Sun Tzu diz: Geralmente o comando dos exércitos cabe ao general,
depois que o soberano lhe deu o mandato para mobilizar o povo e recrutar as
tropas.
I. Conhece o terreno. Se estiveres em lugares pantanosos,
passíveis de inundação, cobertos de espessas florestas, cheios
de desfiladeiros, inundados, desertos e áridos, ou seja, em
lugares onde não poderás obter reforço com facilidade, e onde
não terás nenhum apoio, tenta sair o mais rápido possível.
Procura instalar tuas tropas em lugar espaçoso e vasto, de onde
possam se retirar facilmente e onde tens aliados possam, sem
dificuldade, aportar-te a ajuda providencial.
II. Evita, com extrema atenção, acampar em lugares isolados. Se a
necessidade te obrigar, só permaneças o tempo necessário para
escapulir. Toma rapidamente medidas eficazes para safar-te de
forma segura e ordenada.
III. Encontrando-te em lugares afastados de fontes, riachos ou poços,
onde dificilmente encontrarás víveres e forragem, não demores
para fugir. Antes de levantar acampamento, observa se o lugar
que escolheste está abrigado por alguma montanha, que te
colocará a salvo das surpresas do inimigo. Verifica as vias de
acesso, e se tens as facilidades necessárias para conseguir
víveres e outras provisões. Em caso positivo, não hesites em
tomar posse do terreno.
IV. Encontrando-te em um campo de morte, busca o combate.
Chamo de lugar de morte esses ermos onde não há nenhum
recurso, onde se definha inelutavelmente pela insalubridade do
ar, onde as provisões mínguam sem esperança de serem
repostas; onde as doenças começam a grassar no exército,
prenunciando grandes flagelos. Se te encontrares em tais
circunstâncias, precipita-te em deflagrar o combate. Asseguro-te
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que tuas tropas se mostrarão intrépidas no combate. Morrer pela
mão do inimigo lhes parecerá suave em comparação com todos
os males que as atormentam.
V. Se, por acaso ou por erro, teu exército se encontrar em lugares
inóspitos, cercado de desfiladeiros, onde o inimigo facilmente
poderia colocar emboscadas, de onde seria difícil fugir em caso
de perseguição, onde poderiam interceptar teus víveres e armar
ciladas nos caminhos, evita com cuidado atacar em tal terreno.
Mas, se o inimigo te encurralar em semelhante local, combata até
a morte. Não te contentes com uma 'pequena vantagem ou com
meia vitória. Isso poderia ser um engodo para te fulminar por
completo. Permanece de sobreaviso, mesmo depois de obteres
todas as aparências de uma vitória completa.
VI. Sabendo que uma cidade, por menor que seja, está bem
fortificada e tem munições e víveres em abundância, evita sitiá-Ia.
Se só fores informado da situação depois de começado o cerco,
não te obstines em prossegui-Io. Corres o risco de ver todas as
tuas forças fracassarem contra essa praça, e serás constrangido
a abandoná-Ia vergonhosamente.
VII. Não desprezes nenhuma pequena vantagem que puderes obter
de forma segura e sem nenhuma perda. Essas pequenas
vantagens, quando negligenciadas, geram prejuízos irreparáveis.
VIII. Antes de pensar em conseguir alguma vantagem, compara-a com
o trabalho, a fadiga, as despesas e as perdas humanas e de
munições que ela poderá ocasionar. Avalia se poderás conservá-
Ia facilmente. Só depois de ponderar é que te decidirás a
aproveitar ou a abandonar tal vantagem, guiando-te por uma
sábia prudência.
IX. Nas ocasiões em que for necessário tomar imediatamente uma
decisão, não esperes as ordens do príncipe. Se tiveres que
desobedecer ordens recebidas, não hesites, age sem medo. A
principal intenção do príncipe que te colocou à frente dos
exércitos é venceres o inimigo. Se ele tivesse previsto as
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circunstâncias em que te encontras, certamente tomaria a
decisão que queres tomar.
