Atrevida e Ardente (Completo)

By PudimdeUva

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Ela era independente e sabia o que queria: um homem difícil, porém inesquecível! A escritora de romances... More

Capítulo II
Capítulo III
Capítulo IV
Capítulo V
Capítulo VI
Capítulo VII
Capítulo VIII
Capítulo IX
Capítulo X
Capítulo XI
Capítulo XII
Capítulo XIII
Epílogo
Esposa Temporária
Definitivamente... Amor!

Capítulo I

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By PudimdeUva

Sydney Colburn abriu a porta para interromper as batidas infernais. A luminosidade brilhante a obrigou a recuar cambaleando, mas ela conseguiu agarrar a maçaneta e recuperar o equilíbrio. Incapaz de dizer um palavrão à altura de sua ira, optou por grunhir.

A pessoa que a levara àquele estado de indignidade teve a audácia de soar debochada.

- E sempre tão bem-humorada ao meio-dia ou está apenas feliz por me ver?

Sydney tentou abrir os olhos contra a luz ofuscante, uma luminosidade explicada pelo horário, e descobriu quem tinha a impressionante coragem de aparecer em sua porta com todo aquele incrível entusiasmo enquanto ela enfrentava uma horrível ressaca. A raiva perdeu força quando ela encontrou os olhos de Cassie Michaels, olhos azuis como safiras e cheios da inocência típica dos dezenove anos.

Sydney sabia que a inocência não era apenas uma encenação. Como um corpo delicado e cabelos naturalmente escuros presos em trancas juvenis que lembravam Mary Ann de Gilligan, Cassie apostava todas as fichas na carta da inocência. Mas Sydney a conhecia há tempo suficiente para não se deixar convencer totalmente pela representação da menina doei;. Mesmo assim, ela a deixou entrar em seu apartamento. Afinal, Cassie era sobrinha de sua melhor amiga. A melhor amiga que era indiretamente responsável pela bebedeira da noite anterior. E Sydney sabia que Cassie se responsabilizara por deixá-la em casa em segurança.

- Feche a porta antes que eu lhe mostre quanto estou realmente feliz - ela ameaçou com tom fraco, cambaleando para longe da soleira e lamentando a infeliz idéia de misturar vodea e rum. Ou teria sido tequila e gim? Não conseguia lembrar. Não precisava lembrar. O que quer que houvesse bebido na noite anterior, havia sido misturado a alguma substância cor-de-rosa. Groselha? Suco de morango? Quando abriu o refrige-rador procurando alguma coisa que pudesse aplacar sua sede e viu uma jarra de Espuma do Oceano, ela foi tomada de assalto por um violentoespasmo e agradeceu à sorte por não ter tomado café da manhã, ou já o teria posto para fora.
Por que ainda não havia comido, se já era meio-dia? Oh, sim. Porque acabara de acordar. E por que saíra da cama? Sim, por causa das batidas na porta. Cassie.

A morena pequenina entrou em sua cozinha como se houvesse estado ali milhares de vezes antes. O que era bem provável.

- Divertiu-se muito ontem à noite?
Sydney teria grunhido novamente, mas odiava ser redundante.

- O que veio fazer aqui? - perguntou.

- Tia Devon me pediu para vir e verificar se está tudo bem.

- Mentira. Devon está em lua-de-mel.
Cassie puxou uma cadeira de perto da mesa da cozinha, enchendo a cabeça de Sydney com um horrível guincho que encobriu as primeiras duas ou três palavras de sua resposta.
- ...bebeu mais do que todos os padrinhos do noivo juntos. Fiquei preocupada por essa bebedeira ser um sinal de depressão por ser a última mulher solteira em seu círculo de amizades.

- Deixe-me adivinhar - Sydney começou em voz baixa, puxando outra cadeira, porém sem fazer barulho. - A primeira aula que teve em Tulane foi de Psicologia Popular.

