Havia um bom tempo que Valentyn não retornava. Cansada de esperar, resolvo procurá-lo.
Gostaria de saber o que significava estas lembranças e quem eram aquelas pessoas. Um pouco abatida, caminho pelos corredores me apoiando.
O vento era forte, mas não o suficiente para acabar com o calor de meu corpo, estava um pouco febril. Depois de tanto procurá-lo, resolvo ir até o seu prédio. Enquanto eu descia os degraus da escadaria do meu dormitório, tropecei, rolando escada a baixo. Parecia tarde da noite, visto que não havia ninguém ao redor. A chuva agora era fraca.
Meus joelhos sangravam com a queda, mas isto não seria um pretexto para eu desistir. Minha roupa estava um pouco molhada. Chegando ao grande portão, que separava o prédio do turno da noite com o restante, empurro com todas as minhas forças.
Alguns morcegos farfalhavam, foram embora com a abertura do portão. Meu corpo fraquejava a medida que eu avançava. Caí diante da escadaria do prédio de Valentyn.
- Valentyn! - gritei. Um rapaz de cabelos castanhos aparece no portão principal, assim que me vê, abre um sorriso.
- Não sabia que a janta seria servida mais cedo.
- Onde está Valentyn? - ignoro seu trocadilho.
- Mesmo que eu soubesse onde ele está, não te diria.
- Eu desejo falar com ele, é de extrema importância, posso esperar no Hall principal. - o rapaz me olhava com o mesmo sorriso, ainda mais malicioso.
- Sendo assim... mas é claro, minha senhora. - Ele desce a escada rapidamente, me agarra pela cintura e repousa meu braço em seus ombros.
- Seu cheiro é doce...
- Hum, obrigada. Mas não esqueça dos limites - digo.
- Com toda a certeza, senhorita - ele mantém o ar debochado. Assim que chegamos no Hall, ele me posiciona no grande sofá de couro. O rapaz retira um lenço do bolso de seu casaco, e passa nos meus joelhos feridos.
- Se não resolver isto, todos sentirão.
- Obrigada... - agradeço sua gentileza.
- Não precisa agradecer, é o que os cavalheiros costumam fazer - ele olha para mim - pelas damas. - Conclui, sorrindo.
- É, acho que sim - digo desconfortável, por estar tão próximo. O rapaz se levanta após limpar os meus joelhos. Ele vai até o balcão, serve duas bebidas de costas para mim.
- Como se chama, senhorita? - pergunta.
- Julliet, e você?
- Andrew.
- Prazer em conhecê-lo, Andrew.
- O prazer é todo meu - fala, trazendo duas bebidas consigo, tinha o mesmo sorriso malicioso.
- Não poderei beber, estou...
- Um pouco de vinho não fará mal, beba - interrompe, oferecendo a taça.
Penso em continuar com a recusa, mas acabo cedendo, penso que é bom me distrair um pouco. Logo depois de uma pequena conversa sobre a Instituição, onde ele dizia se arrepender de ter vindo, começo a me sentir fraca e sonolenta demais. Olho para Andrew, ele parecia cada vez mais radiante, conforme minha fraqueza se tornava evidente.
- Acho que irei voltar. - Falo, tentando me levantar.
- Desta forma? Você me parece cansada - ele diz, me segurando.
- Estou bem - tento me levantar mais uma vez, porém é em vão, caio sobre o sofá. Vejo a taça rolar pelo tapete, manchando com o pouco de vinho que havia.
Andrew pega um pouco mais do vinho, ele balança um pouco a taça e bebe, enquanto assistia ao meu quase apagão.
- Você me drogou - afirmo.
- Eu apenas te dei pelo que seu corpo gritava, a melhor parte nem começou.
Andrew se ajoelha ao meu lado, passa as mãos em meus ombros, ele desce com a alça da minha camisola na altura dos seios. Ele acaricia meu rosto. O rapaz então segura meu queixo, ele puxa para o lado oposto ao seu rosto, e roça seus lábios no meu pescoço enquanto também cheirava.
- Pare, por favor - eu tentava lutar contra o efeito da droga, uma tentativa fracassada, ela estava me vencendo.
