Camellia

By Hunterina

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🏆 VENCEDOR DO WATTYS 2023! 🏆 O Madre Cordélia era o internato dos sonhos, mas havia se transformado em um p... More

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By Hunterina

querida, nós dois sabemos

que as noites foram feitas principalmente

para dizer coisas que não se pode dizer no dia seguinte

(do i wanna know?)




Depois que bateu a porta, Bianca pisou duro até o meio do quarto e parou em frente à Daniel de braços cruzados:

— Que porra é essa?

Encarou aqueles olhos azuis familiares que pareciam enevoados. Ele estava parado bem a sua frente, obrigando-a a olhar para cima, mas seu corpo não parecia exatamente estável. Os cabelos estavam desgrenhados, da mesma maneira que suas roupas e a colcha da cama de Bellini, então Bianca soube que ele esteve deitado ali. Bebendo, provavelmente, pela garrafa de vodka pela metade que repousava na mesa de cabeceira.

— Que porra é essa digo eu — respondeu, e Bianca percebeu que também segurava aquela porcaria de vape na mão. Estava tão chapado que toda a sua fala parecia um pouco letárgica. — Pra que essa cena toda? Agora que já viram que eu tô vivo, podem me deixar sozinho?!

Bianca revirou os olhos, e ficou ainda mais nervosa com a petulância quando o viu dar as costas para ela e ir em direção à janela fumar. Quando a luz do exterior clareou seu rosto, ela notou os olhos inchados e vermelhos, mas nem isso a impediu de erguer o tom:

— Os seus amigos estão preocupados com você, Daniel!

— Valeu, mas eu não preciso de babá.

— Para de ser babaca! Você passou a festa inteira enchendo a cara, não falou direito com ninguém, aí se tranca aqui e não quer nem abrir a porta para verem como você está?! — Bianca desabafou, sentindo uma mistura conflitante de sentimentos. Durante toda a festa não conseguiu tirá-lo da cabeça e, agora que estavam juntos, só queria dar um jeito de descontar nele a frustração que sentia por tudo: — Talvez você precise sim de uma babá, já que está agindo que nem uma criança!

Os olhos de Daniel faiscaram para ela:

— E o que isso tem a ver com você?!

— Aparentemente bastante, se você tá fazendo esse fiasco porque eu fiquei com o Bellini! — Bianca soltou, sem pensar, apenas querendo tirar o peso da dúvida do peito.

Aquilo parecia tê-lo pego de surpresa, porque Daniel parou no caminho de levar o vape aos lábios. Logo a expressão se dissolveu para algo mais inflamado e ele caminhou na direção dela:

— Sério, Bianca?! — Deixou uma risada anasalada escapar. — Você acha que todos os meus problemas têm a ver com você?!

Ela vacilou um pouco, odiando a forma como aquilo soava.

— Foi o que o Victor Hugo me contou — argumentou, não querendo perder a postura. Independente do motivo, continuava brava por Daniel agir daquela forma. — Que você ficou mal desde aquele dia e...

— Eu fiquei mal, mas — ele admitiu, revirando os olhos. Então vacilou, os olhos arregalados como quem percebe que falou demais. Daniel bufou, e emendou: — mas não-

— Como se você tivesse o direito de ficar mal! — Bianca explodiu. Não sabia se era o pouco álcool que bebeu ou toda a raiva que não processara direito, mas as palavras saíram sem que tivesse controle: — Foi você que quis se afastar! Queria que eu fizesse o que, ficasse te esperando?!

— Você sabe bem que eu nunca quis me afastar! Eu fiz isso porque eu não queria que você se machucasse, o que já estava acontecendo! — Daniel retrucou e cambaleou de leve quando trocou o peso do corpo de perna. Passou a mão pelos cabelos, tentando organizar um pouco os pensamentos antes de continuar: — Eu não estou dizendo que tenho direito de porra nenhuma, mas não consigo simplesmente fingir que não me deixa mal... Eu deixei o Bellini te chamar pra-

Deixou?! — Bianca praticamente rosnou.

Merda. Palavra errada. O cérebro de Daniel estava tão lento, acelerado e confuso, tudo ao mesmo tempo, que ele mal pensava direito no que estava dizendo.

