Ensina-me amar

By alinemoretho

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Sarah Rodrigues era uma bela e jovem garota criada sobre a dura disciplina de seu pai e rígida supervisão de... More

Bem-vindo@:
Epígrafe
Prólogo
Um: Desamparada
Dois: Socorro
Três: Amizade
Quatro: Uma Chance
Cinco: Humilhação
Seis: Nova Vida
Sete: Boas-Vindas
Oito: Reencontro
Nove: Ele
Dez: Quebrada
Onze: Perdão?
Doze: Verdade
Treze: Bagunça
Quatorze: Reconciliação
Quinze: Medo
Dezesseis: Adaptação
Dezessete: Covarde
Dezoito: Sentimentos
Dezenove: Ciúmes
Vinte: Viagem
Vinte e Um: Pai
Vinte e Dois: Fé
Vinte e Três: Família
Vinte e Quatro: Sufoco
Vinte e Cinco: Retorno
Vinte e Seis: Confusão
Vinte e Sete: Temores
Vinte e Oito: Tormento
Vinte e Nove: Fuga
Trinta e Um: O Retorno
Trinta e Dois: Correção
Trinta e Três: Fazer o certo?
Trinta e Quatro: Temor
Trinta e Cinco: Voltar?
Trinta e Seis: Sujeição
Trinta e Sete: Aniversário
Trinta e Oito: Casar?
Trinta e Nove: Mãe
Quarenta: Padrinho
Quarenta e Um: Casamento
EPÍLOGO:
Agradecimentos

Trinta: Confissões

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By alinemoretho

Antes de começar saibam que: Minha heroína não é forte, não! Ela não é perfeita, nem madura, nem consegue vencer sozinha. Mas essa história não é sobre ela! É sobre alguém muito maior que ela, que mesmo na fraqueza dela, na imaturidade, e nos inúmeros erros e pecados, mostra-se grande, forte e poderoso! E é sobre o poder transformador do sangue do Cordeiro! Não espere ver superação, mas arrependimento e mudança de vida.

Boa leitura.

CAPÍTULO TRINTA: CONFISSÕES

Senti como se todo o sangue estivesse deixando meu corpo quando vi Coelho sair do automóvel. O semblante dele não era nada amigável. Na verdade, eu nunca o vi tão bravo como parecia estar naquele momento. Um calafrio percorreu meu corpo quando o analisei brevemente e notei o distintivo pendurado em seu peito e a arma no coldre na cintura.

— Você não vai me mandar pra cadeia, não é? — perguntei assustada enquanto meu amigo oficial ainda me encarava com aqueles olhos estreitos.

— Por quê? Você cometeu alguma injustiça que mereça punição? — ele questionou em tom grave e irônico, fazendo-me engolir em seco e, logo depois deu a volta no veículo e fez o favor de abrir a porta do passageiro, dando espaço para que eu entrasse com a bebê. — Deveria agradecer porque eu estou de férias, do contrário você agora estaria de algemas e voltaria pra casa de camburão. Agora entra logo na porcaria do carro, Sarah.

Aquela ameaça me causou desconforto, pois Josué não parecia estar para gracinhas.

— Tudo bem — murmurei e, como uma criminosa, sentei-me no banco com Mabel, sem conseguir encarar o homem autoritário ao meu lado. Ele fechou a porta e não voltou de imediato para o seu lugar. Enquanto isso, reparei no alvoroço que toda aquela cena causou entre os curiosos ao nosso redor e fiquei sem saber aonde enfiar minha cara. — Sua mãe está muito encrencada, filha — comentei com Mabel que soltou uma de suas gargalhadas inoportunas. — Obrigada pela sensibilidade.

Permaneci abraçada a minha ovelhinha, que certamente deveria ser a única a não estar me odiando naquele momento e acabei notando a demora Coelho em retornar. Quando procurei nos arredores, logo o vi parado extremamente tenso a alguns metros do veículo, talvez pensando. Por um instante seus olhos tristes encontraram os meus e, além de vergonha, fui inundada por culpa.

