AFETROPIA - transferência de...

By handyyx

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Rodrigues era dono do mundo, dono da razão. Dono de tudo, menos de si mesmo. Sua cabeça martelava pensamentos... More

APRESENTAÇÕES.
Vida, morte e eternidade.
O cego, a mulher e o publicano.
Tudo é do demônio.

Prefácio.

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By handyyx

"É curioso como não sei dizer quem sou.
Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer. Sobretudo tenho medo de dizer, porque no momento em que tento falar não só não exprimo o que sinto como o que sinto se transforma lentamente no que eu digo."

Clarice Lispector.


Estudiosos afirmam, que lendas existem somente para misturar fatos com o sobrenatural e dar sentido à vida que vivemos, ao mundo em que existimos. Uma forma simples e eficiente de passar conhecimentos, alertar sobre perigos e deixar ensinamentos.

O que é a vida?

Um átomo. Uma das menores partículas já estudadas pela ciência. Componente constituído por energia positiva, negativa e neutra. E, basta dois deles se encostarem e haverá explosão. Engraçado como algo tão pequeno pode levar a destruição, não é?

O que é a vida?

O que nos faz crer que na verdade, tudo o que nós hoje conseguimos tocar não se passa de um sonho? Que tudo aquilo planejado e realizado terá que acabar em um piscar de olhos? O que nos sustenta, de fato, nesse planeta?

Um Deus? Aquele todo poderoso, Senhor onipresente, onipotente e onisciente. "Buscar-me-eis e me achareis quando me buscardes, de todo o vosso coração" Afirma sua palavra, entretanto, o que há de dizer para as vítimas das guerras? O que há de inventar enquanto desculpa, para conformar o coração de uma mãe que segura seu filho morto em seus braços por simplesmente ser negro?

As controvérsias não podem fazer acordo com a realidade. Segurar suas inseguranças e ideias em cima de uma imagem de um único Deus, é a maior estupidez. Mas é claro, à medida que nós, seres humanos, nos desenvolvemos, é de fato muito triste e solitário imaginar que estamos sozinhos no universo. Então, abraçar a imagem de algo soberano, é a primeira esperança.

Logo, surgiram diversas religiões. Com a pluralidade, surgiu o preconceito. O ódio contra a própria raça, o próprio sangue. O egoísmo, arrogância e o desdém começa a fazer parte da sociedade. E as consequências nos perseguem.

O que é a vida?

Um dia, a criança tem esperanças de ser um de seus exemplos, ídolos. Quando ela cresce, e percebe o quão cruel é o mundo, ela é exposta a um sistema ainda mais doloroso. Seja aquilo que lhe é disposto para ser, não crie expectativas para mais nada. Trabalhe e me dê o seu suor até a última gota, e seja recompensado com uma pequena porcentagem do seu esforço.

Isso é viver de verdade? Viver em prol do luxo e lucro do outro?

Potência em cima de potência. Poder em cima de poder. Dor em cima de outra dor.

Um dia, disseram a mim que a vida só é maravilhosa porque existe a morte..

É uma pena que a morte em si, não tenha gostado muito da minha cara. Acho que finalmente chegou a minha hora, a hora de apresentar a minha história.

[...]

"Zeus, filho do grandioso deus Titã Cronos. Aquele que conseguiu desafiar seu pai, e o colocar para as profundezas do nosso mundo. Zeus, aquele que era adorado por seus humanos. Deuses gregos sabiam amar, trair, enganar, prejudicar ou salvar os homens. Eram deuses para humanos, sendo profundamente humanos. Zeus, aquele que tornou-se grandioso, não soube se controlar. Leto, a pobre menina, apegou-se demais a imagem que o Deus quis passar, e a consequência desse amor resultou rapidamente. Hera, raivosa e temperamental, resolveu puni-la. O castigo afetou a mulher que carregava o semideus em seu ventre, que saiu a chamar por ajuda. E então, surgiu Delos. Onde foi então, concebido o nascimento de duas divindades: Apolo, deus do Sol, da profecia, ordem e justiça. E Ártemis, deusa da caça, da Lua, da castidade, do parto e dos animais selvagens."

Há muitos, muitos anos.. Quando os jovens ainda viviam juntos e apaixonados, eles partilhavam de momentos, nuances e olhares, nos quais poucos possuíam a dádiva de viver ou observar alguém vivendo-a. O preconceito ainda não era, de fato, colocado em prática. O amor era visto por todas as partes, de todos os jeitos.

