Em uma outra vida, eu serei o...

By mariihreis

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EM BREVE LIVRO FÍSICO FINALIZADA | taekook | séc XVIII | romantismo | romance epistolar | +18 Kim Taehyung e... More

Trailer
01. Asas são feitas para voar
02. A ambiguidade consome cada partícula sã que me resta
03. Gostaria que o dia não findasse
04. À mercê de sensações confusas e paradoxais
05. No céu, uma miscelânea de cores. Em mim, de sentimentos
06. Talvez eu nunca possa tocar o céu
07. Perdidos em palavras não ditas
08. Que te custavas ter-me neste engano?
09. Culpa e santidade
10. Que seja eterno enquanto dure
11. Talvez em uma outra vida
12. Quando este mundo será diferente?
13. O Inferno é tão quente quanto pecar?
14. O sigilo ainda não me sacia
15. Meu devoto coração é todo teu, apenas teu
16. Aflição de ser água em meio à terra
18. E se amamos, sobrevivemos
19. O Sol surge com a Aurora, o Amor surge com Daehy
20. Quero abrir minhas asas e experimentar o tutano doce da liberdade
21. Meu anjo
22. Meu garoto
23. O voo alçado
pré-venda do livro físico aberta!

17. Lembro do vazio me abraçar

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By mariihreis




Olá, amore! Como vc está? Espero que bem 💜

Primeira publicação do ano hehehe espero que venham muitas outras nesse ano (inclusive de fics novas 👀)

Enfim, boa leitura! Lembre-se de comentar sempre que possível para continuar me motivando 💜

29 de setembro de 1790.

Lembro de chegar na praia e avistar um corpo estirado na areia, já com um amontoado de pessoas ao redor. Reconheci o vestido azul claro, os cabelos acastanhados. Meus membros todos entraram em estado de alerta, adrenalina percorria minhas veias e comecei a correr.

No entanto, correr na areia é ter a sensação de que não importa o esforço que faças, mal sairás do lugar. Ao enfim alcançar o corpo deitado de bruços, a palidez dele me desmoronou. Caí sobre meus joelhos, os pulmões queimavam em busca de fôlego. Toquei a pele esbranquiçada e gélida, eu precisava ver aquele rosto.

Um grito ficou preso em minha garganta, minha vista se tornou embaçada. Os lábios roxos entreabertos, os olhos amendoados e vermelhos, tudo tão sem vida. Aquela não era minha mãe. Não podia ser. Por favor, Deus, não faças isto comigo.

Ainda segurando aquele corpo, lembro de olhar para o céu e gritar. Um grito visceral vindo do fundo de minh'alma. Eu não queria acreditar. Não queria acreditar que ela tinha ido embora. Que eu tinha perdido a pessoa mais importante da minha vida inteira.

Fiquei ali por horas, estático, enquanto pessoas ao meu redor iam e vinham. Meu pai também estava ali, mas fiquei tão imerso na minha própria dor que nem prestei atenção no comportamento dele ao perder o amor de tua vida.

Apenas saí do transe quando ele tocou meu ombro, dizendo que precisávamos ir embora. Abracei o corpo mórbido e gelado de mamãe na tentativa de me despedir. Falei que ela descansaria e a agradeci por tudo.

Lembro do medo, da dor, da solidão, da angústia. Foram muitos sentimentos naquele final de tarde, talvez por isso hoje eu não consiga sentir tantas coisas.

Lembro da pele macia e gelada. Muito gelada. Lembro da minha mãe sem vida. Lembro da constatação de que ela tinha ido embora chegar como um soco. Lembro da minha alma chorar. Lembro do vazio me abraçar. Lembro da saudade invadir o meu peito e implorar para ficar. Lembro de permitir.

E permito...

E permito...

﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋

01 de outubro de 1790.

Mãe, tu fostes a pessoa mais importante da minha vida e o que me motivava a viver aqui na Terra era apenas a certeza de que fui muito amado por ti.