- Não tinha nenhuma intenção de responder à pergunta invasiva de Cassie. Além do mais, não tinha uma resposta. Não queria admitir que havia bebido tanto por conta de um clichê. "Pobre de mim, mulher solteira. Não tenho mais nenhuma amiga disponível com quem possa estar. Não há nenhum homem em minha vida para tornar meu mundo completo." Ah!

- Não, mas eu li o mais recente livro do Dr. Phill enquanto voava para cá, para o casamento - respondeu Cassie. - Além do mais, tenho dezenove anos, o que faz de mim uma especialista diplomada em todos os assuntos. Lembra-se?

Lembrar o quê? Os dezenove anos? Sydney resmungou alguma coisa. Não conseguia recordar a noite anterior! Como poderia lembrar algo que havia acontecido há mais de onze anos? E fizera um grande esforço para suprimir a maior parte das lembranças compreendidas entre os dez e os vinte anos de idade. Esses haviam sido anos de formação preenchidos por mais enganos, tropeços e infelicidade do que gostaria de recordar.

No entanto, por volta do vingésimo-primeiro aniversário, Sydney tomara a decisão de ignorar o sistema de sua educação típica da Nova Inglaterra e viver sem desculpas. Passara a fazer o que queria, quando queria. Dizia a verdade, mesmo quando as pessoas não queriam escutá-la. Jogava no mercado de ações como se participasse de uma partida de pôquer, e ganhava. Escrevia romances históricos populares e subversivos nos quais as mulheres eram fortes e inteligentes, capazes de colocar de joelhos gigantescos cavaleiros e guerreiros sanguinários.
E sempre que podia, tomava amantes como faziam os homens, ou a maioria deles, com ênfase na satisfação física imediata e evitando o compromisso. Na última década, o estilo de vida inconseqüente e livre de Sydney havia operado maravilhas. Formara-se na universidade, construíra uma carreira de sucesso como romancista e reunira um grupo de amizades pequeno, porém leal, pessoas que a aceitavam como realmente era. Sem mencionar que tinha uma vida amorosa que deixaria verdes de inveja até as mais satisfeitas heroínas em seus livros.

E, sim, na noite anterior se tornara a última mulher solteira naquele leal grupo de amigas, excluindo Cas-sie, que ainda era jovem demais para ser levada em conta, apesar de já ter ouvido rumores sobre um romance sério e promissor entre ela e um rapaz da universidade. Quem podia saber em quanto tempo Sydney estaria organizando um chá de cozinha para uma noiva treze anos mais jovem que ela? Oh, bem. Organizara uma festa memorável.

Nunca tivera planos de se casar mesmo. Não havia bebido demais na noite anterior por sentir-se solitária ou abandonada, ou por qualquer outro sentimento choroso situado no lado mais sombrio do espectro emocional.

Bebera demais porque não conseguira pensar em outra coisa para fazer agora que sua vida havia parado. Não se havia embriagado pelo casamento de Devon.
Estava realmente feliz por ela. Como guardiã legal de Cassie, Devon Michaels havia passado a maior parte de sua vida adulta cuidando da sobrinha, em detrimento da própria satisfação pessoal. Sydney havia brinda-do à amiga e colega escritora com grande entusiasmo e lindas palavras poéticas. Gostava de pensar que tinha uma participação no romance da amiga e escritora e Jake Tanner, o belo ex-policial com quem Devon se casara. Encorajara esse relacionamento desde o início e não tinha nenhum arrependimento.

Não, a vida de Sydney Colburn havia parado exatamente às cinco da tarde de quarta-feira, três dias antes do casamento, simplesmente porque havia atingido o ponto máximo de sua carreira. Seu mais recente trabalho, um romance histórico situado nos pântanos da Escócia, debutara no primeiro posto da cobiçada lista de mais vendidos do New York Times. Realizara seu maior sonho, como provava o jornal que Cassie levara ao seu apartamento e agora abria sobre o balcão da cozinha.

- Parabéns! Soube que andou chutando alguns traseiros literários na semana passada - a jovem comentou, usando um sorriso amplo para compensar o tom desprovido de entusiasmo.

- E o que parece - resmungou Sydney.