— Como se fosse você quem escolhesse o que-

— Eu não quis dizer isso! — Interrompeu-a, igualmente nervoso. A escolha certa seria pedir desculpas e explicar melhor o que ele tentou dizer, mas só pensou nisso depois de já ter falado: — Eu só fiquei na minha a noite inteira, você que se meteu e veio atrás de mim! Você nem ao menos sabe o que tá acontecendo na minha vida. Eu tenho meus motivos pra querer ficar sozinho.

Bianca ficou particularmente mordida com a parte do "você que se meteu e veio atrás de mim". Será que aquele inconsequente não podia refletir sobre as coisas que ele fazia uma porra de vez?!

— E eu não dou a mínima para que motivos são esses! — Ergueu a voz. — Eles não te dão o direito de agir assim e deixar as pessoas que se importam com você preocupadas! Seus amigos que me chamaram aqui porque-

— Porque são uns exagerados! — Daniel falou ainda mais alto que ela, sua voz ecoando pelo quarto escuro de Bellini. — Porque não gostam da forma como eu lido com os meus problemas, mas nenhum deles faz o mínimo de esforço para entender que não me resta mais nada para fazer! Parece que todo o dia eu descubro que tem alguma coisa diferente errada comigo, com a família... — Pela segunda vez, ele deu as costas à Bianca e fez menção de ir em direção à janela, depois de tirar seu vape do bolso da calça. — Eu também adoraria saber uma forma melhor de lidar com toda essa merda-

Bianca agiu antes de pensar.

Estava irritada por muitas coisas naquela noite: pela forma como as coisas terminaram entre eles, pela sua própria confusão de sentimentos, pela preocupação que sentiu quando VH pediu sua ajuda... mas, acima de tudo, ficou furiosa com aquela demonstração de inconsequência, depois de ver como os amigos de Daniel se importavam com ele.

Não se orgulharia mais tarde, mas mesmo assim deu um passo à frente e arrancou o vape das mãos de Daniel tão rápido que ele não teve reação. Em seguida, o espatifou no chão para deixá-lo mais parecido com seus corações.

— Sabe como você pode começar?! Não tentando resolver tudo da maneira mais autodestrutiva possível! Não se enfiando em um looping de autossabotagem onde você só pode perder!

Demorou vários segundos até que os olhos de Daniel abandonassem o vape em pedaços e se reencontrassem de novo com os de Bianca. A mistura de sentimentos ali era difícil de decifrar.

Bianca hesitou, o arrependimento por ter feito aquilo batendo de imediato. Voltou a falar, temendo que tivesse piorado completamente a situação:

— A gente se importa com você, Daniel. Eu me importo! Ninguém quer fazer pouco caso dos seus problemas, só... não quero te ver fazendo isso. — Bianca suspirou e surpreendeu até a si mesma com a sinceridade das próximas palavras: — Não tem nada a ver com o que aconteceu entre a gente, tá? Eu ainda sou sua amiga, Dani. Eu sei que não é só querer mudar e pronto, mas é difícil te ver fazendo coisas que só vão servir para você se culpar mais.

Quando parou de falar, o quarto teria caído em silêncio completo, não fosse a batida abafada da música que vinha do quintal da frente. Bianca não estava conseguindo reconhecer, mas era um pop agitado que não tinha nada a ver com aquele momento.

— Bianca, por que você não vai embora da minha vida?!

As palavras vieram de maneira tão repentina que a acertaram como um soco. Esperava uma explosão e, apesar dele ter mantido a voz no tom alto da briga anterior, aquela única frase foi mil vezes pior do que ser xingada. Mordeu o lábio para não deixá-lo tremer e sentiu um aperto sufocante em seu pescoço. Quis se afastar imediatamente e dar as costas para ele, mas estava atordoada demais para isso.

Então o viu erguendo as duas mãos para esfregar os olhos, depois se arrastarem pelo cabelo em um movimento quase agoniado. Da segunda vez que falou, não havia mais nenhuma confiança no tom de voz de Daniel, apenas uma desespero latente:

— Por que você continua voltando?! Não interessa o que eu faça, de que forma te afasto... — As últimas palavras saíram subitamente afinadas, denunciando que ele estava prestes a chorar. Daniel não tirou as mãos da cabeça, aproveitando para continuar escondendo o rosto, e se sentou pesadamente na cama de casal. — Você volta. Por que?!