Entretanto, descobri que a notícia de tua gestação soou feito uma maldição. Perdoe-me. Não pedi para nascer. E se fosse o caso, jamais seria na intenção de te ferir de alguma forma. Jamais seria um espinho.

Mas pelo visto fui apenas isto para ti.

Agora sinto na pele o teu incômodo ao conceber um filho não desejado. Talvez seja essa mesma dor que estou sentindo por estar vivo, sendo que minha existência não fora celebrada. Isso é muito pior do que ser visto como uma aberração pela sociedade. Pior do que carregar o peso do pecado nas costas.

Sinto muito por te fazer sofrer antes mesmo de vir à Terra, mãe.

﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋

06 de outubro de 1790.

Querido Diário,

Muitas coisas aconteceram desde a última vez que te escrevi. Havia vários dias que eu não comia bem. O pranto roubou minha fome, sequer tinha energia para levantar da cama. Faltei ao trabalho, estava revivendo o luto.

Mas dessa vez era o luto de ter me perdido.

Desde que li aquela última carta, não me sinto merecedor de estar vivo. Mas sou tão inútil que não consigo findar minha própria vida.

"Taehyung?!"

No meio de meu transe, ouvi a voz de Jeongguk soar distante. Meu corpo foi sacudido com força. A consciência me retornava aos poucos.

"O que fizestes?!"

Céus, por que ele gritava? Minha cabeça doía. Não sei o que ele fizera em seguida, mas de repente eu estava na cama e um gosto de vômito permeava meu paladar. Eca.

Com esforço, entreabri as pálpebras e o vi segurando o frasco do remédio enquanto me olhava com uma preocupação inquisidora. Quase como se estivesse me julgando.

"Estava doendo, então tomei para aliviar."

"Mas o frasco todo?!"

Fechei meus olhos, sentindo uma pontada de dor na cabeça. Por Deus, tudo doía! Apenas assenti em concordância, virando-me para o outro lado. Não queria encará-lo, não queria me explicar, não queria que ele tivesse me salvado.

Não pedi para nascer. Não pedi para ser salvo.

De alguma forma, o universo inteiro gritava que era para eu estar vivo. Nesta vida. Nesta lástima de vida. O motivo ainda não sei. Talvez eu esteja pagando pelos meus pecados.

Ouvi o suspiro de Jeongguk e senti o colchão afundar ao meu lado. Os dedos macios dele se embrenharam por entre meus fios e ele passou a acarinhar meu couro cabeludo. Aos poucos, a tensão em todos meus membros foi se extinguindo, o peito já não esmagava o coração.

"Amor, o que houve?", a voz doce de Jeongguk soou baixinha e cuidadosa. Sim, ele me chamou mesmo de amor, mas naquela hora não pude dar a devida atenção. Mas posso dizer que parte do mal-estar se foi. "Não me pareces doente. O que está doendo?"

"Tudo."

Respondi, o rosto enfiado no travesseiro. Eu não queria contar nada, tinha vergonha. Além disso, também doía muito. Sabes, não é fácil dizer que tua própria mãe não queria que tivesses nascido.

Jeongguk suspirou outra vez. Senti quando teus dedos deixaram de me fazer cafuné e ocuparam minha cintura, puxando-me para mais perto. Ele deitou na cama e me abrigou num abraço. Diário, era só o que eu precisava. Um abraço.

Um abraço quente, silencioso e acolhedor. Um abraço que pudesse preencher o vazio em meu peito e curar a ferida aberta. Com aquele abraço, senti como se o sangue de uma antiga ferida tivesse sido estancado. Logo um curativo ia ser feito e seria apenas questão de tempo até cicatrizar. Tudo ficaria bem.

Jeongguk me transmitia esses sentimentos com aquele abraço.

Deitei a cabeça em teu peito e inspirei fundo, me inebriando com o perfume dele. Jeongguk me ninou como se eu fosse uma criança e me permiti ser embalado ao mundo dos sonhos.

