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By dayligzt

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By dayligzt

— Theo! — Nalu a olhou com espanto assim que a fêmea entrou na Casa da Cidade. O rosto ainda inchado e o corte aberto na bochecha, apesar do sangue ter parado de escorrer. — O que aconteceu?

— Você foi um mentor muito melhor, acredite — Theodosia murmurou na direção de Lucien, que já estava se levantando do sofá e dando a volta pelo móvel para chegar a fêmea.

— Ah! — Kai esbravejou ao sair da cozinha e chegar a sala de estar, deparando-se com uma Theo descabelada e cheia de hematomas roxos pelo rosto. — Que horror, o que aconteceu?

— Apanhei de três trogloditas alados e fedidos, foi isso que aconteceu — ela parecia pronta para começar a espumar de raiva pela boca. — É assim que imaginaram que seria o treino de Azriel? Porque se foi, Nalu, você vai ter que me explicar o porquê de desejar tanto que eu morra!

— Ele simplesmente mandou três illyrianos te esmurrarem? — Kai perguntou com as sobrancelhas arqueadas, os braços cruzados contra o peito.

— Sim. E eu estava amarrada em uma árvore, nem pude me defender. Vocês deviam ir atrás de Azriel para fazê-lo se arrepender por causar tanto sofrimento a princesinha de vocês.

— Theo — Nalu chamou, a voz mostrando que não caiu na historiazinha. Ele continuou com os olhos escuros focados nela, esperando por uma resposta de verdade. Theodosia bufou.

— Eu lutei contra os três. Foi fácil acabar com o primeiro, mas me cansei demais com ele e o segundo, e então, quando chegou a vez do maior brutamontes que eu já vi na vida, eu acabei com a cara sendo esmagada por um toco de madeira — a ruiva contou, antes de abrir um sorriso zangado e erguer as mãos para o ar. — Azriel veio com aquele papinho de que eu podia parar quando eu quisesse e que poderia ganhar se usasse a minha magia.

— E você não usou a magia para vencer? — Kai perguntou.

— O que você acha? — Perguntou ela com sarcasmo, se voltando para ele com um sorriso enorme e dramático antes de indicar com o dedo o corte profundo em sua bochecha.

— Me deixe te ajudar com isso — Lucien falou ao se aproximar da fêmea, tocando o rosto dela com as mãos firmes.

— Posso não saber usar minha magia de fogo, Lucien, mas sei me curar sozinha — Theo tirou as mãos dele de seu rosto, passando pelos três machos para seguir em direção as escadas.

— Descanse, mais tarde vamos jantar no Demônio do Mar — Nalu avisou, virando-se para a ruiva que já estava alcançando o segundo andar da casa. — Eris e Selene virão para ver você.

Theodosia não respondeu, apenas continuou arrastando os pés com o rosto emburrado até chegar ao quarto e fechar a porta com um estrondo.

Maldito Encantador de Sombras, Mestre Espião, Azriel, demônio, e qualquer outra forma possível de chamá-lo.

Ele estava realmente querendo ajudá-la com a magia ou apenas tentando a fazer odiá-lo tanto quanto ele a odiava?

Theo queria domar sua magia. Queria mesmo. Mas preferiria fazê-lo sem queimar um acampamento inteiro no processo.

Não queria machucar pessoas inocentes, não de novo. Não como feriu Nalu, Cassian e Lucien na Casa do Vento.

Não como feriu inúmeros feéricos nas câmaras do Palácio da Outonal, duzentos anos atrás.

O poder podia ajudá-la a matar Dastan e conquistar o trono, sim... Mas também podia destruir tudo. Ela era destrutiva, perigosa.

Theodosia queria tomar um banho gelado, mas seu corpo estava tão quente que a água também ficou. Ela desembaraçou os cabelos e curou os hematomas e o corte no rosto. Ainda sentia um leve latejar na bochecha enquanto se vestia.

Ela estava cansada e irritada, então os vestidos teriam que esperar por outra ocasião. Vestiu calças escuras e uma blusa vermelha de mangas compridas, o cabelo longo preso em um rabo de cavalo alto.

Ela calçou botas marrons sem salto e de cadarços vermelhos antes de sair do quarto. Quando chegou as escadas, se deparou com Eris e Selene na sala de estar, esperando-a.

— Ah, já se curou? Lucien falou que você chegou parecendo uma bruxa que foi atacada por mamutes, eu queria ver! — O macho zombou quando a irmã chegou ao cômodo, um sorriso nos lábios.

— É sempre tão agradável te ver, Eris — Theodosia murmurou sem humor, antes de abrir um pequeno sorriso para Selene.

— Agora imagine viver na mesma casa que ele — Selene bufou, um sorriso levemente perverso nos lábios ao ver o marido arfar e levar a mão ao peito, ofendido.

— Você é muito cruel, espero que nosso filho não puxe esse traço da sua personalidade — Eris rebateu ao cutucar com leveza a barriga redonda.

— Vamos? Estou morrendo de fome. Melinda disse que faria bolo de carne para o jantar — Kai chegou a sala, saindo do jardim dos fundos da casa. Ele arregalou os olhos para dar ênfase ao dizer: — e você sabe como eu gosto daquele bolo de carne.

— Acho que você ama mais bolo de carne do que ama seu pai — Nalu chegou ao cômodo logo atrás do filho, um sorriso zombeteiro nos lábios antes de se voltar para Theo. — Está se sentindo melhor?

— Vou me sentir depois de uma caneca de cerveja e muito bolo de carne — Theodosia franziu o cenho para Nalu e Kai, depois para Lucien, Eris e Selene. — Não era só um jantar no navio? Por que estão todos tão arrumados?

