OS MISTÉRIOS DE ELIZA GUNNING...

By autoralotorino

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❝ Confiem em mim, leitores. 1832 será um bom ano. - Srta. Silewood. ❞ Lady Eliza Gunning não é nem de longe u... More

SINOPSE COMPLETA
DISCLAIMER
EPÍGRAFE
PRÓLOGO
CAPÍTULO I
CAPÍTULO II
CAPÍTULO III
CAPÍTULO V
CAPÍTULO VI
CAPÍTULO VII
CAPÍTULO VIII
CAPÍTULO IX
CAPÍTULO X
CAPÍTULO XI
CAPÍTULO XII
CAPÍTULO XIII
Capítulo sem título 18
CAPÍTULO XV
CAPÍTULO XVI
CAPÍTULO XVII
CAPÍTULO XVIII
CAPÍTULO XIX
C A P Í T U L O XX
C A P Í T U L O XXI
C A P Í T U L O XXII
C A P Í T U L O XXIII
C A P Í T U L O XXIV
C A P Í T U L O XXV
C A P Í T U L O XXVI
C A P Í T U L O XXVII
C A P Í T U L O XXVIII
C A P Í T U L O XXIX
C A P Í T U L O XXX
C A P Í T U L O XXXI
EPÍLOGO
Notas Finais + Amazon

CAPÍTULO IV

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By autoralotorino

Quanto ao baile confesso que minhas expectativas não estavam tão altas. O Sr. Henry Walker havia garantido mês passado que não faria qualquer propagando partidária lembrem-se que ele é um entusiasta ferrenho dos Whigsdurante os eventos. Esperei por muito tempo que ele quebrasse sua promessa, mas ele não o fez. Mulheres londrinas, devo dizer que esse é o tipo de homem que devem procurar. Honrado. E nem digo isso em razão de seu posicionamento político (quem seria eu para opinar, não é?), mas sim por seu dever com a palavra. Homens íntegros estão em falta em nossa sociedade há tempos.

Confesso que isso foi o que mais me chamou atenção. O resto dos convidados, entretanto, estava adorando as fofocas usais. Aparentemente lord Morley, marquês de Normanbury, foi visto dançando com várias jovens durante o baile. A primeira delas, entretanto, foi lady Veronica Besset (ou melhor, Ronnie como ela insiste em ser chamada). Pareceu que os dois mantiveram uma conversa agradável durante a valsa. Infelizmente a Srta. Kateryn Laurens e o Sr. Winston não tiveram momentos tão passivos. Quase ao final da festa eles tiveram uma discussão e o Sr. Laurens proibiu Winston de voltar a ver a filha. Esta autora não sabe o motivo da briga — e confesso que não me interessa muito —, mas gostei de ver o Sr. Laurens tomando posição. Este também é um bom exemplo de conduta honrada. Lembrem-se de que ele é viúvo, para quem por ventura se interessar, mas longe de mim querer criar uma coluna para casamentos.

Atualmente minha única ocupação é mantê-los informados, e de vez em quando, encaixar meus comentários ácidos que certamente não seria capaz de pronunciar em voz alta.

Srta. Silewood Stanley Journal, maio de 1832.

A Srta. Scales aproximou-se. Cassandra usava um vestido cor-de-rosa claro, sapatos de veludo branco e um laço cheio no topo da cabeça. Com seus cabelos claros, olhos azuis e lábios desenhados, ela pareceria adorável. Pareceria. Era quase humanamente impossível não estremecer com seu andar. Seus olhos estavam semicerrados, a sola do sapato ecoava no assoalho e ela estampava na boca o sorriso mais cínico que Frederick viu em anos.

Cassandra Scales era um caso perdido e ele não podia fazer nada em relação a isso.

— Ora, ora — Cassandra arqueou uma sobrancelha — parece que lord Morley apareceu no edital de Silewood. Não é uma honra?

— Sem dúvida... — resmungou — mas o que estamos fazendo aqui mesmo?