"Ah, Senhor! O erro foi meu, mas, por favor, derrame sua graça e permita que eles tenham misericórdia de mim e me perdoem" implorei voltando a sentir um aperto no peito.

A porta se abriu novamente, rompendo meus pensamentos e me dando um baita susto. Era Josué e, por algum motivo, ele não entrou logo de cara.

— Sim, eu as encontrei — eu o ouvi trocando informações com alguém no celular, obviamente sobre mim. — Estão bem, não se preocupe. — Ele fez uma pausa. — Aconteceu exatamente o que eu te falei. Aposto que se eu não tivesse chegado ela teria embarcado. Obviamente não pensou em nada. Ia passar fome e frio em algum outro lugar. — Aquelas palavras me atingiram como uma bala no peito. — Chegamos em uns quarenta minutos. Até mais.

Que vergonha! Como eu fui burra!

Josué finalmente entrou, colocou o cinto e, ainda parecendo tomado de raiva, alisou a própria face freneticamente. Por alguns segundos intermináveis eu só consegui ouvir as inspirações e expirações fortes e sentir o modo intenso com o qual eu era analisada. Meio minuto depois ele girou as chaves na ignição e deu inicio a viagem, sem falar um pio.

O silêncio sepulcral nos seguiu pelas rodovias vazias de Santa Fé e a cadaa minuto eu me sentia cada vez mais culpada e miserável. Eu queria acabar logo com aquilo. Queria que Josué falasse alguma coisa, qualquer coisa, e não me evitasse como estava fazendo, pois isso só me deixava mais temerosa quanto ao modo como seria recebida de volta.

Eu não aguentava mais aquela angustia me consumindo. Talvez devesse tomar a frente e mostrar meu arrependimento por ter fugido.

Virei-me para ele e, mesmo observando sua postura tensa e a cara fechada, decidi não me acovardar. 

— Você não vai falar nada? — perguntei temerosa e, como previ, não obtive resposta verbal alguma, antes Josué pisou no acelerador aumentando levemente a velocidade com a qual dirigia. — Por favor, diga algo, Coelho! — implorei aumentando o tom de voz.

Ele virou-se levemente para mim e tomei um susto quando o velocímetro começou a oscilar entre setenta e oitenta quilômetros por hora.

— O que você quer que eu diga? — ele questionou aumentando o tom e a gravidade da voz. — Que você agiu como uma tola ao tentar fugir mesmo sem ter aonde cair morta?

Oitenta, oitenta e cinco, noventa quilômetros por hora.

Meu coração já saía pela boca e eu me segurava a Mabel com mais força.

— Coelho, mais devagar, por favor...

— Que ideia fantástica a sua! — ironizou, sem ouvir meus pedidos de clemência e percebi a ira deixando suas bochechas vermelhas. — Pegou dinheiro do Victor e, sem levar nem uma mala ou, sei lá, um casaco, saiu com a menina sem avisar ninguém e foi direto para a rodoviária. O que raios você faria em outra cidade, Sarah? Iria levar sua filha para morar debaixo de uma ponte? Ia matar ela de frio só porque não passa de uma garota imatura, covarde e irresponsável? 

Noventa e três, noventa e sete, cem, cento e dez quilômetros por hora.

As lágrimas começaram a inundar meus olhos e o desespero tomou conta do meu corpo, fazendo-me respirar rapidamente.

— Por favor...

— Você foi egoísta, Sarah! Só pensou nos seus problemas! Não se importou em deixar todos feridos em prol do seu bem-estar em segurança — berrou, me interrompendo. — E não me diga que estava agindo como uma mãe em apuros, porque você não pensou duas vezes em colocar Mabel em risco!

A bebê começou a chorar em pânico e eu também, ambas sentíamos pavor.

— Pare! Você vai nos matar, Josué! — implorei e fechei meus olhos esperando pelo pior.

