OS MISTÉRIOS DE ELIZA GUNNING...

By autoralotorino

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❝ Confiem em mim, leitores. 1832 será um bom ano. - Srta. Silewood. ❞ Lady Eliza Gunning não é nem de longe u... More

SINOPSE COMPLETA
DISCLAIMER
EPÍGRAFE
PRÓLOGO
CAPÍTULO I
CAPÍTULO II
CAPÍTULO III
CAPÍTULO IV
CAPÍTULO V
CAPÍTULO VI
CAPÍTULO VII
CAPÍTULO VIII
CAPÍTULO IX
CAPÍTULO X
CAPÍTULO XII
CAPÍTULO XIII
Capítulo sem título 18
CAPÍTULO XV
CAPÍTULO XVI
CAPÍTULO XVII
CAPÍTULO XVIII
CAPÍTULO XIX
C A P Í T U L O XX
C A P Í T U L O XXI
C A P Í T U L O XXII
C A P Í T U L O XXIII
C A P Í T U L O XXIV
C A P Í T U L O XXV
C A P Í T U L O XXVI
C A P Í T U L O XXVII
C A P Í T U L O XXVIII
C A P Í T U L O XXIX
C A P Í T U L O XXX
C A P Í T U L O XXXI
EPÍLOGO
Notas Finais + Amazon

CAPÍTULO XI

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By autoralotorino

— É a segunda vez que eles estão dançando hoje. — Eliza comentou para ninguém em especial.

Lady Ronnie assentiu, pegando o último doce de nozes antes que a Srta. Duncan. Samantha deu de ombros, enrubescida. Ela esperaria que chegasse outra bandeja, já que provavelmente ninguém a tiraria para dançar por mais uma noite, poderia contentar-se com o menu dos Backfords. A Srta. Hawkins manteve-se ereta e dispersa, ignorando totalmente a observação de lady Eliza. Ela estava buscando outra pessoa

— Uma pena que não tenhamos mais a Srta. Silewood, Liz — Ronnie disse mantendo o tom de voz baixo — assim ao menos você poderia despejar sua repulsa por ele no edital.

Eliza lentamente voltou-se para ela, fuzilando-a com o olhar. Ainda não era hora de conversar sobre Silewood, muito menos em baile lotado de pessoas. Ronnie encolheu-se, procurando mais doces de nozes, mas assim como Samantha decepcionou-se. Sua única alternativa foi voltar a observar lord Morley e Stephanie Churchill caminhando em direção à pista de dança mais uma vez. Frederick, como sempre, vestia preto, fazendo contraste perfeitamente com sua pele alva e seus cabelos escuros. Stephanie, por outro lado, era um raio de luz, vestindo azul com branco, seu traje assemelhava-se ao céu em um dia ensolarado. E seu sorriso... Ah, quando ela sorria para lord Morley seus olhos brilhavam.

E os de Eliza ardiam em fogo.

— Ela é um bom partido, — Ronnie continuou como se sua observação sobre Silewood não fosse suficiente — é bonita, tem uma ótima educação e um pai endinheirado. Existe alguém que combine melhor com um titulo de marquesa?

Lady Eliza concordou com a cabeça.

— Eu poderia citar uma lista.

— Então comece... — Veronica levantou uma sobrancelha.

Eliza a fitou, indignada. Ela não gostava dos joguinhos que Ronnie Besset sempre teimava em jogar. Se ela queria arrancar alguma confissão de lady Eliza provocando-a em relação à lord Morley ela não conseguiria nada. Até porque nada havia para confessar. Há última vez que eles haviam se visto foi há dez dias, quando Frederick fez a gentileza de acompanha-la até a soleira de sua casa. Desde então Eliza viveu dez dias muito agradáveis.

Ela estava pronta para inquerir Ronnie em relação ao assunto quando Bridget postou-se à frente delas com um sorriso largo estampado no rosto. As outras três se entreolharam, receosas. Os olhos azuis e angelicais da Srta. Hawkins piscaram inúmeras vezes em êxtase e ela juntou as duas mãos à frente do corpo, apertando-as. Seria uma longa noite.

