OS MISTÉRIOS DE ELIZA GUNNING...

By autoralotorino

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❝ Confiem em mim, leitores. 1832 será um bom ano. - Srta. Silewood. ❞ Lady Eliza Gunning não é nem de longe u... More

SINOPSE COMPLETA
DISCLAIMER
EPÍGRAFE
PRÓLOGO
CAPÍTULO I
CAPÍTULO II
CAPÍTULO III
CAPÍTULO IV
CAPÍTULO V
CAPÍTULO VI
CAPÍTULO VII
CAPÍTULO VIII
CAPÍTULO IX
CAPÍTULO X
CAPÍTULO XI
CAPÍTULO XII
Capítulo sem título 18
CAPÍTULO XV
CAPÍTULO XVI
CAPÍTULO XVII
CAPÍTULO XVIII
CAPÍTULO XIX
C A P Í T U L O XX
C A P Í T U L O XXI
C A P Í T U L O XXII
C A P Í T U L O XXIII
C A P Í T U L O XXIV
C A P Í T U L O XXV
C A P Í T U L O XXVI
C A P Í T U L O XXVII
C A P Í T U L O XXVIII
C A P Í T U L O XXIX
C A P Í T U L O XXX
C A P Í T U L O XXXI
EPÍLOGO
Notas Finais + Amazon

CAPÍTULO XIII

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By autoralotorino

— Qual o problema com você? — James Alberdeen perguntou enquanto se preparava para a próxima rodada.

O homem jogou a peteca para lady Kriss Evans que conseguiu rebater após recuar dois passos. Ela quase se desequilibrou, mas conseguiu salvar o objeto antes que ele tocasse o chão. Lord Alberdeen, entretanto, nem ao menos deu tempo para que a moça se recuperasse. Assim que a bola chegou ao seu alcance ele a atirou novamente, dessa vez com mais força. O amontoado de penas foi ao chão.

— Qual sua intenção com isso, Alberdeen? — Kriss cruzou os braços e deixou os olhos puxados mais estreitos ainda — Marcar pontos? Não estamos contando.

— Irritar você. — James deu de ombros — E Morley, está me escutando? Eu pedi se há algum problema? Está tão calado.

Lord Morley revirou os olhos. Não havia nada de especial em sua conduta. Ele apenas estava sentado, em silêncio, assistindo os dois jogarem. Não resmungava, não parecia entediado nem irritado. Apenas estava calado. Um homem não poderia ser obrigado a falar.

— A Srta. Chesterfield também está calada e ninguém está implicando com isso.

Ruby ergueu o olhar começando a prestar atenção na conversa. Ninguém tinha ideia de onde sua mente estava antes. Provavelmente nem ela.

— Eu prefiro assim — Alberdeen deu de ombros, se preparando para o próximo lance. Kriss não se moveu — Vamos, querida. Sua vez.

— Quero jogar croquet não peteca. Milorde não sabe jogar apenas como um passatempo. Quer vencer de mim a todo custo.

— Você mesmo disse que não estamos contando... — James suspirou, atirando o cabelo loiro para trás — e não podemos jogar até que Cassandra ou lord Crosby decidam aparecer. Não poderemos fazer uma partida com três.

— Eu estou aqui... — Ruby murmurou.

Ela estava sentada em uma das cadeiras colocadas ao lado do marquês. Ruby usava um belo vestido em um tom claro de amarelo, com rendas e babados brancos e um laço destacando mais ainda a cintura fina. Seu cabelo extremamente loiro estava como sempre em um penteado perfeito no topo de sua cabeça. Toda sua beleza era valiosa demais para ser destruída.

— Sim, está em corpo, mas não em espírito. Não irá agarrar aquele taco com vontade.

A Srta. Chesterfield deu de ombros.

— Não pretendo destruir meu cabelo de qualquer forma. O parque está lotado demais para arriscar minha boa aparência.

— Também não quero jogar — Frederick disse.

Kriss Evans ficou boquiaberta em indignação. Lord Alberdeen teve que se controlar para não proferir palavras indelicadas para os dois. Frederick, porém, estava tão distante mentalmente deles que escutaria de bom grado o pior dos insultos.

— É claro que iremos jogar, Morley. — Alberdeen afirmou — Agora vamos, Kriss.

— Se a Srta. Chesterfield não precisa eu tamb...

— Ah, Ruby irá jogar sim... — Lady Kriss Evans disse — Eu dancei com o Sr. Barnett no último baile no lugar dela. Está me devendo uma.

James sorriu, vitorioso. Kriss aproveitou o momento de distração para atacar a peteca em lord Alberdeen. Ela bateu na testa do homem e foi direto ao chão.

Ruby Chesterfield resmungou.

— Se eu for obrigada a jogar vou atirar essa bola no Serpentine.

— Desde que você vá buscar depois.

A Srta. Chesterfield suspirou. Aparentemente seu belo penteado com presilhas brilhantes seria destruído em breve. Lord Morley também não estava muito entusiasmado para o jogo. Ele gostava de encontrar os amigos no Hyde Park para passar o tempo, porém nesse dia em especial não conseguia pensar em nada além de lady Eliza Gunning. Desde o encontro dos dois na última noite sua mente não parava de gritar seu nome e seu corpo para deixava de deseja-la.

Frederick Morley havia sido inundado por aqueles olhos oceânicos. E não confessaria isso para ninguém.