Eu estava do lado de mamãe na colina Bihaeng, caminhávamos pelo enorme campo de flores amarelas. Eu ainda era criança e segurava na mão dela, precisando erguer a cabeça para conseguir fitá-la lá debaixo. Ela sorria para mim, Diário. Ela sempre carregava uma promessa no sorriso. A promessa de que tudo ficaria bem e que ela sempre estaria ao meu lado.

Mas então senti falta da palma quente dela contra a minha. Mamãe começou a caminhar para longe de mim e eu fitava tuas costas enquanto ela se afastava, o cabelo acastanhado valsava com o vento. Sorri e tentei correr até ela, porém meus pés não saíam do chão. Ao olhar para baixo, vi as flores amarelas crescendo e se entrelaçando nos meus calcanhares, mantendo-me imóvel.

"Mamãe! Mamãe!"

Gritei em total desespero, esticando a mão na direção dela, tentando, inútilmente, alcançá-la. Mamãe apenas olhou para trás, sorriu e acenou em despedida. Ela foi embora.

Acordei ofegante no meio da madrugada e me pus sentado. Minha testa estava toda suada. Ao apoiar minha mão no colchão, notei outro corpo ao meu lado. Jeongguk dormiu comigo e não sei te descrever a paz que me invadiu por não estar sozinho, Diário.

No entanto, uma fagulha de angústia ainda existia em meu íntimo devido ao pesadelo e precisei abraçar meus próprios joelhos. No ato de mamãe acenar e ir embora, a imagem mais marcante foram teus olhos tempestuosos. O castanho carregava culpa, medo e dor. Muita dor. Pelo teu olhar, senti que ela não queria me deixar. Apenas... precisava.

"Tae?", a voz rouca de Jeongguk me resgatou do tormento. "Tudo bem? Estás passando mal?", pôs-se sentado na cama e em seguida me abraçou. O peitoral nu dele encontrou com meu braço. Encaixei minha cabeça em teu ombro.

"Está tudo bem. Só tive um pesadelo."

"Queres me contar o que sonhou?" Hesitei por um instante. Ele se livrou do lençol que nos cobria. "Vem, vamos para a cozinha, vou esquentar a sopa."

"Sopa? Tu cozinhastes ontem?"

"Sim, tu parecias bem fraco. Mas não quis te acordar para comer", explicou e me ofereceu a mão.

Apenas percebi que estava morrendo de fome no momento em que ele me serviu o prato. O cheiro delicioso me fez suspirar de deleite e não demorei para dar as primeiras colheradas. A cada uma que eu dava, suspirava maravilhado.

"Muito obrigado pela sopa, Guk. Está muito saborosa."

Ele sorriu pequenininho e segurou na minha outra mão. Começou a fazer carinho nela, estava pensativo.

"Tu sumiste, Tae. Não deu mais notícias, faltou ao trabalho. E quando enfim consigo vir aqui, te encontro nesta situação. Posso saber o que aconteceu?", levantou as íris pretinhas para mim. Preocupação transbordava dali.

Parei de comer, deixei a colher no prato e fitei os legumes na sopa. Era vergonhoso, mas eu precisava compartilhar com ele sobre o que estava acontecendo. Não queria fazê-lo sofrer. Já bastava eu.

Levantei-me sem dizer nada e fui atrás da carta. O papel já estava todo amassado porque descontei minha raiva nele. Entreguei para Jeongguk. Ele franziu o cenho e passou a ler o recado.

"Essa é uma das cartas entregues à tua mãe?", indagou após terminar a leitura. Tua expressão já demonstrava toda a perplexidade dele. Acenei em positivo. "Tae, meu Deus... Eu sinto muito."

Ele correu para me abraçar e foi o mesmo de desfazer a barreira que continha minha vulnerabilidade. Chorei feito um bebê. E era muito estranho porque nem lágrimas haviam mais, entretanto eu soluçava em alto e bom som.