Cassandra deu de ombros. Sentou-se na única poltrona vaga e estendeu os pés para cima de uma sofisticada mesinha de apoio. Lady Kriss Evans abaixou-se ao seu lado, vistoriando o vestido da amiga com extremo cuidado, enquanto Cassandra parecia preocupada. Ruby Chesterfield e James Alberdeen não saíram do divã onde lord Crosby tentava apoiar-se. Aparentemente todos ali, exceto Frederick, sabiam qual era a extrema emergência que os forçou a reunirem-se em uma sala da casa dos Duncan durante o sarau. Lord Morley pairava ao lado deles, com os braços cruzados e roupas escuras, como uma sombra negra na imensidão de cores dos companheiros. Ele moveu a cabeça, afastando alguns fios escuros que insistiam em cobrir seus olhos.

— Encontrei! — Kriss sorriu — Aqui.

A morena apontou para um rasgo perto da barra do vestido de Cassandra. A Srta. Scales estreitou os olhos, tentou puxar o tecido para mais perto de si e por fim tirou uma bolsa abaixo do corpete que continha materiais de costura. Frederick observou a cena por alguns segundos para apenas depois expressar sua indignação.

— A sua emergência era um rasgo minúsculo no vestido?

Cassandra revirou os olhos.

— Não é minúsculo. Ele tem pelo menos cinco centímetros e se alguém pisar em cima pode ficar ainda maior. E eu não vou embora antes do fim do sarau.

— Como isso aconteceu, Cassandra?

A Srta. Chesterfield perguntou do divã. Não havia ânimo nenhum em sua voz, mas lord Morley tampouco achava que ela preferiria estar no salão escutando as Duncans tocarem. Elas não eram totalmente péssimas, mas Samantha conseguia desafinar todas as irmãs e primas. Além disso, as partituras pareciam ter sido entregues fora de ordem. Em um momento o violino estava tocando a sinfonia número cinco e uma página depois já estava na quarenta. Era tortuoso permanecer lá.

— Voltando ao assunto da Srta. Silewood... — A Srta. Scales iniciou — Ai! Ei, dê-me isto, Kriss. Você é uma péssima costureira. Eu mesma farei minha barra.

Lady Kriss levantou-se com um suspiro. Era uma moça atraente e de uma beleza única. Assim como os outros integrantes do pequeno grupo ele já há conhecia há alguns anos. Ela era neta de um comandante japonês com rota de exportações em Gênova. Na Itália ele conheceu uma mulher com quem teve uma graciosa filha italiana. Lord Evans havia se apaixonado por esta italiana mestiça há mais de trinta anos em Nápoles e os dois se casaram. Desse casamento originaram-se cinco crianças, sendo uma delas a bela Kriss Evans.

Kriss era bonita. Não gratuitamente era melhor amiga de Cassandra Scales e Ruby Chesterfield. Tinha longos cabelos escuros e lisos, olhos negros e levemente puxados como os do avô, pele clara, mas com fundo quente, e seu corpo grácil assemelhava-se a uma escultura renascentista. E, assim como as fiéis amigas, havia uma imensidão de admiradores aos seus pés.

— Voltando ao assunto de Silewood... — Ruby murmurou do outro canto da sala — Cassandra, você falava sobre a fofoqueira.

— Certo... — Scales respondeu voltando-se para lord Morley — Ronnie Besset? Você está ciente do que está fazendo?

Frederick deu de ombros.

— A mãe dela é uma bruxa. — Cassandra garantiu.

Lord Morley riu. Eles não. Até Alberdeen e Crosby pareciam concordar com aquela afirmação.

— Ela está falando sério — Ruby garantiu — lady Besset matou o marido. Todos em Londres sabem disso.

— Com uma poção venenosa. — Kriss completou.

— Tomarei cuidado para não comer nada que lady Ronnie tocar — Frederick ironizou com um sorriso cínico estampado entre os lábios — eu agradeço a preocupação.

Cassandra revirou os olhos. Ela não perderia tempo com as ironias de lord Morley. Ajeitar a barra de seu vestido era mais importante do que qualquer coisa naquele momento. Ruby deu de ombros, desinteressada, mas Kriss ainda parecia estar considerando as palavras de Frederick como reais.

— Todo o cuidado é pouco, lord Morley.

— Deixe-o. — Cassandra murmurou fazendo um ponto — Ele deve ser resistente à magia.

— Sim, graças a uma poção que eu tomei.

— Engraçadinho.