— Estamos todos arrumados ou você que está vestida com trapos? — Kai arqueou uma das sobrancelhas. Ele usava um gibão púrpura escuro, com uma camisa de mangas compridas cinza por baixo. Um cinto grosso e um pouco mais escuro que o gibão rodeava seu quadril e uma bandana também púrpura escuro rodeando sua testa.

— Vá trocar de roupa, me recuso a ser visto perto de uma pessoa tão desarrumada — Eris indicou as escadas atrás de Theodosia. O ruivo usava calças que subiam até a altura de seu quadril, o couro mesclava vermelho, marrom e verde, um cinto de gemas douradas rodeando-o, deixando a camisa de linho branca e de mangas compridas por dentro das calças.

A fêmea revirou os olhos, mas estava cansada demais para pensar em sua aparência dessa vez. Ela seguiu para a porta e saiu da casa, esperando o grupo elegante do lado de fora.

— Se divertiu na sua festinha do chá particular? — Theodosia provocou quando Lucien a alcançou, os dois caminhando lado a lado pela calçada.

— Foi agradável, sim — Lucien respondeu, ignorando o deboche na pergunta da irmã. — Ela parece bem. Talvez chateada, mas... parece determinada a melhorar.

Lucien estava com uma espécie de regata branca e sedosa, os braços fortes adornados com braceletes de ouro. Haviam dois cintos ao redor do quadril dele, um debaixo do outro, os dois dourados. As calças também brancas. A Corte Diurna caía bem nele.

— Sobre o que vocês conversaram? — Theodosia perguntou, deixando o sarcasmo de lado para abrir um pequeno sorriso para o irmão mais velho.

— Deixe-me adivinhar: tulipas e pães doces — Eris se intrometeu, andando em passos largos para se aproximar da dupla com um sorriso travesso nos lábios.

Selene estava conversando com Nalu e Kai sobre o mar, um pouco mais atrás. O assunto deixou Eris entediado o suficiente para ir atazanar os irmãos.

Lucien soltou um rosnado para o Vanserra, um olhar raivoso em sua direção. Eris ergueu as mãos em redenção.

— Desculpe. Não vou zoar sua situação, deve ser horrível ficar preso na zona da amizade. Eu nunca passei por isso, você sabe, sempre fui encantador demais para levar um fora — Eris tagarelou, colocando as mãos nos bolsos das calças de maneira despretenciosa.

Theodosia rolou os olhos para cima e Lucien respirou fundo, como se estivesse se contendo para não atirar Eris na casa mais próxima.

Em algum momento da caminhada, Selene decidiu que era melhor atravessar porque os tornozelos inchados estavam matando-a, e todos atravessaram diretamente para o cais com ela.

Eles chegaram ao Demônio do Mar por último, quando todos os outros tripulantes já estavam lá, à espera. E é claro que não havia uma grande mesa arrumada. Haviam barris agrupados onde os pratos de comida estavam dispostos.

Melinda tinha levado seu famoso bolo de carne, Marcel fez um barril de cerveja rolar pelo convés, e Tobey fez enroladinhos de queijo que estavam horríveis, tão terrivelmente temperados que Selene vomitou só por sentir o cheiro. O pobre Tobey seria zoado por isso pelo resto da noite.

Mais alguns marujos levaram comidas e bebidas, e todos se empanturraram. Kai estava do outro lado do convés, batucando por cima de um barril vazio enquanto um marujo bêbado cantava ao seu lado. Nalu estava rindo de alguma bobagem que Eris falou e Lucien estava um pouco mais afastado, apoiado contra a amurada e observando as ondas calmas do Sidra se chocarem contra o casco.

Theodosia e Selene estavam sentadas em cima de caixotes, uma a frente da outra, mas não exatamente juntas. A princesa ainda não tinha tirado um tempo para conversar a sós com a cunhada, talvez aquela fosse uma boa hora.

— Como você e Eris se conheceram? — Theo perguntou de repente, ganhando a atenção daqueles olhos redondos e pretos.

— Ah, é uma longa história — Selene abriu um sorriso, uma onda loira de seu cabelo caindo por seu rosto depois dela levar um copo d'água aos lábios.

— Temos a noite toda — Theo incentivou.

— Muito bem — Selene assentiu, escorando-se contra a amurada. Ela deixou o copo e o prato de lado, apoiando as mãos por baixo da barriga redonda. — Nos conhecemos logo no fim da guerra contra Hybern. Eu sou curandeira e me juntei em uma tenda com os outros para cuidar dos feridos.

— Então, viu Eris sangrando e se apaixonou? Que romântico — Theodosia zombou com um sorriso travesso, as sobrancelhas se arqueando ao ver Selene bufar.

— Não mesmo. Eris estava com um corte ridículo na perna, mas fraco demais para se curar sozinho. Minha magia também estava esgotada, então tive que fazer os pontos com agulha e linha — Selene explicou —, seu irmão esperneou feito uma criança.

Theodosia soltou uma risada, e Selene desviou os olhos para Eris, que estava entornando uma taça de vinho. Ele a observou de volta, mandando uma piscadela. Selene revirou os olhos.

— Foram os quarenta minutos mais estressantes da minha vida. Mas quando finalmente terminei, acha que Eris me agradeceu por ajudá-lo? — A loira arqueou as sobrancelhas de forma sugestiva. — Ele me chamou para sair.

— E tem lugar melhor para convidar uma fêmea para sair do que em uma tenda cheia de moribundos? — Theo quis saber, um sorriso nos lábios ao ouvir Selene soltar uma risada.

— Obviamente eu disse que não. E, quando eu e os outros curandeiros terminamos tudo, fui embora. Voltei para Corte Primaveril, onde eu trabalhava como curandeira de uma aldeia. E, depois de alguns dias, adivinha quem foi me visitar?