Lord Alberdeen parecia pronto para implicar mais uma vez com ele quando Cassandra Scales se aproximou. Como sempre ela estava radiante. Durante os últimos bailes ela havia intensificado a busca por um marido, procurando se casar irremediavelmente nessa temporada, e lord Morley mal havia tido tempo de vê-la. Entretanto, Cassandra ainda era Cassandra. Sua presença cintilava há metros de distância, seu sorriso estonteava qualquer um que cruzasse seu caminho e seus passos exalavam todo o poder que ela detinha. Cassandra Scales não estava sendo ninguém além de Cassandra Scales.

Porém ela estava acompanhada. Não demorou muito para que lord Morley reconhecesse suas companhias: Harriet e Holly Scales, as irmãs mais novas de Cassandra. Elas eram frequentemente vistas nos bailes também, mas nunca com tanto destaque quanto a irmã mais velha. Harriet era sem duvida adorável com seus cabelos claros, olhos atentos e modos gentis, mas não especialmente bonita ou cativante. Holly era jovem, devia ter seus dezessete anos e ainda exalava um ar infantil e brincalhão. Ambas eram agradáveis, mas a popularidade da mais velha sempre as ofuscou — não que elas se importassem com isso. Enquanto o maior atrativo das Scales mais novas era o dinheiro do pai, o de Cassandra era ela própria.

— Você não prefere que Mary fique com você, Cassie? Nós já estamos na companhia uma da outra... — Harriet tocou nas mãos de Cassandra, referindo-se à acompanhante que vinha logo atrás delas.

— Está tudo bem. Vocês vão precisar de ajuda para levar as compras — A voz da Srta. Scales era suave e compassiva. As irmãs assentiram — voltarei depois com Ruby. Diga para papai não se preocupar e que cheguei ao Hyde Park em segurança.

Harriet concordou com um sorriso. Ela trouxe as mãos da irmã mais velha até a boca e beijou-as com ternura. Cassandra sorriu.

— Amo você, maninha. — Harriet respondeu — Holly, pare de olhar para lady Flemming do outro lado das árvores e diga tchau para Cassie.

— Eu nunca vi um chapéu tão feio, mas tudo bem... — Holly deu de ombros — Até mais. Tente não quebrar o dente de alguém na partida de hoje.

Ruby grunhiu.

— Até o jantar. Boas compras! — Cassandra despediu-se, acenando.

Em seguida voltou-se para os amigos. Imediatamente a pose de rainha londrina retornou para seu corpo. O sorriso tenro deu lugar a uma expressão presunçosa e repleta de malicia. A Srta. Scales jogou uma mecha que caia em seu olho para trás, caminhou na direção dos companheiros e arqueou uma sobrancelha, tentando ler a situação antes mesmo que algum deles se pronunciasse.

Lady Kriss deu graças. Finalmente se livraria do jogo de peteca com Alberdeen.

— Onde estava, Cassandra? — Ela suspirou — Eu não aguentava mais ser atacada por um monte de penas. James definitivamente não é um bom jogador.

Cassandra deu de ombros, desviando o olhar.

— Comprando coisas para o enxoval de Harriet.

Ah... — os olhos de Kriss pesaram por um instante.

Antes que a morena pudesse dizer alguma coisa Ruby se levantou. A presença da amiga foi a única coisa capaz de fazê-la sair de sua confortável cadeira na sombra. Ela tocou os braços de Cassandra com carinho notável, mas a amiga não parecia muito interessada em consolo. A Srta. Scales forçou um sorriso, abaixou-se ao pé de uma árvore recolhendo os tacos e esforçando-se o máximo possível para parecer entusiasmada. Ainda assim ela ainda pensava na irmã.

Harriet se casaria com Ashton Howell dentro de alguns dias. O homem em questão era o único filho de um mercador do oeste e viveu parte de sua vida do outro lado Atlântico, em New York. Era sem dúvida um homem cativante, mas também imaturo. Havia chegado em Londres há pouco tempo, e apesar de conquistar um bom lugar na sociedade, não parecia lidar bem com a nova posição. O maior objetivo dele era apenas subir socialmente. Enquanto seu orçamento estava em ruínas pelos gatos excessivos do pai as preocupações de Ashton não eram em reconstruir o patrimônio, mas sim em construir seu legado em Londres ao lado dos whigs — membros do partido liberal. Ainda assim, apesar de todos eventuais defeitos de Ashton, ninguém na família se opôs ao casamento. A felicidade das filhas sempre em primeiro lugar.

E Cassandra queria um marido. Um marido poderoso. Ela precisava sua família tinha dinheiro, mas nenhum titulo relevante. E se alguém daquela família poderia elevar o nome dos Scales essa pessoa seria Cassandra. Harriet, entretanto, poderia se dar ao luxo de se casar por amor.

— Oras, — Cassie resmungou — Crosby não teve a decência de comparecer?

Ela entregou os tacos para os participantes. Kriss e James começaram a se alongar. Ruby e Frederick pareciam disputar quem era o menos animado.

— Crosby deve estar atrás da bruxinha. — Kriss girou o taco — Vamos espera-lo?

— Deveríamos esperar Aaron, — Ruby disse. E apesar de realmente não querer jogar, sua objeção era sincera — Nós nunca deixamos ninguém para trás.

—É preocupante que ele ainda não apareceu...

