Duologia Renegados - LIVRO UM...

By thais__araujo

36.4K 621 375

Em uma Colônia futurística chamada Vila América - em homenagem ao passado desse grande continente quase extin... More

Capítulo 1 - O Caçador Ilegal
Capítulo 2 - Aniversário Infeliz
Capítulo 3 - Sorriso gentil
Capítulo 5 - Conselho Militante
Capítulo 6 - Prateleiras de papel

Capítulo 4 - Injustiça?

909 82 67
By thais__araujo


                                                                                      DANIEL

Caio e eu fugimos do prédio da Militância enquanto eles nos prendiam para a punição de traição, naquele dia. É traição contra Vila América, falarmos de assuntos proibidos. Eu teria ficado calado se soubesse que livros é um assunto proibido, mas fazer o que se eu não sabia o que eram livros?!

Corremos o mais rápidos que podíamos naquela noite, sorte que a escuridão pelas ruas da Região nos ajudava a nos mantermos escondidos nas sombras, enquanto mais de vinte militantes eram chamados para nos seguirem nas redondezas. Todos calados, eretos e de armas prontas em várias direções. Agora entendo a necessidade delas.

Nos esquivamos e fugimos para o Leste, conseguindo abrigo na floresta. Foi assim que conhecemos Abgail e os outros.

Caio já estava como eu na Militância: começando a questionar algumas coisas. O sentido das coisas. Foi assim que descobrimos que todos os militantes são do jeito que são por causa das doses mensais, das pílulas. Só não descobrimos porque, de alguma forma, conseguimos ter lembranças se uma das funções das doses é apagá-las.

Daí veio nossa designação: Renegados. O que antes pensávamos ser o certo começa a se desintegrar. Perder o sentido. Mas isso não acontece com todos. Não são todos os militantes que conseguem ter alguns flashes de memória, caso contrário, teriam arranjado um jeito de fugirem também. Somos considerados "falhas" das doses, militantes ainda nos caçam para o Regente. Somos os únicos acordados nessa cidade, pois achamos que as doses mensais que os civis ganham não tem nada a ver com prevenção de doenças, como falam. A única explicação para as Regiões terem pessoas tão despreocupadas, satisfeitas e felizes é porque elas também não se lembram. Falta alguma coisa. Vivem como zumbis para o Regente, que decide tudo por eles. Há quanto tempo vivemos assim? Porque?

Nosso objetivo é descobrir.

-Você primeiro. -Digo á Marta, que aceita enfim e sobe as escadas para a saída do abrigo.

A luz do dia na floresta faz meus olhos se encherem de água, tampo minha visão com uma das mãos e com a outra escondo nossa entrada com folhas e gravetos cheios de formigas.

-Sabe o caminho? -Pergunto a ela, assim que começamos a caminhada ao norte da floresta. Ela nega com a cabeça. -Tudo bem, não é tão longe.

-Já foi lá muitas vezes? -Me pergunta, segurando as duas canecas fundas de alumínio que Juliana conseguiu semanas atrás.

-Algumas. Acho que virei amigo das vacas. -Sorrio para ela, que desvia o olhar sem jeito, mas também sorrindo.

As vezes sou o escolhido por Abgail - a mais velha de nós, portanto a que decide a maioria das coisas - para pegar um pouco de leite e ovos nas redondezas. Claro, furtivamente, pois é o único jeito que temos.

A Região Leste é cheia de casas de campo, simples e com plantações, gado e pescadores nos rios próximos - de onde pegamos água. Como todos na Colônia, saem despreocupados de suas casas, portas abertas e janelas escancaradas. Já sabemos a rotina de alguns, horários que saem de casa e que o caminho fica livre para pequenos furtos. Como o de hoje.

Olho para Marta de relance, acompanhando meu ritmo entre as árvores espaçadas e brisa leve. Seus cabelos curtos se agitam um pouco com o vento, e me pergunto como ela havia se saído em sua prova de aceitação. É uma garota bonita para uma vida de militante. Rapidamente ela me pega olhando-a, desvio os olhos tarde de mais e sorrimos juntos.

É a primeira vez que ela sai para mais longe do abrigo, não é a toa que Abgail pediu a mim para acompanhá-la. Sou quase expert nessa vida de fugitivo.

-Você não se sente...mal, por estar entrando na casa de alguém desse jeito? -Ela me pergunta após uns minutos, e a observo antes de responder. -Desculpa, sei que não tem escolha, mas é que...

-Não. Tudo bem, eu entendi. -Falo em seguida, querendo tirar a expressão tensa de seu rosto. -E sim, no começo me senti muito mal. Não ia querer ninguém entrando assim na minha casa, mas... eu coloquei na minha cabeça que essas pessoas de algum modo estão bem. Se sentem seguras, trabalham e recebem por isso, acham que são felizes. Por pior que seja a verdade, disso tudo ser uma ilusão distorcida, é isso que eles acham. E não podemos fazer nada para mudar isso, por enquanto... Porque nós... Todos os dias nos sentimos inseguros, com fome e sede, tristes e com uma pequena faísca de esperança quase se apagando. Entende? -A olho, imaginando se havia falado demais, muita informação. Acabei desabafando com ela. Marta concorda com a cabeça, me olhando serena. -De um jeito injusto, passei a acreditar que o que fazemos é o certo para nós.

