Crossroad (EM REVISÃO)

By burningtsky

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O que é pior, novas feridas que são horrivelmente dolorosas ou velhas feridas que deveriam ter sarado anos at... More

Prólogo
01 | Garrafa de água
02 | Assombrada
03 | Fingimentos & egos inflados
04 | Primeiro erro
05 | Sorte no azar
06 | Passado atormentado
07 | Desafio
08 | Pecadores
09 | Xícara de açúcar
10 | Cicatrizes
11 | Chamas
12 | Regras
13 | Só se você me ensinar um pouco de francês
14 | Ainda sente o toque dele?
15 | Uma taça de vinho
16 | Três perguntas
17 | Qual deles?
18 | Eu quero você
19 | Nu e confuso
20 | Compaixão, não paixão
21 | Se divertiu sem mim?
22 | Terraço
23 | Você gosta dele
24 | Refri & garrafas de vodka
25 | Quero pintar você
26 | Cômodo lotado de quadros
28 | Qual é a sua?
29 | Homens são horríveis às vezes
30 | Eu quero fazer ela te odiar
31 | Se ele estiver me ouvindo

27 | Conhecendo

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By burningtsky

"Ele me beijou e prometeu que eu ficaria bem

Nós dois sabemos que isso é besteira

Quanto mais eu fico com ele, menos eu fico viva"

- 911, Ellise.

Faziam dias desde que a última gota de álcool entrara pela minha boca. Dias desde que a leveza que essa mesma bebida trazia consigo, após ser ingerida, se encontrava ausente.

Dias.

Não é tão difícil, não como foi com a heroína. Nada se compara. Os músculos pareciam se esticar, prestes a arrebentar. O suor lambia meu corpo tremulo e agitado, deixando minhas roupas encharcadas. Às vezes, os tremores aumentavam e evoluíam para convulsões. Os vômitos constantes me deixavam fadigada e o choro nunca cessava. No entanto, as alucinações foram, de longe, a pior parte. As diversas imagens que meu cérebro desorientado projetava da minha mãe já morta me fizeram desejar outra coisa além da droga: a Morte.

Nada se compara.

Minha pele pinica e meus pés balançam fora da cadeira em um ritmo constante. Deslizo o dedo indicador pela tela lisa do celular, os olhos atentos nas informações diante deles. O brilho alto vindo do aparelho me irrita um pouco mas, mesmo assim, continuo a ler detalhadamente o site de um dos museus de artes da Geórgia. Levanto da cadeira, indo atrás de um papel e uma caneta e, após tê-los em mãos, anoto o endereço.

1280 Peachtree St NE, Midtown.

Dobro o pedaço de papel, enfiando-o no bolso traseiro da calça jeans. Antes de sair, pego outro pedaço de papel e escrevo um bilhete para Cora.

"Espero que tenha transado por nós duas. Volto mais tarde.
Amo você,
Aly."

Diferente do outro, deixo esse papel sob a caneta em cima da mesa.

Meus pés se movem pelo piso, percorrendo o caminho familiar até a saída. Levo a mão até a maçaneta da porta, porém, antes mesmo que eu possa girá-la, a campainha toca. Me detenho por alguns segundos, contanto até dez. Merda!, grito internamente. Enfim abro a porta, me preparando para mandar quem quer que seja para o inferno e seguir à diante com meus planos. Contudo, todo o nervosismo desnecessário se esvai quando meus planos se materializam diante dos meus olhos.

- Você está péssimo - zombo, analisando sua pele úmida e as olheiras que rodeiam seus olhos.

- Como se você estivesse longe disso - ele retribui a provocação, um sorriso mordaz flutuando em seus lábios secos. - Está de saída?

Dou de ombros, ainda segurando a maçaneta da porta.

- Na verdade, eu estava indo ver como o meu vizinho chato está.

Hunter estreita os olhos e, apesar do semblante cansado, seus olhos cintilam bom-humor.

- Qual deles? - Indaga.- O bonitão?

Sorrio, negando com a cabeça.

- O arrogante que anda por aí como se fosse a última água do deserto - dou de ombros. - Você já deve ter visto.

- Arrogante, última água do deserto e bonitão - ele finge pensar. - Ah, sim. Conheço esse cara.

Meu sorriso se alarga e por um instante me pergunto o porquê do seu bom- humor. Consigo listar diversos sintomas de comportamento que a abstinência traz consigo, no entanto, estar disposto e, aparentemente, feliz não é um deles.

- Como você está? - Pergunto.

O moreno curva os ombros para frente, enfiando ambas as mãos nos bolsos do jeans escuro.

