Capítulo7
[Neil Melendez]
Já passava das 9 p.m e Shaun ainda não tinha chegado.
A oficina que ele estava participando era suposto para acabar às 8 p.m, e o caminho até o hotel era curto, sem dúvidas ele já deveria ter chegado. Eu me peguei verificando o visor do meu celular a cada dois minutos. Não conseguia me concentrar no programa de entretenimento que passava na TV. Eu já havia jantado, tomado banho e vestido minha calça de moletom e uma camiseta folgada para dormir, mesmo sabendo que eu não conseguiria descansar sem saber se o Shaun tinha retornado em segurança para o hotel.
Me peguei batendo o pé no chão freneticamente, decidi levantar e caminhar pela sala. Eu estava inquieto.
Dane-se! Eu iria ligar pra ele.
Busquei pelo nome dele nas minhas chamadas recentes e apertei o botão verde. O telefone chamava e ele simplesmente não atendia. Porque ele não está me atendendo?
Eu ouvi o barulho do beep que a porta automática fazia ao ser destravada. Desliguei a chamada e quase tropecei nos meus próprios pés ao que corri para a entrada.
-Onde diabos você estava?!
Shaun apenas entrou e fechou a porta.
-O meu grupo da oficina decidiu jantar no restaurante que tinha do outro lado da avenida.
A calma com que ele falava estava me tirando do sério.
-E você não pensou em me avisar?!
Ele me olhou como se eu tivesse com alguma mancha estranha no meu rosto.
-E porque eu faria isso?
-Ha! Você não tem nenhuma consideração por mim? Eu estava preocupado!
-E se você estava preocupado como diz, porque você não me ligou então?
Eu não poderia continuar essa conversa. Eu queria dizer que eu escolhi deixar a decisão de avisar ou não na mão dele. Mas afinal, que direito eu tinha de pensar sobre ele dessa forma. Eu estava me tornando muito protetor, e ao mesmo tempo, estava lutando contra isso.
Levei minhas mãos à cabeça, bagunçando meus cabelos num ato exasperado.
-Quer saber, deixa pra lá Shaun. Bom mesmo que você chegou, eu já estava indo dormir. -caminhei até a sala e me joguei no sofá.
Eu olhava para a TV mas não fazia ideia do que estava passando. Minha atenção estava voltada para aquele jovem... homem, caminhando ao meu redor. Ele abriu o frigobar, entrava e saía do quarto, voltava para a sala para pegar alguma coisa em sua mochila... Foi só quando ele finalmente entrou no banheiro e fechou a porta, que eu percebi relaxar meus ombros. Desliguei a TV e decidi tomar um ar na sacada do nosso quarto.
O que eu estou fazendo? Não é como se eu pudesse evitar sentir tudo isso que eu estou sentindo. Eu poderia até lutar contra, mas até quando eu seria forte o suficiente para não acabar pirando de vez?
O quarto estava prateado pela luz da lua que adentrava como um holofote de luz apontando em direção a janela. Decidi não ligar a luz amarela do quarto. A noite estava linda, o céu escuro tinha algumas estrelas que brilhavam mais fortes que as outras e se destacavam mais. Algumas aves noturnas passavam voando ao longe e eu me perdi as observando. Não percebi quando Shaun se aproximou ao meu lado, ele já estava com seu pijama, e os cabelos -eu percebi- penteados e já seco.
-Que bom que se lembrou de secar os cabelos dessa vez. -eu quis tocar o cabelo dele, minha mão involuntariamente se moveu em sua direção, mas eu percebi a tempo o quão estranho isso poderia parecer para ele, então eu simplesmente apontei.
-É como você disse da outra vez, eu não quero pegar um resfriado.
Shaun estava mais bonito essa noite. O que poderia ser? A luz do luar talvez? Sim... Definitivamente era a luz do luar que tocava a sua pele, a deixando com uma aparência de veludo e seus olhos azuis que estavam mais ressaltados do que de costume e refletiam aquela luz de forma tão brilhante.
-Você está me encarando -ele disse, sem nem ao menos me olhar.
E eu realmente estava, percebi.
-Me desculpe, eu.. É que você está muito bonito hoje à noite, é só isso.
Pronto. Sem nem ao menos planejar, eu falei. E não me arrependia, pois eu realmente tinha falado a verdade.
-Eu? Bonito? -ele sorriu, como se eu tivesse sido irônico sobre o que eu disse- Eu estou vestindo um pijama!
-Eu não estou elogiando só as suas roupas, eu estou elogiando você num todo. Você está mais bonito do que o de costume hoje, Shaun. E eu acho que o motivo disso é a luz do luar.
Eu estiquei minha mão e toquei levemente a mão dele que estava apoiada no parapeito da varanda. Levantei um pouco a manga comprida da camiseta do pijama que ele usava e acariciei seu pulso. Ele tinha se virando em minha direção com o meu movimento, quase como um ímã, eu me sentia atraído por ele... e ao olhar aquele rosto agora ruborizado pelo meu toque, eu sabia que ele também se sentia atraído por mim.