E então, graças a Deus, ele atendeu meu pedido e foi desacelerando aos poucos, fez uma curva e parou. Quando abri meus olhos outra vez reparei que estávamos estacionados em um acostamento. Coelho ainda segurava no volante e seu tórax expandia-se rapidamente.

— Perdão, eu não quis assustar vocês duas — ele pediu, mostrando-se muito arrependido pelo momento de surto.

Eu continuei em prantos e, ainda assim, precisei acalmar Maria, que permaneceu muito assustada por algum tempo.

— Sarah, eu passei dos limites e...

— Você está certo. Eu sou uma pessoa horrível, Coelho — admiti ainda um pouco arfante e atraí os olhos dele para mim. — A pior de todas...

Inspirei o ar algumas vezes e, ainda que assustada, declarei-me pronta para desabafar tudo quanto vinha carregando em meu peito. Antes de começar, orei ao Senhor para que Josué não se recusasse a me ouvir e pudesse me ajudar de alguma forma.

— Antes de engravidar da Mabel tudo era diferente — comecei com a voz hesitante. — Eu sempre tive do bom e do melhor. Desde muito pequena o cargo de princesa perfeita da casa era meu. Você deve saber que minha mãe morreu com um tumor no cérebro quando eu tinha uns três anos, então eu nem me lembro dela direito. Em decorrência disso eu me apeguei muito ao meu pai que sempre fez de tudo e participou de todos os momentos da minha vida, sem exceção.

Fiz uma pausa e massageei minha garganta tentando aliviar o incomodo sentido. Remexer no passado nunca era uma tarefa fácil, principalmente quando eu me empenhava para fugir do meu.

— A cumplicidade entre nós quatro era maravilhosa! Eu me lembro de chegar todos os dias da escola e passar a tarde brincando com o Davi e Jonas e suas aventuras idiotas de meninos, enquanto, é claro, esperava ansiosa pelo retorno de papai da igreja. Só ele tinha paciência de se sentar comigo, ouvir minhas histórias mirabolantes e ainda aceitar brincar comigo de boneca, contanto que depois eu ouvisse seus conselhos e o deixasse ler a bíblia comigo todo o santo dia. Nós éramos uma família boa, entende? Um time, como eles diziam. Havia três homens incríveis protegendo e cuidando de mim o tempo todo.

Sorri um pouco tendo a mente invadida por boas memórias da minha infância, mas meu coração ardia por pensar em como perdi tanto.

— Sempre me considerei uma criança esperta e, por vezes, assumia as tarefas domésticas igualmente distribuídas entre meus irmãos e eu, apenas para poder impressionar e ganhar o sorriso e o abraço de gratidão do meu herói. Eu queria ser a melhor sempre, sabe? Queria retribuir, porque papai era simplesmente maravilhoso. Sério! Ele me tratava como uma flor delicada, me ajudava com os deveres da escola, ia à todas às minhas apresentações comemorativas e nunca deixava meus irmãos me desrespeitarem em hipótese alguma. — Mirei o horizonte ao nosso redor. — Talvez ele me mimasse temendo que eu me sentisse deprimida sem a presença de uma mãe, compreende? Enfim, nós éramos extremamente próximos. Eu podia afirmar que tinha um melhor amigo de quem não escondia nada. E mesmo assim, eu...  Mesmo assim eu o machuquei tanto...

As lágrimas começaram a descer dos meus olhos sem minha permissão e eu tive dificuldades em transpor as grossas barreiras que vinha usando para me proteger de todo o julgamento. Contudo, observei Coelho ao lado e percebi misericórdia em seu semblante. Ele era um grande amigo e mostrou-se disposto a continuar ali comigo me apoiando, quando acariciou minhas costas. Sem dizer nada ele me deixou mais a vontade, tomando Mabel do meu colo. Inspirei e expirei profundamente até me acalmar novamente. Eu não perderia a oportunidade de extravasar tudo.