— O que a Srta. Scales quer dizer... — Alberdeen tentou — É que certamente existem outras mulheres além de Ronnie nesses salões. O senhor está apaixonado por ela?

Frederick negou.

— Longe disso.

— É um posicionamento sensato, lord Morley, pois devo dizer que não acredito que Ronnie esteja apaixonada pelo senhor. — Cassandra disse finalizando sua costura.

— Paixão é para tolos.

Lord Crosby coçou a garganta e naquele instante Frederick arrependeu-se fortemente das palavras que havia pronunciado. Pensou em voltar atrás, mas já era tarde. Aaron aprumou-se, levantou-se e pairou a frente deles. Todos sabiam o que estava por vir. A Srta. Chesterfield até sentiu seus pelos eriçando-se.

— A paixão não para tolos, Morley. — Aaron respondeu com uma calma admirável. — A paixão é o fulgor da alma humana. A paixão é o que nos torna felizes. A paixão é o que nos faz vivos. A única coisa maior do que a paixão é o incomparável amor. Como Shakespeare outrora disse: o amor não prospera em corações que se amedrontam com as sombras. Ele é a única loucura de um sábio e a única sabedoria de um tolo. Eu vos digo, lord Morley. Quem vive sem amar, vive sem viver.

Nenhum dos quatro pareceu impressionado. Frederick nem fez questão de dizer qualquer coisa. Apenas olhou para Cassandra Scales esperando qual comentário ácido ela faria para o pobre lord Crosby.

— E você está casado há quantos anos mesmo? — ela arqueou uma sobrancelha.

— Amor não se mede por casamento, Srta. Scales. Você sabe muito bem disso. Feliz é o homem que se casa com a mulher que ama, mas nem sempre é possível. Enquanto não acho a dona de meu destino continuarei me dedicando aos prazeres de sua busca.

— Em outras palavras ele continuará sendo um libertino — Cassandra olhou para Kriss e Ruby, esclarecendo.

— Não penso como você, Crosby. E você sabe como ninguém. Porém respeito seus delírios amorosos. Talvez algum dia todos eles caiam por terra. — Frederick o fitou com desdém.

Crosby não disse nada. Ele jogou seus cabelos dourados para um lado e cruzou os braços. Lord Alberdeen pegou sua taça de vinho que havia deixado em uma das estantes.  Ruby Chesterfield levantou-se tomando Kriss em um dos braços e Cassandra em outro.

— Vamos... — Ruby resmungou — Antes que Crosby inicie outro discurso.

— Ainda encontrarei alguém que aprecie verdadeiramente minhas palavras — Aaron murmurou.

— Nós apreciamos, lord Crosby — Cassandra sorriu — longe de nós concordarmos com lord Morley. Se estamos solteiras é porque acreditamos que o amor seja algo necessário. Porém ás vezes suas declarações espirituosas ficam cansativas.

— Principalmente após minutos de tortura sonora com Samantha Duncan. — Kriss fez questão de acrescentar.

— Acredita que foi a amiga dela que pisou em meu vestido?

— Lady Eliza Gunning? — Alberdeen sugeriu.

— Não, não. A loirinha... — Cassandra estreitou os olhos tentando se lembrar — Hawkins. Bridget Hawkins, irmã do visconde.

Eles saíram da sala e adentraram em um estreito corredor que logo os levaria para o salão. Sim, finalmente a música havia acabado, mas agora surgiam os intermináveis murmúrios da confraternização social. Lord Morley tentaria ser breve. Cumprimentaria quem fosse necessário e se com sorte encontrasse lady Ronnie eles poderiam ter rápida conversa.

— Não tenho ideia de quem sejam essas pessoas que vocês tanto comentam — Frederick disse logo atrás das mulheres — saí de Londres por alguns anos e quando volto parece uma cidade nova.

— Ah, lord Morley. O senhor tem sorte de não conhecê-las. Silewood deveria comentar como elas são péssimas.  — Ruby respondeu abafando um risinho.