— Adivinhem quem está de volta à Londres?

Ronnie sorriu.

— O circo itinerante? — tentou.

Bridget revirou os olhos.

— Não, lady Veronica. O Sr. Charles Farnsworth. Isso não é maravilhoso?

A Srta. Duncan enviou à lady Eliza um olhar expressivo. Liz retraiu-se ao lado de Ronnie que não estava dando muito importância para o entusiasmo da loira. Ela apenas moveu seu copo com limonada, misturando o liquido, e deu de ombros.

— Com uma corda no pescoço até o gado vai para o abatedouro.

— O que você quer dizer com isso? — Bridget franziu o cenho.

Lady Ronnie decidiu não comentar.

— Bem, mas essa não é uma garantia que ele realmente se estabeleça aqui por muito tempo... — A Srta. Duncan disse com calma, tocando de leve o tecido por cima das ternas da amiga — afinal, ele saiu de Londres fugindo.

— Ele não fugiu! — Bridget rosnou — Ele voltou duas vezes. Uma pessoa que foge não retorna para visitas.

— Ele saltou em uma carruagem em movimento com o filho e a sobrinha do conde de Hertside, — Ronnie bebericou sua limonada — se isso não é fugir eu definitivamente nunca assisti uma fuga verdadeira.

— Não importa — a Srta. Hawkins acenou no ar, dispersando o assunto — o importante dessa situação é que ele provavelmente está em algum lugar desse salão. Nós precisamos encontrá-lo para, depois, ele me tirar para uma dança.

Lady Eliza duvidava que o Sr. Charles Farnsworth estivesse muito disposto á dançar com Bridget, mas considerou que sua melhor atitude seria permanecer calada em relação a isso. A paixonite da Srta. Hawkins em relação ao vizinho fazia parte de uma história antiga, infeliz e por vezes cômica. Os filhos dos Hawkins e dos Farnsworths haviam sido criados com extrema proximidade. O relacionamento estreito das duas famílias chegou a resultar no casamento de Matthew, o novo visconde, e Alicia, a filha mais nova dos Farnsworths. O amor havia batido à porta dos dois, mas aparentemente Bridget e Charles não teriam a mesma sorte. Além do querido Charlie não parecer muito interessado em casamento ele não parecia muito interessado em Bridget também.

Ainda assim, a jovem era persistente. Acreditava que alguma hora, de uma forma ou de outra, o coração do rapaz seria tocado por ela. Todos sabiam que não, porém era impossível dizer isso para Bridget sem criar um baita problema. A melhor solução era sem dúvida deixá-la sonhar acordada com o homem alto, de cabelos loiros na altura do ombro e sorriso arrebatador.

— Encontrei! — Bridget sorriu, agarrando Samantha pelo pulso. A amiga grunhiu. — Venha, venha. Vamos passar bem na frente dele por coincidência.

— Eu estou esperando a reposição dos doces, Bridie!

— Eu disse venha, — a Srta. Hawkins a arrastou pelo salão, afastando uma Samantha relutante da mesa de aperitivos — Eliza, vejo você mais tarde. Tente não fuzilar lord Morley com o olhar durante a noite toda.

Ela revirou os olhos. Ronnie Besset concordou com um sorriso divertido.

— Eu disse que todos podem perceber isso.

— Não me importo com alucinações coletivas — lady Eliza sorriu — tenho mais o que fazer, como por exemplo, tentar tirá-la daqui antes que lord Crosby apareça também.

— Aaron está no baile?

— Provavelmente. Ele tem vinte e oito anos, um título e amigos desesperados por casamento. Eu me surpreenderia se ele estivesse em qualquer outro lugar além daqui.

— Ele tem vinte e sete.

— Ronnie, eu posso fazer uma pergunta?

— E tem a ver com lord Crosby?

— Certamente.