Havia sonhado com esse dia desde que soubera da existência de uma coisa chamada lista dos mais vendidos. Esses romances eram tão procurados pelas livrarias e pelos leitores que os nomes dos autores eram divulgados no jornal de maior prestígio do país.

- Tia Dev me contou que você sempre quis isso.

- Bem, não creio que esse tenha sido meu sonho aos quatro anos de idade - Sydney devolveu com ironia. - Nessa idade, minha maior ambição deve ter sido uma Barbie com um Corvette conversível.

- Você dirige um Corvette conversível. Talvez haja uma ligação.
Sydney ergueu as sobrancelhas, encolhendo-se ao ser atingida pela dor de cabeça provocada pelo simples movimento.

- Você acha?

Cassie suspirou como só alguém com menos de vinte anos é capaz de fazer. Sydney olhou para o refrigerador, pensando em pôr à prova aquele ditado sobre o "pêlo do cachorro que o mordeu". Tinha pelo menos uma garrafa de vodca, rum, gim ou tequila. Lembrava-se vagamente de um bar muito bem estocado em algum lugar da sala de estar. Não bebia muito, mas quando bebia, fazia questão de ir até o fim. Mas não queria mais álcool. Queria se ver livre daquela menina, porque assim poderia voltar a chafurdar em paz.

- Quando você estabelece um objetivo, deve levá-lo a sério - Cassie continuou, mostrando-se determinada a ter aquela conversa psicológica e profunda, mesmo que Sydney não estivesse interessada nela. Oh, bem. Por que lutar? Não tinha mais ninguém com quem discutir o assunto.

Devon estava em lua-de-mel, e embora as outras amigas fossem boas companhias para fazer compras e almoçar na beira da praia, nenhuma delas era escritora. Apoiavam sua carreira comprando os livros que escrevia e enaltecendo-os para qualquer pessoa que se dispusesse a ouvi-las, mas nenhuma delas poderia entender de verdade o aspecto negativo de ter atingido seu maior objetivo. Mesmo sabendo que sua profissão não tinha de fato o glamour criado pela mídia e respeitando seu trabalho, elas não conseguiam enxergar os pontos negativos, as dificuldades da carreira que havia escolhido. Ganhava a vida inventando histórias. Acabara de conquistar a maior façanha da ficção popular, seu acima dos de Clancy, Grisham e Roberts, pelo menos naquela semana. Assim, enquanto estivesse tentando explicar a elas como se sentia perdida, as amigas não iriam além das congratulações entusiasmadas.
Amava-as por seu apoio. Mas, com ou sem ele, ainda se sentia como um barco à deriva num mar batido pelo vento.

Não sabia nem se Cassie, que havia sido criada por Devon e conhecia mais sobre o ramo das publicações do que muitos agentes literários, seria capaz de entendê-la. E como poderia, se nem ela mesma entendia? Realizara seu sonho anos antes do esperado, e ainda não estava feliz. Por que não estava embarcando para Nova York a fim de comemorar com o editor? Por que não subia no telhado do prédio para gritar sua alegria aos quatro cantos do mundo?
Deus, sua cabeça doía!

- Não quero conversar sobre isso, Cassie.

- Está falando como minha mãe. Sydney suspirou com aparência cansada.

- Veio aqui para me ajudar ou me ofender?

A mãe de Cassie era D'Arcy Wilde, fenômeno do rock e várias vezes premiada com o Grammy. Dentre todas as musas que desfilavam perante os telespectadores da MTV, apenas Darcy era capaz de fazer Madonna parecer June Cleaver usando um sutiã de enchimento. Madonna ao menos criava os próprios filhos. Darcy deixara Cassie com a irmã Devon, e seguira levando uma vida desregrada, pulando de um amante para o outro, construindo um império pessoal sobre uma fundação de vídeos provocantes e concertos grandiosos. Apesar de Sydney e Darcy terem sido comparadas muitas vezes por causa da atitude aberta com relação ao sexo e aos homens, nenhuma das duas considerava a comparação como um elogio.

Em resumo, elas se desprezavam.

- Minha mãe gosta de você - Cassie afirmou.