— Cassandra também se atrasou. — A Srta. Chesterfield reforçou, apoiando o taco no chão e soltando o peso do corpo nele — Nem por isso a deixamos para trás.

A Srta. Scales arqueou uma sobrancelha com desdém.

— Vocês nunca me deixariam para trás. Até porque não seriam nada sem mim.

— Não a deixamos para trás porque você também faz parte de nosso grupo, Cassandra. Foi essa razão. — Ruby insistiu.

Ela deu de ombros. A Srta. Scales decidiu que o melhor a fazer naquele instante seria checar se os arcos estavam corretamente posicionados no chão. Ela não gostou do ângulo de alguns. Se a bola fosse até o Serpentine...

Kriss suspirou.

— Ótimo. Esperaremos a tarde inteira aqui.

— Não será necessário — lord Alberdeen comentou, estendendo o taco em direção ao lago. Um grupo se aproximava deles — Aparentemente Crosby está vindo e trouxe companhias.

Eles estreitaram os olhos. A figura era reconhecível facilmente. Seu jeito de andar despojado, jovial, mas ainda assim aristocrático era reconhecível há metros de distância. O homem ao seu lado, entretanto, não tinha características tão evidentes assim. Tinha cabelo castanho, devia ser alguns poucos centímetros maior do que Aaron e possuía um corpo atlético, ainda que mais reforçado. Demorou até que alguém conseguisse decifrar a segunda figura.

— Reynard Paine... — Kriss estreitou os olhos, incrédula.

A terceira pessoa também era evidente, ao menos para Frederick. Ele não precisou de muito esforço para notar que se tratava de lady Eliza Gunning. O fantasma que o assombrava decidira mais uma vez fazer uma visita. Lord Morley ficou indignado. Desde quando Eliza era amiga de Crosby? Desde quando ela acompanhava Reynard sem Ronnie? Era aceitável o fato de que ela estava com uma acompanhante, mas ainda assim... Não, Frederick não gostou de sua presença.

— E lady Eliza Gunning. — Alberdeen sorriu.

Cassandra girou o taco com um sorriso maléfico.

— Isso será divertido.

Kriss estremeceu.

— Agora eu até aceitaria voltar com a peteca...

— Acho que quem vai parar no Serpentine é Crosby ou Paine, — Ruby comentou — espero que Paine. Nós gostamos de Aaron demais para isso. Eliza também seria engraçado.

Frederick rosnou. Cassandra estreitou os olhos.

— Lord Crosby não estava tentando roubar a noiva de Reynard Paine há apenas alguns dias? — a Srta. Scales resmungou.

— Oh, meu Deus... — Ruby riu — Eliza está trazendo um cão. Será que teremos a honra de ver aquela cena de novo?

Frederick respirou fundo. Os amigos iniciaram uma sequencia de piadas que dessa vez não estavam trazendo uma satisfação para ele. O trio — e a acompanhante da lady — se aproximavam. Eliza e Reynard estavam mais ao fundo, receosos e apenas seguindo os passos de Aaron. Lord Crosby aproximou desfilando, passou a mão pelo lustroso cabelo dourado e sorriu com a majestade de um rei. Seu colete em amarelo chamuscado cintilou ao refletir o sol.

Reynard e Eliza se entreolharam, apavorados.

— E a estrela desse jogo chegou! — Aaron anunciou, se aproximando.

Kriss bateu palminhas. Ruby faria o mesmo se não estivesse com preguiça de soltar o taco e buscar novamente. Ela decidiu que sorrir era uma atitude mais aceitável.

— Pronto para animar Londres com essa partida, Crosby? — Alberdeen atirou o taco na direção dele — Vamos lá, companheiro.

Aaron concordou, agarrando mais ainda o taco e buscando o melhor amigo com o olhar. Frederick estava apoiado na sombra de uma árvore, com o taco balançando no ar e parte do cabelo sobre a testa. Os outros começaram a organizar melhor o trajeto para tentar desviar do Serpentine e nisso lord Crosby se aproximou do outro.

— Tudo bem, Morley? — sorriu.

— Eu não tenho a mínima ideia do porquê de lady Eliza e o Sr. Paine estarem aqui e não vejo sentido algum nisso. — Frederick disse — Isso aqui virou um espaço para qualquer um?

Crosby estreitou os olhos.

— Eles não são qualquer um. Qual o problema com você?

Frederick revirou os olhos. Novamente a maldita pergunta.

— Estou tentando ser sensato.

— O Sr. Paine e eu viramos bons amigos, Frederick — explicou — e lady Eliza nós encontramos de uma maneira engraçada. Ela estava correndo atrás do cãozinho com a dama de companhia. Nós decidimos ajudar... Depois de rir um pouco. Bem pouco, garanto.

Lord Morley levantou uma sobrancelha.

— E convidou os dois para o jogo?

— Fiz errado? — Aaron deu de ombros — Seria indelicado dispensá-los. Além de que ninguém pareceu se importar.

— Lady Eliza! — Cassandra vociferou — Esse animal está sujando meu vestido!

O cão havia pulado aos pés da Srta. Scales e estava latindo. Cassandra puxou a barra do vestido, mas ele mordeu o tecido. Ruby Chesterfield tentou ajudar, mas acabou piorando ainda a situação. Ele rosnou.

— Oh, Deus... — Eliza inclinou-se — Hunter, venha comigo. Desculpe. Eu realmente não compreendo. Ele sempre é tão calmo...