Lady Veronica levantou uma sobrancelha e em seguida assentiu com um leve movimento de cabeça. Ela tirou uma mecha castanho-arroxeada que caiu ao lado de seu olho e claramente tentou desviar a atenção de Eliza. Liz apenas sorriu, tocando levemente no braço da amiga por cima do tecido, como se a troca de calor entre as duas fosse dar algum tipo de apoio moral para lady Ronnie. Ela voltou-se na direção de uma das portas laterais, fazendo com que o rodado vestido rosa claro girasse, e em seguida levou ás mãos da amiga ao encontro de seu braço, sem cerimônia.

— Sim, sim. Mas poderíamos conversar nos jardins? Tenho certeza que teremos mais privacidade...

Era óbvio que Ronnie sabia exatamente o assunto que a amiga iria abordar, caso contrário, não se importaria tanto com a dita privacidade. Gentilmente Eliza concordou, acompanhando-a em direção á saída com passos calmos. A área do jardim felizmente havia sido preparada para os convidados naquela noite. Lamparinas deixavam o ambiente claro, algumas mesas haviam sido colocadas no gramado e criados perambulavam entre canteiros e visitantes. Elas iniciaram a caminhada sob a intensa luz do luar.

— Ronnie, você sabe que eu odeio parecer invasiva, mesmo que no fundo eu realmente seja. A questão é que eu estou preocupada verdadeiramente em relação ao seu relacionamento com ele. Eu não acho que, na situação que você está, seja saudável nutrir sentimentos para outro homem além de seu noivo.

— Ah, Liz... — Ronnie suspirou — acha que eu não sei? Até lord Crosby sabe que nosso relacionamento não tem esperanças, mas ele disse que gostaria de continuar sendo meu amigo. Aaron pediu para que eu apresentasse Reynard para ele. Quem sabe eles poderiam desenvolver uma amizade...

As palavras de Eliza no último baile ecoaram em sua própria mente. Lord Crosby deveria conhecer o noivo dela, Reynard Paine. Ao menos lord Morley havia demonstrado um pingo de sensatez repassando sua sugestão para o amigo. Não parecia uma missão fácil fazer com que dois homens apaixonados pela mesma mulher desenvolvessem uma amizade, porém lady Eliza sabia que talvez essa fosse a única solução para a aflição do coração de Ronnie Besset. Ela não suportaria perder Aaron, mas também não suportaria perder Reynard. Estava em fogo cruzado.

Elas adentraram um caminho entre dois canteiros de violetas. O movimento ali já era menor, dessa forma, eles puderam ficar mais à vontade. Eliza soltou-se dos braços da amiga, tentando relaxar e continuar o assunto da maneira menos indelicada possível. Ronnie estava alheia, abaixando-se para ver as flores e deixando que os dedos percorressem a mureta de seu lado direito, despreocupadamente. O rosto dela começou a enrubescer pela brisa primaveril que estava mais amena aquela semana. Era admirável como Veronica conseguia ficar bonita até mesmo corada. Quando Eliza enrubescia, ela apenas ficava tão vermelha quanto uma pimenta.

Liz fitou a amiga com o canto dos olhos. Ronnie sorriu esfuziante, estendendo uma violeta caída, mas ainda muito bonita, para a amiga. Lady Eliza aceitou com um sorriso e olhou para os próprios pés.

— Vocês se beijaram? — Liz perguntou hesitante, mas ainda assim a curiosidade em sua voz era visível.

— Aaron e eu? Sim — Ronnie levantou uma sobrancelha, recolhendo outra violeta caída. Essa ela guardou para si — Na verdade ele me beijou e eu recuei.

Lady Eliza assentiu.

— Compreendo... — disse — mas você não correspondeu nem por um milésimo de segundo?

— Oras, Liz. Claro que sim. Só Deus sabe o quanto esse rapaz faz bem para mim, mas Reynard também. Não posso sacrificar um amor como o que tenho por uma paixão momentânea.

— Eu diria que é algo sensato de sua parte, — Eliza sorriu fraco — além de que quando Reynard e você se casarem vocês vão para Whitshire. Tenho certeza que distância de lord Crosby fará bem para você.