— Sabe, Josué, — funguei algumas vezes e sequei minhas bochechas com a gola da camiseta. — Minha adolescência foi difícil. Eu passei por tantas mudanças na mente e no corpo e me senti muito sozinha porque estava cercada de homens, que apesar de maravilhosos, não podiam me ajudar a entender como passar por tudo aquilo sem dificuldade.

— Eu imagino que deva ter sido fácil para nenhum de vocês — Josué comentou com pesar e abraçou Mabel, balançando suas pernas. 

— Sim, papai até tentou me dar apoio, mas acabou me assustando e eu acabei fugindo constrangida. Com isso, guardei muitas dúvidas e até me irritei com Deus por ter levado minha mãe. Ela certamente me entenderia e poderia me explicar tudo aquilo.

Suspirei e desci um pouco o vidro do carro para aliviar o calor provocado pela minha ansiedade e suspirei.

— Foi muito duro não poder contar com meu herói nessa época. Então, como qualquer jovem sem suporte, eu me fechei. Não queria mais compartilhar meus anseios com ninguém e também não aceitava ajuda. Só piorei depois disso, pois comecei a fazer amizades com quem meu pai desaprovava, me apaixonei constantemente e saía escondida para trocar saliva com garotos da escola que não prestavam. Por isso, com razão ele começou a tirar meus benefícios, me lembrando sempre que como cristã eu deveria ser exemplo. — Meu coração batia acelerado com toda aquela tensão. — E de melhor amigo, eu passei a vê-lo como um inimigo, porque odiava obedecê-lo e ser obrigada a acompanha-lo na igreja, não suportava ser taxada de careta e ser filha de pastor para mim acabou se tornando um castigo. Mesmo assim continuei vivendo como uma cristã de aparências. Quem me olhava, não imaginava quantas coisas terríveis se passavam em minha cabeça.

Lembrei-me das inúmeras brigas com meu pai e senti raiva por ter sido uma verdadeira idiota com ele. 

Encolhi e abracei minhas pernas contra o tronco.

— Eu fui me transformando em uma mentirosa e aproveitadora de mão cheia. Só fazia minhas tarefas domesticas quando queria alguma coisa em troca. Discutia com meus irmãos o tempo todo. Sentia vergonha de contar aos meus colegas que meu pai era um simples pastor e até dizia a mim mesma que quando completasse dezoito anos, eu sairia de casa, pois não aguentava mais ter o Sr. Rodrigues pegando no meu pé por tudo. — Repousei a cabeça em meus joelhos, sentindo uma grande repulsa de mim mesma. — Ainda revoltada, eu Ingressei na faculdade, acabei conhecendo o Victor, nós nos envolvemos e enfim... — Olhei para a bebê fazendo gracinhas no colo de seu tio. — Não houve nenhum de conto de fadas para mim.

Josué continuava prestando atenção a mim e tanto eu quanto ele, sabíamos que ainda havia mais para ser dito. Eu usei aqueles instantes em silêncio para refletir e organizar meus pensamentos, pois havia tomado a decisão de me expor completamente

— Eu me senti um lixo quando perdi a virgindade com o Vic — confessei e virei o rosto para encarar algum outro ponto. — Mesmo com a minha rebeldia, eu almejava me casar virgem com um homem crente. Engraçado, não é? Eu mesma não tinha um compromisso com Cristo e, do mesmo modo, queria um de seus filhos para me casar de branco, com toda a pureza. — Soltei uma risadinha irônica, que logo foi dissipada pelas memórias tristes. — Agora imagine como eu me senti quando aceitei passar a noite com meu namorado e perdi a coisa mais valiosa do mundo aos meus olhos. Eu me via como vaso bonito, mas quebrado, ou seja, perdi todo o meu valor...

Parei alguns instantes, só pensando em como aquela sensação de não ser digna era o meu pão de cada dia. Para mim, não havia diferença alguma entre o meu comportamento e os de uma prostituta.