— E Paine e você são amigos? — Frederick olhou para Aaron, reforçando mais uma vez.

— Se isso fará Ronnie feliz... Além de que ele é interessante, Morley. Fiquei surpreso. Ontem nós estávamos no Autin's e...

— Irão jogar também? — Ruby indagou, aproximando-se das duas vitimas que se mantinham longe do grupo ainda — Eu cuido do seu adorável cãozinho, Eliza. Tome meu taco.

Lady Eliza apertou o terrier mais ainda contra o próprio corpo. Hunter parecia bem mais confortável ao colo da dona do que aos pés da Srta. Scales.

— Bem, eu não sei... — Ela balbuciou — Encontrarei a Srta. Hawkins em breve. Não tenho tempo...

— Será rápido. — Ruby entregou o taco. A única escolha de Eliza foi segurar. — E é croquet. Ou se preferir a maneira afrancesada, Paille-Maille. Imagino que você conheça as regras.

— Também chamam de Pall Mall em alguns lugares — Crosby quis acrescentar.

Liz pigarreou.

— Conheço. Não parece muito rápido e...

Os olhos de Eliza cruzaram-se com de Frederick. Ele parecia uma sombra negra ali. Enquanto todos usavam cores alegres como amarelo, azul e rosa, ele estava como sempre imerso em trajes negros. Seu corpo estava fechado, os olhos indecifráveis e a boca não demonstrava o mínimo sorriso. Liz suspirou. Não era como ontem quando eles haviam se beijado há apenas alguns metros na Grosvenor Square.

Em seu momento de distração Ruby Chesterfield pegou o terrier e voltou para o banco onde preservaria muito bem o penteado. Eliza suspirou. Esforçou-se para desviar dos olhos duros de Frederick e deu de cara com uma cínica Srta. Scales. Ela esperou a provocação da mulher, mas Cassandra resignou-se a sorrir ironicamente. Um desconforto percorreu o corpo de Eliza.

— Quem começa? — Kriss indagou.

— Eu. — Alberdeen sorriu.

Eliza e Reynard analisaram simultaneamente os tacos. O Sr. Paine inclinou-se discretamente para cochichar.

— Ronnie era a única capaz de nos salvar.

— O destino foi cruel conosco, Paine. Basta aceitar.

Eles começaram a se organizar. Lord Alberdeen quis posicionar os arcos, mas Cassandra o seguiu, tentando manter tudo sobre o seu controle como sempre. Lady Kriss pegou o kit para distribuir o material. Os jogadores frequentes já tinham cores pré-determinadas. O de Kriss era vermelho, o de Cassandra rosa e o de Ruby amarelo. Eliza ficou com o da Srta. Chesterfield. O taco azul era de Crosby, o verde de Alberdeen, para o Sr. Paine sobrou o marrom e para Frederick... Óbvio que era o preto.

Eles decidiram iniciar do mais velho para o mais novo, seguindo segundo eles uma hierarquia justa. Lady Eliza pigarreou antes que James pudesse fazer o primeiro movimento.

— Nós, hum, não deveríamos ter nos divido em dois times? Acho que seria mais fácil e...

— Lady Eliza, com todo respeito, mas gostamos de manter nossas conquistas para nós mesmos. Esse é um jogo onde pode haver apenas um vencedor — ele estudou o melhor ângulo para a tacada — durante essa partida nossas amizades não importam mais.

Lord Alberdeen bateu na bola. Ela rolou perfeitamente sobre o gramado verde do Hyde Park e passou pelo primeiro arco. Lady Eliza ficou boquiaberta. Ela nunca conseguiria fazer aquilo com tanta precisão ou força. Entretanto, nenhum dos outros jogadores — exceto Reynard — parecia especialmente surpreso com a jogada de lord Alberdeen.

— E quem frequentemente ganha? — o Sr. Paine perguntou esforçando-se para parecer indiferente.

— Alberdeen ou Cassandra. — Ruby respondeu da cadeira, finalmente conseguindo acariciar Hunter sem que sua mão fosse arrancada — Apesar de que lord Morley vem nos mostrando excepcional desempenho nas últimas partidas.

— Ei, eu também ganho — Crosby retrucou com a voz afetada. Em um tom baixo, acrescentou: — ás vezes.

Ele também fez sua jogada. Nem de longe ela foi tão boa quanto à de lord Alberdeen, mas ao menos se aproximou do primeiro arco e se ninguém a tirasse do caminho em uma próxima tacada ela o cruzaria. Em seguida lord Morley se aproximou com seu taco negro, dobrou um pouco os joelhos para aumentar a precisão e a bola fez praticamente o mesmo percurso que a de Alberdeen, batendo na do oponente e tirando-a do caminho.

James Alberdeen balbuciou. Pelo seu tom as palavras não foram muito gentis. Sutilmente, Eliza cutucou Reynard Paine pelas costas, indicando que ele seria o próximo a jogar. O Sr. Paine estremeceu.

— Não tenho ideia de como farei isso.

— Oras, nunca jogou na universidade? — Cassandra indagou levantando uma sobrancelha — Ou o senhor nunca teve amigos suficientes para montar um time?

