornou mulher. E descobriu na morte a força dos seus poderes, que eram quase ilimitados, as trevas a fizeram renascer em forma de espírito, e esse poder a tornou ainda mais violenta.

Por onde passava, levava destruição em massa, criando terremotos, erupções, desastres ambientais de escala global... seu corpo era apenas uma casca que segurava todo seu poder, ela era a verdadeira morte.

E foi assim durante muito tempo até que em uma de suas viagens pela cidade em que cresceu, notou uma grande casa, pobre e simples. Queria destruí-la para nunca se lembrar quem foi, mas ao observar mais de perto, notou que era um orfanato para crianças. Mirtes tinha todo o poder para destruir em um fechar de mãos, mas notou algo que lhe fez parar.

Naquele lugar havia alguém como ela, uma garota assustada e frágil, que tinha perdido os pais, ela chorava muito e não se misturava com as outras crianças. Se aproximando mais de perto, Mirtes ouviu as freiras falarem que aquele ano não teriam condições de manter mais ninguém ali, "Os deuses devem estar furiosos conosco por tirarem tantas vidas e o que será dessas pobres crianças sem pais?", uma das moças falou. Mas não era apenas naquele lugar, as destruições causadas por sua ira haviam deixado centenas de orfanatos sobrecarregados de crianças sem lugar para ir, e foi nesse momento que ela sentiu algo molhando seu rosto. Eram lágrimas.

Mirtes sentiu algo doer dentro de si, algo que ela nunca tinha sentido quando humana, um desejo estranho que estava encoberto pelo véu negro de sua alma, despertando um dos desejos mais humanos que existe, amor materno. Ela nunca foi amada, sempre viu o lado ruim das coisas, mas ao ver aquelas crianças ali, inocentes e sem culpa, se sentiu tocada pelo que fez a elas, percebeu que o mundo não era apenas trevas, ainda havia luz na humanidade, e foi então que Mirtes jurou guardar a vida de cada uma das garotas e garotos que viviam ali, era pouco por ter feito tanta destruição, mas era um grande começo para um espírito maligno.

A garota por quem Mirtes se afeiçoou, era chamada de Jasmim, uma menina bem-comportada e tímida. A mulher passou a ficar sempre ao lado dela, observando tudo que acontecia naquela pequena vida.

Em uma noite muito fria, ladrões invadiram o orfanato para roubar alimentos, mas Mirtes os matou sem dó. Ela jamais deixaria algo assim acontecer, e foram diversos acontecimentos desse tipo, começo de incêndio, que misteriosamente se apagou, ventanias terríveis que destruíram vários telhados na vizinhança, menos no orfanato, entre outros acontecimentos que fizeram com que aquele lugar se tornasse conhecido, um lugar guardado por um deus.

Anos se passaram e Jasmim cresceu, se casou com um dos garotos do orfanato, teve uma menina muito bonita, tinha um trabalho e amigos.

Mirtes se imaginou o que teria sido dela se tivesse tido uma família amorosa, amigos e paz. Pensava onde estaria, se teria tido filhos? e netos? Para ela já não era mais possível viver aquilo tudo, mas poderia dar a cada criança daquele orfanato um futuro decente. Mesmo depois de adultos, Mirtes ainda os observava, sempre guardando de tudo que podia, e foi assim durante anos e anos até um por um morrer de velhice.

Jasmim estava sentada em uma jardineira, sentindo a brisa em seu rosto, Mirtes tinha agora toda atenção para ela, já que os outros se foram, se sentou ali do lado da protegida e foi quando ouviu algo que não acreditou.

— Até quando irá ficar aqui sem dizer nada? — disse a velha Jasmim, olhando para Mirtes como se a visse perfeitamente. — Eu sei que está aí, desde quando fui para aquele orfanato eu soube que tinha alguém ao meu lado, durante anos achei que fosse minha mãe, mas depois de um tempo descobri que era outra pessoa.

Mirtes se abalou profundamente com aquela revelação, estava tão acostumada ao silêncio de sua alma, que nunca imaginou que alguém poderia sentir sua presença.

— Não precisa falar comigo, só quero te dizer algo. — A velha olhou para o horizonte e sussurrou. — Obrigada. Obrigada por ter cuidado de nós, todos esses anos.

Mirtes novamente sentiu algo molhado em seu rosto, sentiu alegria aquecendo seu peito, sentiu amor, e uma vontade imensa de abraçar Jasmim, mas sabia que não conseguia tal proeza e ficou ali observando a velha amiga falar.

— Minha hora está chegando, meus filhos já tomaram rumo e vi meus netos crescendo. — encarou o lugar onde Mirtes estava. — Meu trabalho está pronto e o seu também. Descanse espírito, você está livre.

Aquelas palavras soaram de uma forma tão pura que fez algo mudar ali, Mirtes sentiu seu corpo se transformando, suas vestes negras se tornaram alvas e puras, ela estava deslumbrante e para sua enorme surpresa a velha agora a podia realmente vê-la.

— Você é linda? Como se chama? — perguntou a velha.

— Mirtes. — O espírito respondeu, ouvindo o som da própria voz pela primeira vez em anos. — Mirtes. — tornou a dizer, dessa vez sorrindo e chorando ao mesmo tempo.

— Pois bem, antes de ir, deixe me escrever tudo o que você fez por mim e por todos, e depois disso me leve para um lugar calmo.

Foi uma longa tarde, as duas conversaram horas, trocaram sentimentos e vivências que ambas tiveram naquela vida longa e calma. Jasmim anotou tudo que podia, queria deixar uma história para seus netos lerem depois que ela partisse, Mirtes estava radiante, pela primeira vez não se sentia movida pelo ódio, esses anos vividos ajudando as crianças do orfanato lhe fizeram bem, exorcizou seu demônio interior, descobriu que seus poderes sombrios poderiam ser usados para algo bom e foi o que fez.

Quando o sol já havia se posto no horizonte, Mirtes estendeu a mão para a alma de Jasmim, que retribuiu, e ambas subiram ao céu, desaparecendo nas nuvens, atravessando o véu da existência e começando em um novo amanhã.

Fim

Conto com selo Concurso/Fantasia Sobrenatural

Notas do autor:

Olá, esse conto foi escrito para o sexto concurso do perfil FantasiaBR no Wattpad e obtive uma menção honrosa para ele, "Desafio das Anti-heroínas".

Espero que tenham gostado, ele também se encontra postado na minha antologia de contos de terror, não deixem de conferir.

Obrigado,

Att,

Lucas Aquino

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