- Ela também gosta de abrir buracos estratégicos em suas camisetas e brincar de esconder com os ma-milos no palco. Devo me sentir lisonjeada?

Cassie riu.

- Cassie gosta de chocar as pessoas. Como você.

- E aí que se engana. Para gostar de chocar as pessoas, é necessário se importar com o que elas pensam a seu respeito. Eu não me importo.
A jovem assentiu com ar sério.

- Mas sempre considerou muito importante chegar ao topo da lista dos mais vendidos no Times. O que vem agora?

- Sexo na praia - Sydney decidiu.

- Oh, sim! Beber novamente é a solução.

- Não me refiro ao drinque. Vou mesmo à praia para escolher um bonitão bronzeado para fazer sexo.
Há muito tempo Sydney não vivia um romance anônimo. Tempo demais. Tentou encontrar na memória algum rosto, já que os nomes eram normalmente opcionais, e não viu nada que merecesse destaque. Humm. Não era verdade. Havia um rosto. Um rosto másculo, de beleza esculpida e iluminado pelos olhos mais incomuns que já vira. Olhos cor de amêndoas. Os olhos de Adam Brody. Deus. Adam Brody. Ele havia desaparecido de sua vida há um ano, mas ainda invadia seus pensamentos com uma freqüência irritante. Nos momentos de maior fraqueza.

- Não devia estar conversando com você sobre minha vida amorosa - ela refletiu em voz alta.

- Não tem vergonha de seu estilo liberal, tem? - perguntou a garota, seu tom de voz desconfiado demais para o gosto de Sydney.

- Nunca senti vergonha de nada - ela garantiu.

- Por outro lado, não quero corrompê-la. Meu estilo de vida é apenas isso: meu estilo de vida. Minhas escolhas não são para todos.

- Eu sei - Cassie assentiu. Depois levantou-se e caminhou até o refrigerador, que Sydney esquecera aberto. Ao vê-la erguer-se na ponta dos pés para espiar atrás do litro de leite desnatado aberto há uma semana, Syd-ney se deu conta de um detalhe.

A menina estava usando maquiagem. Desde que a conhecia, quando sua maior preocupação na vida eram as bonecas, durante a infância e a adolescência, Cassie escolhia as roupas pensando no próprio conforto e só escovava os cabelos quando a tia ameaçava reter sua mesada. Ela havia evitado os bailes do ginásio e as festas da formatura, preferindo um concerto de música clássica ou um jogo de hóquei. Então, por que de repente a relaxada e risonha Cassie tinha a aparência de uma candidata ao programa Ilha da Tentação?

Os rumores que ouvira sobre Cassie e um namorado deviam ser verdadeiros. Não era de estranhar que ela estivesse tão preocupada com o estado de sua vida amorosa. Ninguém era mais intrometido do que uma jovem apaixonada.

Cassie pegou uma jarra de suco de laranja e fechou a porta da geladeira.

- Pode ficar com suas escolhas, Sydney. Graças a você e a minha mãe, jamais sentirei necessidade de experimentar o tipo de vida dissoluta que vocês sempre viveram.

Sydney ergueu uma sobrancelha, observando enquanto a garota pegava dois copos, enchia-os com suco e devolvia a jarra à geladeira. Sempre soubera que Cassie era madura demais para a idade e fizera descobertas incríveis desde os dois anos de idade, quando começara a formar frases perfeitas, mas mesmo assim ela ainda a surpreendia. Talvez por estar subestimando sua jovem amiga.

- Tem certeza? - perguntou. - Muitas pessoas da sua idade mal podem esperar por uma vida mais ousada.

- Porque a maior parte delas não foi criada dentro da ousadia.

- Devon fez de tudo para que você tivesse uma vida normal - Sydney lembrou.

- Graças a Deus. Mas escutei muitas de suas conversas com minha tia durante as partidas de pôquer das noites de terça-feira. E assistia Entertainment Tonight pelo menos uma vez por semana para descobrir qual amante minha mãe havia abandonado nos últimos dias.