Todos seus amigos riram. Inclusive lord Morley. O rosto de lady Eliza corou com a nova onda de irritação. Ela não podia acreditar que Frederick estava sendo tão cruel. Atitudes assim vindas de Cassandra eram corriqueiras, não havia surpresa alguma ali, porém ela esperava que com Frederick fosse diferente. Não havia motivo sensato para isso. Lord Morley sempre foi hostil. Ninguém, em toda sua história em Londres, havia o elogiado por sua simpatia ou gentileza. Elogiavam Frederick por seu porte cortês, por sua beleza e por seus títulos, mas nunca por atributos de seu caráter. O problema era com Eliza. Ela estava fantasiando coisas irreais a respeito de Frederick.

Compreensível. Ontem ela estava delirando quando o beijou ludicamente abaixo das estrelas. Havia sido completamente influenciada pelo momento e pelo desejo de saber o que era beijar alguém. Ninguém em especial, apenas alguém. O azarado simplesmente havia sido o marquês de Normanbury. E quanto a Frederick... Ele era homem. Eliza não era uma especialista no sexo oposto, mas sabia o suficiente para afirmar que seus comportamentos poderiam ser animalescos. Ele não estava especialmente inclinado para ela, ele estava inclinado à libertinagem. Se fosse uma árvore de saias ele provavelmente teria feito o mesmo.

Ela que havia sido tola de agir por seus impulsos em um momento de fraqueza. A conversa, a brisa, o momento havia os levado àquele maldito ponto. Ela não iria repetir aquilo. Não com Frederick, ao menos. A insolência do marquês estava irritando-a. Ele mal olhava para ela, ignorava completamente sua presença e no momento analisava o Sr. Paine com evidente desprezo.

Assim como todos. Desprezíveis. Eliza sentia saudades da Srta. Silewood por várias razões, mas uma delas era definitivamente a oportunidade de criticar pessoas como eles. Vazios, fúteis, que se importavam apenas com aparências ou um maldito jogo de Pall Mall ou croquet — ela não se importava com o nome. A única pessoa razoavelmente aceitável ali era lord Crosby, mas ainda assim ele seguia os risos indiscretos do grupo, divertindo-se com cada palavra.

Reynard soava frio.

— Apenas jogue — Alberdeen resmungou — pretendemos terminar isso antes do anoitecer.

O Sr. Paine atacou. Sua bola foi ainda mais longe do que a de lord Morley e parou próxima ao segundo arco. O ângulo não era dos melhores, mas certamente aquela era uma vantagem. Reynard sorriu, satisfeito. Cassandra ficou boquiaberta, porém esforçou-se para disfarçar a surpresa e seguir com a partida novamente. Ela empinou o nariz e aproximou-se da linha de inicio com seu taco cor-de-rosa.

Ela olhou para a Srta. Chesterfield. Ruby teve que fingir entusiasmo, aplaudindo a amiga. Cassandra sorriu.

— Vamos ver...

Sua tacada também não foi a esperada. A bola ultrapassou o primeiro arco, mas ficou ainda trás de lord Alberdeen. Ela começou a resmungar desculpas para seu fraco desempenho, mas ninguém se importou. Lady Eliza já se colocou a postos.

Ela olhou para a disposição das bolas e decidiu repassar a jogada de cada um mentalmente mais uma vez. Ela tentaria copiar a tacada do Sr. Paine, que sem ser presunçosa, teve um ótimo desempenho. Sem muita preparação ela atacou. Sua bola parou ao lado da de Cassandra.

Liz não conseguiu ver, mas sentiu a Srta. Scales quase ficando cega ao revirar os olhos.

Lady Kriss Evans aproximou-se, entusiasmada. Ela dirigiu-se aos companheiros.

— Certo... Todos em silêncio, por favor.

Ela abaixou-se o máximo possível que a decência permitia. Estudou todos os ângulos possíveis, ensaiou cinco jogados e mediu a força necessária no ar. Colocou o pé esquerdo na frente, o direito um pouco para trás, inclinou as costas e afastou o taco conforme seu cálculo mental indicou.

Um, dois, três e...

— OLHEM! — Crosby gritou, apontando para o céu — Uma pipa.

Farabutto! — Kriss rosnou.

Sua bola havia ido para qualquer lugar, menos na direção do arco. Até Aaron se saiu melhor o que ela — e a culpa era dele por seu grito.

— Você não pode praguejar em italiano. — Lord Morley disse, visivelmente achando graça da situação.

Eliza revirou os olhos. A presença de Frederick estava irritando-a novamente. A Srta. Chesterfield moveu-se na cadeira, desconfortável, e olhou com seriedade para lord Morley.

— Isso é uma nova regra?

— Sim, é. — Cassandra interrompeu-os rispidamente — Está proibido praguejar em italiano. Alberdeen, sua vez. Vamos logo.

Kriss voltou para sua sombra resmungando. A regra era especificamente sobre italiano.

Tā mā de...

Lord Alberdeen caminhou até onde sua bola havia sido atirada por lord Morley. No caminho ele enviou alguns olhares ameaçadores para o amigo, mas Frederick deu de ombros como se aquilo fosse normal. Eliza começou a vasculhar o parque procurando uma boa rota de fuga. Ela não aguentava mais ficar naquele lugar com eles. A presença deles era tão detestável que ela estava sentindo se afogar.

James colocou a bola de novo na área de jogo, mas não passou pelo segundo arco. Ele deveria rezar para que ninguém batesse nela de novo. O próximo era Crosby, sendo assim, o perigo não estava tão eminente assim.