- Não se preocupe, eu não vou fazer nada que te fará se arrepender por ter vindo - ele prosseguia com seus gestos. Seus dedos agora desenhavam algo sobre minha pele acima dos seios. Desceu com o indicador entre os meus seios, até que olhou para mim e sorriu.
- Você é irresistível, o perigo vale a pena. Que Armin me perdoe por isso, mas acabarei com a honra de sua filha.
Andrew corta minha pele com a unha e chupa seu dedo. Ele desliza uma de suas mãos pela minha perna, subindo o tecido da camisola. Andrew estava se deitando sobre mim até que uma faca atravessa nossos rostos e se prende no sofá de couro.
- E eu com a sua vida - fala Joseph. Fico aliviada ao ouvir sua voz.
- O quê...!? - antes mesmo de Andrew terminar sua frase, Valentyn surge suspendendo ele pelo pescoço.
Estava extremamente raivoso e fora de controle. Sua raiva se intensifica quando me vê. Joseph aparece ao meu lado, ele toca o meu rosto e diz algo que não sou capaz de ouvir, ele arruma minha camisola e me puxa para seu colo. Estava fraca demais para ver o que acontecia.
Antes de sairmos do Hall, olho para Valentyn , o qual ainda permanecia segurando o Andrew pelo colarinho, os dois mostravam as presas afiadas. Entretanto, o olhar de Valentyn era sombrio e extremamente vermelho, eu jurava que poderia ver uma luz vermelha ofuscando de seus olhos.
- Valentyn... - chamo quase que num sussurro, mas sei que ele poderia me ouvir. As portas se fecham com a nossa retirada do local, sem que Valentyn olhasse para trás. Eu me encolho nos braços de Joseph, tento evitar as lágrimas, mas é quase impossível.
- Julliet, te manterei afastada da Instituição por um tempo, até que tudo se resolva, ele se expôs demais - diz Joseph.
- Para onde vamos? - pergunto entre soluços.
- Para bem longe, só eu e você - responde, olhando ao longe.
Eram oito horas da manhã, arrumava minha mala cautelosamente. Observei a leve chuva pela janela. As cenas do ocorrido no dormitório do turno da noite, se repetiam freneticamente. Valentyn talvez tenha matado um nobre e isso traria grandes consequências, um problema ainda maior por eu ter sido a causa, uma mera humana.
Entrei no carro carregando minha mala. Joseph levava três malas, uma delas era menor que as outras. A garagem da Instituição tinha duas saídas, mas o motorista escolheu a saída que menos usávamos, a saída que dava para o prédio do turno da noite. Quando passamos em frente ao prédio, Valentyn surgiu da escuridão da entrada. Recebeu alguns nobres e olhou para mim discretamente como uma despedida. Assim que os nobres notaram a presença do carro, ele os guiou para dentro. Joseph fechou o meu vidro e tocou minha mão.
- Isso acabará logo - ele se referia ao que eu acabava de ver.
No aeroporto, Joseph verificava as nossas passagens com uma certa dificuldade.
- Quer ajuda? - pergunto.
- Não. - responde, concentrado no que estava fazendo.
- Certo, vou ao banheiro - falo. Joseph me lança um olhar preocupado.
- Não se preocupe, qualquer coisa eu grito.
- Isso parece bom - brinca. Eu reviro os olhos.
Quando chego no banheiro avisto duas garotas ou mulheres, não sei dizer, cochichavam algo sobre alguém, ao perceberem minha notória presença, pararam. Ignoro e uso uma das cabines.
- Acha que Valzinho vai finalmente enxergar a mulher que me tornei? - pergunta uma loira, enquanto arrumava o decote de sua blusa.
- Ele com certeza não resistiria ao seu charme, você está estonteante - responde uma garota de cabelos loiro escuro, retocando seu batom vermelho. A loira usava um batom rosa nude com gloss, mas nada exagerado, ela era até menos vulgar que a outra, ou era apenas uma tentativa.
- Veremos, senão terei que forçar a barra - ela me vê saindo da cabine e me chama - Ei! Nós nos conhecemos? Você me parece familiar.
