A Ordem Da Lua

By JoiceCruz15

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Crystal Halle é uma adolescente aparentemente normal. Crescendo em uma família adotiva vivencia problemas típ... More

1- Devaneios
2- Minha Vida Extraordinária Sem Nada De Extraordinário
3- Escola, Doce Escola!
4- Fantasmas do passado
5- Colegas de almoço
6- Abram as cortinas do teatro
7- Turbulência
8- Gota D'água
9- Fugitiva
10- Contos De Terror
11- Um Gnomo Fora Do Jardim
12 - Entre Contos E Realidade
13- Pó De Fada
14- Sonho
15- Sementes Élficas
16- Lembrança
17- Vazios
18- Guardiões Da Lua
19- Respostas
20- O Sugador De Almas
21- Rose
22- Voltando Para Casa
23- Um pingo no i
24- Preparativos
25- Viagem
26- Fechem O Livro! A Ficção Está Saltando Para Fora Dele
27- Expresso Hogwarts?
28- Peter Verlac
29- Família
30- Nova Vida
31- A Espera
32- Mestre Garret
33- Os Mestres
34- Novos Conceitos
35- Monstros na curva
36- Embate
37- Teste Místico
38- Os Melhores Perdedores
39- Seleção
40- Armas ao Alto!
41- Progresso
42- A Angústia de Natasha
43- Que Comecem As Provas!
44- Pontos
45- Táticas
46- Massacre
47- Sherlock Holmes
48- Revanche
49- Troco
50- O Encapuzado
51- Provocações
52- O Baile
53- O Ataque
54- A Missão
55- A Cidadela
56- Desabamento
57- O Sangue da feiticeira
58- Nuances
59- Amigos criminosos
60- Nosso Colega Morto
61- Como Um Dia No SPA
62- Ladrões De Armamento
63- As Defesas De Uma Fortaleza
64- Juventude versus experiência
65- Alianças
66- Confiança
67- Lealdade
68- Caminhos
69- Primeiro Passo
70- Transfiguração
71- Vigília
72- Julgamento
73- Uma Lua Azul
74- Velhos amigos
75- GAIOLA
76- Marionete
77- Enjaulado
78- Calmaria
79- Laços Paternos
81- Lar
82- Epílogo:

80- O Fim Das Férias

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By JoiceCruz15

Eu estava mergulhada em um sono tranquilo, sem sonhos, quando raios de sol persistentes me fizeram abrir os olhos. Percebi que, no turbilhão de emoções de ontem, havia esquecido de fechar a cortina da janela. Embora a intensa claridade me incomodasse, eu não tinha vontade de sair da minha cama. Braços fortes e possessivos me envolviam, mantendo-me firmemente em seu abraço.

Ao abrir os olhos um pouco mais, deparei-me com um jovem moreno de beleza cativante. Seus lábios repousavam entreabertos, e seus olhos estavam cerrados em um sono sereno e tranquilo. Ele dormia ao meu lado, segurando-me de forma gentil e possessiva. Parecia que já deveria ser pelo menos umas dez da manhã, e isso era estranho, já que Tyler costumava acordar cedo. Percebi o quão exausto ele devia estar, e como os últimos dias haviam sido verdadeiramente desgastantes para ele.

Fechei meus olhos e preparei-me para roubar alguns minutos a mais de sono, ignorando por completo a luminosidade que invadia o quarto, enquanto me aconchegava ainda mais nos braços de Tyler. Entretanto, três batidas suaves na porta romperam a quietude, fazendo-me erguer da cama num movimento ágil. Desejava que Tyler pudesse desfrutar de mais tempo de descanso, ininterrupto, sem ser despertado, então, com extrema cautela, desembaracei-me de seus braços e me dirigi à porta, pisando com suavidade no chão.

Ao girar a maçaneta e abrir a porta, me deparei com minha avó. Jane Sullivan estava vestida de forma simples, porém elegantemente. Ela usava um vestido longo de linho creme com um cinto de couro marrom para acentuar a cintura, sapatilhas combinando, e seu cabelo dourado estava arrumado em um coque baixo e elegante.

Antes de me cumprimentar, minha avó, Jane Sullivan, direcionou seu olhar para dentro do quarto com uma expressão preocupada. Segui o olhar dela e percebi que ela podia ver Tyler estirado na minha cama, com a manta caída, revelando sua cueca boxer preta. Minhas bochechas coraram instantaneamente. Em um movimento rápido, fechei a porta atrás de mim, sentindo-me envergonhada na presença dela.