— Coloque mais força no taco... — Reynard opinou como se fosse um profissional depois de uma jogada certeira.

— Certo — Aaron concordou, consideravelmente nervoso — eu só vou...

Sim, dessa vez ele colocou mais força no taco. A bola simplesmente voou dali e, por alguma razão, na direção oposta da desejada. Por sorte não parou no Serpentine, mas acertou o chapéu de Charlotte Watson, a melhor amiga de Stephanie Churchill.

— Oh meu Deus! — Crosby apavorou-se — Vou me desculpar.

— É o recomendado — o Sr. Paine fez uma careta.

Aaron correu até Charlotte. Ela estava visivelmente nervosa, mas se bem conheciam lord Crosby seu charme seria suficiente para acalmar os nervos da moça. Seria simples. Ele beijaria sua mão, pediria desculpas e exaltaria sua beleza naquela tarde. Em breve as coisas voltariam ao normal como sempre.

Os erros de pessoas como eles sempre eram perdoados. Os de pessoas como Eliza, entretanto, eram emoldurados para sempre.

— Foi um sinal divino para que ela tirasse aquele chapéu horrível — Ruby Chesterfield disse.

Cassandra concordou, ainda observando a cena. Ela girou o taco rosa no ar.

— Se ela tivesse que tirar tudo de horrível nela certamente suas vestimentas seriam inadequadas para sair em público.

Lady Eliza cerrou o punho.

— Oras, olhem. Stephanie Churchill apareceu. — Ruby continuou — Stephanie deve ter dó de Charlotte. Ela é até agradável, mas a amiga...

— Humpf, vocês não deveriam ter avisado que Churchill está aqui — Alberdeen disse — agora como lord Morley irá se concentrar no jogo?

Eliza se contraiu. Seus olhos correram até Frederick e ele estava preso na visão de lady Stephanie. Ela conversava com a amiga e lord Crosby gentilmente, gesticulando com graça e inclinando a cabeça ao lado para rir. Como sempre sua aparência estava perfeita. O cabelo cor de chocolate preso com presilhas brilhantes e delicadas, o vestido vespertino em um tom estonteante de verde e seu sorriso conquistador e singelo, como sempre se destacando junto ao seu belo tom de olhos âmbar.

Frederick estava enfeitiçado.

— Você vai atrás dela, Morley? — Alberdeen indagou.

Por alguma razão seus olhos fixaram-se em Eliza logo depois. Ela se perguntou se Morley havia dito algo da noite passada, mas dissipou a ideia rapidamente. Primeiro, ele não parecia ser o tipo fofoqueiro, ao menos não a respeito da vida pessoal. Segundo, ele teria vergonha. Os motivos eram óbvios e o momento ilustrava muito bem. Lady Eliza mal sabia segurar o taco, estava encolhida ao lado do Sr. Paine, usando um vestido longo demais para ela e com babados demais, enquanto Cassandra, Ruby e Kriss deslumbravam o parque. Elas sabiam perfeitamente como escolher um decote decente, mas ainda sedutor. Sabiam o tanto exato de rouge para passar nas bochechas e nos lábios, sabiam as cores que combinavam melhor com o tom de pele e com o cabelo. Sabiam, acima de tudo, serem incríveis.

Eliza sabia enviar expressões rudes. Quando os olhos de James Alberdeen fixaram-se nela, provavelmente na intenção de arrancar algo comprometedor dela, — Deus sabe por que — Eliza deu de ombros. Ela começou a olhar para o próprio taco, de repente muito mais interessada nas linhas amarelas do que na tórrida atração que Frederick tinha por Churchill.

— Alberdeen, a única coisa que vou atrás agora é de minha bola. — Frederick respondeu, avançando pelo gramado.

Lady Eliza continuou desviando o olhar. Quando ele passou bem a sua frente ela teve consciência de que lord Morley olhou para ela, mas não se moveu. Estava tímida, é verdade, mas tentava parecer apenas desinteressada. Como se o taco fosse mais interessante do que ele ou sua tacada.

Mais uma vez seu movimento foi preciso. Morley estava em vantagem. Mais um pouco ele atravessaria o segundo arco. Porém, sua felicidade durou pouco, logo o Sr. Paine o desbancou. Reynard sorriu.

— Sou melhor do que imaginava.

— Ás vezes Deus tem piedade. — Cassandra disse.

Ela se saiu melhor dessa vez. A bola aproximou-se da dos adversários e estava em um ângulo melhor para atravessar o arco. A Srta. Scales voltou para o lado de Kriss com um sorriso de satisfação.

— Eliza está com a cabeça na lua? Não vai jogar?

— Vou sim, Cassandra. — Respondeu rispidamente — Estava pensando em outras coisas.

— No jantar dos Browdish amanhã à noite? — Cassandra indagou — Apesar de que imagino que você não tenha sido convidada...

— Obviamente não. — Ruby riu.

— Espero que tenha bolo com pedaços de morango — Kriss comentou.

Eliza se encolheu. O jantar em questão não era do duque, mas sim em comemoração o aniversário de seu filho mais velho. Ainda assim...

— Sou filha de um conde. — Eliza disse como se isso bastasse.

— E infelizmente isso não garante convite para nada, querida. — Cassandra sorriu, girando mais uma vez seu taco.

Eliza quis que o maldito taco cor-de-rosa criasse poderes mágicos para voar em direção aos dentes de Cassandra. Ela merecia!

