OS MISTÉRIOS DE ELIZA GUNNING...

Autorstwa autoralotorino

281K 29.4K 13.8K

❝ Confiem em mim, leitores. 1832 será um bom ano. - Srta. Silewood. ❞ Lady Eliza Gunning não é nem de longe u... Więcej

SINOPSE COMPLETA
DISCLAIMER
EPÍGRAFE
PRÓLOGO
CAPÍTULO I
CAPÍTULO II
CAPÍTULO III
CAPÍTULO IV
CAPÍTULO V
CAPÍTULO VI
CAPÍTULO VII
CAPÍTULO VIII
CAPÍTULO IX
CAPÍTULO X
CAPÍTULO XI
CAPÍTULO XIII
Capítulo sem título 18
CAPÍTULO XV
CAPÍTULO XVI
CAPÍTULO XVII
CAPÍTULO XVIII
CAPÍTULO XIX
C A P Í T U L O XX
C A P Í T U L O XXI
C A P Í T U L O XXII
C A P Í T U L O XXIII
C A P Í T U L O XXIV
C A P Í T U L O XXV
C A P Í T U L O XXVI
C A P Í T U L O XXVII
C A P Í T U L O XXVIII
C A P Í T U L O XXIX
C A P Í T U L O XXX
C A P Í T U L O XXXI
EPÍLOGO
Notas Finais + Amazon

CAPÍTULO XII

6.8K 847 404
Autorstwa autoralotorino

Maldição — Eliza resmungou enquanto se levantava.   

Lord Morley riu. Ele tirou uma mecha que insistia em ficar na frente de seu olho, jogando-a para trás. O homem parecia ainda mais enigmático na escuridão. Suas roupas eram negras, tanto quanto seu cabelo e seus olhos, e a única claridade parecia vir de sua pele pálida, quase cintilando no vão. Ainda assim, Eliza conseguiu ver um sorriso irônico formando-se no lábio dele.

— Praguejando, milady? — Frederick perguntou tentando abafar um riso sarcástico.

— Sim, lord Morley.

Lady Eliza pairou de pé com visível mal humor. Ela alisou o vestido, tirando todos os restos de folhas ou de possíveis insetos do chão. Demorou mais do que o esperado ali, evitando o máximo possível de contato com o lorde. Frederick, entretanto, parecia bem paciente em relação à moça. Ele chegou a cruzar os braços enquanto esperava sua recuperação.

Ela sorriu falsamente, procurando manter o controle da situação e buscando uma boa desculpa, mesmo sabendo que Morley dificilmente acreditaria em suas palavras. Pela diversão dele com a cena ele com certeza já tinha tirado várias conclusões.

— Eu, hum... — ela balbuciou, tentando enrolar — tropecei e cai atrás do arbusto.

Frederick concordou com a cabeça.

— No meio do baile dos viscondes Backford? Em uma área deserta dos jardins?

Ela levantou uma sobrancelha, pousando as mãos sobre os quadris na tentativa de parecer no controle da situação. Todavia, seu nervosismo era visível. Lord Morley não seria convencido facilmente.

— Não é deserta se milorde está aqui.

— Eu estou aqui justamente porque precisava de uma área deserta para conversar com meu amigo, — Frederick respondeu com seu típico tom de voz sério, cínico e que para Eliza beirava a rispidez — conversa que penso que você e lady Ronnie estavam interessadas em demasia. Ao menos se julgarmos o estado de vocês e que, provavelmente, tentavam nos espiar.

Eliza riu. A intenção era soltar uma risada sarcástica e zombeteira, fazendo o marquês se envergonhar de sua suposição ego centrista. Entretanto, na última gargalhada, a hesitação da voz da jovem demonstrou seu nervosismo e que consequentemente havia verdades em suas palavras. A decisão da jovem foi recuar mais um passo, quase batendo nas folhas da planta, imaginando que a distância do homem fosse dar mais lucidez a seu discurso.

— Ah, faça-me o favor, lord Morley. Ronnie e eu não faríamos isso, até porque não há nada que me interesse em vossas conversas particulares.

— Então porque ela mentiu que a milady foi procurar ajuda?