Jane me observou com preocupação e falou com seriedade: - Crystal, eu entendo que o amor juvenil é empolgante, mas é preciso ter cautela. Mesmo sendo Guardiões, e tendo responsabilidades diferentes das pessoas comuns, vocês ainda são quase crianças, e certos acontecimentos não planejados, mesmo na vida de uma Guardiã, podem ser complicados.

Minha vergonha aumentou, e eu respondi imediatamente: - Não fizemos nada, vó. Estávamos apenas dormindo.

Jane pareceu acreditar facilmente em minhas palavras e continuou: - Peço desculpas por ser intrometida, mas sei que você não teve o apoio de uma mãe para discutir certos assuntos. - Ela parecia triste ao mencionar isso. - E bem, Susan não tem sido uma mãe exemplar para você. Saiba que estou aqui para conversar sobre qualquer assunto. - Jane tocou meu ombro. - Não precisa se sentir envergonhada em falar comigo. Podemos discutir qualquer assunto, até mesmo sobre os meninos. - Ela sorriu ao ver minha face ruborizada. - Em minha experiência, sei que jovens com a aparência do Tyler costumam dar um pouco de trabalho, não é mesmo?

Sorri concordando com sua afirmação, mesmo com minha vergonha evidente. Ao mesmo tempo, senti uma gratidão sincera por ela me oferecer uma relação de cumplicidade que eu nunca havia experimentado com nenhum adulto. - Obrigada - agradeci com sinceridade.

Jane me analisou, vestida apenas com minha camisola, e sugeriu: - Acho que você deveria se trocar e prender o cabelo. Não é adequado ir assim para uma conversa com seu pai.

Suas palavras me acertaram. - Eu realmente não tenho vontade de falar com ele!

Jane suspirou. - Crystal, você deve enfrentar isso. Vocês têm questões a discutir. - Ela tocou carinhosamente meu rosto. - Ele errou muito, mas ele te ama. Apenas o ouça. Adiar isso só tornará tudo mais difícil.

Suspirei, aceitando a sabedoria de minha avó. Ela estava certa. Eu não era mais uma criança para me esconder no quarto e evitar esse encontro. - Tudo bem, vou me trocar em um minuto. - Jane sorriu com aprovação diante da minha atitude positiva.

Após me vestir silenciosamente no meu quarto e deixar Tyler ainda dormindo, dirigi-me à ampla biblioteca que Jane Sullivan possuía em sua mansão. Ao entrar, deparei-me com Marcos sentado em um pequeno sofá de dois lugares próximo à lareira, segurando um exemplar de algum jornal de páginas acobreadas. Assim que me viu parada à porta, o homem sorriu:

- Olá, Crystal - falou com certo constrangimento. - Venha, sente-se aqui - apontou para um lugar ao seu lado.

Caminhei hesitante, meus passos pareciam ecoar pelo silêncio da biblioteca à medida que meu sapato tocava o piso amadeirado. Sentei-me no sofá de forma tímida, tendo o cuidado de não encostar naquele homem estranho.

Marcos permaneceu lendo o jornal. Ao seu lado, pude observar os traços do seu rosto, que até então eu não havia conseguido prestar tanta atenção. Sua pele era clara, mas não tinha o mesmo tom pálido que a minha possuía; era cremosa. Seus olhos lembravam os meus, rodeados por longos cílios escuros. Seus cabelos eram de um castanho claro acobreado, e seu rosto bem desenhado era emoldurado por um maxilar forte. Seu corpo era atlético, vestindo uma calça de alfaiataria bege e uma camiseta azul celeste. Observando o homem estranho ao meu lado, lembrei-me das piadas inapropriadas de Natasha, Dalla e Maya sobre sua aparência, e compreendi que, de fato, ele era bonito.

A boca do homem se torceu levemente, as linhas de sua testa se contraindo em preocupação.

- Então - falou sério - qual é a sensação de ser famosa agora?