E Frederick olhou Eliza. Pela primeira vez cravou os olhos nos dela intencionalmente naquela tarde. Ele parou por um instante, estudando as palavras e montando uma longa frase, mas ao final desistiu e apenas deu uma explicação rápida.

— É um jantar íntimo. Duvido que tenha mais do que vinte pessoas.

Lady Eliza deu de ombros. Não precisava de explicações. Ela nem era amiga dos Browdish mesmo. Ao menos poderia ficar em casa fazendo qualquer coisa. Liz revirou os olhos e enquanto seu globo ocular se movia ela teve um deslumbre de sua salvação.

Bridget Hawkins!

— É sua vez, lady Eliza. — Ruby avisou.

— Tenho que ir — Liz disse.

Reynard piscou por alguns segundos. Ele iria ficar sozinho com eles?

— Agora? — Paine perguntou. Bem baixinho, acrescentou: — E eu vou ficar?

— Sim. Acabei de ver a Srta. Hawkins...Saindo da balsa no lago... Olhe, Crosby já estava voltando. Seu novo amigo.

Era estranho se referir ao homem que tentou tirar Ronnie dele como amigo, mas Eliza não conseguia classifica-los de outra forma. Eles não pareciam se odiar, mantinham uma boa convivência e não pareciam estar juntos só porque Veronica havia pedido. As desavenças estavam aos poucos sendo deixadas de lado.

Ainda assim... Era Crosby contra todo o clã. Não valia tanto a pena.

— Fique. — Reynard implorou.

— Deixe-a fugir, — Ruby disse — está com medo de fazer uma jogada péssima.

— Pelo menos estou jogando. — Eliza retrucou com uma velocidade surpreendente.

A Srta. Scales estreitou os olhos e soltou um riso irônico.

— Ora, ora. A quietinha Gunning tem língua. E bem afiada até... — Cassandra deu de ombros, empinando o nariz. Kriss e Ruby riram. — Vá. Deixe o taco junto com o resto do kit.

Lady Eliza até iniciou a caminhada para deixar o material junto ao kit, mas desistiu no meio do caminho. Ela caminhou em direção a sua bola e disse, decidida:

— Se já estou aqui qual mal faz uma última jogada?

— Tente não acertar o chapéu de ninguém.

— Que pena que você não está usando um, Cassandra.

— Como disse?

Eliza não teve coragem de responder. Não com palavras. Ela jogou, mas não querendo atravessar o arco. Ela tinha um objetivo melhor.

— O quê?! — Cassandra rosnou.

— O quê?! — Lord Morley bradou.

— Minha tacada. — Eliza fingiu estar aborrecida — Não sou muito boa...

— Você tirou totalmente minha bola de rota! — Cassandra vociferou.

— O problema é esse, Cassandra? — Frederick fuzilou Eliza com o olhar — A minha está na lama. Literalmente em uma poça nojenta.

Todos ficaram em silêncio. O taco preto foi ao chão.

— Não vou mais jogar.

— Parabéns, filha do conde... — Alberdeen disse.

Eliza se encolheu. Todos os olhares estavam nela. Inclusive o de Reynard, mas esse ao menos tinha compaixão.

— O que houve? — Lord Crosby perguntou assim que retornou.

— Lady Eliza fez lord Morley desistir do jogo — Kriss explicou.

Liz suspirou. Ela foi até a Srta. Chesterfield e pegou Hunter no colo. Ela precisava ir embora agora. Cassandra, entretanto, não perdeu a oportunidade de piorar a situação.

— Esperavam o que a aceitando no jogo? É Eliza. Sempre desastrada. Pisou no pé do duque, derrubou vinho na Srta. Colins, correu de um bando de cães por Mayfair...

— Cassandra, nós já entendemos. — Frederick a interrompeu — Basta.

— Bem, se o senhor faz tanta questão de defendê-la a acompanhe até a Srta. Hawkins. — Cassandra disse — E depois você pode correr até o que realmente te importa. Stephanie.

Certo, Eliza quis chorar. Ela não iria, é óbvio, mas quis verdadeiramente. E lord Morley percebeu, pois ele não fez questão de tentar discutir com a Srta. Scales. Ele estendeu o braço para lady Eliza. Ela colocou Hunter no cão, segurando a coleira, e eles iniciaram a caminhada quase imediatamente. Eles caminharam em direção ao quiosque itinerante onde a Bridget comprava um sorvete.

Stephanie e Charlotte também. Elas estavam nas mesas ao redor, rindo e conversando. Lady Stephanie viu Frederick de longe. Ela acenou gentilmente e sorriu.

Eliza decidiu que não gostava dela.

— Obrigada pela companhia. — Eliza disse na metade do caminho — Pode voltar.

— Porque eu faria isso?

— Eu sei ir sozinha.

— Sim. Você saberia ir sozinha desde a área da partida, entretanto eu estou te acompanhando, não guiando — Morley respondeu.

Eliza tentou se soltar. Ele não deixou.

— Há algo de errado?

— Não. Eu só quero um pouco de sorvete.

— Certo, vamos.

Eu. — Lady Eliza reforçou — Eu quero.

— Eu estou a acompanhando e então...

— Não quero que você me compre um sorvete, lord Morley — insistiu — além de que não será bom para você fazer isso na frente de Stephanie. Ela pode achar que você pode ter inclinações a mim.