"Já não basta ser o que sou, ainda descubro que minha mãe nunca me quis aqui."

"Não fales assim, Taehyung."

"Mas é a verdade! A-aí hoje e-eu tive um pesadelo com ela", solucei e tentei puxar ar para os pulmões. "Sonhei que ela me deixava por querer, Guk", choraminguei. "E se isso de fato aconteceu?"

"Amor, olha..." ele coçou a nuca. "Eu sinto muito mesmo por teres se deparado com uma carta dessas, com palavras tão insensíveis. Imagino como deve ter doído. Porém, se tua mãe de fato não ficara feliz pela gravidez, mesmo sem tê-la conhecido eu sei que se arrependeu disso logo após te segurar no colo a primeira vez."

"Tu falas como se pudesse ter certeza", resmunguei, mexendo nos legumes da sopa com a colher.

"E eu tenho, sabes por quê? Porque tu és o ser humano mais maravilhoso que já pisou nesta Terra. Ao te conhecer, tua mãe deixou qualquer outra mágoa para trás e se apaixonou perdidamente por ti. Afinal, é este o teu feitiço, Kim Taehyung. És tão encantador que é impossível não se apaixonar por ti. Digo por mim mesmo."

Não sei descrever o que eu senti naquele momento. Meu peito estava leve, o mundo ficou mais colorido. Por dias, lidei sozinho com o vazio. Porém, a presença de Jeongguk o preenchia com amor.

"Não quero desmerecer a dor que estás sentindo, sequer consigo imaginar como deve ter sido ler esta carta. Porém, acho importante ressaltar que seres humanos se enganam. Sem dúvidas, tua mãe se enganou e não imaginava que o filho dela seria uma pessoa tão boa. Taetae, agradeço a Deus todos os dias por te ter na minha vida. E só de imaginar te perder me dói muito. Digo... foi por pouco. E se eu não tivesse chegado a tempo? Eu... e-eu não sei como reagiria se tu tivesses partido mesmo."

Meu peito apertou e de repente essa ideia me deixou com muito medo. Diário, no fundo, eu também não quero partir.

"Desculpe, fui precipitado. De repente a dor falou muito mais alto e tomar todo o frasco pareceu ser o caminho mais fácil. Mas... agora me arrependo do que fiz. Não precisas se preocupar, não farei de novo."

Jeongguk suspirou. Um suspiro cansado. Também aparentava estar farto da vida. Desta vida.

"Queria poder estar sempre ao teu lado, todos os dias. Poder cuidar de ti até esta ferida sarar", ele murmurou.

"Bom, podemos aproveitar que estás aqui agora."

Falei e o puxei de volta para a cama. Deitei em teu peito e me aconcheguei em teu calor. Fechei minhas pálpebras e fingi estar habituado àquilo. A tê-lo ao meu lado todas as noites.

No entanto, ao acordar na manhã seguinte, a mesma sensação de sempre se repetiu quando percebi que ele não estava mais ao meu lado. Não chorei, apesar de que meu peito voltou a doer. Apenas fiquei quietinho na cama, sem a mínima vontade de levantar.

Foi então que ouvi a porta da casa ser aberta e a luz do sol adentrou o cômodo.

"Vamos acordar? Temos um longo dia pela frente!", Jeongguk disse conforme puxava o lençol de mim. Estava todo arrumadinho e perfumado. Não pude deixar de demonstrar minha surpresa, ele conseguiu arrancar um sorriso sincero meu.

"Ei, o que é isso? Quem falou que vou sair daqui?"

"Eu falei."

"Não, Guk. Vamos ficar aqui", pedi manhoso, puxando-o pelo braço. "Aqui é quentinho e seguro."

"Ora, ora. Não era tu que querias registrar nossa marca no mundo? Pois então. Levante-se e vista tua melhor roupa."

"Aish, o que estás tramando?", resmunguei num falso aborrecimento.