Cassie pôs um copo de suco diante de Sydney, depois retirou dois comprimidos do vidro de analgésicos que encontrou no armário sobre a pia. Sydney os aceitou com avidez.

- Posso afirmar com certeza absoluta que não desejo viver como você ou minha mãe - concluiu a garota.

Sydney suspirou aliviada e pressionou as mãos contra as têmporas latejantes.

- E bom ouvir isso.

Cassie sentou-se novamente diante dela.

- Está horrível. Sabe disso, não é?

- Não posso afirmar que sua declaração me surpreende.

- Atrair um bonitão na praia não vai ser tarefa fácil.

Sydney riu.

- Acho que essa não foi a melhor idéia do dia.

Cassie reclinou-se e apoiou os pés na cadeira ao lado da dela.

- Minha mãe me deu um desses pacotes completos em um SPA em Safety Harbor. Foi um presente de formatura, mas ainda não me animei a desfrutar dele. Aposto que podemos conseguir reservas para os próximos dias. Afinal, seu nome está no topo da lista dos mais vendidos do New York Times.

- Oh, e o fato de sua mãe ser D'Arcy Wilde não teria nada a ver com isso?

- De certo não seria prejudicial...

A idéia era tentadora, mesmo no estado confuso de Sydney. Mas, depois de passar o dia sendo temperada, esfoliada, massageada e mimada, o que aconteceria? Ainda teria o mesmo problema com que convivia há quatro dias. Não sabia o que fazer com sua vida ou com sua carreira.

Já estivera na lista do New York Times antes, e fizera bom uso dos benefícios. Seu agente havia manipulado as constantes aparições nas quinze primeiras posições em um contrato multimilionário, contrato que acabara de cumprir entregando o último título. Ser citada na lista do jornal havia sido excitante, especialmente nas primeiras vezes, tanto que estabelecera o primeiro posto como seu objetivo profissional, uma meta pela qual trabalharia até o fim de sua carreira.

Quem poderia imaginar que o sucesso viria tão depressa?

Sentia-se uma fraude. Uma fraude ingrata e sem direção.

- Não tenho o direito de sentir-me deprimida, sabe? - confessou.

- Se a constituição houvesse sido criada pelas Mães Fundadoras, não pelos Pais, o direito de sentir-se deprimida diante da boa sorte e do sucesso teria figurado no segundo item da lista.

Sydney sorriu, embora o gesto fizesse o rosto doer.

- Devia estar gritando de alegria! Por favor, diga que não sou maluca. Não quero pensar que uma pessoa equilibrada pode se sentir tão perdida depois de alcançar aquilo que mais queria no mundo.

- Se tivesse alguém com quem dividir sua vitória...

- Já dividi, meu bem. Com Devon...

-... Que estava envolvida demais com os preparativos do casamento para realmente comemorar sua conquista.

- Telefonei para minha mãe.

- E?

- Ela telefonou para todas as amigas do clube. Elas querem que eu faça um discurso durante a reunião do grupo de almoço das senhoras no próximo mês.

- Já não esteve lá antes?

- Sim, mas elas sempre me proibiram de mencionar a palavra sexo.

- E agora você pode falar sobre sexo?

- Estreei no primeiro posto da lista dos mais vendidos do New York Times. Posso falar sobre o hábito de comer e depois vomitar, tão popular no século quinze, e elas vão pensar que estou apenas sendo divertida, irreverente. Oh, Deus... Por favor, não me diga que acabo de adquirir o direito de ser excêntrica!

- Tem sido excêntrica desde que a conheci. Mas quando se tem menos de sessenta e cinco anos, o nome é outro.
- Não quero saber.

- Eu não ia dizer.

- Sabe dar valor à vida, não é?

- Tanto quanto você valoriza seu Corvette Barbie.

ATREVIDA E ARDENTE...

- Muito bem, dividi minha vitória com as pessoas que considero mais importantes. E agora?

- Escolha um novo objetivo.