A voz de lady Eliza era serena, mas Veronica conseguiu perceber a melancolia que ela guardava para si. Ronnie aproximou-se da amiga novamente, pairando ao seu lado e entrelaçando seus dedos. Seria difícil para Eliza lidar com o fato de que em breve a melhor amiga estaria partindo para uma cidade distante, onde assumiria o papel de Sra. Paine e raramente teria tempo para despender com as antigas amizades. Ela não poderia culpar lady Ronnie por viver a própria vida, mas por vezes era inevitável ser invadida por aquele egoísmo desejo de que ela não se casasse. Eliza não queria ser condenada á uma vida solitária nos salões com a Samantha e Bridget.

— Liz... — lady Veronica chamou com um sorriso travessamente tímido formando-se entre os lábios — você já sentiu vontade de beijar alguém?

Eliza estreitou os olhos.

— Como?

— Beijar... Tocar os lábios...

— Sim, sim — lady Eliza acenou no ar — eu entendi, apenas fiquei surpresa com a pergunta.

— Não sei, é que nós já conversamos tantas vezes sobre os meus beijos. Eu queria saber sobre você também.

— Oras, Ronnie. Se eu não beijei ninguém como vou poder dar o meu testemunho?

Lady Eliza perguntou brincalhona, mesmo que na prática ela não levasse a situação com tanto otimismo quanto gostaria. Ela certamente não desejava sair beijando todos os rapazes de Londres, mas estaria mentindo se negasse o eventual desejo experimentar a maldita sensação de tocar os lábios em alguém. Como na semana passada quando...

— Sim, mas imagino que ao menos vontade você tenha sentido. — Ronnie disse — Barclay Jones nunca causou esse tipo de sentimento em você?

Eliza fez uma careta milenar.

— Barclay Jones é apenas um velho amigo que teve o azar de se apaixonar justo por mim. Pobrezinho, na verdade, tantas mulheres em Londres... — Ela respondeu. Ronnie quase revirou os olhos, mas resignou-se a sorrir com o canto da boca. — Sendo assim, nunca senti a mínima vontade de beijá-lo. Eu gostaria que nosso relacionamento tivesse se limitado á apenas caminhadas no Hyde Park e eventuais companhias em sarais. Eu nunca quis que ele me pedisse em casamento.

Lady Veronica assentiu com a cabeça. Não havia muito que discorrer á respeito de Barclay. Ele era um homem admirável, neto de um conde e formado em Oxford. Jones não possuía uma beleza excepcional, mas sem dúvida era agradável. Sua companhia foi por muitas vezes estimada por lady Eliza em virtude de seu entusiasmo perante a vida, seus comentários engraçados sobre a sociedade e a disponibilidade de sua agenda para passeios. Além de que eles se conheciam há anos, desde que Eliza fizera aulas de bordado com a irmã dele. Barclay Jones era considerado um bom amigo, mas nada além. Foi um susto e tanto quando ele apareceu na propriedade dos Gunning pedindo a mão da jovem em casamento.

— Certo... — Ronnie assentiu — e além de Barclay? Você nunca sentiu vontade beijar qualquer outro homem?

Lady Eliza riu. Ela colocou a flor recebida atrás da orelha. O tom violeta da planta combinou perfeitamente com o vestido lilás que Eliza usava. A peça era graciosa, com a saia repleta de babados e sobreposições em tons de roxo e branco. O corpete era firme, bordado com pequenas flores roxas, e com o decote ombro à ombro, em manga bertha. Talvez ao ar livre estivesse frio demais para ela, mas isso não foi um empecilho para continuar a caminhada.

— As coisas não são tão simples assim, Ronnie.

— Claro que são, — Veronica insistiu, batendo o pé — não estou dizendo que você beijá-los, mas a vontade vem de maneira involuntária. Quando você percebe seus olhos já estão fixos nos lábios dele, sua respiração fica descompassada e seu coração começa a palpitar fortemente. De súbito você não tem mais controle de suas emoções.

Eliza pensou por alguns segundos. Dar qualquer deixa para Ronnie era o mesmo que brincar com fogo. Dessa forma ela apenas sorriu, entrou em outro caminho entre os canteiros e deu de ombros, relevando a pergunta.

— Não.