"Vista-se e verás."

Antes de me levantar, bufei alto. Enquanto me esperava trocar de roupas, Jeongguk foi organizar a casa rapidamente. Já havia alguns dias desde que eu não arrumava nada ali e as coisas foram se amontoando pelos cantos. Toda aquela bagunça estava prestes a me engolir.

Enfim fiquei pronto e, ao sairmos de casa, me deparei com o Pátroclo e o Aquiles amarrados à árvore, apenas nos esperando. Fitei Jeongguk e o flagrei me observando com um sorriso no rosto. Éramos o espelho um do outro. Quando um estava feliz, o outro também estava e assim por diante.

Com ajuda de Jeongguk, subi em Pátroclo. Mal o esperei fazer o mesmo em Aquiles e já movimentei as rédeas para meu cavalo correr. O vento tocou meu rosto e me fez lembrar como é bom estar vivo. E como viver se tornou melhor depois que Jeongguk floreou os meus dias. Ele é o meu sol, Diário.

Galopamos por entre os campos floridos, fazendo os olores das flores se erguerem e perfumarem aquela manhã ensolarada. Com eles, algumas borboletas e pássaros também alçaram voo conforme nos aproximávamos. Eu e Jeongguk brincamos em nossos cavalos, rodopiamos e apostamos corridas. Ri até sentir minhas bochechas doerem.

Por fim, fomos até a mansão dele porque Jeongguk precisava pegar não-sei-o-quê e aproveitaríamos que Mayumi não se encontrava ali. Caso ela nos visse juntos de novo, provavelmente ficaria magoada.

"Vem, Taetae. Entre!", Jeongguk convidou ao abrir a enorme porta.

"'Taetae?'"

A voz doce de Mayumi me fez paralisar. Eu tinha acabado de descer do Pátroclo e estava indo para a entrada quando a ouvi pronunciar meu apelido num tom de confusão. Não se mostrou surpresa pela minha presença, mas sim pelo apelido pronunciado pelo teu marido de modo tão íntimo.

"Oh, Yumi. Ainda estás aqui?", ele perguntou claramente nervoso e depositou um beijinho na bochecha dela. "Chamo Taehyung hyung assim quando quero irritá-lo", tentou desconversar.

Apenas abri um sorriso forçado para disfarçar meu nervosismo. Ela suavizou a expressão, entrando na brincadeira. Em seguida, quis saber:

"E onde irão?"

"Vamos no Yoongi hyung. Ele me pediu para levar algumas tintas para ele", Jeongguk levantou os dois baldes que pegou na dispensa.

"Oh, juras? Aproveitem e levem esses biscoitos para ele, por gentileza? Fiz a receita que ele me ensinara."

"Podes pegar a cesta para mim, Taehyung? Minhas mãos estão ocupadas", Jeongguk pediu e fui até a mesa para fazê-lo.

Despedimo-nos de Mayumi e seguimos em direção ao ateliê de Yoongi. Eu e Jeongguk optamos por não falarmos nada sobre o que ocorrera na mansão, apenas nos mantivemos absortos em nossos próprios pensamentos.

"Yumi mandou trazer? Para mim? Que fofa!", Yoongi ficou fascinado com a cesta.

Observei o momento em que ele apanhou um dos biscoitos com um sorriso enorme no rosto e o cheirou, soltando um suspiro moroso em seguida. Saboreou os biscoitos e juro que pude ver as íris dele brilharem de um jeito jamais visto antes. Ele parecia... apaixonado.

"Então, vamos começar?", Jeongguk interveio. Estava agitado, ficava limpando as mãos na roupa o tempo todo.

"Certo, vamos. Depois termino de comer."

Yoongi lavou as mãos e as secou. Depois, se colocou atrás de um cavalete o qual segurava uma tela bem grande.

"O que pintarás, hyung?", perguntei.