Sydney balançou a cabeça. O que mais havia? Tinha o melhor trabalho do mundo. Passava longas horas todos os dias em seu mundo de fantasia, inventando histórias sobre sexo ardente e amor profundo, e ainda ganhava dinheiro com isso. Não que precisasse do dinheiro. Levando em conta o valor que tinha depositado em um fundo de investimentos, poderia passar a vida toda com conforto e tranqüilidade mesmo que nunca mais escrevesse uma única palavra. Mas, aos dezoito anos, quando recebera o primeiro terço de seu legado, começara sua aventura no mundo das ações e dos investi-mentos. Quando recebera o segundo terço, não só ganhava a vida como escritora, mas já havia duplicado os investimentos que havia feito com a quantia inicial. Sydney descobrira que tinha um talento especial para três coisas: história, sexo e dinheiro.

E como bem-sucedida autora de romances históricos, transformara essas três características em uma carreira prodigiosa. Desfrutava até mesmo de uma condição ideal de celebridade, aparecendo em lançamentos de livros, programas de televisão e rádio, sem no entanto perder a privacidade ou a liberdade de ir ao supermercado ou ao shopping sem ser assediada.

Para completar, atuava na diretoria de uma fundação que oferecia treinamento literário em bairros pobres. Servia como voluntária duas vezes por mês.

- O que restou, Cassie? Devo ser a mulher mais superficial do mundo para ter conquistado tudo o que desejava aos trinta e dois anos.

Cassie balançou a cabeça.

- Você não é superficial. Não realmente.

Sydney levantou uma sobrancelha. Ouvira um "porém" ali em algum lugar da frase.

- O que quer dizer com "não realmente"?

Qualquer um com um pouco mais de juízo teria encolhido os ombros e inventado uma desculpa qualquer para não ter de apontar os defeitos de Sydney, mas Cassie, na confiança e na ignorância tão típicas da juventude, endireitou-se na cadeira.

- Aparentemente, você tem uma vida ideal. Dinheiro, amigos, um excelente carreira.

- A fundação. Não esqueça a fundação.

Cassie sorriu.

- Sim, você faz até um trabalho voluntário. Tem sido muito cuidadosa e calculista, organizando sua vida com precisão.

- Ei, não comece com os insultos. Eu não organizo nada. Sigo meus instintos, apenas.

O comentário fez a jovem franzir a testa.

- Isso é o que gosta de pensar.

- Pensar? Sou famosa por minha casualidade. Pergunte a sua tia. Ela vive me censurando por ser tão inconseqüente e desorganizada.

- Porque tia Devon elevou a organização e o planejamento à categoria de religião. Comparada a ela, você é a personificação do caos.
Mas, comparada à população normal do mundo, você tem traçados todos os caminhos de sua vida, e todos eles levam à estréia de um de seus livros no primeiro posto da lista dos mais vendidos do New York Times. Estou certa aqui?

Era impossível protestar, não só por causa da horrível dor de cabeça que a castigava, mas porque as coisas que Cassie dizia fazia sentido.

- Mas você não tem ninguém para amar.

Com um gemido, Sydney cruzou os braços sobre a mesa e apoiou a testa neles. Devagar. Isso confirmava sua suspeita. A jovem Cassie estava apaixonada e queria compartilhar sua alegria. Que bom. Maravilhoso.

- Deus, por favor, poupe-me de ser a heroína clichê de um romance! - ela gemeu com exagero dramático antes de castigar sua jovem amiga com um olhar poderoso.

- Caso não saiba, essa fala de Jerry Maguire foi escrita por um homem. Eu não, repito, eu não preciso de um homem para completar-me. Se acredita mesmo nesse tipo de teoria, acaba de enviar o feminismo de volta aos dias de Susan B. Anthony.

Sydney conseguiu manter a cabeça erguida por tempo suficiente para ver Cassie rir, mas não compreendeu onde estava o humor. Aquilo não tinha graça.

- Chame minha atitude de novo feminismo. Não estou afirmando que precisa de um homem para completá-la. Mas podia fazer bom uso de algo mais profundo, não? Uma experiência emocional para desafiá-la e pôr à prova seu status quo. Alguém para desafiá-la e pôr a prova seu status quo.