Touché. Eliza revirou os olhos, dando de ombros. Frederick aproximou-se, acabando com a distância que ela tinha criado entre eles, e avançando ainda mais do que antes. Dessa vez ele estava perto o bastante para sentir a respiração descompassada dela em seu peito, para inspirar seu perfume delicado e para conseguir ver o tom vivaz de seus olhos se sobressaindo em seu rosto, mesmo no escuro. Ela estava visivelmente nervosa, mas quem deveria estar assim era ele. Eliza não tinha muito que temer ao estar com o marquês, Frederick, porém, ainda era constantemente assombrado por suas memórias do sonho, que apesar de serem irreais, faziam-no pulsar.

Era diferente vê-la assim, tão próxima dele, com o peito subindo e descendo de maneira irregular, em um ambiente escuro, sendo iluminada apenas pela meia-luz das lamparinas distantes e pela luz do luar. Ele gostava de manter-se próximo, demonstrar estar no controle e intimidar de maneira sutil, mas odiava quando seu feitiço voltava-se contra ele. Era lady Eliza que estava intimidando-o apenas com o ato de existir.

— Não tem importância, lord Morley. — Ela disse dispersando o assunto e olhando para os lados.

— E o que vocês conseguiram ouvir? — Frederick indagou, olhando para baixo e sem recuar.

Ela hesitou em responder. Seus olhos subiram até o homem e cravaram-se nele por alguns segundos. Se Eliza sentiu o efeito daquele contato visual, Frederick também sentiu. Por alguns segundos o silêncio reinou. Não por não haver resposta, mas pela intensidade daquele choque de olhares. Tudo parecia mais inebriante na penumbra da noite. Uma excitação incomum invadiu o corpo de Eliza e, dessa vez, sentiu que beijá-lo seria um ato impulsivo muito justificável. A brisa da noite, as chamas brilhando há metros e os lábios dele, pressionados e com certeza convidativos...

Ela olhou para baixo, afastando os pensamentos. A única coisa que Frederick iria beijar uma árvore. Ou uma roseira. Sim, uma roseira também era uma boa escolha.

— Nada de importante... — Eliza disse despreocupadamente.

Essa mulher é peculiarmente insana. E mesmo assim, não sei, parece que sempre, de uma forma ou de outra, nós acabamos nos trombando, lembrou-se. Definitivamente isso era algo. Porém Eliza era covarde demais para tentar entrar no assunto. Deveria? Provavelmente não. O que ela tinha a ver com isso? Mesmo que no fundo achasse que ele estava se referindo a ela — qual outra mulher tinha tanto azar de encontra-lo sempre e sem querer assim como lady Eliza? — sua parte racional dizia para que ela parasse de pensar em possibilidades irreais. Havia tantas mulheres em Londres, porque o marquês falaria justo dela? A que ele menos parecia suportar?

— Na verdade o que eu ouvi foi a aproximação do Sr. Paine. Sem querer, é claro. E então Ronnie se entusiasmou com a presença do noivo. Milorde sabe... Jovens apaixonadas... — ela completou.

Frederick concordou com a cabeça, fazendo questão de sorrir de uma maneira que ficasse explicita sua postura zombeteira em relação ao relato da lady. Eliza desistiu. Não se importava com lord Morley e tampouco cederia explicações para ele. Quem era aquele homem para se intrometer tanto em sua vida? Ela havia sido convidada. Poderia estar em qualquer lugar da propriedade dos viscondes e Morley não tinha nada a ver com isso.

Ela levantou o queixo, pegou nas saias para gira-las e olhou no fundo dos olhos de Frederick com desprezo.

— Se me permite dizer, lord Morley, não sou obrigada a ceder quaisquer outras explicações à respeito de minha vida privada. Obrigada pela preocupação, mas estou de saída! Passar bem.

Frederick assentiu.

— Até logo, milady.

Adeus! — ela afastou-se pisando duro — Adeus, adeus e adeus. Até quando Deus desejar. E ele certamente terá piedade de minha alma mantendo milorde longe por muito tempo!

🕎🕎🕎

— Boa noite, lord Morley.

Frederick levantou uma sobrancelha. Seu sorriso sarcástico irritou-a.

— Aparentemente a piedade de Nosso Senhor durou pouco.

Eliza revirou os olhos. Aproximou-se do balanço de jardim onde o marquês estava sentado e acomodou-se ao lado dele — mantendo a maior distância que conseguia. Ela poderia rebater o comentário sarcástico do homem, mas estava cansada demais para isso. Seus pés que mal tocavam o chão moveram-se, dando um pequeno impulso para o balanço e iniciando o leve vai-e-vem da estrutura de madeira.