Essas são as nove variáveis ou nove circunstâncias principais que
devem te engajar a mudar o comando ou a posição de teu exército, a mudar a
situação, a ir ou vir, a atacar ou se defender, a agir ou permanecer em repouso.
Um bom general não deve jamais dizer: Aconteça o que acontecer, farei tal
coisa. Irei lá, atacarei o inimigo, sitiarei tal praça. Somente as circunstâncias
devem ditar a conduta. Ele não deve ater-se a um sistema geral, nem a uma
maneira única de comandar. Cada dia, cada ocasião, cada circunstância requer
uma aplicação particular dos mesmos princípios. Os princípios são bons em si
mesmos; sua aplicação os torna amiúde nefastos.
O general deve conhecer a arte das mudanças. Se ele se fixa em um
conhecimento vago de certos princípios, em uma aplicação rotineira das regras
da arte bélica, se seus métodos de comando são inflexíveis, se examina as
situações de acordo com esquemas prévios, se toma suas resoluções de
maneira mecânica, é indigno de comandar.
Um general é um homem que, pelo nível que ocupa, se encontra acima
de uma multidão de outros homens. Por conseguinte, deve saber governar os
homens. É preciso que saiba conduzi-Ios. É preciso que esteja
verdadeiramente acima deles, não apenas por sua dignidade, mas por seu
espírito, por seu saber, por sua capacidade, por sua conduta, por sua firmeza,
por sua coragem e por suas virtudes. É preciso que saiba distinguir as
vantagens verdadeiras das falsas; as perdas reais das aparentes; que saiba
aplicar a arte da compensação e tirar partido de tudo. É preciso que saiba
empregar corretamente certos artifícios para enganar o inimigo, e se mantenha
sempre alerta para não ser enganado.
Um general não deve ignorar nenhuma armadilha que podem lhe
colocar. Deve decifrar todos os artifícios do inimigo, quaisquer que sejam, mas
nem por isso deve querer adivinhar.
Mantém-te de prontidão, vê quando o inimigo chega, perscruta suas
atitudes e sua conduta e tira conclusões. Procedendo assim, não corres o risco
de te enganares e de seres ludibriado ou vitimado por conjeturas precipitadas.
Se não quiseres ser esmagado pela infinidade de trabalhos e
sofrimentos, prepara-te sempre para o pior. Trabalha sem cessar para
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prejudicar o inimigo. Poderás fazê-Io de diferentes formas, mas eis o que há de
essencial neste tópico.
Lança mão de tudo para corromper seus melhores homens: oferendas,
presentes, afeição, nada omitas. Se preciso for, suborna. Engaja pessoas
dignas do campo adversário para praticarem ações vergonhosas e indignas de
sua reputação, ações das quais elas se envergonharão quando descobertas, e
não deixes de divulgá-Ias amplamente.
Mantém ligações secretas com os elementos mais corruptos do campo
inimigo; serve-te deles para alcançar teus fins, agregando outros corrompidos.
Contraria o comando do inimigo, semeia a dissensão entre seus chefes,
fornece motivos de cólera a uns contra outros, faz com que murmurem contra
seus oficiais, amotina os oficiais subalternos contra seus superiores. Interceptalhes
víveres e munições. Semeia entre eles melodias voluptuosas para lhes
estiolar o coração. Envia-Ihes mulheres para acabar de corrompê-los. Faz com
que saiam quando conviria que ficassem acampados, e permaneçam tranqüilos
quando urgiria que atacassem. Dissemina ininterruptamente falsos alarmas e
falsos avisos. Conquista, para tua causa, os governadores de províncias
inimigas. Eis aproximadamente o que deves fazer, se queres ludibriar, usando
habilidade e astúcia.
Os generais que brilhavam entre os antigos eram homens sábios,
previdentes, intrépidos e afeitos ao trabalho. Tinham sempre os sabres à mão.
Jamais presumiam que o inimigo não viria, estavam prontos para qualquer
eventualidade. Tornavam-se invencíveis e, deparando-se com o inimigo, não
necessitavam esperar reforço para bater-se. As tropas que comandavam eram
bem disciplinadas, e sempre dispostas a investir, ao primeiro sinal do
comandante.