As outras duas riram também. Até mesmo lord Alberdeen esboçou um sorriso e lord Crosby certamente teria feito o mesmo se ainda não tivesse pensativo sobre seu último discurso. Frederick não disse mais nada. Ele não restringia suas relações sociais apenas a pessoas de moral extrema ou intelectuais, mas não gostava muito de comentários maldosos que pareciam ser frequentes por aqueles salões. Ele apreciava a companhia deles. Havia estudado com Alberdeen, conhecia Lady Kriss Evans há anos, encontrou a Srta. Scales na casa de campo dos Farnsworth em 1828 e até agora manteve uma boa relação com a Srta. Chesterfield, mas mesmo assim continuava negando qualquer tipo de fofoca ou vestígio de futilidade. Ele não se importava com a vida de ninguém e também desejava que não se importassem com a dele.

Eles entraram no salão, por fim. Estava cheio e as pessoas dividiam-se em pequenos grupos. Ao menos hoje Frederick não precisaria dançar, ele estaria livre para conversar livremente com as mulheres, principalmente com lady Veronica. Ronnie estava perto de uma das colunas, acompanhada de um homem alto e desconhecido e de uma jovem baixinha e até então desconhecida também. Lord Morley não conseguia ver as feições deles com clareza, mas tampouco fazia questão. Suas atenções estavam completamente focadas naqueles olhos castanhos bem a sua frente.

— Lady Ronnie Besset — lord Morley fez uma mesura.

— Lord Morley — Ronnie sorriu — esses são o Sr. Paine e lady Eliza Gunning.

Os dois também fizeram uma mesura. Frederick lentamente moveu seus olhos em direção aos indivíduos. Reynard Paine era um homem bem-apessoado, alto, de cabelos castanhos encaracolados e um tanto discreto. Em seus lábios havia um tímido sorriso que beirava a condescendia. A outra figura, no entanto, era ainda mais peculiar. Lady Eliza Gunning era baixinha, com imensos olhos azuis, cabelos negros e corpo bem marcado. Lord Morley tentou não reparar, mas acima de seus favorecidos seios brilhava uma solitária safira exatamente no tom vivaz de seus olhos.

Frederick ficou alguns segundos hipnotizado por aquela enigmática figura, sem ao menos conseguir explicar o porquê. Havia algo em seus olhos que ele não conseguia identificar. Um brilho, uma chama convidativa, um mistério a ser resolvido. Ficou surpreso ao ver olhos tão vibrantes como os dela. Os seus em contra partida eram escuros com algumas linhas esverdeadas. Ele notou suas sardas, sua tez pálida e apenas tocou-se de que estava prologando-se demais quando ela pigarreou. Lord Morley voltou à realidade.

— É um prazer conhecê-los. — Frederick curvou-se brevemente. — Apreciaram o sarau?

Lord Morley foi educado perguntando a todos, mas era óbvio que ele dirigia sua pergunta apenas a Ronnie. Seu olhar voltou-se para a mulher mais alta que o escutou com um simpático sorriso. Ela usava um vestido verde, tinha em mãos um copo com limonada e seus cabelos pareciam cintilar em um estranho tom violeta essa noite. Provavelmente era a iluminação — ou um feitiço de sua mãe, como os amigos acusariam.

— Foi, hum... — Ronnie estreitou os olhos procurando as palavras exatas — Inspirador.

— Inspirador?

— Sim, — ela assentiu — é a palavra correta para definir o sarau anual dos Duncans. Inclusive a caçula melhorou muito do ano passado para esse.

— A maioria das pessoas definiria como torturante, lady Ronnie — Frederick inclinou-se na direção dela. Veronica prendeu a respiração —, mas acredito mais fielmente em seu julgamento do que de qualquer outra pessoa aqui. Suas palavras são um documento.

Ela o fitou com os olhos em interrogação. Ronnie não compreendeu muito bem a conduta de lord Morley. Estaria ele tentando flertar? Ela gostaria de acreditar que não, pois não conseguia se lembrar de algum momento em que havia dado esta liberdade para Frederick. Ela sorriu novamente, endireitou a postura e estava pronta para dizer algo quando uma voz já esquecida a interrompeu. Lady Eliza.

— Se me permite dizer, lord Morley, a maioria das pessoas presentes não tem o conhecimento musical necessário para fazer um julgamento do talento das senhoritas. Torturante para mim é escutar leigos em música falando sobre o que não sabem.