Lord Morley respeitou os minutos de silêncio que se seguiram. Ele poderia continuar com os comentários provocativos, mas manteve-se ali, sem proferir uma única palavra e sem se afastar. Lady Eliza estava séria e concentrada. Frederick observou-a de perfil, resignando-se por vários segundos na contemplação dos traços de seu rosto, como o nariz arrebitado, os lábios pressionados e os cílios que cintilavam com o brilho proveniente da iluminação. A brisa ainda os atormentava. O marquês se incomodava quando o vento trazia novamente sua mecha para cima de seu olho, mas Eliza não parecia se importar o penteado que se deteriorava cada vez mais.

— A última pessoa com quem eu gostaria de estar é você.

— O sentimento é recíproco. — Frederick deu de ombros e em seguida gesticulou sutilmente em direção à porta lateral — E não estou obrigando ninguém a ficar aqui. Pelo contrário, estava apreciando em demasia a minha própria companhia. Caso esteja incomodada...

— As portas laterais foram fechadas provavelmente em razão do vento. — Lady Eliza interrompeu-o.

Lord Morley permaneceu impassível. Ele arqueou as sobrancelhas e aconchegou-se mais ainda no banco. Não havia qualquer vestígio de emoção em seu rosto e muito menos de preocupação. Eliza suspirou, inclinando-se para frente e apoiando as mãos sobre os cotovelos.

— Eles foram embora. — Ela disse por fim.

Frederick concordou com a cabeça.

— Certo, lady Eliza. — Respondeu com a voz compassada — Eles quem?

— Ronnie e meu pai. A carruagem de nenhum dos dois estava no estacionamento. Eu havia dito para lord Gunning que ele poderia partir antes de mim, que eu passaria a noite na casa de Ronnie, mas também não confirmei com ela. Deve ter havido uma confusão enquanto eu estava fora e acabei sozinha — ela disse — que maravilha.

— Não foi culpa deles, Eliza. — Frederick disse em um tom compreensivo. Ela se paralisou por alguns instantes, surpresa. — Seu pai provavelmente confia em lady Ronnie e em lady Besset. Ele deve ter imaginado que vocês estariam juntas já que não estavam nos salões. E como você demorou um pouco para retornar e a carruagem do seu pai não estava mais lá, Ronnie também deve ter concluído que você partiu.

Lady Eliza não retirou os olhos de lord Morley. Frederick vacilou, repetindo suas últimas palavras mentalmente e procurando um possível erro. O olhar da jovem não era repreensivo, mas tampouco compassivo ou afetuoso. Ela estava intrigada. O que ele havia dito de errado? Nada. Apenas tinha defendido a hipótese que ela não fora esquecida de propósito, mas sim que houve uma confusão. Lord Morley franziu o cenho, demonstrando estar confuso. Ela desviou o olhar.

Frederick percebeu que ela sorria. Um sorriso discreto, mas que consumia seus lábios de maneira genuína. Era como se os próprios pensamentos de lady Eliza tivessem provocado um involuntário sorriso. Ela inclinou à cabeça para o lado direito — lado em que o marquês estava — e comentou, deixando que suas palavras dissipassem-se no ar.

— Pela primeira vez milorde me chamou de Eliza.

Frederick estreitou os olhos. Os pés da moça impulsionaram o balanço mais uma vez. A árvore rangeu.

— Não é seu nome?

— Sim, sim... Mas sempre sou lady Eliza para milorde. É interessante vê-lo me chamando pelo primeiro nome.

— Não vi necessidade de formalidades, — lord Morley respondeu normalmente — mas creio que agora você também tenha a liberdade me chamar de Frederick.

— Frederick. — Eliza repetiu apenas para testar como as palavras saiam em sua voz — Frederick Morley. O sexto marquês de Normanbury.

— Você pretende começar a anunciar os convidados nos eventos? — ele indagou de maneira divertida, apenas para tentar animá-la um pouco — E a propósito, estou surpreso que você saiba sobre a sucessão de meu título.

— Sei de muitas coisas sobre muitas pessoas — lady Eliza deu de ombros.

— Quer que eu te leve para casa? — Frederick indagou, fitando-a — A última vez não acabou muito bem, mas tentarei manter meus pés longe dos seus hoje.

Eliza conseguiu rir. Lembrava-se bem em como havia pisado nos pés do marquês em seu momento de irritação. Ela sabia que tinha sido indelicada, mas tampouco fazia questão de pedir desculpas. Lord Morley certamente compreendeu que ela não estava em um bom dia e que normalmente não pisava nos pés de seus acompanhantes.