Não compreendi sua pergunta, mas assim que ele estendeu em minha direção o jornal que lia, vi uma foto minha e da minha equipe recebendo a medalha de honra no evento de ontem. Agarrei o jornal curiosa, passei os olhos rapidamente por ele, lendo de cara alguns elogios à nossa equipe e, mais do que isso, elogios ao acampamento, ressaltando como a Ordem formava bem seus Guardiões. Compreendi que o evento de ontem foi mais uma tentativa da Ordem de esconder suas falhas e erros do que nos homenagear. Sorri sem entusiasmo.

- Eu não sabia que aqui tinha jornais.

Marcos retirou o jornal das minhas mãos, colocando-o sobre uma pequena mesa que ficava ao lado do sofá.

- Você sabe pouco desse mundo, não é mesmo? - o homem falou com uma expressão grave.

- Não é como se eu tivesse vivido por muito tempo por aqui para poder aprender - falei amarga.

- Filha - Marcos falou, colocando uma mão no meu joelho.

- Eu sei - falei seca. - Você só estava tentando me proteger - falei, sem de fato passar credibilidade de que acreditava naquelas palavras. - Acredite, minha avó já narrou várias vezes esta história para mim, tentando explicar suas escolhas.

_Mas você não me parece muito convencida _falou o homem me olhando apreensivo.

Virei-me para ele, irritada com o peso que suas palavras carregavam. Quem havia realmente crescido sem o amor de sua família biológica era eu. Ele não podia se fazer de vítima agora, afinal, quando ele me afastou de si, também me privou do convívio de minha avó, de Peter e de todo o mundo ao qual eu pertencia. Como ele ousava inverter os papéis e se fazer de ferido?

- É que, se bem me lembro, na carta de minha mãe, ela te pediu para cuidar de mim, não para me enviar para Gheorge Halle como se eu fosse um filhote de estimação indesejado - respondi.

Ele olhou sério para mim e disse: - Crystal, eu só estava te protegendo. Longe daqui, você teve a chance de viver uma vida feliz, sem todos os dramas que esse mundo traria para alguém como você.

- Vida feliz? - sorri ironicamente. - Nunca tive uma estrutura familiar saudável, percebo agora. Todas as vezes que Gheorge me olhava com orgulho, não era amor paterno, mas apenas satisfação por ter sido incluído em algo relacionado aos Guardiões - meu sorriso se tornou amargo. - Quanto a Susan, bem, ela nunca conseguiu esconder que me adotou apenas para satisfazer o capricho do marido. Especialmente depois que Gheorge morreu, precisei aprender a ignorar todos os sinais que indicavam que eu não era uma filha para ela, ao contrário de minhas irmãs de criação. Tive que encontrar maneiras de viver discretamente naquela casa, para não me tornar mais um estorvo do que eu já me sentia.

_Ei _falou meio atônito com minhas palavras _Gheorge a amava! Não fale isso.

Eu ri com amargor - E eu o amei muito. Ele foi a única figura de pai que eu tive, e amo também a Susan, apesar de cada uma das vezes que ela me fez sentir rejeitada, das vezes que não foi intencional e até das vezes que foi proposital depois que ela encontrou aquela carta da minha mãe. E eu amo também minhas irmãs, até a Ângela, que na vida dela nunca deve ter conversado comigo usando duas palavras gentis que fosse em sequência. Suspirei - Mas como eu não iria amar? São a família que eu convivi minha vida toda, mas esse amor não anula todas as vezes que eu via minha mãe abraçando minhas irmãs, as protegendo, mimando e mesmo que tentasse não conseguindo ter as mesmas atitudes comigo. Definitivamente não apaga o fato de que mesmo fazendo minhas vontades, e tentando me dar o máximo de carinho que conseguia, agora depois de mais velha eu vejo com clareza que eu era uma missão para Gheorge. Suspirei - Então se quiser inventar uma justificativa boa e vazia sobre os seus atos, está ok, pode falar, e eu irei aceitar, mas não venha tentar mandar no que eu devo ou não estar sentindo agora! Uma lágrima grossa e indesejada riscou a minha face, mas assim que Marcos estendeu a mão para limpá-la eu me afastei, secando meu rosto eu mesma.

- Crystal. - Marcos, o grande guerreiro da Ordem da Lua, me olhava perdido, como se não soubesse de maneira alguma o que dizer. - Eu estou me esforçando, apenas se esforce também. Precisamos nos aproximar mais. - Suspirou. - Eu quero te conhecer!