Ah, então o rapaz misterioso havia abalado a vida de Cassie. Que bom para ela. Sydney já havia ultrapassado a etapa das grandes descobertas do começo de vida.

- Homens como esse não existem - ela concluiu.

- Já procurou? Não.

- E claro que sim.

- E nenhum homem jamais a afetou a ponto de colocá-la em uma encruzilhada? Ou ia embora, ou corria o risco de perder o coração?

É claro que o rosto de Adam Brody surgiu novamente na mente de Sydney, causando uma descarga elétrica que desceu até o centro de seu ventre e retornou até os mamilos. Ele havia sido um amante incrível. Egoísta... Quando convinha, mas sempre entregando-se de corpo e alma. Ele havia sido tão incrível que, enquanto estivera com ele, Sydney havia quebrado várias de suas regras auto-impostas, tanto que fizera mais do que arriscar o coração, arriscara a própria alma.

No entanto, quando ele sugerira que transformassem o relacionamento sexual em um compromisso de amor, ela desistira de tudo. Para ser mais exata, fugira apavorada. Sentira-se assustada e fora de seu elemento, como uma criança do segundo ano solicitada a resolver cálculos complexos. Resmungara uma desculpa fria para sair de cena com estilo, mas não havia conseguido tirá-lo dos pensamentos. Nem durante o vôo de oito horas para Londres no qual embarcara no dia seguinte, nem durante a viagem de um mês pela Escócia, nem nas três intermináveis semanas que passara com os pais na Nova Inglaterra. Quando finalmente retornara decidida a desistir da luta e correr os riscos implícitos na proposta, ele havia desaparecido da face da terra.

Vendera o apartamento, desativara o telefone celular, fechara o negócio. Certa vez ele havia comentado que considerava a possibilidade de mudar-se para Bal-timore e formar uma sociedade com um antigo mentor, e Sydney concluíra que ele havia ido atrás de seu sonho. Sendo uma mulher que nunca anunciava seus arrependimentos, inclusive para si mesma, simplesmente seguira em frente, escrevendo seus livros, jogando pôquer com Devon nas noites de terça-feira, viajando para dar autógrafos e fazer pesquisas, e tomando um belo amante sempre que seu corpo clamava por alívio.

Talvez Cassie tivesse uma certa razão. Talvez precisasse de uma relação menos previsível do que aquelas baseadas apenas em sexo. Orgasmos que podia dar a si mesma. Precisava de um envolvimento que pudesse ser comparado a uma caixa de fogos de artifício, uma ligação arriscada, excitante, explosiva, uma espécie de aposta que poderia jogar seu mundo de volta no poço de caos que tanto apreciava.

E quem melhor para acender esse pavio do que o sexy Adam Brody?

- Conhece algum investigador particular, Cassie?

A jovem inclinou-se para a frente com os olhos iluminados pela curiosidade.

- Na verdade... lembra-se do padrinho de Jake? Cadê Lawrence? A esposa dele, Jillian, é detetive particular. Ouvi dizer que ela é muito competente.

Sydney assentiu, ergueu o corpo e terminou de beber o suco de laranja, esvaziando o corpo. Tentou passar os dedos por entre os cabelos, mas um emaranhado de fios deteve o movimento. Oh, sim. Estava horrível.
Bem, pelo menos a aparência era algo que podia consertar.

- Quero o número do telefone dessa mulher. Depois fique à vontade. Descerei em vinte minutos.

- Devo imaginar que vai seguir meu conselho?

Sydney foi buscar um bloco de papel na gaveta da mesa do telefone, depois jogou-o sobre a mesa diante da jovem amiga. Um lápis aterrissou ao lado do bloco.

- Depois de escrever o número do telefone de Jillian, ligue para o SPA e faça toda pressão que puder. Estou precisando muito de uma sessão de estética facial.