Bianca o observou cobrir o rosto com as mãos, como se estivesse tentando lutar com as lágrimas. Seu coração batia tanto que era difícil raciocinar, mas ela se obrigou a responder mentalmente àquela pergunta: por que ela continuava voltando?

Porque ele voltaria por ela.

Porque mesmo que agora as brigas estivessem mais constantes, ainda lembrava dele ao seu lado em todos os momentos em que se sentiu mal e sozinha. Porque ele a lembrou mais vezes do que qualquer outra pessoa o quanto ela era incrível em tudo o que fazia, e falou as coisas mais incríveis que já tinham sido ditas sobre ela. Porque convenceu os amigos a invadirem um prédio e roubar filmagens para fazer justiça por ela. Porque mesmo que tentassem se afastar, algo sempre os puxava de volta.

Ela respirou fundo e sentou ao lado dele, igualmente cansada. Observou-o tirando as mãos do rosto e deixando-as pousadas no colo, ainda sem conseguir fazer contato visual. As pulseiras de couro pretas contrastavam com a pele pálida mesmo sob a luz baixa do quarto, iluminado somente pela luz exterior.

— Porque eu me importo com você. Apesar de tudo, ainda somos amigos e eu não quero te ver assim péssimo assim, bebendo-

— Eu não tô péssimo! — Ele a encarou. — Que porra, eu só-

Daniel não conseguiu terminar pelo súbito movimento de ânsia que sacudiu seu corpo. Arregalou seus olhos azuis e imediatamente precisou se levantar e correr para o banheiro. Bateu a porta e Bianca ouviu o som da chave girando na fechadura.

Ela deixou um riso anasalado escapar. Em seguida, soltou um suspiro pesado enquanto se deitava na cama de casal. Pela primeira vez, deu uma olhada no quarto, percebendo que aquele cenário até então era apenas um borrão em segundo plano para a sua discussão com Daniel. Apesar do quarto espaçoso, Bellini não parecia ser muito organizado e havia um número considerável de pilhas de roupas espalhadas aqui e ali. O setup de jogos era tão incrível quanto o de Daniboy e havia um frigobar logo ao lado. Na parede, um expositor mostrava vários troféus e medalhas.

Deu uma risadinha consigo mesma pensando em apenas deixar uma mensagem em seu grupo de amigas, sem qualquer contexto: "terminei a noite no quarto do Bellini 😳", mas apenas avisou que estava com um amigo e não voltaria mais com elas. Depois responderia ao interrogatório... falando nisso, não podia esquecer de adicionar Zoe ao grupo, agora que ela tinha confirmado que iria na casa de Emily também. Mesmo que encontrasse com a Megera (o apelido gentil que deram à Angela Beaumont).

Quando finalmente ouviu o barulho da descarga, levantou da cama e foi até a porta trancada do banheiro. Deu dois toquinhos na madeira:

— Você tá vivo?

— Infelizmente. — A voz de Daniel veio abafada. Ele estava sentado no chão, com as costas e cabeça apoiadas no armário da pia para tentar controlar a labirintite. E ficar ao alcance do vaso sanitário.

— Você é um idiota — Bianca avisou. Àquela altura, todo o clima tenso anterior havia se dissipado. — Abre essa porta.

O silêncio se estendeu por vários segundos, então ela o ouviu murmurar:

— Meus pais vão se divorciar, Bianca.

Pega de surpresa, deixou um suspiro de assombro escapar. Daniel deve ter ouvido aquela reação, porque continuou, fechando os olhos e limpando uma lágrima solitária que escorria:

— Minha mãe me contou hoje. Por isso eu tô mal. Eu nem queria ter vindo na festa, mas se eu falasse isso, os moleques achariam que era por causa de você e... — Ele suspirou e arrastou a mão pelos cabelos desgrenhados, limpando a garganta para tentar afastar aquele gosto de bile. Então se abriu, simplesmente porque era mais fácil quando não estava encarando ela: — E, olha, eu fiquei mal mesmo. Desculpa ter dito que eu deixei, não era essa palavra que eu queria usar, mas o Bellini me perguntou antes. Eu não tenho direito de me meter na sua vida, eu sei, só... Desculpa, eu não consigo fingir que não me afeta, pelo menos um pouco. — Ele deixou um riso sem graça escapar: — Por isso eu digo que não sei o que fazer. Independente do que eu tente, parece que sempre estou errando e deixando as pessoas perto de mim piores. Eu não queria estragar a porcaria da festa de ninguém, só queria encontrar um jeito de não me sentir tão mal.

