Camellia

By Hunterina

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🏆 VENCEDOR DO WATTYS 2023! 🏆 O Madre Cordélia era o internato dos sonhos, mas havia se transformado em um p... More

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By Hunterina

se você ficar para sempre

nós poderemos ser eternamente jovens

(here's to never growing up)




Se Bianca ganhasse uma moeda para cada vez que foi acordada por alguém enquanto estava dormindo com Daniel, ela teria duas moedas — o que não era muito, mas era estranho como tivesse acontecido mais de uma vez em tão pouco tempo.

— Porra, eu sabia que vocês estavam aqui! — Bellini reclamou enquanto entrava no quarto e ligava a luz, sem cerimônia. Bianca franziu os olhos, o cérebro sonolento tentando contextualizar onde estava. — Ah cara, não acredito que vocês transaram na minha cama!

— A gente não fez nada. Idiota. — Ela murmurou enquanto se sentava. Olhou para o lado e encontrou Daniel igualmente sonolento, com um dos braços ainda agarrados à sua cintura. Perdeu alguns segundos admirando como ele estava lindinho com a bochecha meio amassada e os cabelos bagunçados, então lembrou que tinham deitado para descansar e provavelmente pegaram no sono. Deixou um bocejo escapar: — Que horas são?

— Hora de vocês irem embora! — Bellini atravessava o quarto de um lado para o outro, como um furacão, recolhendo roupas jogadas, coisas fora do lugar e fechando armários e gavetas. — ... Três da manhã.

— Desculpa cara. — A voz de Daniel estava ainda mais rouca que o normal. Quando tentou se levantar, franziu a testa, com dor. — Tá tudo bem?

Bellini parou para respirar e Bianca percebeu como ele parecia... nervoso? Desesperado? Os cabelos loiros estavam desgrenhados e ele não para quieto nem um segundo.

— Eu tô com... hm, uma menina. Ela tá na cozinha, mas já vai subir. Sério, preciso que vocês vazem.

Por um segundo, Bianca ficou levemente curiosa na menina que estava com ele. Não devia ser Zoe, porque haveria motivo para toda aquela cena... Então Daniel deu um gemido sôfrego e ela esqueceu do assunto:

— Você tá bem? Consegue ir embora?

— Não tô bem, mas consigo — falou, tentando disfarçar o cambalear quando levantou da cama.

— Todo mundo já foi embora, Bellini? — Bianca perguntou. O combinado era voltar com as amigas para o internato, mas tivera a decência de avisá-las que voltaria com Daniel. O dia seguinte seria uma dor de cabeça...

— Sim. Os moleques presumiram que vocês voltariam juntos. — Bellini suavizou um pouco o tom, mas não parava de olhar para o relógio no pulso. — Querem que eu chame um Uber?

Bianca negou com a cabeça.

— Pode deixar, nós nos viramos. — Recolheu rapidamente seus fones, celular e bolsa. Depois, fez Daniel beber um pouco de água e, para o alívio do anfitrião, finalmente saíram do quarto. — Desculpa por perder o horário.

— Não tem problema. — Henrique falou, voltando sua atenção para a arrumação desesperada que tentava fazer: — Pela saída de trás! O Daniel sabe onde é!

— Não vai queimar a largada com toda essa empolgação! — Bianca provocou, antes de seguir Daniel em direção à uma segunda escadaria que ficava na sacada e levava diretamente à parte externa. Felizmente, não se sentia estranha por ver Bellini com outra garota apenas uma semana depois de terem se beijado... Claro que não poderia dizer nada, pois ele literalmente a encontrou com Daniel em sua cama. Pelo menos o clima não ficou estranho. Ainda assim, seu lado fofoqueiro não se conteve e virou para o amigo: — Quem você acha que é a menina?

— Eu não poderia estar menos interessado — Daniel grunhiu, mas seu tom não era grosseiro, apenas exausto: — Desculpa, eu tô me sentindo péssimo ainda.

— O que você está sentindo?

Bianca estendeu a mão para segurar a dele enquanto atravessavam o jardim, que não escondia muito bem que houvera uma festa: ainda haviam latinhas de cerveja espalhadas, assim como garrafas de bebida e copos de plástico. Boa sorte para o Bellini do dia seguinte.

— Tô tonto, enjoado e com dor de cabeça — admitiu, respirando fundo o ar fresco da rua, na esperança que ajudasse um pouco com a tontura. De mãos dadas, ficava ainda mais evidente para Bianca o quanto ele cambaleava. — Eu nunca mais vou beber na vida.