A raiva pulsou no meu sangue, somando-se ao ressentimento e formando uma espiral perigosa em minha mente.

- O esforço também inclui ter me arrastado como a uma boneca de trapo? Ter me jogado no chão e tentado me mandar para longe novamente o mais rápido possível?

- Crystal, controle esse gênio. - Falou, suas sobrancelhas se unindo em reprovação, e o ver me recriminando como um pai preocupado com a educação de um filho fez meu humor inflamar ainda mais.

- Quer me conhecer, Marcos? - Falei ferida. - Você teve malditos dezesseis anos para fazer isso, não acha que chegou tarde demais?

Eu me levantei do sofá, irritada, as lágrimas teimosas desciam, mesmo eu as evitando. Quando dei alguns passos à frente, fui impedida. Marcos, em um gesto rápido e inesperado, me puxou para um abraço. No início, tentei empurrá-lo, mas ele era forte. Ele afundou o seu rosto em meus cabelos, em um gesto terno.

- Você se parece com ela, e herdou também toda a teimosia. - Ouvi uma risada rouca escapando de sua boca. - Nossa menina, ela ficaria tão orgulhosa quanto eu estou.

Naquele momento, me perdi um pouco, e antes que percebesse, relaxei o corpo e retribuí o abraço. Quando ele me soltou, olhando para o meu rosto emocionado, senti-me confusa, meus sentimentos brigando em minha mente, parecendo abrir uma cratera em meu cérebro. Sem mais nenhuma palavra, saí da biblioteca, sem saber ao certo o que estava sentindo e o que deveria sentir.

Ao chegar em meu quarto, não encontrei Tyler, mas deparei-me com um bilhete cuidadosamente deixado sobre a cama. A mensagem dizia:

"Crys, Eu precisei ir. Sua avó me contou que você foi conversar com o seu pai. Bem, eu também preciso conversar com o meu."

Li o bilhete, desejando a Tyler mais sorte do que eu tivera na minha própria conversa com meu pai. Afinal, a situação com meu pai era complexa. Seria mais simples se ele tivesse simplesmente me abandonado, se ele fosse sempre o ogro bruto que conheci inicialmente. Nesse caso, eu poderia facilmente odiá-lo e afastá-lo sem remorso. No entanto, a verdade era mais complexa: um pai perdido que havia errado enquanto tentava acertar. E isso era difícil de ignorar.

Tyler demorou bastante para voltar, passando o dia fora. Felizmente, não fiquei sozinha. Natasha, Maya e Peter vieram até a casa de nossa avó. Embora os Verlac tivessem uma mansão enorme, Peter sempre fez questão de dividir seu tempo entre as duas famílias, evitando que Jane Sullivan se sentisse solitária quando estava na Cidade dos Guardiões. Em contraste, meus parentes maternos eram escassos, sabia que tinha primos distantes, mas a família Stowe não era conhecida por sua sociabilidade. Eles viviam em missões e explorando outros mundos, o que resultava em poucos parentes a serem visitados na Cidade dos Guardiões.

O dia passou rápido, com horas facilmente consumidas entre risadas diante das piadas questionáveis de Natasha e as expressões chocadas de Peter, sempre pronto para repreendê-la. Maya também se revelou uma ótima companhia, uma mudança notável em relação às primeiras impressões que tive dela ao ingressar na Ordem.

No final da tarde, minha avó me chamou para a biblioteca. Entrei na sala, já um pouco apreensiva, e minha tensão aumentou ao ver meu pai ali. Jane estava tranquila, saboreando uma xícara de chá em uma poltrona, enquanto Marcos ocupava o mesmo sofá onde conversamos pela manhã. Sentei-me em uma poltrona, observando os dois com curiosidade.

Jane sorriu para mim e disse: - Não precisa arregalar esses grandes olhos azuis, querida. Chamamos você aqui para alinhar nossas próximas ações.

Olhei para Marcos, que me encarava, seus olhos refletindo os meus, e ele parecia tão perdido quanto eu.

Minha avó prosseguiu: - Chegou a hora de você voltar para o mundo humano, Crystal! Sua declaração me chocou, fazendo-me levantar defensivamente da poltrona.