— Bem, lord Morley... Desde que não nos vejam juntos não me parece uma má ideia — foi a maneira de Eliza aceitar a proposta — em casa eu diria para meu pai que lady Besset trouxe-me em uma carruagem de aluguel.

Frederick assentiu.

— Um bom plano.

— É isso ou dormir nos jardins.

— Não acho que lady Backford deixaria uma lady dormir em seus jardins. Certamente a viscondessa cederia ao menos uma cama.

— Se eu conseguisse entrar com as portas fechadas. — Eliza suspirou, levantando-se e alisando o vestido — É maio. O clima não deveria estar tão ameno assim.

— Perdão por minha indelicadeza... — Frederick murmurou.

Lady Eliza estreitou os olhos. Ela estava entretida em um dos laços de sua saia que havia se desfeito. Entretanto, quando ouviu o singelo pedido de desculpas de lord Morley ergueu o olhar, fitando-o com curiosidade. Frederick estava tirando o pesado casaco negro. Ele usava uma camisa formal por baixo, com mangas longas e gola alta, dessa forma ainda estaria consideravelmente protegido dos ventos. Liz permaneceu estática quando ele se aproximou, pousando o casaco sobre seu ombro e ajudando-a a se envolver no interior dele.

Ela pareceu ainda menor usando as roupas dele. O casaco negro fez contraste com o delicado tecido lilás do vestido da moça e estendeu-se até metade de suas saias. Eliza reconheceu, mesmo sem querer, que a roupa veio com o cheiro dele. Reconheceu o aroma da colônia na gola e sentiu como se estivesse abraçando à Frederick. Ele sorriu cordialmente como se aprovasse o novo visual dela. Involuntariamente Eliza corou. Desviou o olhar, fitando qualquer coisa menos o marquês.

— Obrigada... — ela murmurou com a voz beirando a timidez.

— Por nada, Eliza. Que tipo de homem eu seria se a deixasse passar frio?

— E você está bem?

Ele assentiu.

— Claro que sim, não se preocupe — eles começaram a andar suavemente — procuraremos alguma carruagem de aluguel?

Lady Eliza ponderou por alguns segundos.

— Você não veio com a sua?

O marquês negou. Eles entraram no mesmo caminho entre os canteiros de flores de antes. A diferença era que a essa altura os jardins já estavam vazios. O único acesso ou saída do salão era pela entrada principal — que eles evitariam a todo custo. A decisão mais sensata a ser tomada foi de contornar a casa, evitando contato com outros convidados que poderiam vê-los.

Eliza ainda estava intrigada. Ela fitou lord Morley que mantinha uma postura despreocupada.

— Mas por que você não veio com a sua carruagem?

Frederick deu de ombros.

— Minha casa não é longe. Preferi fazer uma caminhada noturna. Caso não estivesse disposto eu alugaria uma carruagem, mas acreditei que não havia necessidade de deixar alguma reserva, — respondeu — mas isso não é um problema. Podemos encontrar alguma disponível em minutos.

— Não, não... — Lady Eliza proferiu impulsivamente — nós podemos ir andando. A minha casa também não é longe daqui.

— Se alguém nos ver...

— Não vão. Já está tarde e nós podemos cortar pela Grosvenor Square. Além de que... — ela deu de ombros, fingindo não se importar. Frederick percebeu que ela se importava. Muito. — Eu queria saber como é caminhar por essas ruas durante a noite. É algo que eu nunca fiz. Não acho que vá ter outra oportunidade de fazer.

Lord Morley assentiu, levantando uma sobrancelha. Lady Eliza havia colocado completamente seu casaco e ele evitou sorriu ao vê-la assim. A gola era alta demais, os ombros largos demais e ele nem conseguia ver as mãos dela pelo comprimento das mangas. Eliza Gunning parecia incrivelmente frágil dentro das roupas dele e isso trouxe uma excitação nova para Frederick. Gostou de vê-la com seu casaco, esforçando-se para dobrar a barra da manga e para caminhar sem que a gola cobrisse parte de seu queixo e de sua boca.