— Mentirosa!

Eliza virou-se para a amiga, cruzando os braços.

— Se você sabia que iria me chamar de mentirosa se minha resposta fosse não, por que perguntou?

— Tenho esperanças, — Ronnie respondeu — e é claro que você está mentindo. Os salões estão lotados de homens bem apessoados. É humanamente impossível nunca ter sentido atração por nenhum deles. — Eliza continuou ignorando, fingindo-se de dispersa — Ou você vai me dizer que lord Morley, por exemplo, é um homem feio?

Lady Eliza encarou a amiga que se esforçava em manter-se séria. Seus olhos percorreram o globo ocular em um circulo completo e demorado.

— Podemos passar um dia sem falar dele?

— É só um exemplo, Liz. — Ronnie insistiu — Por que você se incomoda tanto com ele? Ainda não superou o que ele disse sobre a Silewood? É passado, você deve esquecer, o que estamos colocando em questão agora é a inegável beleza dele.

— Se ele é tão arrebatador posso sentir que você sentiu vontade de beijá-lo, hum?

Tática antiga. Lady Eliza odiava ser uma covarde, porém sua melhor solução era constantemente desviar o assunto. Ela poderia ser uma boa mentirosa se quisesse, pois não tinha muitos problemas em atuar, mas a questão era que não gostava de mentir. Não para Ronnie. A amizade delas tinha se pautado desde o inicio em devoção, confiança e apoio — tanto que Veronica era uma das únicas pessoas que sabiam sobre a coluna. Por mais que Eliza quisesse olhar nos olhos da amiga e dizer que não, nunca sentira a mínima vontade de beijar Frederick Morley, ela não podia. Não podia ser cínica a esse ponto. Não podia negar o inegável para si. Sendo assim, o melhor a se fazer era focar em qualquer coisa além dos lábios do marquês.

— Óbvio que não senti, Liz — Ronnie chegou a parecer ofendida — todas as vezes que o vi eu estava com Reynard antes. Além de que ele é muito bonito, mas não faz muito meu tipo de partido. Prefiro homens mais sensíveis, artísticos, que possam mergulhar intensamente em minha vida. Frederick parece, hum...

— Frio. — Eliza ajudou. — Insensível.

— Eu diria distante. Não acho que ele seja frio e muito menos insensível. Só protege demais a si mesmo com medo de se machucar. As coisas não devem ser fáceis para ele. Você sabe, o pai e tal... Com certeza foi algo complicado.

Eliza concordou. A conversa que teve com lord Gunning e Julian Stanley ainda estava clara em sua mente. Diziam que ele havia se matado. Deveria ser horrível para um homem pensar que o pai poderia ser capaz de tirar a própria vida. Pior ainda seria lidar com uma mãe viúva e uma irmã menor, prestes a debutar. Liz não tirava a razão dele de tentar preservar a si mesmo, mas mesmo assim não conseguia compreender o motivo de uma postura tão rígida em relação aos sentimentos. Amar alguém poderia salvá-lo, não destruí-lo.

— Ele é bonito. — Eliza disse, apenas para acabar logo com o assunto — E poderia ser mais ainda se fosse gentil. Se ele tivesse outra personalidade talvez eu até me interessasse por ele. Talvez.

Ronnie riu.

— Não, Eliza. Se ele tivesse outra personalidade ele não seria ele. Uma boa aparência é desejável, mas eu a conheço como conheço a mim mesma e sei que isso não é o suficiente para você. O seu homem ideal deve ser sagaz, não apenas gentil. — Disse — Se gentileza fosse o único quesito você estaria casada com Barclay.

E Eliza fitou a amiga com uma expressão zombeteira. Ronnie estreitou os olhos, não se importando com as provocações divertidas de Liz.

— E você considera Morley sagaz?

— Ele não é? — Veronica cruzou os braços, séria.

— Ele é um libertino convicto. Isso não o torna de forma alguma um homem sagaz. Só faz com que ele seja um perigo para as mulheres mais ingênuas.

Ronnie sorriu.

— E você não é ingênua...

— De forma alguma. — Eliza levantou o queixo.