Lord Morley voltou-se lentamente para Eliza. Ela mantinha uma expressão séria, mas não zangada. Os olhos estavam semicerrados, os lábios exprimidos e suas sobrancelhas estavam levemente arqueadas, como se ela esperasse com expectativa a resposta de Morley. Não decepcionando uma dama, Frederick sorriu.

— E milady considera-se detentora do conhecimento musical necessário? — indagou, deixando a ironia pairar entre eles. 

Foi o suficiente para acender o gênio de Eliza.

— Não, lord Morley. Tenho total consciência de que sou uma leiga no assunto, porém em momento algum fiz qualquer julgamento sobre o sarau. Como convidada cumpri com minha única função de apenas aprecia-lo.

— Convidados não tem direito a expressar a opinião?

— Tem direito a expressar a opinião, mas não de coloca-las como uma verdade irrefutável. — Respondeu — Minha opinião é de que morango é a melhor fruta, porém infelizmente não posso usar minha afirmação como base para uma verdade inquestionável. Se milorde gosta de mirtilos, então que os coma.

— Alguma dessas garotas é sua amiga, lady Eliza?

— Samantha Duncan. Há vários anos.

Frederick riu, voltando-se novamente para o seu objetivo: Ronnie Besset. Ele não perderia tempo com defesas pessoais de lady Eliza, considerando que seu fervor era ocasionado justamente por seu sentimento de amizade em relação a Srta. Samantha Duncan. Se elas não fossem amigas certamente a filha do conde seria capaz de concordar que os minutos que se passaram não poderiam ser classificados como nada além de uma tortura auditiva.

Veronica escutava a conversa pacientemente. Ela brincava com o liquido em seu copo, não se importando em ser ou não o centro das atenções. Quando Frederick virou-se novamente em sua direção ela sorriu. Deu um passo para o lado, aproximando-se mais ainda do silencioso Sr. Paine. Lord Morley permaneceu simpático, ao menos até Ronnie encaminhar as mãos em direção a Reynard e entrelaçar suas mãos. Ela sorriu.

— Não sei se lord Morley sabe, mas o Sr. Paine e eu estamos noivos.

Frederick piscou algumas vezes. Aquele era definitivamente um detalhe importante. Olhou para os lados, tentando flagrar alguém que pudesse dizer que aquilo era uma brincadeira, mas a única coisa que viu foi um sorriso zombeteiro surgindo nos lábios de lady Eliza. Como ninguém havia o avisado? Se as fofocas corriam rápido em Londres porque justamente essa não correu? Ele havia realmente perdido seu tempo alimentando expectativas para um casamento aparentemente impossível? Era completamente injusto. 

Lord Morley tentou parecer seguro, como se aquelas duras palavras de Ronnie não tivessem o afetado, mas quando foi pronunciar sua fatídica frase sua voz saiu vacilante.

— D-Desde quando?

Ah... — Ronnie olhou para Reynard com um sorriso apaixonado — Há apenas alguns dias. Porém todos sabiam que cedo ou tarde iriamos oficializar.

— Era nosso destino. — Paine assentiu.

— Eles estão apaixonados, lord Morley. — Lady Eliza disse serenamente, mas ele desconfiou que houvesse vestígios de uma provocação em sua voz.

Frederick estava boquiaberto. Os dois pareciam tão distintos que lord Morley dificilmente imaginaria que eles estavam juntos. A única coisa que tornava inegável a ligação deles não era a aliança, mas sim o sorriso. O olhar. Os dois estavam contaminados pela valorizada paixão no qual lord Crosby tanto falava. Seus olhos brilhavam, pareciam penetrar um na alma do outro, e em seus lábios havia sorrisos de felicidade genuína. Frederick não acreditava no amor, porém tampouco queria trazer infelicidade a alguém. Se Ronnie Besset estava comprometida — e apaixonadinha — ele não insistiria na relação. O cortejo estava acabado antes mesmo de começar.

Hum, sendo assim parabéns para os noivos. Que o casamento de vocês provenha e...  — blá blá blá? — tudo mais. Eu devo...

— Boa noite a todos!

Tarde demais. Sua rota de fuga foi interrompida por Aaron Crosby. O aspirante-poeta havia se aproximado sorrateiramente até o pequeno grupo. Agora ele fazia uma mesura, cumprimentava individualmente cada uma das damas — como Frederick foi incapaz de fazer — e sorriu para todos do grupo. Aparentemente eles gostaram da nova companhia.