Bianca suspirou, aproximando o rosto da porta de madeira, como se de alguma maneira pudesse diminuir a distância entre eles:

— Eu... Sinto muito. Não sabia sobre os seus pais.

— Obrigado. Eu só tenho medo que isso acabe me afastando da Emily.

— Dani, abre a porta? — Bianca pediu de novo, abaixando o tom de voz.

— De jeito nenhum.

— Estou mandando, Daniel.

Ele revirou os olhos com a petulância daquela pirralha em achar que podia mandar nele. Então se apoiou na pia e levantou para abrir.

— Eu queria pelo menos manter um pouco de digni-

Deixou a frase no ar quando os braços de Bianca envolveram sua cintura e sentiu o calor do corpo dela contra o seu.

— Eu sinto muito por tudo o que você tá passando. — Ela murmurou, com a bochecha grudada no peito dele. — Só que você precisa entender que essa forma de enfrentar as coisas só piora tudo. Você sabe disso. Tentar sufocar seus sentimentos com vícios, automutilação, ou tentar se isolar ao invés de buscar ajuda... No fim, você só está se machucando mais. E machuca os outros.

Ele não respondeu, mas Bianca sentiu os braços rodearem seu corpo. Com força. Apertando-a contra si com tanta urgência que parecia ter medo que, quando soltasse, ela se desfizesse. Sentiu os olhos arderem com lágrimas que ameaçavam escapar, mas se esforçou para controlá-las e continuar:

— Eu sei que você tem medo das coisas que não pode controlar. Da sua relação com seus pais, dos sentimentos, do futuro... Você tem medo que essas coisas afastem as pessoas de você, mas não percebe que, por causa disso, você acaba afastando elas.

Daniel segurou a respiração. Era mais fácil gritar, discutir, era até mais fácil ter que lidar com a ansiedade estrangulando sua garganta... do que ouvir coisas que ele já sabia. Do que estar sempre tão vulnerável, porque ele mesmo já tinha feito todo o estrago.

— Obrigado, Bianca.

Seria mais fácil se ela fosse embora.

Ou se ele não a amasse. O suficiente para pensar, só dessa vez, que o risco valia a pena.

Antes que chegasse a qualquer conclusão (e provavelmente não chegaria nenhuma, porque mesmo que tivesse acabado de vomitar as tripas, ainda estava com o cérebro enevoado), Bianca se soltou dele e abriu a boca para falar alguma coisa, mas sua boca pendeu aberta, com os olhos arregalados:

— Minha nossa, o Bellini tem uma jacuzzi no banheiro dele?!

Daniel olhou para a banheira enorme no canto do cômodo e deu de ombros, como se não fosse completamente fora da realidade um cara de dezoito anos ter uma fodendo jacuzzi na suíte. "Bando de mauricinho mimado do caramba" Bianca pensou consigo mesma.

— Ele pediu de aniversário — Daniel explicou, ainda meio aéreo. — Ele chama ela de "abatedouro", mas duvido que tenha realmente trazido alguma mina pra cá.

Bianca franziu o cenho.

— Enfim, você vai tirar a roupa e tomar um banho agora — falou, o tom sério de volta à voz. Apontou não para a jacuzzi, mas para o box do chuveiro. — Frio, de preferência. Você ainda tá bêbado pra caramba.

— Você tá só tentando me ver pelado — Daniel debochou, mas quase imediatamente tropeçou no tapete do banheiro e precisou se apoiar na bancada para não cair. Ele devia transformar "passar vergonha" em profissão.

A segundanista revirou os olhos, mas precisou fazer força para conter o sorrisinho. Apesar da brincadeira, era óbvio que nenhum dos dois estava exatamente no clima para nada. Nem na faculdade mental adequada.

— Anda, tô falando sério. — Ela se preparou para dar as costas para ele fechar a porta, mas virou para perguntar: — Como você vai embora mesmo?

— Eu... não lembro — Daniel deu um sorriso amarelo.

Ela revirou os olhos de novo.