"Eu falei que ele tinha que ir embora pois eu estava trabalhando e minha atenção era apenas dos doentes e feridos. Então, no dia seguinte, Eris apareceu com um arranhão leve no braço, pedindo para que eu o ajudasse. Eu passei álcool no ferimento e o mandei embora."

— Mas Eris não desiste fácil — Theo comentou, e Selene assentiu.

— Não mesmo, esse macho presunçoso — ela riu com escárnio. — Na terceira vez que ele apareceu com algum machucado ridículo, eu disse que não o levava a sério. Ele me disse que faria qualquer coisa para que eu o desse uma chance. — Selene fez uma pausa, lembrando-se. — Eu pedi uma confissão.

— Uma confissão? — Theo franziu o cenho levemente em confusão.

— Qualquer confissão, sobre qualquer coisa, contanto que fosse sincero — Selene explicou, e então olhou para Theo. — Ele falou sobre você.

Theo se ajeitou, deixando a postura ereta. Ela olhou com surpresa para Selene antes de desviar os olhos para o irmão ao longe, que agora tinha se juntado a Kai e estava fazendo coro para o marujo que continuava cantando uma música indecente.

— Eris falou sobre o irmão que o odiava, sobre odiar a si mesmo por ser culpado pelo sofrimento dele. E falou sobre a irmãzinha desaparecida, que ele nunca foi corajoso o suficiente para proteger do pai — Selene contou, a voz ficando mais baixa conforme ela também murchava. Um suspiro escapou entre os lábios rosados. — Ele me mostrou ser mais do que um principezinho arrogante, vi que ele é mais sensível e amável do que parecia.

Theodosia viu Selene abrir um pequeno sorriso, os dedos acariciando a barriga coberta pelo tecido azul do vestido.

— Depois disso, disse que ele podia me levar para um encontro. Ele tinha uma chance de me conquistar. Se falhasse, iria embora — Selene revirou os olhos, uma risada escapando dos lábios. — Agora estou casada e grávida.

— Isso não quer dizer muito. Ele te conquistou mesmo ou você está enfeitiçada? — Theodosia quis saber, soltando um riso ao ouvir a gargalhada da loira.

— Ele me conquistou — ela admitiu. — Eris pode ser  bem convincente, às vezes.

Theodosia viu como Selene olhava para Eris, apaixonada. Eris a olhava da mesma forma. E ela ficou feliz em saber que o irmão estava tão verdadeiramente apaixonado.

Se apaixonar podia ser perigoso, Theo sabia bem. Ainda mais quando se é um Vanserra. Mas Eris não morava mais no Palácio da Outonal, e mantinha sua nova família em segredo. E, enquanto ele e a esposa trocavam olhares amorosos, a ruiva reparou em alguém que não estava tendo a mesma sorte que Eris.

Lucien já estava há algum tempo olhando o Sidra, em silêncio. E Theo torcia para que ele não estivesse pensando em uma certa fêmea que gosta muito de rosa.

[...]

Theo acordou com as batidas na porta e bufou, colocando o travesseiro por cima do rosto. Ela continuou em silêncio e imóvel, na esperança da pessoa que estivesse do lado de fora do quarto fosse embora.

— Theo, está acordada? — A voz de Nalu chegou aos ouvidos da ruiva, abafada pela porta. — Azriel está lá fora te esperando para o treinamento.

— Treinamento ou sessão de tortura? — Theo murmurou com a boca ainda contra o travesseiro quando a porta do quarto foi aberta.

— Acho que hoje será melhor do que ontem — Nalu riu levemente, usando um tom sugestivo.

— Para você, talvez, que ficará em Velaris. Mas eu estarei em Illyria apanhando — Theodosia rebateu com mau-humor.

— Eu não sei, não — Nalu sentou na ponta da cama, esticando o braço para puxar o travesseiro que cobria o rosto dela —, acho que o Encantador de Sombras está querendo uma trégua entre vocês dois.

— E por que você acharia uma coisa dessas? — Theodosia perguntou com desinteresse, cobrindo os olhos com as próprias mãos, já que agora tinha ficado sem travesseiro.

— Desça e veja você mesma — Nalu respondeu ao se levantar da cama. Theo tirou as mãos do rosto e arqueou as sobrancelhas. Ele apenas sorriu e deixou o quarto, fechando a porta.

Tudo bem, Theo estava curiosa. Mas não tanto assim. Ainda estava com raiva, logo, se deu o direito de ser imatura. Ao invés de descer imediatamente para o jardim para encontrar Azriel, ela se levantou calmamente da cama e escovou os dentes, depois, penteou os cabelos - até fez um penteado! Dividiu o cabelo em três tranças e depois as juntou em uma única trança-. Passou um óleo hidratante no corpo também, para relaxar um pouco.

Não sabia se tinham passado dez minutos ou... bem, quarenta minutos. Theodosia vestiu o robe alaranjado por cima da camisola e fechou-o no corpo.

Descendo as escadas, viu Kai e Nalu espiando algo pela janela da sala de estar.

— Ele está parado lá fora há quanto tempo? — Kai perguntou ao pai, o cenho franzido.

— Acho que trinta minutos — o Capitão respondeu, os olhos curiosos focados em algo que estava do lado de fora, no jardim.

Theo passou pelos dois, seguindo em passos desconfiados até a porta. Quando abriu, se deparou com Azriel, segurando um traje nas mãos a alguns metros de distância.

— Está parado aqui faz quanto tempo? — Theo quis saber, assim podendo responder a pergunta de Kai mais tarde.

— Só trinta e nove minutos — Azriel a mediu enquanto a ruiva se aproximava —, e vinte segundos.

— Você poderia fazer os illyrianos virem para cá ao invés de me arrastar até Illyria — Theodosia sugeriu, cruzando os braços abaixo do peito. — Se for para me encherem de porrada, que seja aqui.