— Eu quis me casar com Victor a todo custo porque pensava: “E agora? O que será se mim? Quem vai me querer assim suja e usada?”. Ele mesmo disse que não era cristão na época, então não entendeu porque ser e me manter virgem até o casamento era tão importante para mim. Obviamente, ele não quis e, por isso nós terminamos e eu fiquei perdida e devastada. — Mordi o lábio inferior com bastante força, tentando acabar com aquela agonia sem fim. — Além de me sentir podre e manchada para sempre, eu tinha medo constante, pois esperava o castigo de Deus a qualquer instante, afinal Ele nunca me perdoaria por ter feito aquilo.

Abaixei a cabeça e fechei os olhos por alguns instantes. Cada vez eu me aprofundava mais em minhas feridas e isso me trazia mais dor.

— Quando voltei para casa naquele dia, meu pai não me falou nada. Ele já sabia o que tinha acontecido e embora, não tenha expressado, ficou muito magoado comigo. Como eu podia viver com tudo aquilo? — Voltei a encarar Josué, visivelmente abalado com meus relatoa. — De uma hora para outra eu me vi sem pai e irmãos. Meu namorado me abandonou porque certamente não iria querer mais uma garota fácil, que cedeu aos seus caprichos como eu cedi. Meus amigos não queriam mais saber de mim e Deus, certamente deveria estar muito ocupado para pensar em uma pecadora. Nem orar antes de dormir eu conseguia, pois me via em um tribunal! Eu me fechei mais ainda e só queria morrer! 

— Oh, Sarah...

— Descobrir que eu estava grávida de Mabel foi a gota d’agua — continuei, interrompendo-o, pois ainda havia mais para ser dito. — Meu pai e eu já não nos falávamos direito, pois eu o evitava a todo custo. Eu tinha medo, pois só conseguindo imaginar quanta vergonha ele deveria sentir de mim por desonra-lo de todas as formas. Por isso, eu fugi quando tive a chance — confessei com grande culpa. — Mais do que querer manter minha filha segura, eu me sentia exausta de sentir aquele remorso e almejava paz, mesmo que isso custasse tudo para aqueles que cuidaram de mim. — Engoli em seco. — Eu afundei completamente, Coelho. Fiz muitas coisas erradas enquanto morava sozinha. Cheguei ao ponto de me desesperar e roubar o dinheiro de uma senhora de uma igreja pra quem prestei serviço, passando roupa e só não fui presa porque mesmo quando ela descobriu, resolveu ser misericordiosa porque eu estava grávida e só me pediu para devolver, o que eu fiz com muito remorso. Cada dia mais eu me afastava dos princípios do Senhor e acumulava mais fardos nas minhas costas.

Josué seguiu atento e com os olhos até um pouco marejados. Graças a Deus a raiva dele havia sido aplacada.  

— Um dia após eu ter dado a luz a minha filha, uma das enfermeiras veio checar meu estado e me pegou chorando muito. Ela perguntou do meu estado e, levada por todas aquelas emoções, eu contei a ela que tinha medo de Deus querer tomar minha filha porque fui desobediente e infiel e ela compartilhando sua fé, citou: “Se formos infiéis, ele permanece fiel; não pode negar-se a si mesmo”. 2 Timóteo 2:13. Eu aceitei a Cristo quando ela perguntou e tive grande consolo por muito tempo, mas, eu não sei como, minhas feridas da alma continuaram abertas e o fardo não diminuiu completamente, mesmo que eu lesse a bíblia, fosse a igreja, orasse, eu não O sentia. E ainda não sei se o sinto. — Senti um desespero tomando conta do meu coração. — E como eu poderia senti-Lo se faço tudo errado? Eu não mereço o amor e o cuidado de ninguém! E também nunca estarei á altura de alguém como Victor, que já deixou claro não querer nada comigo. E eu o entendo! Quem em sã consciência iria desejar se casar com uma mulher suja e usada como eu? Sou apenas uma mãe solteira que não tem nada de bom a oferecer a qualquer um! Não mereço nada... Não...