— Vou avisar pros meninos que você tá bem. — Então o olhou de cima abaixo: com as roupas e cabelos desgrenhados, cognição prejudicada e tendo acabado de vomitar, ele já teve dias melhores. — Quer dizer, vivo.

Ouch.

— Vê se não se afoga, vou te esperar aqui fora.

Bianca fechou a porta e grudou as costas nela. Quase um minuto inteiro depois, ouviu o barulho do chuveiro ligando e respirou fundo, tentando colocar alguma ordem nos sentimentos que lutavam por um lugar dentro do seu peito.

Foi até o frigobar no canto do quarto em busca de algo para beber e procurou, em meio às várias latas de energético e cerveja, até encontrar duas garrafinhas de água. Abriu uma para si e a outra deixou na cabeceira da cama.

Depois, ligou o ar condicionado e reuniu os pedacinhos do vape quebrados em cima da escrivaninha. Precisava lembrar de avisar para Bellini, mas no momento estava cansada demais e apenas chutou os tênis para longe antes de deitar a cabeça nos travesseiros da cama de casal. Pegou o celular para ver o horário: uma da manhã. Felizmente ainda faltava um pouco para ir embora, mas ainda assim enviou uma mensagem para seu grupo de amigas, avisando que estava com Daniel e voltaria com ele. Depois teria que explicar aquilo melhor. Também garantiu à VH que o amigo estava bem e negou quando ele se ofereceu para subir e ajudá-la.

Sentindo o corpo cansado depois de tanto dançar na festa (e da tensão daquela briga, ela não podia negar), procurou seus fones de ouvido dentro da bolsinha que trouxera e os conectou no celular. Abriu o Spotify, clicou na primeira playlist que apareceu, então trancou a tela e fechou os olhos.

Só percebeu que havia apagado quando a sensação do outro lado da cama sendo afundado a despertou. Sentiu um dos seus fones sendo retirados.

Ela abriu os olhos, um pouco sonolenta, e o encontrou deitado ao seu lado, colocando o fone que havia tirado dela na orelha. Seus cabelos brancos estavam úmidos e, apesar de claramente bêbado, pelo menos parecia um pouco melhor.

Os dois ficaram em completo silêncio por alguns minutos, deitados lado a lado na cama de casal, sendo embalados por Panic! At the Disco. Apenas no final da música, Daniel quebrou o silêncio:

— Sabia que eu fui convidado para fazer um teste para um time profissional?

— Sério?! — Bianca virou para ele e encontrou os olhos azuis já presos ao seu rosto. — Parabéns, Dani. Se quiser ajuda para treinar, eu posso...

— Quero — respondeu, num sussurro. Ela ainda não entendera que, para qualquer sugestão que desse, a resposta dele sempre seria sim. — Imagina se eu consigo, e depois você vira embaixadora do time?

Bianca sorriu. Ela moveu a mão mais para perto dele ao mesmo tempo em que Daniel fez menção de aproximar a sua. Ambos recuaram por um segundo depois de se tocarem, com receio de serem interpretados incorretamente, mas antes que formassem qualquer pensamento coerente, já estavam com os dedos entrelaçados.

Não era só Bianca que sempre voltava.

Os primeiros acordes de 505 os embalaram no quarto escuro.

— Como você está se sentindo? — ela perguntou.

— Bêbado, com a cabeça explodindo — admitiu, sem muita empolgação. — E sem qualquer pingo de dignidade.

— Você nunca teve dignidade perto de mim. E eu deixei uma garrafa de água aí do seu lado.

— Você é um anjo.

Ela abriu um sorrisinho e fechou os olhos de novo, aproveitando a brisa geladinha do ar condicionado.

— Eu... — Daniel começou, mas se calou. Quando Bianca abriu a boca para perguntar o que houve, finalmente conseguiu continuar: — Não quero que você vá embora da minha vida. Quando eu falei, eu...

Bianca sentiu o coração acelerar e apertou a mão dele um pouquinho mais forte.

— Eu não vou... Se você prometer não ir embora da minha.

— Eu prometo.

Nenhum dos dois falou mais nada até o fim da música e Bianca finalmente conseguiu ouvir o som da festa à distância, abafado, como se acontecesse em uma realidade totalmente diferente e distante deles. Lembrou a si mesma que apenas estava dando um tempo para Daniel descansar, mas assim que Do I Wanna Know? começou a tocar, fechou os olhos de novo.