— Vejo bem. Sabe mais o que vejo?

Lady Eliza pensou por alguns segundos. Ela imaginou que Ronnie continuaria a sequencia de comentários naquele tom, por isso resignou-se a dar de ombros. Veronica tentou ser discreta, inclinando levemente a cabeça em direção à esquerda delas, onde lord Crosby e lord Morley caminhavam entre os canteiros. Liz ficou boquiaberta. Ronnie só poderia ser mesmo uma bruxa.

— E é só mencionar o nome de Belzebu que ele é invocado... — Eliza comentou com visível desgosto.

Ronnie a puxou, tirando-a do caminho na próxima entrada e escondendo as duas atrás de uma árvore, que certamente não conseguiria oculta-las por completo. Eliza cruzou os braços e respirou fundo, prevendo a ação mirabolante que estava por vir. Sim, claro. Lady Veronica não perderia a oportunidade fazer algo que certamente se arrependeria depois — e é claro que forçaria Eliza a acompanha-la.

A menor moveu-se, tentando voltar para a trilha e seguir caminho em direção à propriedade. Veronica a segurou.

— Tive uma ideia... — Ronnie sussurrou com visível entusiasmo.

Eliza quis chorar.

— Diga-me que sua ideia é voltar para o salão, por favor.

— Precisamos escutar o que eles estão falando.

— Eu apenas faria isso caso fosse uma espiã da coroa e estivesse sendo paga para espioná-los — lady Eliza manteve o tom de voz normal, sem se preocupar com a aproximação dos homens — Ronnie Besset, você está louca? Não me importo com o que eles dizem.

— Ah, mas eu definitivamente me importo! — Ronnie inclinou-se, tentando vê-los — Imagine se estão falando de mim? Imagine se estão falando de nós?

Lady Eliza fez uma careta.

— Imagino que eles tenham tópicos melhores, querida.

— Sim, sim... — Ronnie deu pulinhos — Está escuro, eles devem achar que estão sozinhos, consequentemente terão uma conversa particular. Você nunca quis saber sobre o que homens falam nessas conversas?

— Eu tenho uma vaga ideia...

— Eliza. — Ronnie insistiu — Vamos, por favor... Ou você não quer ouvir aquilo que sempre nos proibiram? Você é solteira, não uma puritana, eu sei disso. Consigo ver em seus olhos que você é tão curiosa quanto eu.

Eliza suspirou. Eles poderiam estar falando sobre qualquer coisa. Se ela estava certa — e sempre estava — os dois se conheciam há mais quinze anos, desde Eton. Era uma amizade antiga, ainda mais antiga do que a dela com Ronnie, Bridget ou Samantha. Eles poderiam eventualmente discutir detalhes sobre como era estar com uma mulher, mas não seria uma surpresa se eles estivessem falando sobre, não sei, um jogo inacabado de cricket em 1823.

Mesmo assim algo havia a instigado. Talvez fosse o olhar de Ronnie, talvez a sensação de estar tão afastada de todos, talvez o simples fato de ser ele. Eliza decidiu esquecer toda sua sensatez por pelo menos alguns instantes e concordou com Ronnie, decidindo segui-la. A mais alta as guiou entre o breu das extremidades do jardim, preocupando-se em não ser vista e não tropeçar, já que não era possível visualizar muita coisa. Elas acomodaram-se perto de um arbusto, bem na curva que eles certamente fariam caso quisessem retornar para o salão.

Lady Veronica teve que se abaixar. Eliza nem tanto.

— E se eles nos virem? — Liz indagou em um sussurro.

Ronnie pensou por alguns segundos antes de emitir um som estranho.

Uuuuh-uh uhu.

Eliza se arrependeu profundamente de ter deixado Samantha ir com Bridget na busca por Charles Farsnworth. Por Deus, poderia ser ela buscando o loirinho. Se a Srta. Duncan tivesse sobrado como companhia para Ronnie ela certamente não seria capaz de fazer Samantha passar por isso.

Eliza, por outro lado, sempre sofria pela mente audaciosa de Besset.