Rompi em um choro copioso que me impediu de prosseguir com meus relatos. Eu urrei enquanto as lágrimas jorravam em resposta dor dilacerante cortando meu coração cheio de grande culpa. Solucei e prossegui com meu pranto alto, deixando a menina ferida dentro de mim se libertar e mostrar todos os seus machucados .

Josué, como um verdadeiro amigo, se aproximou devagar e com o braço livre me trouxe para perto e me abraçou, permitindo que eu desmoronasse completamente. Deitei a cabeça no peitoral dele e durante alguns minutos tudo o que se podia ouvir naquele carro era o barulho do meu lamento de miséria.

— Lembra-se de Jacó? Meu irmão mais velho que vivia implicando comigo? Então esse Jacó ganhou um cachorro em seu aniversário de dez anos — Josué começou falando mansamente, me fazendo estranhar a entrada repentina no tema. — Eu sempre quis um cachorro. Sempre! Era o meu sonho. E mesmo assim meu pai  resolveu presentar e deixar aquele tonto responsável pelo Aroldo, que obviamente gostava muito mais de mim. Tudo porque Jacó era o mais velho. — Observei quando ele sorriu, mas continuei sem compreender. — Bem, certo dia eu fui comprar pão na padaria da esquina, deixei o portão aberto e o Aroldo fugiu. Eu até tentei procurar, mas quando não o encontrei, resolvi ficar calado. Meu irmão ficou arrasado e ainda tomou uma surra quando meu pai chegou do trabalho. E eu, cara de pau, assisti tudo sem confessar meu pecado. Pra piorar Jacó envolveu todos os nossos colegas da rua em uma busca e acabou caindo e quebrando a perna. — Ele deu uma risadinha fraca. — Carreguei aquela culpa durante meses e no Natal eu ouvi minha tia Socorro comentando com minha mãe sobre como Deus odiava aqueles que eram hipócritas e escondiam o seu pecado e então, movido pelo arrependimento, eu não aguentei mais e resolvi confessar diante toda a minha grande família durante a ceia que eu deixei o pobre Aroldo fugir e pedi perdão. Claro que não escapei dos cascudos, mas fiz a coisa certa.

Eu me afastei dele e cruzei os braços, indignada com a falta de bom senso de Josué. Eu estava abrindo meu coração e ele queria falar do tal cão Aroldo.

— Você está de brincadeira, Josué? — rebati com a voz rouca. — Isso não é nada comparado ao que eu fiz, você não percebe?

— Aí é que você se engana, Sarah. — Ele me olhou com seriedade. — O pecado pode ter consequências diferentes, mas ofendem a Deus da mesma maneira. O Senhor é Santo e qualquer transgressão á sua Lei, igualmente perfeita, é passível de condenação. Sabe o que isso significa?

Balancei a cabeça negativamente, mas não era a primeira vez que eu ouvia sobre aquilo, então já tinha uma ideia.

— Nós todos somos condenados ao inferno. Todos, sem exceção, pecaram e estão separados do Senhor. Seja pela mentira, pela lascívia, pelo adultério, somos todos como trapos sujos diante dos olhos do Santo dos Santos. Não podemos mudar essa condição, pois somos miseráveis, traidores e maus. O mal está no nosso DNA — apontou com um ar de tristeza. — Não é possível mudar essa condição sem ajuda e a palavra de Deus em Romanos 6:23 nos diz que “o salário do pecado é a morte”. E de um jeito ou outro alguém tinha que morrer e receber o castigo merecido por tanta podridão. Então, eu e você não somos dignos. Merecíamos o inferno e o julgamento eterno.

Olhei para baixo e deixei meus ombros caírem, sentindo-me mal por confirmar minhas suspeitas, todo meu sofrimento era apenas uma paga por todo mal cometido por minhas mãos. Sem Deus, meu destino não seria outro senão o lago de fogo e enxofre.