- Vocês não podem fazer isso comigo! Olhei irritada para meu pai, apontando um dedo em sua direção. - Você deve estar feliz, me diz, como conseguiu convencê-la a me mandar embora? Elevei o rosto desafiadoramente. - Só quero saber como vocês pretendem fazer isso, porque não vou aceitar. Estão planejando apagar minha memória?

Marcos passou a mão nos cabelos, impaciente. - Calma, Crystal, você só irá retornar se quiser, filha.

Fiquei confusa. - Como assim?

Jane sorriu. - Suas férias de verão acabaram, querida, e o seu primeiro ano no acampamento também chegou ao fim. Comecei a entender. - Você pode voltar para o mundo humano, estudar na sua escola normalmente e retornar nas próximas férias, para o seu segundo ano no acampamento.

Marcos complementou. - Mas se quiser ficar aqui, nós não vamos nos intrometer. - Passou as mãos pelos cabelos em um gesto nervoso. - Conversei com a sua avó, e agora, mesmo não concordando que este mundo seja seguro para você, não há muito a ser feito. Você já mergulhou de cabeça nele. - Bufou. - Oh céus, você já esteve em Storm Obsidiam, quase foi executada como traidora e ficou cara a cara com Murdoch. Como algo aqui poderia ser seguro?

Minha avó lançou a ele um olhar solidário, parecendo entender o desespero do homem.

- Então - continuou ele - se quiser voltar para o mundo humano e continuar com a sua vida, e depois retornar para o acampamento para continuar a sua formação como Guardiã, eu aceito. Mas se quiser simplesmente abandonar a sua vida no mundo humano e ficar definitivamente aqui, bem, eu também irei permitir.

Eu me sentei novamente, refletindo sobre minha vida. Aqui eu me sentia encaixada, como se tudo fizesse sentido, mesmo quando não fazia. Aqui eu tinha amigos e minha família biológica. No mundo humano, eu tinha uma família, problemática e cheia de falhas, mas a única que conheci por dezesseis anos. Eu queria ficar, mas ao mesmo tempo, como seria isso, desaparecer da vida de Susan e de minhas irmãs?

- Como iriam justificar o meu sumiço para Susan? Uma poção de perda de memória? - Perguntei.

Minha avó riu. - Você, como mística, deveria saber que não é tão fácil assim. Teríamos que apagar a memória de muitas pessoas, todos os seus colegas de escola e todas as pessoas que já te viram. As coisas não funcionam desse jeito.

- Seria uma solução mais prática, filha. - Falou Marcos, o que me deixou confusa novamente. - Iríamos forjar a sua morte. Pronto, resolvido. - Jane concordou com a cabeça, aceitando as palavras do filho.

Aquilo me pareceu terrivelmente errado. Apesar de Susan não ter me dado o mesmo amor que deu às minhas irmãs, ela fez o melhor que pôde dentro de suas limitações afetivas. Mesmo que não de maneira igual, ela me amou à sua maneira. Pensei nas minhas irmãs, especialmente em Luíza. Não, aquilo não parecia certo. Elas poderiam se sentir culpadas, sofrer com uma mentira. Eu não poderia seguir minha vida causando danos psicológicos a outras pessoas. Mas a próxima informação reforçou minha convicção.

- Tyler ficará aqui no acampamento, certo? - Perguntei, triste.

Meu pai bufou, irritado com minha pergunta. - A escolha é sobre você, não sobre o filho de Gregory.

Minha avó foi mais amena e sorriu. - Não, ele irá para o mundo humano. Selena não o deixaria aqui. O amargor e ressentimento da mulher continuam os mesmos. - Ela olhou para meu pai. - E o garoto é um bom menino. Ele não magoaria os sentimentos de sua mãe, embora eu ache que, se você decidisse ficar aqui, ele repensaria sua escolha.

Sorri aliviada, o peso da minha decisão diminuindo. - Eu vou para o mundo humano. - Meu pai revirou os olhos, aparentemente compreendendo o que me deixou mais segura em minha decisão. - Vou treinar de lá, estudar as coisas que preciso aprender, e nas minhas férias de verão, quando voltar para o meu segundo ano no acampamento, não estarei atrasada por ter ido para o mundo humano. Algo importante surgiu em minha mente. - Peter e Natasha poderão nos visitar no mundo humano durante o ano, certo?

Meu pai bufou. - Certamente. Peter adora viajar, e sua amiga ruiva poderá te visitar também.