- Não me recordo de ti, creio que não - eu disse.
- Está certo... pois bem, você poderia me ajudar em algo? Aos meus olhos, sua aparência é muito "comportada", gostaria de alguns conselhos. Quero me vestir decentemente para alguém. Ele é das antigas, sabe?
Quando ela diz isso me sinto constrangida, minhas roupas eram simples demais, realmente... não chamavam muita atenção.
- Ah, não sei se eu seria a pessoa certa para isso, mas... você poderia moderar estes decotes, se o que deseja é parecer simples aos olhos de alguém.
- Que audaciosa esta rapariga! Ousa dizer que minha senhora é uma qualquer! - se intromete a garota de cabelos loiro escuro.
- Não diga bobagens, Amanda. Eu pedi uma ajudinha para a jovem, enfim... me mostre a simplicidade da qual você se refere, jovem desconhecida - ao dizer isso, a garota chamada Amanda dá de ombros.
Apesar de me incomodar com suas formas de tratamento, resolvo ajudar. Arrumo o colarinho de sua blusa e abotoo alguns dos botões que faltavam, deixando apenas três abertos. Seus seios eram fartos o suficiente para hipnotizar muitos homens. Pego seu casaco e a faço vestir, escondendo um pouco dos seios. Por fim, ponho sua boina branca acima de seus cabelos e ela arruma.
- Devo admitir que parece outra pessoa agora - fala Amanda.
- Realmente, tão comportado que me dá ânsia. Sem ofensas, jovem desconhecida. Era o que eu queria mesmo.
- De nada - falo, saindo imediatamente antes de qualquer resposta. Ouço algumas risadinhas atrás de mim.
Vejo Joseph impaciente olhando o relógio de pulso a cada minuto. Resolvo fazê-lo esperar mais um pouco. Minha barriga roncava, precisava de um lanche. Paro em frente a um balcão de lanche, peço um sanduíche e um suco. Enquanto me deliciava com o lanche, vi as garotas entrarem em um carro super luxuoso.
- Um padrão bem diferente de mim - sussurro.
- E o que seria esse padrão? - pergunta Joseph - Você demorou.
- Ah! Não chegue desta forma! Cof! - engasgo com o susto.
- Desculpe, vê se não se suja, ainda nem chegamos para um banho.
- Se você me permite comer em paz, agradeço. Aliás, você comeu?
- Não estou com fome - respondeu. E assenti, continuei a comer meu lanche.
Assim que terminei, fomos para a fila. Não demorou muito para que decolássemos.
Eu não era muito fã do calor constante, a temperatura abafada estava me fazendo mal. O verão da Flórida era muito agressivo para quem está acostumado com o frio.
- Vamos a praia - fala Joseph.
- Não estou com muita vontade.
- Seria melhor você se distrair.
- Estou bem. - respondi.
- É... - Joseph se vira mas retorna, me jogando em seu ombro. - Mas você vai mesmo assim.
- Mas o quê? Isso é realmente necessário!? - faço protesto batendo em suas costas.
- Sim, desde que chegamos você está enfurnada nesse quarto. Vai aproveitar o que a Flórida tem para oferecer, lá fora.
- Oh, céus. Tudo bem, mas não precisa fazer isto.
- Preciso, te solto quando chegarmos lá.
- Joseph! - grito.
Dito e feito, Joseph me joga na areia sem muito cuidado. Ele contempla a visão à sua frente.
- Isso não é maravilhoso? - pergunta, mas não para mim.
- O sol está muito forte - resmungo. Joseph me ignora e vai para o mar assim que retira sua camiseta, ele possuía um corpo muito bonito, era forte.
Observo Joseph pegar algumas ondas com a prancha de surfe que alugou. Novamente as lembranças vem à tona, toco o corte que Andrew fez, estava quase cicatrizado.
Eu me pergunto qual é a situação de Valentyn no momento, será que sente a minha falta? Não vejo a hora de tudo acabar e eu poder voltar a minha rotina normal. Resolvo cochilar na sombra de um coqueiro.
- Não vejo a hora de te ver outra vez, Valentyn... - fecho os olhos e durmo.