Ela nem disfarçou a risada.

— Que foi? É sério! — Daniel insistiu, mas também sorria. Então franziu as sobrancelhas e pareceu lutar contra a ânsia de vômito e Bianca riu mais ainda. Ele revirou os olhos de brincadeira, mas puxou o celular do bolso e entregou para ela. — Toma, pede o Uber do meu celular. Põe o seu como primeira parada. Prometo que não vou vomitar no carro.

Saíram juntos pelo portão alto da mansão de Bellini, que ficava num bairro repleto de casas igualmente opulentas. Bastou que sentassem lado a lado na mureta para Daniel apoiar a cabeça no muro de pedra e fechar os olhos.

Assim que desbloqueou o celular dele, deu de cara com o wallpaper de TLOU que já conhecia por prints e uma conversa repleta de mensagens enviadas para "Z". Pelo horário, parecia ser de quando Daniel ainda estava trancado no banheiro.

Seu coração deu uma cambalhota e ela olhou de canto para se certificar de que ele ainda estava de olhos fechados, tentando não morrer. Quer dizer, não é como se tivesse fuçado o celular! Ela literalmente desbloqueou o celular e as mensagens pularam na sua cara.

Então quando saiu do aplicativo de conversa para procurar o de carona, precisou fingir que não tinha lido (com vários erros de digitação que tornaram o processo meio difícil): "O foda, Zoe, é que eu percebi que eu amo ela mais do que odeio a minha vida. Uma vez ela me disse que a irmã era um raio de sol e ela não era nada, você acredita? Eu disse que achava ela intensa como uma tempestade, mas agora eu tenho certeza que é pouco. Ela é a porra do sol, a lua e a estrelas, tudo junto. A Bianca é um universo inteiro. O meu universo. Um onde vale a pena viver."

"Nossa, isso ficou bem gay, né? Nunca fala isso pra ela, pelo amor de Deus... Mas olha, eu pensei no que você disse. Minha vida é uma merda mesmo, mas eu não posso perder as coisas boas nela por medo. Eu falo da Bianca, mas também de vocês, da Emily... Acho que tive uma epifania enquanto colocava as tripas pra fora. Quero me esforçar para melhorar."

"Vou vomitar de novo agora, mas é isso. Espero acordar cedo o suficiente para apagar essas trinta mensagens antes de você ler e me zoar por elas pelo resto da vida. Te amo, espero que você esteja aproveitando a festa"

Com toda a confusão de ser acordada às pressas e praticamente expulsa do quarto, sequer teve tempo de pensar no que sentiu quando o ouviu falar que a amava. Responderia numa batida de coração, se não soubesse que ele só falou aquilo porque achava que ela estava dormindo. Então teve a decência de seguir com o fingimento, tentando ignorar como todas as borboletas que moravam dentro de si enlouqueceram completamente.

Era bom ouvir que ele queria se esforçar para melhorar. Não seria uma mudança da noite para o dia, assim como não foi para ela (dias difíceis nunca faltavam...), mas decidir começar era importante. E pensar que ela era um dos motivos que o incentivou, fazia seu coração bater mais forte.

Depois de mais dez minutos esperando um motorista apenas para ele cancelar a viagem de última hora, Bianca suspirou. Já estavam ali há mais de vinte minutos, Daniel parecia prestes a apagar e ela não fazia ideia de como voltaria para o internato. Boa, Bianca, larga suas amigas por causa de homem mesmo...

Então, pensou em uma coisa. Não dava para dizer que era uma boa ideia, mas definitivamente era uma ideia. Ela já tinha tido outras piores na vida, né? Ou, sei lá, Natalie com certeza já havia feito algo mais idiota (esse era um parâmetro recorrente na sua vida, e muito útil para validar qualquer uma de suas escolhas ruins).

De qualquer maneira, não via mais nenhuma solução além de pegar o seu celular e pedir ajuda de alguém em quem podia confiar.



— Não, cara, não... — Daniel lamentou, os olhos arregalados focados na motorista da Mercedes que diminuía a velocidade. — Me diz que você não chamou a diretora do Madre Cordélia.

— Embora coubesse nós dois, duvido que o Bellini deixaria a gente dormir na jacuzzi dele. — Bianca debochou. — E ela não é a diretora do Madre Cordélia... quer dizer, ela é, mas ela também é minha... eu não sei direito. Cunhada? Sei lá. Nossas irmãs se pegam. É um vínculo importante.