A gargalhada de Cassie a seguiu através da sala de estar e ao longo da escada para o quarto. Adam ficaria excitado ao vê-lo, ou ainda estava zangado? Ele se mostrara bastante ressentido na noite em que o deixara em seu apartamento, firme em sua convicção de nunca envolver-se emocionalmente com homem algum. Ofendera-o profundamente com sua resposta negativa. E não havia oferecido nenhuma explicação. Por que deveria? Havia sido sincera e franca com ele desde o primeiro encontro, ou melhor, desde a primeira trombada na pista de corrida do condomínio. Um encontro levara a outro, e fizera questão de deixar claro que não queria nada além de sexo e talvez algumas boas risadas em sua companhia.

O problema era que havia existido mais do que isso desde o início. Adam era um homem inteligente, bem-humorado, sedutor, um par perfeito para seu sarcasmo cortante. Empresário determinado, ele se perdia em suas plantas e em seus projetos da mesma forma que ela se esquecia de tudo nas partes mais envolventes de seus livros. E da conversa à mesa do jantar às acrobacias no quarto, ele nunca deixara de cumprir todas as promessas que fazia, motivo pelo qual o envolvimento havia durado seis meses além daquela primeira noite.

Então ele cometera o engano final. Uma noite antes de sua partida para uma viagem de trabalho e pesquisa, ele a convidara para dormir em seu apartamento. Havia parecido um pedido tão simples, Sydney lembrou, os olhos fixos na janela por onde um dia pudera ver a do apartamento dele no prédio do outro lado do pátio. Mas sua sugestão não tivera nada de modesta ou simples. Ele havia pedido para que desrespeitasse uma das principais regras de sua constituição do namoro... e já quebrara mais regras por ele do que por qualquer outro homem. Adam chegara a confessar que o convite para passar a noite em seu apartamento havia sido um primeiro passo, a primeira etapa em seu plano de convencê-la a ficar para sempre.

Sydney arrepiou-se, mais por hábito do que pelo desgosto provocado pela idéia de um lar e uma lareira. Não era nenhuma tola. Compreendia e aceitava o temível poder de um relacionamento baseado em compromisso. Escrevia romances, pelo amor de Deus! Normalmente até vertia algumas lágrimas quando redigia as últimas linhas de um final feliz. Mas também sabia que os verdadeiros relacionamentos de amor cobravam o preço da concessão e da mudança, talvez até de uma completa revisão de escolhas de vida e objetivos pessoais. O tipo de revisão para a qual podia sentir-se preparada agora, mas para a qual não estivera pronta quando Adam fizera sua proposta.

Por isso partira. Como estava partindo agora, com o mesmo andar determinado e firme, percorrendo o mesmo caminho para o mesmo lugar, o corredor do lado de fora de seu quarto... e sozinha.

Na parede ao lado do termostato estava seu mais querido objeto pessoal, o item mais adorado de suas coleções, um pôster emoldurado do clássico de 1933 She Done Him Wrong, estrelado por Mae West. Sydney ad-mirava a atriz e a mulher desde a primeira vez em que tivera de afastar-se de sua restrita escola particular em Boston e ficara em casa, doente, presa à cama e assistindo a uma maratona de filmes antigos na tevê, todos protagonizados por Mae West. A irreverente, poderosa e sexy Mãe a inspirara em vários níveis ao longo de sua vida. Aos vinte anos de idade, Sydney havia transformado um lampejo de curiosidade cinematográfica na mais completa e incontrolável obsessão. O autógrafo da atriz enfeitava o canto esquerdo inferior do cartaz amarelado, mas era a citação no topo que mais a encantava.

Sydney leu as palavras em voz alta, injetando em si mesma a confiança de que precisava para encontrar Adam Brody e, mais importante, para atraí-lo de volta a sua cama... e a sua vida.

- Escute - ela leu, sem se dar ao trabalho de tentar imitar a voz distinta de Mae, pois sabia que não tinha essa capacidade -, quando as mulheres erram, os homens vão certeiros atrás delas.

Enquanto caminhava para o chuveiro, Sydney despiu a camiseta e sentiu o arrepio provocado pelo sopro de ar frio em sua pele subitamente febril.

- Espero que esteja certa, Mãe. Espero realmente que esteja certa.

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