— Eu já disse que você pode vencê-los facilmente e também pode parar quando quiser, então vou parar de te relembrar disso o tempo todo — Azriel respondeu, os lábios se movendo muito levemente no que podia ser o início de um sorriso, até ele se tensionar e estender os braços, indicando o que havia em suas mãos.

Theo arqueou as sobrancelhas com desconfiança antes de pegar o amontoado de tecidos e abri-lo. Seus lábios se entreabriram de puro choque ao perceber o que era.

— Já que você não se adaptou ao traje illyriano, pensei em outra coisa — o Mestre Espião murmurou.

— Um traje de treinamento da Corte Outonal — Theodosia sussurrou, ainda olhando a veste com os olhos azuis brilhando.

Ela traçou com a ponta dos dedos o tecido em tom de vinho, repleto de relevos similares à escamas de dragão. Era grosso, mas confortável e sempre se ajustava bem ao corpo. Praticamente impenetrável, a espada teria que estar extremamente afiada para conseguir cortar o macacão de mangas compridas.

— Talvez consiga se sentir mais à vontade durante o combate, usando isso — Azriel comentou, os olhos de avelã medindo cada traço do rosto de Theodosia, esperando para decifrar a reação dela.

— Talvez não sirva em mim — Theo disse, arqueando uma das sobrancelhas ao ver o macho negar com a cabeça.

— Sei suas medidas, vai servir — ele disse simplesmente.

Theo sentiu seu peito embolar, apertando os dedos contra o traje em suas mãos e evitando olhar muito a fundo as orbes de avelã intensas. Ela girou nos calcanhares e caminhou em direção a entrada da casa.

— Vou me vestir e tomar café — Theodosia avisou antes de fechar a porta atrás de si, sem convidá-lo para entrar.

Passando pela sala de estar para subir as escadas, Theo disse, sem olhar Kai e Nalu por trás dos ombros: — foram trinta e nove minutos e vinte segundos.

— Eu cheguei perto — Nalu falou para o filho com um sorriso convencido, Kai bufou.

— Nunca mais vou apostar com você, tenho certeza de que trapaceou — Kai resmungou para o pai enquanto tirava do cinto a bolsa de moedas.

Theo soltou um riso ao ouvir as reclamações de Kai chegando no segundo andar. Assim que entrou no quarto, fechou a porta atrás de si e começou a trocar de roupas.

O traje ficou perfeito, e Theodosia deixou um suspiro escapulir de seus lábios, olhando o próprio reflexo pelo grande espelho. O macacão se ajustou bem ao seu corpo, delineando com elegância as curvas da ruiva. Além de ser muito mais confortável que aquele couro incômodo dos illyrianos, a fez lembrar de casa.

Tinha muitas lembranças da infância, mesmo que já tivesse passado tanto desde aquela época. Aos oito anos, Eris tinha dado a ela e a Dastan trajes de treinamento.

Dastan não se empolgou, sequer vestiu a roupa antes de correr para a cozinha para roubar biscoitos. Mas Theo queria usar o traje, queria treinar. Eris a ensinou alguns golpes básicos com espadas de madeira, rindo da garotinha desajeitada que sempre acabava deixando o objeto cair.

Muito em breve, ela vestiria por cima do traje o bronze da Corte Outonal, e mataria o irmão gêmeo. Mataria o pai, e provavelmente, o irmão mais novo. E ela precisava estar pronta para isso.

Dando uma última olhada em si mesma, Theodosia saiu do quarto e desceu as escadas para poder tomar o café da manhã. Ela devorou uma omelete e poucos minutos depois, estava fechando a porta da Casa da Cidade e caminhando em direção a Azriel, que continuou parado no mesmíssimo lugar no gramado durante todo aquele tempo.

O macho mediu a postura dela com o olhar, reparando que ela estava um pouquinho mais bem-humorada agora, talvez até saltitante, e puxou os lábios no que parecia ser a sombra de um sorriso.

— Feliz? — Ele perguntou quando a ruiva já estava próxima o bastante.

— Você também ficaria se seu traje fosse tão confortável quanto o meu — Theo ergueu a cabeça para o céu claro da manhã.

A princesa viu quando algumas sombras se desgarraram das costas do illyriano e serpentearam pelo ar até ela, enrolando-se na ponta de sua trança. Azriel também observou-as, os olhos avaliadores subiram para o rosto dela por um momento. Ele se manteve em silêncio, mas estendeu uma das mãos marcadas para a fêmea.

Só para atravessarem juntos, ela sabia. Theo colocou a mão por cima da dele, e então, o restante das sombras deixaram as costas do Mestre Espião e começaram a cercar os dois, rodeando-os dos pés a cabeça rapidamente até que deixassem Velaris. Ela fechou os olhos, sentindo o toque frio e acolhedor que as sombras sempre tiveram, e quando os abriu, já estava no Refúgio do Vento.

Azriel tinha deixado-os a frente do ringue da tarde do dia anterior, e Theodosia soltou a mão do macho no momento em que as sombras pararam de rodeá-los.

— Pensei em fazer algo diferente de ontem — o Mestre Espião falou, dando alguns passos para trás.

Theodosia se virou, vendo que o illyriano tinha parado ao lado de uma mesa de madeira escura, com algumas armas, todas diferentes. Ela franziu o cenho.

— Pensei que você só torturasse inimigos da Corte Noturna — ela apoiou as mãos na cintura, os olhos semicerrados ao vê-lo soltar um riso suave e baixo.

— Nenhuma delas é para mim — Azriel explicou —, é para que você escolha com o que você e os outros vão lutar hoje.

Theo se aproximou da mesa, analisando os punhais, lanças, até mesmo machados em cima da madeira. Ouviu passos se aproximando e não precisou ver para saber que eram Gunnar, Halfdan e Cadman.

Ela escolheu que lutariam com a boa e velha espada.