— Tudo estaria perdido se Jesus não tivesse vindo. Ele é o perfeito Filho de Deus. O único que cumpriu todas as exigências do Senhor. Aquele que foi tentado em tudo, mas diferente de nós jamais pecou. — Josué segurou uma de minhas mãos. — A ira de Deus só foi aplacada quando o sangue de seu Filho foi derramada na cruz. Através de Jesus, Deus pôde se reconciliar conosco. Ele bebeu o amargo cálice da irá de Deus para que nós pudéssemos beber água viva. Isso, Sarah, é amor! Um amor perfeito e incondicional!

— Mas, eu não mereço tanto amor...

— Não e eu também não — ele respondeu animado. — Mas nisso consistiu o amor do Senhor, em entregar a si mesmo em favor dos seus. Não há nada, absolutamente nada, que você poderia fazer para alcançar o favor de Deus e isso é graça, Rodrigues!

Aquelas palavras foram como água gelada no deserto da minha alma. Eu começava a perceber muitas coisas que não faziam sentido na minha cabeça.

— Quando olhamos para nós mesmos, não encontramos nada de digno. Pelo contrário, tanta miséria e podridão apenas nos esmaga e acaba com toda a nossa esperança, mas — ele fez uma pausa, suspirou e sorriu — ponha seus olhos na cruz, creia no sacrifício de Jesus e haverá amor, alegria, paz e liberdade de todos os seus fardos. Toda a condenação, tal como os seus pecados serão lançados no mar do esquecimento. — Ele me olhou com grande carinho. — A graça maravilhosa de Jesus pode não mudar o seu passado, mas te dará a chance de começar de novo e fazer aquilo que agrada ao Pai. E mesmo quando pecar, porque você vai, o Senhor, através da cruz de Cristo te perdoará.

Naquele instante eu fechei meus olhos com força e senti um alivio indescritível. A culpa estava indo embora, Cristo estava tomando seu lugar, como o Senhor da minha vida e também derramando seu bálsamo sobre minha alma ferida.

— Venha cá! Mabel e eu vamos orar por você — Coelho se aproximou e passou seu braço ao redor dos meus ombros e começou a interceder, pedindo que a graça do Senhor fosse derramada sobre mim, e verdadeiramente eu viesse a dar frutos para o reino de Deus, vivendo plenamente liberta do meu passado, confiante que o Filho de Deus poderia fazer todas as coisas novas, restaurando aquilo que o meu pecado destruiu.

Quando o garoto findou a oração novas lágrimas vieram, mas dessa vez, eram de alegria. Depois de tanto sofrimento, eu finalmente me sentia pronta para abandonar a antiga Sarah e meu primeiro passo seria voltar àquele contra quem tanto pequei.

— Me leve até meu pai — eu pedi decidida e sabia que aquilo seria o certo a se fazer.

Coelho sorriu para mim, prestou uma continência e entregou-me Mabel quase que no mesmo segundo.

Apesar da viagem ter sido um pouco longa e silenciosa, não houveram intercorrências no caminho. Senti a barriga doer a cada mísero quilometro e isso só piorou quando paramos diante dos portões do instituto aonde meu amigo referiu que tanto Victor quanto meu pai aguardavam pelo meu esperado retorno.

— Você a segura? — perguntei e Josué foi rápido em tomar a pequena já dormindo em meus braços.

Eu desci do carro, caminhei até a varanda segui em direção ao interior do casarão, controlando o tremor das minhas pernas. Meu coração parecia prestes a saltar pela boca. As mãos suavam. A cabeça doía. Mas, nada disso foi o suficiente para impedir de tornar meus desejos concretos.

Eu abri a porta da sala devagar e fui seguindo com calma em direção ao único cômodo com as luzes acesas, á saber, a cozinha.

Ao ouvir o burburinho de uma conversa, reconheci no mesmo instante a voz do meu pai e me tremi inteira.

“Não me deixe desistir agora, Senhor” implorei, respirei fundo e adiantei meus passos até estar diante da entrada do local.

Nem foi preciso fazer alardes, logo que pisei no refeitório um dos dois homens sentados em redor de uma mesa levantou-se no mesmo momento e me encarou com grande choque.

Lá estava papai.

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