Frederick aproximou-se, estendendo o braço para ela. Eliza aceitou, colocando seus corpos mais próximos do que qualquer outra vez. Provavelmente era o efeito da noite. Eles estavam tomando um caminho quase deserto, a brisa era constante e os dois estavam sozinhos. Ele era tudo o que Eliza tinha e ela agarrou-se a ele sem pudor algum. Deveria? Com certeza. Mesmo entre todas aquelas camadas de tecido os pelos de Frederick eriçaram-se ao sentir o calor de lady Eliza. Os pensamentos que o marquês tanto tentava evitar vinham de maneira involuntária para sua mente. Ela estava tomando conta de seu corpo.

— Por que exatamente você acha que nunca mais terá a oportunidade de fazer uma caminhada noturna por Mayfair? — Frederick perguntou alguns metros depois.

Eliza estreitou olhos. Para ela a resposta era óbvia o bastante para que não precisasse de explicação. Lord Morley, entretanto, não tinha a mesma visão que ela sobre a sociedade. Como poderia? Era um homem nobre, bem-apessoado e que nunca sofrera as limitações de ter nascido mulher.

— Bem, milorde, não há grande segredo nisso. — A voz de Eliza era séria, porém mantinha um a cordial e instrutivo. — Eu sou uma mulher. Certamente não é seguro andar sozinha em lugar algum à noite. E é claro que não pedirei para que meu pai me acompanhe em algum desses passeios. Assim, essa provavelmente será a única oportunidade de minha vida.

— E um marido que possa acompanhá-la?

A voz de lord Morley foi cuidadosa. Apesar de nãocultivar sentimentos de afeição em relação à jovem ele sabia que casamento emgeral era um assunto delicado para qualquer mulher. Principalmente quando amulher em questão tinha vinte e dois anos e estava solteira. Ele estava sozinhocom lady Eliza pelas ruas de Londres e a última coisa que queria fazer era iniciar mais uma discussão, por isso estava disposto a tomar cuidado com todas as palavras proferidas, até porque a reação de Liz era constantemente imprevisível. Aos cantos do salão ou sentada nas cadeiras esperando um convite para dança ela parecia inofensiva, mas Frederick já tinha tido o desprazer de constatar que sua personalidade poderia ser ameaçadoramente explosiva.

— Não sejamos tolos, Frederick. Esperar a companhia de um marido para um passeio noturno é o mesmo que esperar a companhia de uma fada.

A diferença é que fadas ainda têm mais chances de serem reais do que de você conseguir um marido, a própria voz de Eliza ecoou em sua cabeça. Ela fez uma careta.

Ele deu de ombros, continuando o caminho e tentando conversar sobre qualquer trivialidade que não causasse problemas ou discordâncias — como o clima. Entraram na Grosvenor Square algum tempo depois. Alguns cavaleiros esgueiravam-se entre árvores, outros caminhavam pelas ruas e, mais geralmente, evitavam passar pelo meio dos jardins escuros. Eliza gostou do ambiente. Reparou no momento em que as nuvens dissiparam-se pelo céu, deixando a lua cheia a mostra e iluminando eles com mais intensidade. Ela soltou-se dos braços do acompanhante e avançou alguns passos, quase rodopiando pelas trilhas e tocando no tronco das árvores que se seguiam.

— Pensei que aqui era mais frequentado durante a noite — Liz disse, jogando conversa fora enquanto abaixava-se para pegar uma flor bonita, mas que havia caído.

Frederick sorriu com o canto dos lábios.

— Geralmente há um fluxo considerável de pessoas por aqui durante a noite, — lord Morley disse tranquilamente — só que agora já está ficando tarde. Não será um problema acordar seu pai ou o mordomo há essa hora?

Ela negou com a cabeça.

— Tenho a chave.

Lord Morley estreitou os olhos.

— Tem?

— Sim, — lady Eliza voltou-se para ele esperando que Frederick a alcançasse — papai insiste. Nunca se sabe quando há uma emergência. Apesar de que nosso mordomo ou os criados sempre estão em casa. Achei que nunca fosse precisar.

Ele assentiu. Sim, aquela era realmente uma situação inusitada. Todavia não era de toda ruim. Frederick estava achando a noite agradável, apesar da brisa gelada que ás vezes se chocava contra eles. E Eliza... Bem, Eliza era Eliza. Seu entusiasmo com o passeio noturno era nítido. Caminhava na frente, inclinava-se no tronco das árvores para observar nos vãos escuros e de vez em quando sorria sozinha, entusiasmada por estar ali. Frederick tinha total consciência de que não fazia parte da felicidade de lady Eliza. Ele era seu meio, mas não seu fim. Sua alegria não estava de forma alguma ligada a ele.