Uma por uma, pesou as quatro espadas nas mãos, decidindo qual usaria. Percebeu que havia gostado mais da que tinha o punhal dourado e o aço escuro. De soslaio, viu Azriel observando-a.

— O que foi? — Theo perguntou.

— Sabia que escolheria essa — ele respondeu, tirando os olhos do rosto da fêmea para focá-los na lâmina.

Theodosia olhou Azriel de soslaio antes de reprimir os lábios em uma linha tensa e mudar de ideia, teimosa, entregando a espada para Gunnar antes de pegar outra de cima da mesa, de punhal escuro e riscado, a lâmina parecia poder cortar o ar de tão afiada.

— Podem começar quando quiser — o Encantador de Sombras avisou, permanecendo ao lado da mesa.

Theo abriu um sorriso perverso enquanto seguia na direção do ringue e pulava a cerca, já esperando no meio. Quando Gunnar começou a se aproximar, ela negou com a cabeça.

— O grandalhão primeiro — Theodosia avisou, indicando Cadman.

Cadman mandou um olhar para Azriel, e depois que o Mestre Espião assentiu, o soldado caminhou com seus passos lentos e brutos na direção do ringue. Theodosia ia gostar muito de arrebentar a cara dele.

O illyriano pulou no ringue, balançando a espada na mão grande, os olhos escuros não mostrando nenhum indício de que ele pegaria leve com Theo.

— Algum limite que não posso ultrapassar, Lorde Azriel? — Cadman perguntou, a voz respeitosa para o Encantador de Sombras, mas o rosto determinado e bárbaro voltado para a ruiva.

— Nenhum limite deve ser ultrapassado — Azriel respondeu, e Theo podia jurar que ele havia ficado tenso só com a pergunta, a voz soando ameaçadora e mortal.

— Não seja estraga-prazeres, corvinho — Theo falou com humor, um sorriso grande nos lábios quando ergueu a espada, preparando-se —, deixe Cadman se divertir.

Cadman não sorriu de volta para ela. Ele avançou.

O som do aço contra aço chegava aos ouvidos de Theodosia conforme ela e Cadman se defendiam e atacavam um ao outro. Ele certamente era maior e mais forte, mas Theo era esguia e ágil, conseguindo desviar dos golpes dele com destreza.

Cadman atacava com brutalidade, deixando claro que se Theo cometesse um único deslize, acabaria perdendo uma mão. Ela era empurrada para trás a cada golpe, quase chegando a cerca de madeira que delimitava o ringue.

Ela precisava ganhar espaço, então se esquivou para a esquerda, se distanciando do macho antes de girar nos tornozelos, ficando de costas para ele por uma fração de segundos, tempo suficiente para atingi-lo nas costelas com o punhal da espada.

Quando ele grunhiu, se virando de frente para ela, Theo já estava pronta para se defender.

Ela não ia perder dessa vez.

Theodosia tinha respirações curtas conforme se defendia, ela pulou para trás, não rápido o suficiente para evitar a lâmina de Cadman em seu peito.

A ruiva arquejou, mas não teve nenhum ferimento além de um provável hematoma abaixo dos seios, o traje da Corte Outonal manteve-se resistente ao ataque, não tendo um único rasgo sequer.

Mas a força havia sido tanta que Theo sentia que não conseguia mais respirar, como se seus ossos tivessem se movido pelo ataque da lâmina. Ela mordeu os lábios, puxando o ar para os pulmões lentamente.

E, pela primeira vez, Cadman sorriu. Um sorriso cruel e horrível que deixou toda sua postura ainda mais intimidadora.

— Acho que estou me divertindo — o macho disse, já erguendo a espada para atingir Theodosia mais uma vez.

A ruiva sentiu o corpo esquentar quando ergueu a espada para impedir o golpe dele, seu rosto fechando em um semblante de ódio efervescente.

A partir daquele momento, Theo não sabia mais o que estava fazendo. Seu corpo se movia sempre para atacar Cadman com mais força do que ela parecia ter, os golpes tão rápidos que o macho precisou começar a se esquivar para se proteger.

Theo fez Cadman dar um passo para trás, recuando.

A ruiva ouvia um zumbido nos ouvidos, sua mente se desligando do que havia ao redor no momento em que conseguiu identificar, baixinho e distante, Azriel mandar Halfman se juntar a ela e Cadman.

Theodosia podia ter vislumbres da pele avermelhada conforme acertava Cadman, e podia ouvir Halfdan se aproximando, pulando a cerca.

Ela se abaixou para desviar da espada de Cadman e quando se ergueu, chutou Halfdan no estômago tão forte que o macho urrou e se curvou para frente. Theo aproveitou para agarrá-lo pela nuca e o jogar contra o colega.

Cadman deixou que Halfdan tropeçasse nos próprios pés e caísse no chão para atacar Theodosia mais uma vez. Ela começou a sentir o punhal ficar molhado em suas mãos, talvez até um pouco mole. Como se estivesse derretendo.

Ouviu Azriel mandar Gunnar se aproximar.

Depois disso, tudo ficou rápido demais para que ela conseguisse processar o que estava fazendo. Tudo era um grande borrão vermelho e furioso.

Theo não sabia quem tinha acertado com o punho da espada, se fora Gunnar ou Halfdan, mas ouviu um macho arfar de dor. Não sabia de quem era a perna que a espada fez um corte.

Mas ela conseguiu identificar outra pessoa.

Theodosia viu quando Brynjar se aproximou, empunhando a espada na direção dela, tentando golpeá-la.

E, depois disso, Theo não sabia mais discernir o bem do mal.


Azriel viu quando a postura de Theodosia mudou completamente. Ele podia jurar que os olhos azuis estavam pegando fogo. Podia jurar que o corpo de Theo emanava calor.