- Precisando de algumas respostas suas.

Concordo com a cabeça e saio no corredor, trancando o apartamento e agarrando sua mão para o conduzir até o corredor. Hunter foge do meu toque, puxando a mão com delicadeza e, dessa forma, me fazendo parar para o olhar.

- O que foi? - Cruzo os braços, nervosa por ter agarrado sua mão involuntariamente.

- Aonde vamos? - Ele pergunta.

Suspiro, tirando o papel do bolso e lhe entregando. Espero que ele leia e, quando sei que ele já o fez, volto a andar. Escuto seus passos atrás de mim.

- Midtown? - Sua voz evidencia surpresa. - O distrito das artes da cidade?

O olho por cima do ombro, concordando.

- Isso mesmo.

Sua cabeça pende para o lado e ele aponta o dedo em minha direção, acusatório.

- Você está planejando me matar e deixar meu corpo por lá, não é?

Rio, arqueando as sobrancelhas em um "quem sabe". Ele retribui o sorriso, ficando ao meu lado quando entramos no elevador. Sua mão acha a minha outra vez e o deslizar do seu polegar nas costas da minha mão faz minha pele voltar a pinicar, dessa vez, contudo, de um modo diferente. Reprimo a vontade de agarrar sua mão e a conduzir pelo resto do meu corpo, desejando a sensação agradável que seu toque traz em todos os pedaços da minha pele.

- Obrigado - ele coça a garganta, como se estivesse aprendendo a falar tais palavras. - Obrigado, Alyssa.

Sorrio, apertando sua mão.

- Aly. Só... Aly.

[...]

Meus dedos coçam e tenho que me conter para não tocar os quadros em exposição, para não traçar os rastros de tinta com o indicador.

- São incríveis - murmuro.

Hunter concorda com a cabeça, analisando as obras com o lábios apertados. Uma vez ou outra o vejo passar a língua pela boca ressecada, tentando se livrar da sensação incômoda. Compramos água no caminho para cá mas a sua já acabou, assim, estendo minha garrafinha em sua direção.

- Pode ficar com o resto - brinco, repetindo as palavras que o moreno me direcionou na noite em que nos conhecemos e arrancando uma gargalhada fraca sua.

Andamos lado a lado pelo museu, perdidos nas obras espalhadas pelo lugar. Hunter, pelo menos, está perdido na arte que são os quadros. Eu, por outro lado, estou perdida na arte que é ele quando vê algo que ama. O brilho nos olhos, o sorriso, mesmo que contido, e sua concentração ao parar para estudar alguns quadros que lhe chamam mais atenção.

- Eu tirava fotos - conto.

Ele vira a cabeça para me olhar, neutro.

- Tirava? - Concordo com a cabeça. - Por que não tira mais?

Dou de ombros.

- Não sei, eu... - ele não me deixa terminar a frase quando agarra minha mão e começa a me conduzir para a saída do museu. - Ei, ei, ei.

Ele para, virando para me olhar e arqueando as sobrancelhas em interrogação.

- Que foi?

- Aonde vamos?

Ele agarra minha mão outra vez, me puxando para perto de si.

- Vamos tirar algumas fotos.

O sorriso que ilumina seu rosto me faz sorrir também. Voltamos a andar e, dessa vez, deixo que me conduza. Nossos dedos entrelaçados.

[...]

O vento que balança meus cabelos é revigorante, assim como a câmera descartável pendurada em meu pescoço. Tiramos, de fato, muitas fotos. Bom, eu tirei. Fomos parar em um aquário e a diversidade de espécies me deixou maravilhada, sendo assim, todas as fotos se resumem nos animais encontrados no aquário. E algumas do perfil de Hunter, é claro. Não que ele tenha me visto as tirando, seria embaraçoso.

Agora traçamos o caminho de volta para o nosso prédio sem pressa. Tento não pensar no dia que estamos tendo juntos. No fim dele, especificamente.

Eu gosto do Hunter de hoje, o verdadeiro Hunter suponho. Sem toda a presunção que ele veste como armadura ou a indiferença falsa dele. Quando nos conhecemos, o invejei. Invejei sua indiferença e desejei não ligar tanto para tudo como ele. Hoje, sinto pesar por ele agir dessa forma. Ele se importou tanto com alguém, algum dia, e, provavelmente, as coisas não acabaram bem. O que aconteceu ao certo não sei, e, talvez, ninguém nunca saiba além dele.

Alguém não se importou com ele o tanto que ele se importava com esse alguém?, penso. Ou esse alguém retribuiu e se decepcionou?