— Conversando muito? — Crosby perguntou dirigindo-se especificamente a Morley.

Frederick deu de ombros.

— Na verdade eu já estava em retirada. Tenho certeza de que a Srta. Scales está nos procurando, lord Crosby.

Apenas com a mínima menção do nome de Cassandra, Eliza inquietou-se. Provavelmente era uma das várias garotas que faziam a legião contra Cassandra, Ruby e Kriss. Lord Morley não compreendia exatamente o motivo da repulsão, já que considerava as três completamente agradáveis aos olhos públicos, mas imaginava que era uma questão de rivalidade. A mãe certa vez havia dito que mulheres têm tendências a rivalizarem todas as relações sociais entre elas. Se lady Eliza não era muito popular, certamente culpava as que eram por seu fracasso.

— Não, não — Aaron estreitou os olhos — Cassandra acabou de seguir o caminho para a outra sala.

— Fugindo de você? — Frederick rangeu os dentes.

— Eu estava completando meu discurso anterior sobre amor e paixão quando ela disse que viu lady Pumbley no cômodo ao lado e deveria cumprimenta-la. — Aaron esclareceu — Eu nunca impediria um encontro de amigas.

— Tenho certeza de que lady Pumbley está na Escócia... — Eliza comentou.

Ignorada. Perfeito.

— Discurso sobre amor e paixão, lord Crosby? — os olhos de Ronnie brilharam.

Frederick implorou para Deus não permitir que Crosby começasse de novo. Aaron, contrariando a vontade divina, tirou do bolso um livro de sonetos e abriu exatamente em uma página marcada. Ninguém fazia objeção alguma — mas eles tampouco tinham consciência do ponto que Crosby poderia chegar se o deixassem.

— Eu iria citar o Soneto 116 de Shakespeare. Penso que ele é uma boa expressão de meus pensamentos particulares a respeito do amor e do amar, pois...

Ele foi interrompido. A Sra. Duncan estava ao palco, fazendo seu discurso de agradecimento. Suas filhas estavam alinhadas atrás dela. Samantha — a ruim — era aparentemente a mais velha. Deveria ter em torno de vinte a vinte e dois anos. Se ela continuava solteira com essa idade sua teoria sobre o grupo de lady Eliza não ser o mais popular acabava de tornar-se verdadeira. Por alguma razão ninguém estava disposto a desposá-las. Ele tampouco fazia questão.

A senhora pediu para que todos os convidados se dirigissem até a outra sala onde seriam servidos alguns pratos especiais. Frederick compreendeu a deixa — e o tumulto — como a oportunidade exata para tirar lord Crosby dali. Agarrou-o pelo braço e o arrastou para longe do grupo. Aaron resmungou, afastou com brutalidade as mãos de Frederick, mas não estava zangado. Estava frustrado.

— Qual seu problema?!

— Lady Veronica está eliminada de minha lista de potenciais pretendentes.

— Está? — lord Crosby estreitou as sobrancelhas.

— Ela está noiva, Crosby. Noiva do homem que estava bem ao lado dela.

— Ah, sim. O Sr. Paine.

Frederick cessou bruscamente o andar.

— Crosby... — rangeu os dentes — você sabia disso?

— Não seja tolo, Morley. É claro que não. — Esclareceu. Os dois dirigiram-se até uma mesa com sanduíches de atum. — Mas eu sabia que o Sr. Paine estava interessado nela. Só não achei que eles fossem realmente levar isso a sério. Os rumores sobre a família dela afastam muitos homens. Não a mim, claro. Fiquei admirado pela beleza dela. Vê-la de perto nem se compara com fita-la de longe nos salões.

— Você acha isso só porque ela se interessou por seus delírios.

Lord Morley não quis sanduíche algum. Serviu-se com vinho.

— Não, não. Sem duvida interessar-se por esses temas torna a alma dela bela, mas a beleza física é a parte. Notei isso quando me aproximei — disse — o bom é que você não vai se casar com ela. Seria difícil para eu lidar com ela tão próxima a mim.