E então, quando Cadman estava prestes a atingir a cabeça dela com o cabo da espada, Theodosia criou fogo nas mãos.

Ele deu um passo para trás. Azriel deu um passo para frente.

E Theodosia arremessou a bola de fogo na direção de Cadman, errando por pouco o illyriano.

O Mestre Espião viu quando a espada da ruiva ficou em chamas.

Era para a lâmina ter derretido, mas Theo pareceu saber formar uma barreira entre o aço e o fogo. Conseguiu moldar as brasas da maneira que ela queria.

Theo se lançou contra Cadman com a espada flamejante. Ela não parecia querer que o macho apenas se rendesse, parecia quer feri-lo.

Parecia querer matá-lo.

— Theodosia — Azriel chamou, dando mais dois passos na direção do ringue —, você já venceu. Pode parar agora.

Mas ela não ouviu. Ela soltou um grito de ódio do fundo da garganta antes de se atirar na direção de Cadman mais uma vez.

Azriel sentiu quando o próprio corpo começou a esquentar, de início apenas no peito, mas depois se alastrando por inteiro, fazendo sua pele latejar.

Ele teve pouco tempo para agir quando viu Theo erguer a espada em chamas.

O Mestre Espião enviou suas sombras. Elas espiralaram em massa até a ruiva no momento em que ela conseguiu acertar a espada no braço de Cadman. O macho gritou quando sentiu a lâmina flamejante cortar a carne, acertando o osso.

As sombras rodearam o pulso de Theodosia, puxando-o para trás. Se demorasse mais um segundo, a Vanserra teria cortado fora o braço do illyriano.

Cadman largou a espada no chão, os olhos horrorizados e embebidos de dor quando levou a mão ao braço ferido, a pele queimada onde houvera o corte e sangue escorrendo sem parar.

— Theo! — Azriel estava correndo para o ringue agora, vendo a ruiva se virar para Gunnar e Halfdan.

Halfdan já estava dando passos largos para trás quando Theodosia o olhou com as orbes pegando fogo. Azriel conseguiu formar uma barreira de sombras a frente do soldado antes dela atirar as chamas na direção dele. As sombras as bloquearam, extinguindo-as.

Gunnar ergueu as mãos em redenção para Theo, os olhos arregalados quando ficou congelado no lugar, diante do olhar impiedoso dela.

— Princesa, a senhorita venceu — Gunnar falou educadamente, a voz vacilando por um único momento.

Azriel estava pulando a cerca de madeira para subir no ringue quando ouviu um soluço que misturava ódio e mágoa vindo de Theodosia.

— Não vão me arrastar para o subsolo — ela sussurrou, erguendo a espada a altura da cabeça dele —, nunca mais.

Antes que Theo atingisse o pescoço de Gunnar, Azriel entrou na frente, usando as sombras para segurarem o pulso da ruiva e o prenderem no ar.

A espada de fogo estava a poucos centímetros do pescoço de Azriel, queimando a pele dele só pela proximidade. Ele ergueu as mãos em redenção, os olhos de avelã focados nos azuis-turquesa.

— Você está em Illyria, Theo — Azriel explicou calmamente —, você venceu os três. Pode abaixar a espada.

Theodosia pareceu não ouvir bem. Os olhos continuavam furiosos, e, se as sombras soltassem-a, ela arrancaria a cabeça do illyriano em uma fração de segundos.

— Não vão me levar para a câmara — Theo avisou, o corpo inteiro trêmulo de necessidade de matar o Encantador de Sombras, ou seja lá quem ela estava vendo naquele momento.

— Sou eu, Theo. Sou o Azriel — ele a lembrou, a voz suave. — Ninguém vai te levar para lá. Não vou deixar que aconteça.

Theodosia piscou por um momento, as orbes ainda parecendo chama viva. Ela deu um passo para frente, ainda sem mover o braço que estava esticando a espada para o pescoço de Azriel.

E, quando ela estava erguendo a mão livre para pegar a Reveladora da Verdade, o Encantador de Sombras agarrou seu pulso e a puxou para si.

Azriel envolveu-a em seus braços antes que ela tentasse usar a espada novamente. A lâmina caiu no chão quando o macho prendeu os pulsos dela entre seus corpos.

— Eu não vou! Não! Não! — Theodosia começou a gritar, sacudindo-se contra Azriel, pisando nos pés dele, tentando chuta-lo.

Ele sentiu quando Theo estava prestes a explodir em chamas.

As sombras a envolveram rapidamente, rodeando a ruiva e o Encantador, deixando carícias pela pele dela, pelos cabelos, deixando que a sensação fria a trouxesse de volta.

— Você está em Illyria, Theo — Azriel a lembrou, curvando-se um pouco para falar próximo ao ouvido da fêmea, que continuava a tentar acertá-lo de alguma maneira. — Nada vai te acontecer.

— Vou matar vocês — ela avisou, a voz mórbida. — Vou matar todos vocês.

Antes que Theo o atacasse, ele entremeou a mão nos cabelos dela, as pontas dos dedos pressionando com cuidado a nuca, não se importando com o calor da pele.

As mãos de Theodosia ferviam de poder quando ela as enterrou no couro illyriano de Azriel, queimando o traje onde os dedos dela tocavam, mas quando roçaram a pele exposta do abdômen, não a queimaram. Como se, gradativamente, ela tomasse ciência de quem ele era e de que não precisava feri-lo.

— Você vai se vingar de todos eles, Theo — Azriel garantiu, uma das mãos firmes no cabelo dela, enquanto a outra firmava-a pelo quadril. — Vai matar todos eles. Mas não hoje. Eles não estão aqui.

Theodosia piscou, mas reprimiu os lábios em uma linha tensa, como se estivesse se contendo para não gritar. As mãos quentes se agarraram a pele exposta da barriga de Azriel agora, mas o calor não era o suficiente para feri-lo. Ela estava se acalmando.