Dessa vez, Daniel nem conseguiu rir. Quando Ariele Cordélia saiu do carro, se empertigou tão rápido que sentiu vertigem. Para ser sincero, ele não conhecia tão bem a diretora do Madre Cordélia, mas se ela tivesse apenas um quarto do mau humor do diretor do Cruz e Souza, ele provavelmente tomaria uma advertência em alguns segundos. E ele nem estudava naquele colégio.

A mulher caminhou até eles, em seu curioso conjunto de calça de pijama e uma T-shirt que poderia ser um pijama. Nem por isso ela ficou menos assustadora quando cruzou os braços e ergueu uma sobrancelha.

— Desculpa, Arielle — Bianca murmurou, abaixando a cabeça. — Eu não tava conseguindo pedir Uber por nada e todos os nossos amigos já tinham ido... O Daniel tava mal então eu não-

Daniel forçou uma tosse muito alta e muito falsa para interrompê-la. A encarou com os olhos arregalados, tentando gritar por eles: Cala a boca, porra!

— Você tem sorte que eu tenho insônia, Bianca. Mas tudo bem, aprecio que você tenha ligado para um adulto e não escondido a situação. Estou puta, mas orgulhosa. — Então os olhos azuis encontraram os de Daniel, que encolheu os ombros imediatamente. — Sabe, não é a primeira vez que eu vou ao resgate de um Beaumont chapado. Tá se sentindo bem? O que você usou?

— O Dani bebeu um monte... E fumou maconha. Aí vomitou tudo e... — Bianca falou, e foi fuzilada com os olhos de novo. — Que foi?! Você tá fora do internato! Pode confiar na Ariele.

Bianca recebeu um carinho na cabeça da mulher mais velha, como se fosse um cachorrinho.

— Isso mesmo, escuta a baixinha. Prefiro que me fale logo o que você usou para eu saber se devo me preocupar. Vocês dois tem autorização para estar fora hoje, né? — Os dois assentiram, Daniel ainda tentando disfarçar o medo. — Perfeito. Você vai vomitar? — Ele fez que "não". — Então podem entrar no carro. Se ficar muito mal, me avisa que eu paro. Tem água lá dentro.

Ainda um pouco horrorizado com a situação, Daniel seguiu uma Bianca que basicamente saltitou atrás de Ariele até o banco do carona. Que noite bizarra.

Entrou no carro em silêncio e agradeceu mentalmente pelas garrafas de água que estavam em cima do banco. Àquela altura, a tontura começava a ceder, mas ainda se sentia um lixo e começava a ficar com fome.

— Hm, o que você quis dizer com não ser a primeira vez que... — Ele deixou a frase morrer no ar, enquanto observava Ariele colocar o cinto e olhá-lo pelo retrovisor.

— Que salvo alguém da sua família? — Abriu um sorriso. — Quem você acha que tirou a Leonora da cadeia?

— Meu Deus, eu não sabia.

— Eu imagino que a sua mãe não deva falar muito desse assunto. — Conversou, descontraída, enquanto acelerava o carro. — Eu estudei com a Leonora no Madre Cordélia, então já conhecia seus pais. Como o antigo escritório que eu trabalhava era bem renomado e Angela queria deixar o assunto baixo, veio falar comigo. Olhando pelo lado bom, pelo menos dessa vez você não estava fazendo muita merda.

A sinceridade (e ouvir um palavrão saindo da boca da diretora) lhe arrancou um riso anasalado. Em menos de dez minutos de uma conversa descontraída, ficou fácil entender por que Bianca olhava para a diretora com tanta admiração.

Quando o ronco do estômago de Bianca interrompeu o assunto, ele foi obrigado a gargalhar.

— Ariele... Será que a gente pode passar no McDonald's? — A segundanista manhou. — Tem um 24h no centro...

Primeiro, recebeu uma olhada feia, mas depois a diretora pareceu pensar melhor:

— Olha, eu até aceitaria um sorvete agora — ponderou, olhando para o relógio. 3:00. — Quer saber? Pode ser. É bom o Daniel comer alguma coisa mesmo, ajuda a não morrer de ressaca.

Ele meio que queria contar para os amigos que foi assim que terminou junto com a diretora do Madre Cordélia, em frente ao McDonald's, esperando Bianca voltar com o pedido. Ariele Cordélia avisou que pagaria e estendeu o cartão para Bianca, enquanto Daniel se afastava alguns passos, temendo vomitar de novo.

O problema é que provavelmente nenhum deles acreditaria.