— Crosby, se eu arrumar uma esposa e você encostar um dedo nela, juro que o matarei. Encontre uma para você. Está em Londres para que? Para ser bajulado por todas, mas nunca achar alguém para se casar?

Frederick estava sendo verdadeiro. Aaron também precisava se casar, mas dificilmente se apaixonava por uma mulher, a atração à primeira vista por Ronnie havia sido algo inusitado. Geralmente ele gostava de atrizes, de vez em quando uma cantora, mas raramente de uma mulher da sociedade. As moças o bajulavam com frequência. Adoravam seu tom dourado de cabelo, seu corpo atlético e toda aquela sensibilidade que cativava, mas Crosby as usava para aumentar seu ego. Não se casaria com nenhuma.

— Estou em Londres a pedidos de minha mãe, mas também porque gosto. Nem todos são antissociais como você, Morley. Alguns gostam de se divertir.

— Eu gosto de me divertir. Muito. Mas não vejo tanta diversão por aqui.

— Pois o senhor está levando isso como um dever. Apenas relaxe. Se ficar calmo os bailes e saraus serão mais prazerosos e será mais fácil encontrar a pessoa certa. Garanto que Ronnie é a primeira de muitas decepções. A maior parte decepciona quando abre a boca, entretanto.

Lady Kriss Evans apareceu. Ruby veio logo atrás, trazendo consigo um ramalhete de rosas que havia conseguido com algum admirador. Cassandra não estava junto, mas ela provavelmente estava com as irmãs — que também haviam comparecido ao sarau — ou conversando com lady Pumbley nos arredores. Alberdeen estava à mesa ao lado. Em geral grande parte dos convidados estava por perto. Era um tumulto de vestidos, vozes e esbarrões.

— Eu só quero ver o que a Srta. Silewood terá a dizer sobre isso. — Kriss comentou.

Ruby tocou em um sanduíche, mas desistiu. Ela não queria ficar com mau-hálito.

— Nada. Silewood raramente critica as debutantes.

— Silewood é uma tola. — Frederick disse. Todos ao redor se calaram.

Aparentemente esse era o efeito que a menção a Silewood causava nas pessoas. Atenção. Eles tinham receio, curiosidade ou admiração por aquela figura mítica da sociedade? Morley não conseguia especificar. Ele aceitou de bom grado a posição central que havia sido colocado e continuou com seu comentário.

— É uma covarde, melhor dizendo. Ou um. Não sabemos nem se é um homem ou uma mulher. A única coisa que sabemos é que essa pessoa é age com covardia se escondendo atrás de um jornal sério e até então íntegro como o Stanley para destilar comentários fúteis sobre a vida de terceiros. Ás vezes ela adiciona questionamentos morais ou políticos, mas é falha. É falha apenas por uma questão...

Ele continuou. Todos — inclusive os lacaios — haviam parado o que estavam fazendo para escutá-lo. Ninguém ousava respirar, murmurar ou se mover. Lord Morley era o detentor de tudo.

— É falha — continuou —, pois não tem a mínima moral para criticar quem quer que seja. Como poderíamos levar a sério uma pessoa que nem ao menos tem coragem de se identificar? Conhecemos tantos homens íntegros que morreram por seus ideais, mas a Srta. Silewood é uma covarde que ama comentar sobre a vida dos outros, mas não diz nada sobre a própria. Essa é minha opinião — finalizou — a Srta. Silewood é apenas a síntese de toda a hipocrisia londrina, e por isso é desprezível.

Calou-se.

E todo o resto voltou a falar. Foi um murmúrio crescente que foi aumentando, aumentando, aumentando e tomando proporções inimagináveis. Até mesmo Cassandra e Alberdeen surgiram das sombras para aproximarem-se do grupo. Todos estavam simplesmente abismados. Olhavam para lord Morley — que calmamente tomava seu vinho — como se ele tivesse cometido um crime inafiançável.

Frederick deu de ombros. Não entendia a razão de todo aquele alvoroço.

— O que diabos eu fiz demais? — perguntou para ninguém em particular.

Cassandra assombrou, com os olhos arregalados e mãos trêmulas.

— Acabou de assinar a sua certidão de óbito.

•••

E é claro que eu ia começar a semana com o primeiro encontro desses dois ❤️

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