Minha mão subiu pelo seu braço, ombro e pescoço. Finalmente toquei sua nuca, minha mão adentrando por seus cabelos macios. E eu senti ele inclinar a cabeça em direção ao meu toque. Shaun gostava daquele tipo de carícia, percebi.
-Você não pode ser tão controlador assim.. e-eu sei me cuidar sabia?
Ele disse depois de um tempo.
O ar estava gelado naquela noite, mas ao que eu havia me aproximado mais dele, pude sentir o calor de seu emanar corpo para o meu. Eu queria poder abraçá-lo, mas o quão estranho seria isso para ele? Eu precisava me conter, eu não queria assustá-lo. Já era surpreendente que Shaun aceitasse tão bem assim o meu toque.
-Eu quero deixar isso claro, Shaun, porque é algo que vem me preocupando há algum tempo... -Eu pigarrei para limpar a minha voz. Eu queria que ele entendesse perfeitamente o que eu estava prestes a lhe falar.
-Não é por você ser autista. Não é nada disso, eu quero que você entenda... -respirei profundo- é porque eu gosto de você.
Ele se afastou do meu toque, o suficiente para se virar em minha direção e me olhar nos olhos.
-Eu quero cuidar de você, Shaun. Você tem que aprender a deixar-se ser cuidado.
Shaun pareceu pensar sobre o que eu lhe disse, ele observava meu rosto, talvez procurando algum sinal que denunciasse que eu estava mentindo.
-Ninguém nunca quis cuidar de mim por outro motivo que não fosse por eu ser autista. Como que eu vou saber que com você é diferente? -Ele analisava bem a minha expressão.
-Você não vai. Você tem que confiar em mim e acreditar nas minhas palavras. Você tem todo o direito de não acreditar, e eu te entenderei. Eu mesmo lutei muito para não passar dos limites com você. Eu ainda... Enfim, eu sei que você é independente, e eu gosto disso. Não se trata de você ser autista, eu sei que não. Se trada do que eu sinto por você. Eu estou... Eu gosto muito de você, Shaun. Você é incrível eu, eu estou apaixonado por você.
Uma vez que eu comece a falar, simplesmente não consegui parar.
O que eu fiz?! Meus olhos se arregalaram e eu senti meu coração acelerar. Eu não havia planejado dizer aquelas últimas palavras, o que eu havia feito?!! Eu não tinha nem admitido para mim mesmo ainda! Apesar de já saber o que eu sentia, eu ainda não tinha dado palavras a esse sentimento. E sim, eu estou apaixonado por ele. Shaun, meu subordinado, um cara mais novo que eu.... O que eu estava fazendo?!
Procurei em seu rosto algum sinal de que eu tinha o assustado com aquelas palavras. Shaun tinha os olhos mais brilhantes que eu já havia visto. Uma lágrima caiu de um de seus olhos. Tão lenta, tão inesperada... Eu levei a minha mão até a sua bochecha rosada e a enxuguei.
Shaun se aproximou, o tanto que seus olhos azuis era tudo o que eu podia ver a minha frente. Seu rosto estava inclinado para cima, eu encaixei a minha mão em sua nuca, sentido seus cabelos macios tocarem meus dedos. E tudo o que eu tinha que fazer era baixar minha cabeça naquela direção. E eu o fiz. Eu o beijei. O toque de seus lábios tão leve nos meus. Eu senti sua respiração entrecortada contra meus próprios lábios. Passei o polegar suavemente pela maça de seu rosto e vi como ele fechou os olhos imediatamente. Eu o beijei novamente, apenas a pressão dos nossos lábios, dessa vez, sentindo a maciez. Aqueles lábios que tinham chamado a minha atenção por tantas vezes durante as últimas semanas. E agora eu o tinha.
Senti Shaun segurar a minha cintura com força, como se aquilo fosse tudo o que ele tinha para se apoiar. O desejo cresceu dentro de mim, e eu tive que me forçar a liberar o beijo. Esse era Shaun que eu estava beijando, eu deveria colocar um limite cauteloso entre nós, ele merecia isso. Eu iria devagar, por ele. Eu conseguiria me conter.
O nosso último beijo soou como um estalar naquela noite silenciosa na varanda. Vi como Shaun abriu os olhos devagar. Seu olhar nublado com o desejo pelo recente beijo, e então, tão de repente, sua expressão mudou para surpresa e então hesitação. E depois, ele não estava mais em minha frente. Shaun correu varanda a dentro, passou pelo quarto e foi rapidamente em direção a sala. Eu ouvi a porta o banheiro se fechar com um estrondo. Só então soltei a respiração que até então eu não percebia ter prendido. Eu me virei contra a borda da varanda, me encostando ali e observando o nosso quarto, a realização dos fatos caindo sobre mim. Eu e Shaun havíamos nos beijado.
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N/A: para quem ficou até aqui, o meu MUITO OBRIGADA, por sua paciência. O burnout no trabalho fez com que eu atrasasse tudo na minha vida, aparentemente. *sigh* porém, aos poucos eu estou voltando a fazer as coisas que eu mais gosto e uma delas é escrever histórias, então... vejo vocês no próximo capítulo.