— Tá melhor? — Ariele perguntou enquanto Daniel caminhava até o carro.

Ela estava com as costas apoiadas na lateral do veículo, fumando um cigarro e Daniel hesitou por alguns segundos, mas parou do lado dela. Sentiu o impulso de pedir um, mas achou que Bianca ficaria chateada se ele fizesse isso.

— Tô... vivo.

— Às vezes é o suficiente. — Ariele deu de ombros. Um silêncio se estendeu entre eles enquanto ela fumava e Daniel acompanhava Bianca com os olhos pela janela do restaurante. Deu um sorrisinho assistindo-a se erguer na ponta dos pés para falar com o atendente. Quando a diretora falou de novo, ele foi pego de surpresa, quase como se tivesse sido flagrado fazendo algo errado: — Mas e aí, bebeu tanto para esquecer o que?

Ele engoliu em seco, pensando em uma resposta genérica. Não, aquela noite poderia estar sendo maluca, mas ele não terminaria desabafando com a diretora do Madre Cordélia.

— Não foi pra esquecer nada, eu só tava com os meus amigos e-

— A Bianca me falou na mensagem que você encheu a cara porque estava mal. — Ariele abriu um sorrisinho divertido para o olhar de horror dele. — Mas não esquenta, não precisa me contar nada.

Daniel resistiu ao impulso de revirar os olhos. Mataria aquela fofoqueira de cosquinha mais tarde.

— Ah, foram só uns problemas em casa. Meus pais são meio difíceis.

Ariele o olhou de canto, assoprando a fumaça para longe. Conhecia bem o casal Beaumont desde a época em que saía com Leonora e a última coisa que usaria para descrevê-los seria "agradáveis".

— Nem me fale sobre isso. — Ariele revirou os olhos de brincadeira, esperando mostrar que entendia bem sobre o assunto. — Mas se quiser uma dica de alguém que sofreu com uma mãe narcisista: começa a descontar esses problemas na terapia, não na bebida. Você vai perder a mão mais rápido do que imagina.

Narcisista. Zoe sempre chamou sua mãe disso, mas Daniel nunca pensou muito no assunto. Se fosse sincero, ele nem entendia muito bem o que significava.

Ergueu seus olhos azuis para observar Ariele. Quantos anos ela tinha mesmo? Provavelmente uns trinta e poucos, como sua irmã mais velha. Para ser sincero, ele não era muito acostumado a conversar com adultos, além de seus parentes e professores (e Andrei, mas ele se comportava como um adolescente), e não estava esperando aquela sinceridade. Principalmente de alguém que parecia ter crescido no mesmo mundo de aparências que ele. Será que Ariele também cresceu numa família merda? Era meio estranho, porque Daniel nunca se imaginou chegando àquela idade. Nunca achou que desse para sobreviver à vida que tinha.

Engoliu em seco, porque Ariele realmente pareceu sincera na tentativa de conselho:

— Eu bem que queria, mas meus pais são contra. Desde que a minha irmã, hm... teve um surto e o médico recomendou que ela tivesse acompanhamento psiquiátrico e fizesse terapia, eles pensam que é coisa de maluco. — Daniel suspirou. — Sei lá, não faz sentido. E eu não tenho nem força para argumentar com eles. Não é como se fossem ouvir, sabe?

Era uma pergunta retórica, mas Ariele riu e respondeu:

— Sei muito bem. — Deu mais um trago no cigarro e soprou a fumaça para longe. Daniel se coçou de novo para pedir um, mas fez força para se distrair. — Hoje em dia eu me dou bem com a minha mãe, mas só porque não moramos mais juntas. Ela não é um monstro, mas é uma mulher que pode ser muito tóxica quando quer. Viver com ela desgastou tanto o meu psicológico que eu a odiava e me odiava. Eu entendo o que é não ter forças para brigar.

Dentro do McDonald's, Bianca finalmente terminou de fazer o pedido e estava esperando sua senha ser chamada. Virou na direção deles e acenou. Os dois retribuíram.

— Viver com pais assim faz a gente tentar sumir. Não incomodar, não falar, não brigar, diminuir até deixar de existir... mas você continua existindo. Lembra disso, tá? Tem vida depois do colégio, depois que você sai da casa dos seus pais... É foda quando você tem dezessete anos e ainda está conhecendo o mundo, mas ele é bem maior do que você imagina. Mesmo se você estiver completamente destruído, sempre vai poder se reconstruir em outro lugar.