Marta novamente concorda e parecia pensativa sobre o assunto. Ela ainda está se acostumando com essas descobertas, as verdades por trás das mentiras do Regente, da vida pacífica de Vila América.

-É ali. -Aponto para ela, quando chegamos na lateral da floresta, de frente para uma descida de mato que mais a frente revelava uma casa simples com cercas protegendo duas vacas adultas e algumas ovelhas mais distantes. -Vamos esperar um pouco.

Ela fica ao meu lado, estávamos próximos de uma das árvores para nos manter numa boa posição da casa. O dono, um senhor que aparenta quase cinquenta anos, deve sair a qualquer momento para a pescaria do dia. Tem vezes que ele volta cheio de sardinhas e robalos, se eu conseguisse um anzol... Fica para a próxima, hoje a missão é pegar leite e ovos, Daniel!

-Como vai ser? -Marta me pergunta, sinto um pouco de ansiedade em sua voz e repuxo um sorriso.

-Você pega os ovos, que é mais fácil. Outro dia te ensino a ordenhar uma vaca. -Ela sorri, os dentes brancos á mostra. -Nos fundos da casa ficam as galinhas, com calma elas não vão se assustar quando você se aproximar. Nos encontramos aqui, ok?

-Tudo bem. -Ela me responde, fazendo uma expressão de confiança. -Lá está ele. -Ela que me lembra do moço, dono da casa.

Em instantes ele sai de casa com suas ferramentas de pesca e passando pela cerca, logo entra do outro lado da floresta em direção ao rio com o chapéu na cabeça.

-Vamos lá. -Digo á Marta, e começamos a descer.

Seguro em sua mão para que não caia, há alguns buracos por ali. Mas meu gesto a surpreende um pouco, quando entrelaço nossos dedos. Ela por fim repuxa outro sorriso ansioso e passamos pela cerca baixa. Ela se encaminha para dentro e vou em direção a amiga vaca.

Das duas, sempre vou na mesma, a com mais manchas pretas pelo corpo. Ela nem se assusta muito com minha presença, e posiciono uma das canecas que estavam com Marta no chão, na direção de minhas mãos. De início é estranho, a sensação nunca me agradou muito, mas seguro com jeitinho e o leite começa a cair. As vezes paro e faço um carinho no animal, ela se acostumou com meu toque assim. E além do mais, é como se fosse um agradecimento. Vou enchendo a caneca funda e as vezes olhando para trás, me certificando de estar tudo ok por perto.

O dono costuma demorar, passa a tarde toda pescando, de manhã que cuida dos animais que cria. O céu estava claro, sem sinais de chuva. Seria bom se nos livrasse um pouco desse calor.

De repente escuto um grito, fino e feminino, claro. Marta. Deixo a caneca cheia de leite com a vaca e corro em direção a casa.

A entrada era a cozinha, passo por uma salinha pequena e mal arrumada, até chegar nos fundos onde fica o galinheiro. Havia um garoto de frente para Marta agora, ela me olha espantada quando entro no lugar e observo o cara de cabelos ruivos segurando uma faca.

-Ei. -Digo me aproximando com calma, ficando entre ele e Marta. -Quem é você? -Pergunto devagar, a faca apontada em minha direção agora.

O garoto mantinha um olhar nervoso, as mãos tremiam e as roupas me pareciam familiares. Ele era outro fugitivo. Também um Renegado.

-Podemos ajudar você. Sei que está assustado, confuso. -Falo, fazendo-o franzir as sobrancelhas de dúvida. -Somos iguais a você, também saímos do Regente. Só abaixe isso...

-Como sabem que saí do Regente? -Ele da um passo em nossa direção, fora de si. Sinto uma gota de suor em minha testa.

-Roupas da Militância, camarada. -Digo, pois bermuda e camisa cinza era nossa marca sem a farda. Ele parece quase convencido. -Temos comida, água. Podemos ajudá-lo. Sei que veio aqui atrás disso também.

Ele então abaixa a faca e me permito respirar normalmente. Ele olha os ovos na caneca de Marta, depois me olha tenso.

-Desculpem. Sou Flavio. -Ele agora se mostrava mais calmo, olho Marta e ela me lança uma expressão aflita, porém mais contida.

-Tudo bem, Flavio. -Digo. -Vamos dar o fora daqui. Você precisa conhecer Abgail.

Continue Reading

You'll Also Like

1.5M 121K 83
Livro 2 já está disponível no perfil💜 𝐁𝐞𝐦-𝐯𝐢𝐧𝐝𝐨𝐬 𝐚𝐨 𝐔𝐧𝐢𝐯𝐞𝐫𝐬𝐨 𝐝𝐞 𝐋𝐚𝐮𝐫𝐚 𝐒𝐭𝐚𝐫𝐤! ⚛ Em Júpiter, um cientista instalou uma...
23.1K 1.9K 9
A Ordem usa um ritual contra a vontade de Harry e Sev. Não produz os resultados desejados que a Ordem deseja. Essa história foi escrita por Elvirakit...
10 0 2
Em um universo vasto e misterioso, oito seres extraordinários, conhecidos como os "Wonders 8", serão reunidos por um propósito divino: proteger as ob...
(sobre)viva By Erika S. Maso

Mystery / Thriller

22.8K 2.7K 58
🏅VENCEDOR DOS PREMIOS WATTYS 2021 EM SUSPENSE 🥇lugar em suspense no Concurso Relâmpago de Natal 🥉Lugar na segunda edição do concurso Mestres Pokém...