Os meninos corriam sob a grama que tocava em seus pés, sorrindo e rindo de qualquer comentário banal. Aproveitando dos bons momentos. Os raios do sol, que faziam o dia ensolarado, iluminavam a pele de ébano dos três ali. O tom tão bonito, significante. Conseguia se assemelhar ao tom dourado do ouro, as jóias mais ricas de beleza.

A brincadeira era simples, entretanto não menos perigosa. Ademais, curioso é o fato de que as histórias podem mudar.. Afinal, com o passar dos anos, a figura impotente de Apolo acabou se distanciando do que diz a realidade. As esculturas de tom sério e aparência europeia, com toda certeza não condizem com as piadas sem graça e os cabelos crespos. Para Jacinto, Apolo era luz, era o que determinava graça de viver, já Zéfiro era alguém inconstante. Rápido demais, temperamental.

—— Zéfiro! Não corras dessa forma, é impossível alcançar-te.. - Concluiu Jacinto, ofegante pela corrida, mas sorrindo mesmo assim. Alcançando o amigo logo em seguida, Apolo não estava tão atrás. Todos estavam suando, pelo calor, as dermes brilhavam e eles riam por qualquer coisa.

—— Agora é sua vez de pegar o disco, Zéfiro. - Afirmou Apolo, animado e pronto para a nova rodada da brincadeira.

Enquanto Zéfiro se distanciava dos dois, alheio em seus próprios pensamentos, não percebeu a aproximação daqueles que restavam ali, nos montes floridos. Seu sangue ferveu.

Não sabia como, nem quando, aquilo surgiu na sua cabeça. Aqueles pensamentos de exclusividade. De repente, Apolo não parecia mais um amigo para si. Era errado. Pensar que seu amigo era seu inimigo era certamente errado, mas Zéfiro nada poderia fazer, já que sentir daquela tamanha intensidade era incontrolável.

Sentir tanta raiva desse jeito, parecia que sua forma de amar era errada. Talvez fosse, de fato.

Sua cabeça explodia, vozes falavam nela. Aquilo não era ele. Parecia tão real, mesmo que se assemelhasse a um sonho. Seus olhos tremiam. Eles se tocaram e riam como dois ridículos, Zéfiro estava perdido. Estava entre odiar o que via, ou sentir inveja e estar ali no lugar do repugnante deus do Sol.

Doía como inferno, ainda que fosse o momento impróprio para isso. No segundo em que os dois na sua frente se aproximaram, os rostos ficaram ligeiramente vermelhos e tudo parecia perfeito para qualquer outro espectador, menos para Zéfiro, tudo virou um breu.

Se ele pensava que seu inferno estava por vir, mal sabia Zéfiro, que ele tinha acabado de começar. Em sua raiva descomunal, Zéfiro jogou o disco para o ar, com tanta força que ele atingiu o rosto angelical de Jacinto. Na mesma hora, o pobre garoto foi atirado ao chão, com a mesma força.

Os olhos, que antes não podiam acreditar no que captava por egoísmo, agora definitivamente não queriam acreditar no que via, por medo e vergonha. O homem então, tratou de correr em direção ao corpo. Apolo tentou intervir, mas tampouco funcionou, também estava surpreso com os acontecimentos repentinos. Desesperado, Zéfiro ajoelhou-se onde pôde, abraçou o amado desacordado, beijando-o e chorando, e tentou estancar o sangramento.

—— Maldito seja eu! Matei o meu grande amor! - gritava Zéfiro, aos prantos.

E mesmo em seu momento de dor e sofrimento, Zéfiro ainda conseguiu escutar no fundo, a voz do deus do Sol, rouca e séria:

—— Zéfiro, deus dos ventos do Oeste, filho de Eos e Astreu. Nunca esqueça do que escutar, eu voltarei e lembrarei a todos do que você fez hoje. Assim como nunca esquecerei como Jacinto e eu nos amamos.

Apolo pacientemente esperou, observando Zéfiro sofrer. Esperou para que este fosse embora, para então se ajoelhar ao lado daquele ser tão belo e delicado, acariciar suas bochechas pela última vez e tocar em seus cachos com um sorriso triste no rosto. Selando os lábios singelamente, apesar de estar acompanhando do gosto salgado de suas lágrimas.

O deus do Sol, nunca se esqueceu do que sofreu naquele fatídico dia. Também nunca se esqueceu de sua promessa.

—— Eu vou te amar, todos os dias da minha vida. E se for preciso, amarei e lutarei por ti em todas as outras.

O que ele não sabia, é que a palavra, certamente, possui poder.

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