Franzi o cenho pensativa, questionando silenciosamente o futuro: - E quando irei voltar?

Minha avó foi quem respondeu, antecipando minha pergunta com uma prontidão cativante: - Amanhã - ela disse de forma prática, notando meu espanto. Ela sorriu gentilmente e tranquilizou-me: - Todas as suas coisas serão trazidas para nossa casa. Não se preocupe, já mandei buscar todas as suas coisas e as de Peter.

Concordei com um gesto de cabeça, ciente de que não usaria muito minhas capas, casacos, vestidos longos e roupas de treino em Huntsville, onde o Texas oferece um clima bem diferente do acampamento.

O sol já começava a se pôr, e eu saí para o jardim da casa para apreciar a tranquilidade que o fim do dia trazia. Para minha surpresa, Caios estava sentado em um banco, dentro da propriedade da minha avó. Curiosa, me aproximei e me sentei ao seu lado. Ao me ver, Caios abriu um sorriso caloroso.

- Peter me disse que você estava ocupada em meio a uma conversa com seu pai e com a sua avó, - ele se explicou. - Mas mesmo assim resolvi esperar um pouco e conversar com você.

- Fico feliz que tenha vindo, Caios, - disse, sorrindo. - Realmente não conversamos muito depois de toda a bagunça que vivemos nos últimos dias. Obrigada, Caios. Você, Clara, Maya, Norman, Felícia e Mirela provaram ser grandes amigos. Devemos muito a vocês por terem acreditado em nós.

Caios estava vestindo uma camiseta branca e uma calça de moletom cinza, com cabelos recém-lavados. Nesse momento, percebi que seu olhar estava um tanto confuso e perdido.

- Não precisa agradecer, Crystal, - ele disse enquanto fixava o sol, que fazia seus últimos esforços antes de desaparecer no horizonte, tingindo o céu de dourado. - Era o certo a se fazer, não apenas porque somos amigos, mas também porque vocês eram inocentes.

- Mesmo assim, devo agradecer, - respondi, dando de ombros. - Vocês arriscaram muito nos ajudando.

Ele simplesmente deu de ombros mais uma vez, recusando meus agradecimentos.

A atmosfera ao nosso redor silenciou, até que ele quebrou o silêncio com uma pergunta direta e séria:

- Então, você e o Montreal são namorados agora? - Caios fez a pergunta sem me encarar diretamente.

Senti um arrepio de surpresa, e com ele um leve rubor ao responder:

- Sim, estamos namorando. - Enquanto ele continuava a olhar o sol se pôr, não consegui evitar notar a ruga que se formou em sua testa.

Logo após minha resposta, eu me senti compelida a pedir desculpas pelo desconforto que minha confirmação causara:

- Desculpe. - Murmurei, desapontada por ter ferido alguém que embora, não romanticamente, eu gostava muito.

Caios desviou o olhar do horizonte, suas mãos inquietas:

- Não peça desculpas. - Ele tentou aliviar a tensão. - Eu sabia que se eu não agisse, isso aconteceria mais cedo ou mais tarde. - Ele soltou um suspiro frustrado. - Montreal não é tolo, ele estava interessado em você já há algum tempo.

Um silêncio desconfortável pairou entre nós, mas Caios o quebrou mais uma vez:

- Eu tinha alguma chance?

A pergunta me pegou de surpresa, e eu não sabia como responder de imediato:

- Caios, eu... - Suspirei, minha voz um sussurro. - Não sei. Você é incrível, mas eu realmente gosto do Tyler.

Ele fechou os olhos, parecendo resignado:

- Bem, eu mereço por não ter agido quando tive a chance. - Ele fez uma pausa, e eu comecei a falar, mas ele continuou. - Mas não se preocupe, não desejo atrapalhar o relacionamento de vocês. Desejo sorte para vocês dois. - Ele apertou os olhos mais uma vez. - Mas se algum dia o Montreal vacilar, saiba que estarei aqui.

Suas palavras me deixaram chocada, e antes que eu pudesse responder, um leve pigarro nos fez virar a cabeça. Tyler estava parado ao lado do banco, e eu não tinha notado a sua chegada.

- Atrapalho a conversa de vocês? - Ele perguntou, olhando para Caios com um toque de desconfiança.