Daniel ficou quase sem ar ouvindo tudo aquilo. Ele amava Zoe e amava todos os seus amigos, mas era muito diferente ouvir uma pessoa adulta falando aquilo. Alguém que parecia entender suas dores e, principalmente, ter superado elas.

— Eu... — Ele limpou a garganta, tentando comprar tempo. Não sabia se era a bebida que fez seu cérebro ficar completamente atordoado. — Obrigado.

— Não, não ainda. — Ariele jogou a bituca no chão e apagou com a sola do tênis. Então pareceu se dar conta de que Daniel ainda estava ali e se abaixou para juntar de volta e atirar no lixinho do carro. Não podia dar um mau exemplo. — O Cruz e Souza também tem psicólogos, né?

— Ahn, até tem, mas o-

— Sim, o problema não é esse, mas nessa parte eu posso ajudar. Daniel Beaumont, né? — Ele franziu o cenho e assentiu. — Você se importa se eu conversar com o seu coordenador? Vou falar sobre essa situação. Precisamos da autorização dos seus pais, mas podemos montar uma estratégia para fazer o meio de campo. Alegar que é um projeto para auxiliar os alunos a escolher uma faculdade, profissão.

— E... Você pode fazer isso? — Seu coração começou a bater mais forte, apenas por ver o interesse dela em ajudar.

— Poder eu posso. É ético? Debatível, mas a minha prioridade é a segurança dos meus alunos. É ético eu acobertar menor de idade enchendo a cara? Não, mas eles vão continuar enchendo e eu prefiro que confiem em mim o suficiente para pedir ajuda, se necessário.

— Cara... você é foda. Obrigado por tentar me ajudar.

— De nada. É importante ter um adulto com quem contar na sua idade. E a gente vai ser família um dia, afinal, não é? — Ela abriu um sorrisinho e apontou com o queixo na direção da porta do restaurante, de onde Bianca saía. Daniel ficou vermelho. — Quer dizer, a menos que você magoe a Bianca. Aí vamos virar inimigos mortais.

Daniel riu, e aproveitou os últimos passos de distância de Bianca para falar:

— Acho que magoei ela um pouco recentemente... mas é por isso que é tão importante pra mim me tornar alguém melhor. Não deixar os problemas atingirem quem importa.

— Cara, a fila tava enorme! — Bianca chegou, reclamando e pisando duro enquanto equilibrava uma sacola enorme, dois refrigerantes e um sorvete. Daniel nunca achou tão fofa. — E uma mulher passou na minha frente, sem mais nem menos, vocês acreditam?! Ariele, processa aquela vaca!

A diretora trancou o riso.

— Não trabalho mais com isso, mas posso te dar uma suspensão pelo linguajar. — E riu mais ainda quando Bianca arregalou os olhos, pegando seu sundae. — Escutem, eu tô cansada, mas já é 4:00 e não é como se eu fosse conseguir dormir, de qualquer jeito. Querem comer em um lugar legal? O rio que passa pelo Madre Cordélia desemboca num lago ali perto, é um local bem bonito. Depois levo vocês para os internatos, pode ser?

Daniel e Bianca nem hesitaram antes de assentir vigorosamente. Enquanto os três voltavam para o carro para concluir o que oficialmente era o rolê mais estranho da vida dos estudantes, Bianca lamentou:

— Por que a minha irmã não é tão legal quanto você?!




Nota da autora:

Mais um capítulo oficialmente na lista de "deveria ter 6 páginas e acabou com 9" 😎

Minha nossa, como eu amo a Ariele. Eu queria que todas as pessoas do mundo pudessem ter uma dessas na vida (e não só pras coisas impuras que vocês estão pensando!!!!)

Espero que tenham gostado do capítulo mais tranquilo para aquecer nossos corações 🥰 essa participação da Ariele era uma das coisas que eu estava mais ansiosa para trazer!! 

E a declaração do Daniel mano.............. eu amo esse puto 😭

E aí, perdedores: por que o Bellini estava tão ansioso com a pessoa que ele ia levar pro quarto? 👀

Essa eu vou responder no capítulo que vem.

Aliás, tô de bom humor hoje e vou lançar um spoilerzinho: vocês lembram que no final de semana seguinte as meninas vão gravar na casa da Emily, né? Graças a Deus que o Daniel não vai marcar treino com os amigos lá no mesmo dia!!! Afinal, apesar de tudo, ele e a Bianca ainda são só amigos e nada poderia acontecer!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Perdão por atualizar tão tarde e até sexta-feira 💜

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