— É claro que não.

Eliza engoliu seco. Doeu, mas já estava se acostumando com os insultos.

— Ah sim, — murmurou — por alguns instantes eu esqueci quem sou.

— E quem você é?

— Eliza Gunning. A que pisou no pé do duque, derrubou vinho na Srta. Collins, que correu de cã...

— Faça-me o favor.

— É mais do que óbvio que você nunca teria inclinações a mim.

— Quem está dizendo é você, não eu — Frederick deu de ombros.

— E você não está negando!

— Preferia que eu negasse, Eliza? — ele a olhou, incrédulo — pensei que havíamos chegado a um acordo há tempos de que não temos que fingir afeição um pelo outro.

— Não, não temos que fingir nada. — Ela se soltou de seus braços — Inclusive você não tem que fingir que é um homem cortês e decente. Eu sei que não é. Irei sozinha e pronto.

— E o sorvete?

— Tomaremos no dia em que eu não aguentar mais de calor e implorar por algo gelado — ela sorriu — o que infelizmente não está acontecendo em maio.

— Junho está chegan...

— Você tem um tórrido prazer em me aborrecer, não tem?

— O que a faz pensar nisso?

— Suas palavras e seus modos grotescos.

— Você me ofende com constância e sou eu que tenho prazer em te aborrecer? — Frederick cruzou os braços — Isso é patético.

Ela ficou na ponta dos pés.

— Isso é patético ou eu sou patética?

— Os dois!

Ela indignou-se.

— Mais uma vez preferia que eu negasse? — lord Morley indagou.

— A única coisa que eu preferiria que você negasse é a minha companhia. Na próxima vez se recuse a me acompanhar, mesmo causando escândalo, pois seria de extremo bem. Dica a verdade. Diga que sou feia, que sou chata, que sou inoportuna e patética! — Ela vociferou — Ninguém vai duvidar de suas ações. Isso já foi longe demais. Pare de fingir condescendia comigo em público pelos bons modos. Eu não me importo em ser humilhada e rejeitada por você na frente de todos. Estou acostumada! Geralmente isso me deixa triste, mas nesse caso eu adoraria.

Ela estreitou os olhos.

— Eu adoraria ser rejeitada por você. Adoraria nunca mais ter que vê-lo.

Morley sorriu. Seu sorriso fez com que Eliza vacilasse. Ele...Oh, Senhor. Ele era lindo. Era lindo nas sombras, com suas roupas pretas e expressão enigmática, mas era ainda mais lindo sorrindo dessa forma. Liz sentiu o impulso de seu desculpar, atirar-se nos braços dele e o beijar. Porém, o que Frederick fez em seguida a desmoronou.

— Que maravilha! — O homem exclamou, radiante.

— O quê? — lady Eliza perguntou.

— Seria uma completa maravilha nunca mais vê-la. Imagine. Um mundo em que estou livre para encontrar uma esposa sem que uma solteira intrometida fique me atrapalhando.

— Um mundo em que você pode beijar os pés de Stephanie Churchill sem que eu esteja ao seu ado no Hyde Park?

— Um mundo em que eu possa beijar o corpo todo de Stephanie Churchill e você esteja em qualquer lugar desde que seja longe de mim.

Ela ficou boquiaberta. Aquilo foi demais. Até para ele.

— Você é horrível, Morley. — Eliza cuspiu as palavras — E eu me arrependo tremendamente de ter saído de casa no dia em que o conheci.

Ele concordou.

— Seu desprezo é recíproco.

— Eu te od... — Ela se interrompeu. Não, não falaria isso para ele. Não falaria que odiaria ninguém. Ainda assim: — Quer saber, Morley? Adeus. Espero que vá para o inferno.

— Que delicada.

— Não me importo. Patife!

— Jezabel.

— Belzebu!

— Vá, Eliza. — Ele abanou no ar — Se quer tanto ir porque não vai?

Porque eu te quero, o inconsciente gritou. Liz, por outro lado, afastou o pensamento com um balançar de cabeça.

— Estou dissipando meu ódio antes que Bridget sofra pela irritação que você criou em mim — Eliza respondeu com a voz mais calma do que tinha imaginado — recomendo que faça o mesmo. Para depois beijar o corpo todo de Stephanie.

Frederick ficou sem palavras.

— Adeus, Morley. Adeus.

E ela saiu.

Frederick ficou parado por mais alguns instantes processando toda a informação. Aquilo sim havia sido uma briga. Todas as discussões anteriores pareciam insignificantes perto daquilo. Seu corpo estava em nervos, não apenas pelas palavras dela, mas sim por ela. E por ele também. Lord Morley poderia ter contornado a situação tantas vezes, mas deixou Eliza acreditar que era feia, inoportuna, indesejável e que ele pretendia beijar o corpo inteiro de Stephanie Churchill.

Por Deus, ela não tinha ideia do que aquela frase significava, mas certamente sabia que não era alguma coisa adequada! Mal sabia ela que de noite, em seus sonhos profundos e nos seus sonhos despertos, era com Eliza que ele sonhava toda noite. Era com seu corpo despido, seus cabelos negros e seus olhos azuis.

Stephanie poderia ser adequada, gentil e agradável. Poderia ser uma boa amiga. Mas nunca — nunca em toda sua existência — conseguiria chegar aos pés de lady Eliza Gunning.

Em nada.

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