— Volte para o presente, Theo — o Encantador de Sombras mandou, os olhos de avelã concentrados nos dela. Mas não teve nenhuma resposta.

Ela parecia não conseguir encontrá-lo em sua mente, em sua memória. Tudo que ela conhecia era o ódio por Brynjar, Beron e Dastan.

Azriel precisava fazê-la se lembrar.

Instintivamente, Azriel puxou o laço, aquele fio tão frágil entre os dois, tão apagado e esfarrapado. Theo suspirou.

— Volte, passarinho de fogo — ele sussurrou, e os olhos azuis se arregalaram. A ruiva tomou uma respiração profunda antes de sua postura vacilar para frente.

O Encantador de Sombras a segurou contra si para que ela não caísse, os braços fortes envolvendo as costas da fêmea. Ela abaixou a cabeça, notando as poças no chão, o sangue manchando a neve.

Theo começou a tremer.

— O que eu fiz? — Ela sussurrou com a voz embargada.

— Nada irreparável — Azriel tentou responder de maneira tranquilizadora, mas não pareceu surtir efeito positivo na princesa.

Os olhos de Theo flagraram a curandeira que corria na direção do ringue. O Mestre Espião conseguiu sentir a respiração dela ficar descompassada.

Theodosia se jogou para trás, se afastando do toque de Azriel. Suas sobrancelhas se arqueando um pouco, os lábios se entreabrindo para deixar um suspiro apavorado escapulir.

Quando ela viu Cadman ensopado de sangue, Gunnar e Halfdan já deixando o ringue em passos largos, mas em posturas de combate, como se ela fosse um risco constante...

Azriel percebeu que ela estava tentando atravessar, mas sua magia ainda estava instável e ela não parecia conseguir se deslocar. Theodosia mostrava frustração e desespero em seu semblante, tentando a todo custo deixar aquele lugar.

— Theo — Azriel deu um passo à frente. Theo ergueu a mão, fazendo-o parar no lugar.

Ela não disse nada quando se virou de costas para o illyriano, os passos oscilantes conforme caminhava para fora do ringue.

Os illyrianos ao redor pararam o que estavam fazendo para ver a cena, de longe. Os olhos horrorizados e desdenhosos acompanhando cada passo de Theo pelo chão forrado de neve.

Azriel esperou algum tempo até procurá-la. Para que ela assimilasse o que aconteceu, para que tivesse espaço.

Quando a encontrou ao anoitecer, ainda no Refúgio do Vento, Theodosia estava em uma taberna próxima do acampamento, bebendo sozinha em um canto escuro.

O Mestre Espião passou pelas mesas de guerreiros bêbados até chegar a dela. Theodosia estava com uma mão cobrindo o rosto, esfregando as têmporas. Ela ergueu os dedos que cobriam sua visão ao sentir a presença de Azriel, e ao olhá-lo, bufou.

— Veio me prender pelas tentativas de homicídio? — Theo quis saber, levando a caneca de cerveja aos lábios.

A fêmea continuava com o traje da Corte Outonal. A trança comprida estava por cima de seu ombro, algumas mechas da frente soltas. Exibia cansaço e melancolia no rosto.

— Você fez um bom trabalho, hoje cedo — Azriel elogiou, observando com os olhos de avelã quando a ruiva franziu o cenho.

— Quase matei aqueles três — Theodosia respondeu, apoiando a caneca por cima da mesa redonda e riscada de madeira.

— Você os venceu — o Encantador de Sombras deu de ombros ao sentar de frente para ela.

— Eu podia ter os matado — ela repetiu de maneira amarga.

— Mas não matou, você recobrou a consciência antes disso.

— Só recobrei a consciência por causa das suas sombras — Theodosia insistiu, mas Azriel balançou a cabeça em negação.

— Da primeira vez que você perdeu o controle, o estrago foi muito maior e levou mais tempo para você voltar a si mesma. Dessa vez, você até conseguiu se manter acordada, Theodosia. Você está progredindo.

Ela soltou um riso de escárnio.

— O que eu fiz com o braço de Cadman não pareceu progresso — a ruiva murmurou, os olhos focados na caneca em cima da mesa.

Azriel ficou em silêncio por um momento, avaliando a fêmea a sua frente, os ombros encolhidos, os suspiros pesados e o sentimento de culpa palpável.

— Ao invés de se preocupar em não ferir as pessoas, Theodosia, devia se concentrar em escolher quem machucar.

— Como é? — Ela franziu o cenho, voltando a encarar as orbes de avelã.

— Você se contém porque tem medo do estrago que pode causar. O que é uma perda de tempo e talento — Azriel respondeu, simplesmente. — Ao invés de se censurar, devia focar em seu propósito. Você precisa do caos que a sua magia é para poder matar Dastan.

— Se não me censurar, Azriel, vou acabar queimando essa montanha inteira.

— Não vou deixar que isso aconteça. Não deixei que acontecesse hoje e vou continuar te ajudando. — Ele suspirou antes de dizer: — precisa confiar em mim.

Theodosia soltou um riso de escárnio, balançando a cabeça. Ela não respondeu.

A ruiva ficou mais um momento em silêncio, presa nos próprios sentimentos. As sobrancelhas se franziram levemente, a garganta oscilou.

— Diga — Azriel pediu quase que em um sussurro.

— Não quero ser um monstro — ela confessou, a voz tão baixa que o Mestre Espião quase não ouviu.

As sombras se desgarraram das costas do Encantador, enrolando-se nos pulsos da fêmea, fazendo carícias suaves. Theo abriu um pequeno sorriso triste para elas.

— Você será Grã-Senhora, Theodosia, e quando acontecer...

— Isso, se a magia me escolher — Theo lembrou.