O toque gentil do seu ombro no meu me desperta, assim como atrai meus olhos para os seus.

- No que está pensando?

- Em como eu sentia falta de fotografar - minto.

- Sei como é.

- Sabe? - Ele confirma em um gesto sutil com a cabeça.

- Na adolescência, quando... - ele arranha a garganta, desconfortável. - Quando meus pais - ele pausa novamente, tentando encontrar as palavras certas -, discutiam, eu pintava para me acalmar. Usava a tinta guache da minha irmã mais nova e folhas sulfite - ele ri, perdido em lembranças. - Mas depois que... - ele sacode a cabeça, deixando de lado o que quer que fosse dizer. - Depois que vim pra cá, eu não pintei por um bom tempo.

Pisco algumas vezes, com medo de estar tendo alucinações. É a primeira vez que ele fala sobre a família.

- O que aconteceu com eles? - aproveito sua abertura para tentar saber mais.

Seu corpo fica rígido e ele arruma os ombros, assumindo uma postura inflexível. A mudança é mínima, mas consigo vê-la. Consigo reconhecer que o Hunter de minutos atrás sumiu.

- Morreram - as palavras duras parecem não causar efeito nele e, de imediato, identifico sua mentira.

Expiro devagar, o seguindo ao entrarmos no prédio. Andamos até o elevador e, quando as portas se fecham, me viro em sua direção.

- Não te conheço de verdade - solto.

Ele franze as sobrancelhas negras e, de repente, estou sendo pressionada contra a parede metálica do elevador.

- Pois eu acho que você me conhece muito bem.

Seu peito sobre e desce rápido demais, assim como o meu, e todos os questionamentos se esvaem da minha mente quando sua boca se choca com a minha. Ele não é delicado, tampouco calmo. Sua língua passa por entre meus lábios e invade minha boca na primeira oportunidade e, apesar do seu ritmo animal, não tenho dificuldades em acompanhá-lo. Espalmo minha mão em seu peitoral, sentindo sua caixa torácica bater como um tambor na minha palma. O empurro de leve, nos separando e, ainda ofegante, dizendo:

- Não dessa forma.

O moreno aperta os lábios em uma linha rígida, se afastando de mim quando as portas do elevador se abrem. Ele sai primeiro e, quando eu acho que vai me deixar para trás e entrar no seu próprio apartamento, ele para em frente à minha porta e me espera. Apresso os passos para chegar logo até ele, no entanto, me detenho quando meu celular vibra no bolso do jeans. Tiro o aparelho do bolso ainda caminhando e o levo até a orelha depois de aceitar a ligação, em momento algum tirando os olhos do moreno.

- Alô?

- Oi, Flor.

Meus pés travam, criando raízes imaginárias ao chão. O corredor parece se estender diante dos meus olhos e minhas vistas se turvam.

Inspire.

1,2,3.

Expire.

Aperto o celular com força e contenho a náusea quando, enfim, respondo:

- Nicholas.

Ele hesita, deixando que alguns segundos de silêncio se estendam.

- Eu só quero agradecer - mal reconheço sua voz e culpo o tom calmo que ele usa por isso. - Sabe, por ter salvo a minha vida.

Ele ri. O desgraçado ri.

- Como conseguiu meu número?

- O seu número continua o mesmo, Alyssa.

Merda.

- Certo. Era só isso? - Não espero uma resposta. - De nada, então. Tchau.

Dessa vez, ele não hesita.

- Flor - ele me chama do outro lado da linha, me fazendo estremecer com o apelido carinhoso tão familiar. - Eu quero me desculpar, também.

Querendo pôr um fim naquilo de uma vez, digo:

- Está tudo bem, Nick.

Ele expira, o ar chocando-se contra a entrada de voz do seu celular e atravessando a linha em forma de ruídos.

Na última vez que nos vimos, ele mal respirava.

- Estou limpo a cinco meses - conta, por mais que eu não tenha perguntado. - É um dos passos que damos, sabe, pedir perdão às pessoas que machucamos enquanto éramos dependentes.

"Machucamos". Quase peço para que ele especifique por qual dos machucados ele está se desculpando, já que foram muitos. Mas sei que ele não se refere aos machucados físicos que me causou, por mais que devesse.

- Por que está falando no plural?

- Ah - ele ri outra vez. - Faço parte de um grupo de ex-viciados, é bem legal e...

- Não quero saber - o corto, farta de escutar sua voz tão doce. - Eu te perdoo, Nick, mas isso não muda nada. Fico feliz que esteja bem e espero que continue assim. Não me ligue outra vez.

Então, enfim, desligo a chamada.

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