Tudo estava bom demais para ser verdade e infelizmente a jovem esqueceu-se de um fato: seu nome era Eliza Gunning e as coisas raramente davam certo para ela. O momento estava sendo inspirador. Depois de dias de lamentações pelo fim da Srta. Silewood finalmente ela estava tendo um vislumbre de êxtase. Contudo, algo literalmente entrou em seu caminho. Um galho caído pelo vento estava no meio da trilha e lady Eliza, distraída, não viu.

Segundos depois ela estava no chão.

— Você está rindo. — Eliza rangeu os dentes.

Lord Morley negou tentando abafar seu riso. A face de Eliza corou imediatamente. Não conseguiria de forma alguma suportar aquela humilhação. Poderia cair na frente de Londres inteira, — o que já havia feito algumas vezes durantes os bailes — mas fazer isso na frente de Frederick Morley assemelhava-se a uma tortura. O homem era detestável e com certeza se lembraria desse momento até a hora de sua morte.

— Deixe-me ajudar.

O marquês aproximou-se estendendo a mão para que lady Eliza se levantasse. Ela não queria aceitar, porém seu pé doía e o vestido era pesado. Lord Morley ainda parecia se divertir com a situação, mas a iniciativa de ajudar era genuína. Por mais que tivesse restrições em relação à lady Eliza ele não era imaturo o suficiente para deixar uma dama sentada no chão no meio da noite de West End. Ele a guiou até um dos bancos da praça onde eles sentaram.

Eliza alisou o vestido tirando mais uma vez os restos de grama e terra do tecido. Pela segunda vez na noite ela havia parado no chão — em duas situações bem distintas, entretanto. Frederick a observou com cuidado, mas permaneceu em silêncio por um bom tempo, talvez temendo que ela ainda estivesse irritada com a queda e com as risadas. De fato lady Eliza estava.

Liz ergueu um pouco a barra da saia para ver o tornozelo. Ela não achava que tivesse torcido, muito menos quebrado, mas com certeza estava sentindo uma dor que com sorte seria momentânea. Frederick seguiu seu olhar observando suas pernas. Não havia pele amostra, mas sua meia branca era fina e delicada, contornando perfeitamente as curvas do tornozelo e da panturrilha. Na lateral havia um bordado com suas flores, porém as linhas estendiam-se até a área coberta pela saia. E Frederick que nunca havia sido um grande admirador de flores decidiu que daria a vida para poder ver o fim daquele bordado.

— Machucou? — lord Morley inclinou-se um tanto, buscando observar melhor.

Lady Eliza soltou a saia, cobrindo novamente os pés e afastando lord Morley sutilmente com os ombros. O marquês endireitou a postura, porém continuou com os olhos fixos nela, preocupado. Liz deu de ombros.

— Está doendo um pouco, mas creio que tenha sido apenas o impacto — respondeu séria.

— Isso é bom, pois...

— E eu estou comovida com a sua imaturidade.

Lord Morley arqueou uma sobrancelha. Eliza cruzou os braços e olhou para o nada.

— Imaturidade?

— Eu tropecei e você riu como se nós tivéssemos dez anos, milorde. — Ela estreitou os olhos, fitando-o com total desaprovação — Essa é uma conduta valida?

— A cena foi cômica, lady Eliza. Eu nunca riria se fosse algo sério. O que importa é que você está bem, então podemos seguir caminho e...

— Não. — Ela permaneceu estática. Lord Morley desistiu de levantar e continuou ali. — Não darei um passo até que meu tornozelo pare de doer. Ou milorde prefere me levar em seu colo?

O marquês assentiu.

— Descanse o tempo que for preciso.

— Ótimo. — Ele sorriu e, inevitavelmente, voltou a segurar o riso.

Eliza revirou os olhos. Ela esforçava-se em manter uma boa relação com lord Morley, mas ás vezes era simplesmente impossível. Homens em geral eram imaturos dessa forma? Sim, Eliza imaginava que sim. Não tinha primos próximos, nem tios ou sobrinhos, mas já havia escutado histórias absurdas sobre o comportamento inconsequente de alguns homens. Além de que ela era Silewood. Tudo o que acontecia em Londres chegava a seus ouvidos. Essa era a maior prova de que homens honrados eram difíceis de encontrar naquela cidade.