— Ronnie. — Ela disse tentando manter a calma — O que é uuuuh-uh uh?

Ronnie olhou para Eliza como se a resposta fosse óbvia.

— O som da coruja, duh.

Lady Eliza riu em desespero.

— Compreendo. Se lord Morley ou lord Crosby nos virem nós fingiremos que somos corujas...

Ronnie levantou uma sobrancelha.

— Pense em algo melhor ou reze para que eles não nos vejam.

Se Eliza fosse rezar teria que ser em silêncio, pois eles já se aproximavam. Com o tempo a voz dos homens ficou mais nítida. Elas ficaram em silêncio absoluto, quase prendendo a respiração e prestando atenção total em cada ação ou palavra deles. Se o Senhor permitisse que elas não fossem pegas ao menos seria uma noite e tanto. Os pés de Eliza estavam até inquietos com o entusiasmo de desvendar Frederick Morley melhor. Certamente ele seria diferente do que ela conhecia quando estava sozinho com os amigos. Com lady Eliza, Frederick era uma mistura de prepotência com cordialidade. Com Crosby, Fredrick provavelmente seria... Bem, Frederick.

— ...simplesmente não entendo, Crosby. Essa mulher é peculiarmente insana. E mesmo assim, não sei, parece que sempre, de uma forma ou de outra, nós acabamos nos trombando.

Era a voz de Frederick. Eliza tinha certeza. Ela conseguiu parar os pés, permanecendo mais silenciosa ainda e dando total atenção a ele. De quem ele estava falando? Com quem mais ele acaba sempre cruzando o caminho sem querer?

Elas se sentaram, bem próximas e encolhidas.

— Destino? — Era a voz de Aaron. Ronnie sorriu involuntariamente.

— Não. — Morley respondeu com sua típica falta de tato.

— Além de que você tem experiência com mulheres insanas. Lembra-se de Paloma?

Eliza e Ronnie se entreolharam com um sorriso. Touché! Eles provavelmente revelariam detalhes íntimos. Quem seria Paloma? Uma de suas amantes, Eliza presumiu. Nesse momento ela sentiu uma onda indecifrável percorrendo seu corpo e fazendo encolher-se levemente. Amante. Quantas ele deve ter tido? E será que ela era apenas uma amante mesmo ou mais do que isso? Afinal, se Crosby fazia questão de recordá-la...

Ronnie tocou levemente os ombros de Eliza e perguntou se amiga estava bem com o olhar. Liz concordou com a cabeça. Apenas havia se perdido nos próprios pensamentos. Isso estava acontecendo com mais frequência do que ela gostaria.

— Crosby, a última coisa que eu desejo é me lembrar de uma espanhola insana agora. — Frederick resmungou — Na verdade, não gostaria de me lembrar de mulher alguma. Não quero correr o risco de ter outro maldito sonho.

— Você disse que foi bom.

— Mas foi com ela.

Eliza comprimiu os lábios. Ela quem?

— Isso significa que você tem des... — Crosby se interrompeu brutamente. Eliza quis se uma mosquinha para poder ver o que estava acontecendo do outro lado do arbusto, mas olhar seria muito arriscado. — Aquele é o Sr. Paine?

Lady Ronnie abriu a boca. Eliza teve que se atirar acima dela para conseguir calá-la. Aquilo era absurdamente improvável. Ás vezes lady Eliza acreditava em reencarnação, pois a série de acontecimentos absurdos que aconteciam em sua vida precisavam de uma explicação mística, como o carma. Seu carma, por exemplo, era tampar a boca de Veronica Besset no jardim dos viscondes Backford em um uma sexta-feira à noite enquanto os três homens que consumiam seus pensamentos nas últimas semanas conversavam bem ali.

— Sim, — Morley concordou — boa sorte.

— Ele parece irritado.

— Você beijou a noiva dele, canalha. É claro que ele está irritado.

Ronnie franziu o cenho. Ela não contou nada para Reynard.

— Lord Morley. — Ouviu-se a voz do Sr. Paine. Rapidamente ela se tornou mais amarga — Lord Crosby.