— Bianca, você tá dormindo?

A voz de Daniel a despertou suavemente, mas ela estava tão cansada que manteve as pálpebras fechadas, esperando que seu silêncio servisse de confirmação. Ainda sentia o calor da mão dele contra a sua, e não queria que a manhã chegasse nunca.

Os dedos dele se desentrelaçaram dos seus e só então ela cogitou protestar, mas percebeu que foi apenas para que ele conseguisse afastar uma das mechas de cabelo que estava no seu rosto. Continuou com os olhos fechados e sentiu o calor dos lábios dele contra sua bochecha em um beijo suave. Seu coração acelerou. Sentiu um cheirinho de menta, provavelmente do bochecho que Daniel fez depois de sair do banho, e conteve a vontade de dar uma risadinha.

A fala dele chegou suave, como uma música que ela nunca queria que acabasse:

— Eu te amo, Bianca. — Sentiu a mão dele voltando para o seu lugar, junto da sua. — Prometo que vou me tornar alguém por quem valha a pena você dizer o mesmo.




Nota da autora:

Amigos, eu estou tão feliz com esse capítulo.

Alguém me segura que o final me desestabilizou completamente. 

E ESSA MÚSICA FICOU TÃO PERFEITA COM ELE 😭

Talvez vocês me odeiem um pouco, mas eu amo como eles nem se beijaram. Eu nunca fiz suspense em dizer que o Dani e a Bee são, obviamente, endgame nessa história, mas o meu maior objetivo sempre foi criar duas pessoas que fossem indiscutivelmente amigos antes de tudo. Eles se amariam e cuidariam um do outro mesmo se todo o resto entre eles desse errado 🥺

Eu também quero falar outra coisa ☝🤓

Sabe, não existe nada mais gratificante para mim do que ver debates sobre os meus personagens. Eu tento ao máximo não me meter em nenhuma discussão, porque quero deixar espaço para os leitores chegarem às suas próprias conclusões, mas eu queria aproveitar para falar:

Como todos os meus livros, em Camellia eu também quis retratar os personagens e relacionamentos mais reais que eu conseguisse imaginar. Eu nunca tive interesse em contar histórias que ensinassem o certo ou errado, mas de sincera com a forma como eu vejo o mundo e as pessoas. Eu sempre fui fascinada pela ambiguidade na índole humana, pelo fato de todo mundo estar certo na sua perspectiva e ser o herói da própria história.  Meu objetivo com os meus personagens é apenas retratar o que eu acho que eles fariam, levando em consideração suas opiniões, personalidades e vivências.

Com isso eu quero dizer que sim, eles erram pra caralho. Às vezes são perdoados e punidos, outras não, mas não é necessariamente tentando fazer um comentário moral, apenas retratar a realidade da maneira mais sincera possível — pra mim. Eu não tenho interesse em romantizar nada, porque o romântico é muito fácil. A vida real não.

O Daniel foi e ainda é tóxico com atitudes autodestrutivas que afetam os outros; a Elisa mandou uma foto íntima da Bianca para a pior inimiga dela; a Bianca destratou a Zoe e espalhou boatos sobre ela por ciúmes; a Emily foi omissa com o bullying que acontecia na frente dela; a Nicole respira; o Bellini nem disfarça que só quer dar uns pega em todo mundo que respira; enfim. Nenhum desses erros ou as consequências refletem o que eu acho certo ou não, apenas o desfecho que vejo como mais apropriado, levando em consideração cada parte envolvida. Às vezes as pessoas aprendem e mudam, outras não. 

Eu genuinamente amo ver as opiniões de cada pessoa lendo meus livros (e como elas são diferentes umas das outras!!), e só achei um momento tão bom quanto qualquer outro para falar sobre a minha intenção por trás dele. Ou seja, ninguém está certo ou errado em nada. Ver como existem diversas opiniões sobre tudo só me mostra que eu alcancei o meu objetivo.

Bom, essa foi a opinião pacificadora. Agora, vou dar a polêmica & completamente gratuita: se o Daniel foi tóxico com a Bianca, não chega aos pés do que a Esther foi com a Natalie. Fight me. *figurinha do Flynn Rider cercado de espadas*

Amo muito vocês e amo a oportunidade de escrever essa história 💜

Obrigada por tudo, amigos, e até semana que vem!

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