— O que sabemos que vai acontecer — ele respondeu com convicção. — Quando você for Grã-Senhora, vai ter que tomar atitudes desagradáveis pelo bem do seu povo.

— Já estou ciente disso... — Theo resmungou.

— Não tem que se sentir mal por fazer o necessário para proteger sua corte — Azriel explicou calmamente. — Essa sua magia que você tanto reprime é o que vai acabar com o terror que o seu pai está fazendo na vida de tantas pessoas inocentes.

Theo observou o Encantador de Sombras com olhos atentos agora, inclinando a cabeça levemente para o lado e arrumando a postura.

— Você é capaz de coisas horríveis — ele admitiu. — E pode usar isso a seu favor. Pare de se lamentar e aprenda a controlar seu poder para ferir quem você realmente quer ferir.

— E é simples assim, não é? — Theodosia soltou outro riso sem humor, uma das sobrancelhas arqueadas. Azriel negou.

— Não, vai ser difícil para caralho. Mas você é forte — ele respondeu.

O sorriso amargo deixou os lábios de Theo. Ela mediu o illyriano uma vez, esperando. Sabendo que ele tinha mais a dizer.

— Duzentos anos atrás, quando você me condenou por ter torturado o espião da Corte Outonal, eu me senti... me senti repugnante. Repulsivo.

— Eu só disse aquilo...

— Eu sei — Azriel assentiu, o cenho se franziu discretamente, pensando. — Mas, se você me dissesse tudo aquilo hoje em dia, sabe o que eu sentiria?

Theo negou com a cabeça.

— Nada. Porque eu faço meu trabalho pelo bem da minha corte. Não causo mal a pessoas inocentes, só a quem realmente merece. Eu protejo a Corte Noturna toda vez que arranco a verdade dos ossos de um espião, ou de um traidor.

Theodosia arrumou a postura agora, avaliando-o com aquele par de olhos que podiam ler Azriel como nenhum outro.

— Você gosta, não gosta? — Ela perguntou, não com julgamento na voz, mas com curiosidade. — Gosta de torturar quem tenta prejudicar a sua corte.

Azriel abriu um sorriso discreto.

— Gosto do fato de ser a última coisa que um inimigo vê antes de morrer — ele respondeu, simples.

O macho percebeu quando a mente dela divagou, quando Theodosia pensou se gostaria de fazer seus inimigos sofrerem.

Admirando aqueles olhos azuis, ele soube que ela gostaria de fazê-los sofrer, mas não tinha certeza de como se sentiria a respeito dos soldados de Beron, que apenas seguiam ordens.

— Você não precisa gostar de matar, não precisa gostar de destruir, Theodosia — Azriel disse. — Talvez você goste, talvez ache satisfatório tirar a vida de alguém que considera odioso. Mas pode não gostar. Não importa o que sinta, contanto que não seja culpa e arrependimento.

Ela não falou nada, mas pareceu absorver as palavras, pareceu guardá-las consigo, para se lembrar quando as coisas ficassem mais difíceis.

Azriel não se deu conta do que estava fazendo até que as palavras saíram de sua boca.

— Me desculpe por ter te culpado pelo fim do meu relacionamento com Elain — ele pediu.

Theodosia bufou, olhando-o de baixo a cima com o cenho franzido.

— Está se desculpando para não ficarmos em uma situação desagradável agora que não conseguiu convencer Feyre a me dispensar da missão em Vendavour?

— O quê? — Foi a vez de Azriel franzir o cenho, tão fundo que pôde ver as sombras das sobrancelhas.

— Eu te conheço, Azriel. Aposto que passou horas buscando informações sobre Vendavour para provar a Feyre que não precisam de mim — Theodosia abriu um sorriso hostil.

— Eu fiz isso — ele admitiu e, ao ouvir o riso de escárnio dela, continuou: — mas não estou me desculpando por conta da missão em Vendavour.

— Então, está se desculpando porque sabe que agiu feito um merdinha? — A ruiva perguntou com os braços cruzados, arqueando uma das sobrancelhas.

— Eu não me definiria com essa palavra.

— Eu definiria. Você foi um merdinha imbecil — ela rebateu, o semblante desdenhoso.

— Certo. Eu admito que errei e fui...

— Foi o que?

Azriel rosnou baixinho. Ela abriu um sorriso.

— Um merdinha imbecil — o Mestre Espião respondeu. — Fui um merdinha imbecil. Está feliz agora?

— Feliz? Acha que eu me importo com esse seu pedido de desculpas? — Ela soltou um riso. — Dá próxima vez que me tratar dessa maneira...

— Já me desculpei e garanto que não vai se repetir — Azriel interrompeu, mas Theodosia ignorou.

— Se me tratar dessa maneira mais uma vez, vai ser a primeira pessoa que vou ferir e gostar disso — ela respondeu, se levantando da mesa. — Nos vemos amanhã de manhã para o treino.

E, sem mais, Theodosia seguiu para a saída da taberna, como se Azriel não fosse nada mais que uma pedrinha em seu sapato.


‧₊˚ Azriel dando o traje da Corte Outonal para Theo foi uma das coisas que eu mais gostei desse capítulo, amo demais esses dois aaa

‧₊˚ Ele incentivando a Theo a falar da mesma forma que ela faz com ele. Apesar de tudo, eles sempre querem ouvir um ao outro :(

‧₊˚ O que acham do Eris e da Selene? Eles não tem muito destaque na fic, mas são um casal inusitado que eu adoro escrever kkkkkkkkkk

‧₊˚ Estou muito animada para os próximos capítulos!  A partir de domingo que vem, vamos chegar em uma parte da história que eu estou muito ansiosa para vocês lerem hihihi

‧₊˚ Por hoje, é isso! Até logo ❤️

——— F.  8 de outubro de 2023.

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