Os homens aparentemente fizeram uma mesura.

— Perdoe-me a indelicadeza, lord Morley, mas eu gostaria de conversar com lord Crosby em particular. É um assunto pessoal.

— Boa sorte, Crosby. — Frederick riu.

Viu-se pavor nos olhos de Ronnie.

— Eu não contei para Reynard. E se Crosby disser alguma coisa... — Veronica balbuciou bem baixinho. Eliza levou à mão aos lábios, pedindo silêncio — Eliza, fique aqui um pouco. Terei que interrompê-los, mas não se preocupe. Não a dedurarei. Tirarei os homens daqui, contornarei a situação e logo depois você volta para o salão. Certo?

— Tem certeza, Ronnie? — Liz sussurrou.

Ela assentiu.

— Toda certeza do mundo. Conversaremos depois.

— Boa sorte... — Eliza sussurrou.

Ronnie levantou. Ela emitiu um grunhido estranho e saiu cambaleando. Os homens calaram-se no mesmo instante e houve um burburinho imediato de perguntas e espanto. Lady Veronica, por sorte, era uma ótima atriz. Sua história foi que estava andando pelos jardins com lady Eliza quando, pela escuridão, não viu um galho no chão e tropeçou. Eliza tinha ido chamar ajuda, mas Ronnie percebeu que não havia se machucado e levantou. Por coincidência, os rapazes estavam ali.

Reynard aproximou-se, preocupado. Ele ofereceu-se como apoio para a lady, disse que a levaria no colo para o salão e até quis ver seu pé, mas Ronnie negou categoricamente dizendo que estava melhor.

— Porém eu adoraria que todos vocês me acompanhassem até lá. Podemos conversar enquanto isso. Não nos vemos há tanto tempo e há tanta coisa acontecendo em Londres. Além de que seria inadequado se eu aparecesse com um cavalheiro, mas com três...

— Ninguém vai vê-los. Já que você está machucada é melhor entrar por aquela lateral, onde há um corredor praticamente vazio. O caminho é bem menor. — Frederick disse — Tenho certeza que o Sr. Reynard e lord Crosby ficariam felizes em acompanha-la de qualquer maneira. A prima de Crosby estava em um dos bancos laterais e tenho certeza que se ainda estiver lá ela fará o favor de entrar com vocês e tornar tudo mais adequado.

Lady Ronnie assentiu cordialmente.

— E lord Morley? — pediu com um sorriso.

— Terminarei minha volta pelos jardins se não for incômodo. Gostaria de ver todas as flores. Afinal, nessa busca por uma esposa todo conhecimento sobre botânica é bem-vindo.

— Compreendo... — Ronnie murmurou — Sendo assim, cavalheiros?

Lord Crosby e o Sr. Paine postaram-se um de cada lado de Ronnie. Eliza queria muito ver a cena, mas não podia. Seria um momento impagável se ela não estivesse escondida atrás de um arbusto no meio da noite.

— Até mais, lord Morley! — Ouviu-se despedir.

— Até. — Frederick respondeu.

Ótimo. Agora as coisas estavam sobre controle. Ela esperaria mais alguns minutos ali, ao menos até que lord Morley se afastasse consideravelmente e sua saída fosse segura. Em seguida iria confirmar se não havia ninguém por perto e se poderia dirigir-se até a mesma entrada lateral sem ser vista. O bom é que lady Eliza não tinha medo de escuro ou de insetos. Com certeza havia algo se mexendo próximo dela, e, desde que não fosse uma cobra, um lagarto ou coisa parecida, ela ficaria bem. O ambiente era calmo, refrescante e agradável. Os jardins dos Backford dariam um ótimo acampamento. Talvez, quando eles fossem para Somerset, Eliza pudesse sugerir um dia para acampar. A sensação de dormir ao ar livre era impagável. As estrelas, a luz do luar, a brisa noturna que...

— Lady Eliza. — Mesmo no escuro foi perceptível que Frederick Morley estava sorrindo. Com a voz repleta de sarcasmo, ele continuou — Que surpresa agradável encontrá-la por aqui.

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