Apesar de que... Bem, Frederick Morley era um libertino. E não, não havia discussão alguma a respeito disso. As fontes de Eliza eram confiáveis e justas. Entretanto, desde que chegou a Londres, ele não havia tomado nenhum comportamento indecente. Ao menos não que se tornou público. Ele respeitou todas as mulheres pelo qual se interessou, estava aparentemente fazendo uma corte respeitosa à Stephanie Churchill e não havia arruinado a reputação de ninguém. Por mais que Eliza tivesse procurado defeitos no homem desde o dia em que eles se conheceram era fácil constatar que eles estavam bem ocultos.

Talvez lady Stephanie, de qualquer forma, não fosse tão azarada assim por ser a possível futura marquesa.

— Não acho que seja educado você se divertir ás minhas custas, — Eliza disse por fim, irritada com o silêncio prolongado que havia entre os dois.

Lord Morley deu de ombros.

— Você faria o mesmo comigo se tivesse oportunidade.

Ela levou as mãos ao peito teatralmente. O casaco de Frederick tampava seu decote, infelizmente, pois ao menos agora ele tinha uma desculpa convincente para olhá-lo sem parecer invasivo.

— É claro que eu não faria. Se lord Morley caísse eu ajudaria e...

— Foi exatamente o que eu fiz.

— Depois de rir.

— Então perdoe essa insensibilidade de minha parte — disse sarcasticamente.

Ela revirou os olhos.

— Perdoado.

— E eu perdoo a sua por ter insinuado que sou imaturo.

Lady Eliza deu de ombros. O que poderia fazer? Não era a primeira vez que seria colocada nessa posição. Frederick, porém, ficou curioso.

— Não se importa?

— Sou chamada de insensível com mais frequência do que você imagina.

— Duvido muito.

— Eu não tenho mãe, lord Morley — Eliza disse, olhando para ele com os olhos brilhantes e sinceros — se uma garota órfã não agir como o esperado ela será chamada de insensível. Disseram-me a vida inteira que eu deveria amar minha mãe, mas eu nunca fui capaz. Não sinto nada por ela. Sei que é desagradável para alguns escutarem isso, mas não posso mentir. Não posso fingir o que não sinto.

Ele assentiu por alguns segundos. Umedeceu os lábios, ponderou com sabedorias as palavras, não apenas as que iria dizer, mas também as proferidas por Eliza. Ela realmente o deixava intrigado. Lord Morley queria verdadeiramente compreender o que se passava naquela cabecinha fora dos padrões. Era surreal como cada vez mais tempo que ele passasse perto dela, mais ele notava o quanto ela era diferente de todas as mulheres que já havia conhecido.

— Nada? — Frederick indagou, reforçando mais uma vez a afirmação.

— Nada. — Liz voltou a dizer. — Não que eu não lamente sua morte, mas eu não a conheci. Não consigo ter nenhum sentimento em relação a ela. Todos sentem pena de mim, da pobre e vulnerável órfã que não conheceu a mãe e deve sofrer permanentemente essa dor, mas não sei. Isso não acontece. Eu nunca senti falta desse suposto espaço vazio de minha vida. Sempre tive meu pai, Stanley, Daisy, minha avó, mesmo que ela me tire do sério ás vezes... — Liz sorriu. Sim, a avó tinha um talento especial para isso — minha família sempre foi disfuncional, um tanto peculiar, mas sempre suficiente para mim. Não a vejo como incompleta.

Frederick concordou e, por alguma razão que ele não sabia explicar, disse:

— Eu sinto a falta de meu pai.

E então Eliza viu a dor em seus olhos. Um olha melancólico, nostálgico e completamente sombrio. Ela tentou sorrir fraco, não por estar feliz, mas para prestar apoio. Suas mãos pousaram sobre as pernas dele.

— Eu compreendo, Frederick. Nunca passei por isso, mas sei o que você quer dizer. Nossos casos são bem diferentes. Você conheceu seu pai, conviveram por anos, seria horrível se você não sentisse a partida dele. O amor sempre tem um preço.

— Minha mãe sentiu mais. Eles se casaram completamente apaixonados. Ela estava noiva de outro homem, mas rompeu com ele para se casar com meu pai — um sorriso bobo surgiu nos lábios do marquês — parece tolice eu não acreditar em amor quando a justificativa para o casamento de meus pais foi justamente essa.

Eliza riu. Sua voz estava doce e melodiosa. Frederick gostou de sua risada.

— E parece tolice eu acreditar no amor quando o casamento de meus pais foi por tudo, menos amor.

— É, Eliza... — ele cobriu a mão dela com a dele — nós definitivamente somos completos opostos.