Caios prontamente respondeu:

- Ah, não, eu só estava conversando com a minha amiga. - Ele recuperou o seu entusiasmo habitual. - Nós nos vemos por aí, Crystal. - Com um sorriso tímido nos lábios, ele se afastou sem esperar por uma resposta.

- O que ele queria com você? - Tyler, com sua postura relaxada ao meu lado, perguntou.

Dei de ombros. - Ele só veio confirmar se estávamos juntos. - Notei que Tyler pareceu um pouco tenso, mas tive que ser sincera. - Mas não foi nada demais, Tyler.

O garoto bufou, sua expressão se endurecendo. Seu estilo de vestuário, casual e despretensioso, destacava sua aparência atlética.

- Que bom que você não vai ficar sozinha por aqui quando eu ficar longe.

Eu me virei para ele surpresa. - Como assim ficar longe?

- Crystal. - Ele falou envergonhado, com uma pitada de tristeza em seu sorriso. - Eu e meu pai estamos nos acertando, e bem. - Suspirou. - Ele me convidou para fazer uma curta viagem com ele, vamos visitar alguns pontos do mundo dos Guardiões. Isso aqui não se resume ao acampamento, à cidadela e à Cidade dos Guardiões, sabia? - Disse entusiasmado, com seus olhos brilhantes refletindo sua empolgação. - Ele acha importante eu conhecer bem o nosso mundo! Então vamos visitar algumas aldeias importantes, e ele me mostrará a geografia do nosso mundo.

Eu murchei. - E quanto tempo vai demorar essa viagem? - Tentei esconder meu descontentamento para não atrapalhar sua felicidade.

- Bem. - Respondeu ele, com um olhar melancólico. - Você vai ficar cinco dias no mundo humano antes do retorno às aulas, o que nesse mundo deve dar quase um mês. - Pegou na minha mão firmemente, transmitindo segurança. - Mas se você quiser, posso ver com meu pai se você não pode ir junto. Ou talvez seu pai ir junto, assim você poderá passar um tempo com ele. - Fez uma careta. - Desculpe por me intrometer, meu pai me fez prometer que te aconselharia a se aproximar de Marcos Sullivan, mas isso parece falso para eu fazer.

Sorri também fazendo uma careta. - São apenas cinco dias - disse parecendo mais decidida do que estava. - Sentirei sua falta, mas não é como se fosse muito tempo, e você precisa ter esse tempo com o seu pai. - Sorri, com seu sorriso tímido respondendo ao meu.

- Eu vou sentir sua falta, sabia? - Ele disse enquanto capturava alguns fios do meu cabelo em sua mão. - Tivemos tão pouco tempo juntos até agora. - Eu ia dizer algo espirituoso, mas as mãos de Tyler me puxaram para um beijo apaixonado.

Os lábios de Tyler contornaram os meus, fazendo minha boca seguir a mesma dança que a sua. Sua mão direita brincava com os meus cabelos, enquanto a outra segurava minha cintura com firmeza. Esses momentos com ele me faziam pensar o quanto este ano havia sido intenso. Eu não aprendi apenas sobre poções, rituais e magia; eu aprendi muito sobre o amor, pois aquele sentimento que consumia o meu peito só poderia receber esse nome.

Após alguns minutos, nos separamos. Tyler, desta vez, não dormiu em minha casa, preferindo passar a noite com sua família. Eu me vi sozinha naquela noite, ansiosa pelo que encontraria na minha antiga casa no mundo humano. No dia seguinte, acordei cedo, tomei meu café e explorei a Cidade dos Guardiões. Também me despedi dos meus amigos que ficariam ali. Reservei um tempo para passear pelas pequenas lojas próximas, onde comprei colares e pulseiras com Natasha em uma boutique. Embora não tivessem pedras preciosas, esses acessórios eram elegantes e delicados, adornados com intricados padrões de prata que reluziam sob a luz. Os colares eram finos, com pendentes sutis lembrando símbolos mágicos, e as pulseiras se ajustavam graciosamente ao pulso. Transmitiam um ar de encanto e sofisticação, adequados tanto para a Cidade dos Guardiões quanto para o mundo humano.