Entre eles, a leitura e o estudo precediam a guerra e os preparavam
para ela. Defendiam com cuidado suas fronteiras, e fortificavam suas cidades.
Não investiam contra o inimigo, quando sabiam que este estava preparado.
Atacavam pelo lado mais fraco, quando suas tropas estavam indolentes e
ociosas.
Antes de terminar este capítulo, devo te prevenir contra cinco defeitos
que, embora pareçam inócuos, são perniciosos e representam obstáculos
funestos que derrotaram a prudência e a bravura mais de uma vez.
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I. O primeiro é o entusiasmo excessivo em afrontar a morte, atitude
temerária que se honra 'Com o nome de "coragem", "intrepidez" e
"valor" mas, no fundo, só merece o de "covardia". Um general que
se expõe sem necessidade, como se fosse simples soldado, que
parece buscar os perigos da morte, que combate e manda
combater até o limite, é um homem que merece morrer. É um
homem precipitado, incapaz de encontrar recursos para safar-se de
um mau momento. É um covarde, incapaz de sofrer o menor revés
sem se frustrar, acreditando que tudo está perdido, se não sair
exatamente como planejara.
II. O segundo perigo é o cuidado exorbitante em conservar a vida.
Acreditando-se necessário ao exército inteiro, o general dá mostras
de covardia. Não ousa, por essa razão, abastecer-se às custas do
inimigo. Tem medo de tudo, até da própria sombra. Hesita, à
espera de uma ocasião mais favorável. Perde a que aparece, não
toma nenhuma iniciativa. Mas o inimigo, que está sempre à
espreita, aproveita-se, fazendo com que um general assim
temeroso perca toda a esperança. O adversário o enredará, lhe
interceptará o abastecimento e o fará perecer pelo amor demasiado
que tinha em preservar a própria vida.
III. O terceiro perigo é a cólera. Um general que não sabe se controlar,
que não tem império sobre si mesmo, e se deixa arrebatar pela ira
ou pela cólera, será ludibriado pelos inimigos. Estes o provocarão,
lhe armarão mil emboscadas que sua irascibilidade impedirá de
reconhecer, e nas quais infalivelmente cairá.
IV. O quarto perigo é a excessiva suscetibilidade. Um general não
deve se ofender de forma intempestiva e despropositada. Por
querer reparar a honra apenas levemente ofendida, corre o risco de
perdê-Ia irremediavelmente. Deve dissimular. Não deve se
desencorajar depois de alguns fracassos, nem acreditar que tudo
está perdido porque cometeu algum erro ou sofreu algum revés.
V. O quinto perigo é a complacência ou a compaixão desmedida em
relação aos soldados. Um general que não ousa punir, que fecha
os olhos para a desordem, que teme que os seus soldados estejam
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sempre vergados sob o peso do trabalho, não ousando, por essa
razão, impor-Ihes novas tarefas, é um general fadado ao fracasso.
Os subordinados devem sempre ser punidos. É preciso que sofram
provações. Se quiseres tirar partido do serviço dos soldados,
mantém-nos sempre ocupados, não permitas que fiquem ociosos.
Pune-os com severidade, mas sem rigor excessivo. Ministra
castigos e trabalho, com discernimento.
Um general hábil evita todos esses defeitos. Sem procurar
desesperadamente viver ou morrer, deve conduzir-se com prudência e
coragem, segundo as circunstâncias.
Se há justas razões para se encolerizar, que o faça, mas não imite a
ferocidade do tigre.
Se crê que sua honra está maculada e quer repará-Ia, que siga as
regras da sabedoria, e não a suscetibilidade advinda de uma reputação
comprometida.
Que ame seus soldados e os poupe, mas com moderação.
Combatendo, movimentando-se, sitiando cidades, fazendo ofensivas,
deve conjugar a astúcia à valentia, a sabedoria à força das armas. Deve saber
reparar seus erros, quando tiver a infelicidade de cometê-los, aproveitando
todos os erros do inimigo e induzindo-o a cometer outros.