Naquele instante um choque percorreu simultaneamente o corpo dos dois. A mão de Eliza estava enluvada, mas mesmo assim o toque foi certeiro. Frederick sentiu sua respiração descompassar e Eliza paralisou-se. Sim, os dois estavam sentindo aquilo. E os dois sabiam que estava sendo uma sensação mútua. Lord Morley foi levado por seus impulsos, subiu um pouco os dedos, erguendo a manga de seu casaco e tocando no pulso de lady Eliza, sentindo sua pele. Ela olhou para baixo e com um sorriso aproximou a outra mão, retirando as luvas.

Frederick permaneceu em silêncio vendo o deslumbre de sua pele. Seus dedos delicados tocaram novamente os dele, dessa vez, despidos de qualquer tecido. O marquês nunca considerou ser tão estimulado por dedos, mas era o que estava acontecendo. Ver a mão de Eliza foi capaz de fazer seu corpo pulsar. Seus dedos se entrelaçaram sobre as pernas de Frederick e ele os apertou por alguns instantes com a intenção de marcar em sua pele os centímetros de lady Eliza perto dele.

E então foi a vez de seus olhares. Os olhos claros de Eliza cravaram-se na imensidão negra de Frederick. Muito mais do que um simples olhar, mas sim uma conexão de almas. Em raio ela enxergou verdadeiramente quem era o marquês. Enxergou verdadeiramente o que sentia por ele. Seus lábios se entreabriram, confusa, e ela tentou desviar. Frederick, porém, não deixou. Não resistiu a tentação, não resistiu à vontade, não resistiu ao seu coração. Tomou os lábios da mulher com tanta intensidade que poderia dizer que sua vida dependia daquele beijo.

E sim, foi definitivamente um beijo. Seus dedos continuaram entrelaçados sobre a perna de Frederick, mas ele usou a outra mão para tocar em sua nuca e mergulhar os dedos nas mechas escuras de lady Eliza. A outra mão de Eliza pousou nos ombros de Frederick, mantendo seu corpo inclinado perto dela. As bocas dançaram exatamente na mesma sintonia. E em um encaixe perfeito ele soube que ela seria sua ruína.

Sua desastrada, inoportuna e irritante ruína. Mergulhou ainda mais em seus lábios, explorando sua boca com voracidade. Eliza nem ao menos ameaçou recuar. Quanto mais os lábios de Frederick pressionavam-se nos seus, mais Eliza entregava-se ao beijo. Tudo o que ela queria era parar o tempo naquele instante. Ter Frederick, ao seu lado, para sempre. Arrepiou-se completamente ao sentir a mão viril dele em sua nuca e arfou quando, sorrateiramente, ele mordeu os lábios dela.

As duas horas e trinta e dois minutos do dia 28 de maio de 1832 Frederick Morley beijou Eliza Gunning na Grosvenor Square sob a luz do luar. Essa sim seria sua informação mais valiosa e secreta.

O marquês mordeu os lábios, ofegante. Eliza não teve reação alguma além de permanecer estática, completamente paralisada depois daquilo. Seus olhos arregalaram-se, a mão tremeu e ela quis desaparecer. Só não tinha certeza se queria desaparecer sozinha ou levá-lo consigo.

Lord Morley levantou-se, ainda desnorteado. Olhou para Eliza, que esperançosa ergueu o olhar. Frederick engoliu seco.

— É melhor irmos — ele disse com a voz mais hesitante do que esperava.

Eliza levantou-se, bamba.

— Sim. Certo... Eu...

— Sim, vamos.

— Certo, hum. Vamos.

— Agora.

— Nesse instante.

E partiram. Dessa vez com mais distancia do que nunca.
•••

O primeiro a gente não esquece, né? Porque depois que escrevi esse capítulo a Grovesnor Square não foi mais a mesma pra mim ❣️

Czytaj Dalej

To Też Polubisz

12.9K 716 7
Nem sempre o final e o que sonhamos! PLÁGIO É CRIME!
2.5M 225K 84
Ela sempre sonhou em casar por amor, mas ao descobrir que foi prometida em casamento para unificar os negócios das famílias mais poderosas de Londres...
42.4K 2.4K 22
O amor às vezes escolhe lugares inapropriados para florescer. Uma sala de aula, uma aluna novata e tímida, um belo professor, olhares acusadores de a...
63.9K 14K 176
Tradução Concluída! Sinopse dentro da tradução!