Após o almoço, minha avó me informou que era hora de nos prepararmos para nossa viagem de volta ao mundo humano. Meu pai não estava em casa, talvez, assim como eu, ele não sabia como se despedir devido a estranheza da nossa relação. Me concentrei nos preparativos da viagem, separei as poucas coisas que poderia levar e me frustrei ao descobrir que meu medalhão e meu arco ficariam para trás. Vesti uma calça jeans surrada que havia levado na mochila e uma camiseta larga e desbotada. Quando desci para a sala, minha avó notou minha vestimenta e fez um comentário:

- Promete que, ao chegar no mundo humano, vai começar a prestar um pouco mais de atenção na forma como se veste? - Ela torceu o lábio. - Imitar um mendigo não combina com você.

Não pude evitar sorrir, reconhecendo que minha moda no mundo humano deixava a desejar:

- Devo ter roupas melhores no guarda-roupa. Susan sempre me dava algumas roupas legais.

Minha avó assentiu:

- Vou providenciar um cartão para que possa comprar coisas de acordo com seu gosto.

Não discuti com ela e apenas sorri.

Uma carruagem nos levou até um portal na Praça de Julgamentos, onde as místicas já haviam reconstruído três portais. Um deles nos levaria ao mundo humano e, a partir de lá, pegaríamos um novo portal que nos conduziria à minha cidade no Texas. Peter e Natasha nos acompanharam até a praça. Peter prometeu me visitar quando pudesse, e Natasha tentou me convencer a ficar na Cidade dos Guardiões, mas eu já estava decidida.

Tyler também havia passado o dia organizando sua viagem com o pai e seu retorno ao mundo humano. Quando chegamos à praça, meu coração se aqueceu ao vê-lo me esperando. Ele usava uma calça preta e um suéter marrom simples, mas sua beleza parecia nunca ter estado mais evidente. Assim que me aproximei, percebi seus olhos fixos na minha trança e nas roupas surradas. Ele sorriu:

- Eu havia esquecido o quão bem você fica com essas roupas. - Disse, me saudando com um selinho desinibido à vista de Peter, Natasha e minha avó, fazendo-me corar.

Natasha limpou a garganta:

- Faça isso dentro de um quarto!

Tyler sorriu para a ruiva:

- Quer um também, né, Nat, mas não sabe como pedir.

Natasha revirou os olhos:

- Prefiro beijar um polvo!

Tyler riu diante da piada da menina e olhou para o meu primo:

- Peter, quantos braços você tem?

Natasha corou, lançando um olhar de morte para Tyler, que apenas zombou mais da garota. Peter corou levemente, desviando o olhar e fingindo não ter entendido a piada.

Tyler continuou a me olhar concentrado:

- Eu sei que estou horrível - falei tímida.

- Você sempre está linda! - respondeu o garoto, fazendo Natasha revirar os olhos ao nosso lado.

Minha avó interveio apressada:

- Crystal, se despeça do garoto Montreal, da Natasha e do seu primo. Precisamos ir.

Os minutos finais antes da partida foram cheios de emoções. Eu e Tyler nos abraçamos com carinho, nossos olhos transmitiam a intensidade do nosso amor, mesmo sabendo que a separação seria breve.

Tyler segurou o meu rosto com ternura e disse com voz emocionada:

- Vou sentir saudades. Cada momento que eu passar longe de você será longo demais.

Assenti, segurando suas mãos e olhando profundamente em seus olhos.

- Eu também vou sentir muito a sua falta. _disse sincera.

Depois me voltei para Peter e Natasha, abraçando-os calorosamente.

- Vou sentir falta de todos vocês. Até breve! _falei limpando uma lágrima fofoqueira que teimava em molhar meu rosto.

Natasha me abraçou em seus raros momentos de afeto escancarado, Peter também me abraçou, me fazendo girar no ar, demonstrando nenhum pouco de timidez ao demonstrar seu carinho por mim.

Tyler me beijou uma última vez antes de eu ir, quando atravessei o portal eu ainda podia sentir os meus lábios quentes, transmitindo ao meu corpo mais uma promessa do que sentíamos um pelo outro.

Nota da autora:

Gratidão a todos que acompanharam esta história até aqui!

Gostaria de apresentar a vocês mais uma obra de minha autoria, "Delírios Sombrios" já está disponível no meu perfil. Confiram essa nova história, espero que gostem. Ah, e deixem um comentário em "Delírios Sombrios" contando o que acharam. Espero que estejam se divertindo com "A Ordem Da Lua", e deem uma chance a mais histórias postadas no meu perfil.

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