"Vou registrar na tela algo um tanto sigiloso", respondeu com um sorrisinho ladino e contraí o cenho. Era algum enigma, por acaso?

"Vem, Taetae! Sente-se aqui", Jeongguk me chamou conforme batia em tua coxa esquerda. Estava sentado numa cadeira e sugeria para eu ocupar teu colo.

Enfim entendi a intenção dos dois.

"Teremos um retrato nosso?", pronunciei perplexo, caminhando até Jeongguk.

"Como não podemos gritar sobre nós dois para o mundo inteiro, achei que seria uma boa ideia registrá-lo numa pintura, hm?"

"Sim, é uma ideia incrível, meu amor", deixei um beijo sutil em teus lábios ao me posicionar em tua coxa, abraçando-o pelos ombros.

"Quietos, desse jeito não vou conseguir registrá-los corretamente", Yoongi reclamou, já com o pincel em mãos, provocando risadas em nós.

Passamos um imenso tempo na mesma posição, Diário. E não podíamos mover um músculo sequer que Yoongi hyung já reclamava. Ele é um grande mandão às vezes. Paramos apenas para almoçar, mas logo foi preciso voltar para a mesma posição. Pelo menos Yoongi não reclamava sobre o fato de que conversávamos muito.

Já era metade da tarde quando ele enfim nos liberou da posição, dizendo que a partir do esboço feito ele já conseguiria dar seguimento. Achei que finalmente poderia me jogar no sofá do ateliê e descansar minhas costas, mas Jeongguk me disse que ainda faltava mais um lugar para eu e ele irmos. Bom, eu só estava o seguindo, permitindo-o de me levar para onde quisesse.

E o lugar era a praia. Céus, ainda estou me perguntando porque demorei tanto tempo para voltar ali. A praia é literalmente embaixo de minha casa e nunca separei um tempinho para ir até lá andar descalço na areia.

"Acho aqui tão lindo, mas não venho muito", Jeongguk disse.

"Por falta de tempo?"

"Também, mas porque não sei nadar, e ver o mar de longe não é tão divertido para mim."

"Não sabes nadar?! Uaaah, isso é mesmo surpreendente. Te ensinarei algum dia."

Ele riu e me agradeceu.

"Gostas do mar?", interveio. Caminhávamos lado a lado pela areia branquinha. Nossas pegadas ficavam registradas nela para em seguida as ondas virem e as apagarem.

"Amo o mar. O infinito dele parece carregar tantos mistérios, não achas?"

"Concordo. Acho-o muito bonito, mas o desconhecido assusta."

"Então tens medo do mar?", perguntei e ele assentiu. "E como irás para a França desse jeito?"

"Bom, não tenho escolha. Meu pai não se importa se tenho medo do mar ou se não quero ir de jeito nenhum. Eu apenas devo ir."

De repente, o clima se tornou denso. Pigarreei.

"E tua mãe? Vós se dais bem?", mudei de assunto. O objetivo era amenizar a tensão, mas também estava curioso para saber.

"Minha mãe é um anjo que Deus colocou em minha vida para equilibrar um pouco a ruindade de meu pai. Só tenho pena dela por ter se casado com um carrasco como ele. Penso que, pela tua bondade, ela merecia coisa melhor, mas infelizmente meus avós não pensavam da mesma maneira", Jeongguk chutou uma pequena concha para longe. "Mamãe sempre me acolheu em teus braços quando papai me magoava com tuas palavras e ações. Óbvio, ela nunca conseguiu ir contra ele, mas às escondidas sempre me dava colo quando precisava, ou então beijava meus hematomas para sarar. É uma mulher de poucas palavras, mas um beijo dela pode curar uma ferida enorme."

"Isso é lindo, Guk. Fico feliz porque a tens em tua vida."

"Sim. Ela e tu foram presentes divinos para mim. Agradeço a Deus todos os dias por tê-los aqui comigo."

Apenas apertei a mão dele e deixei um beijinho rápido em tua bochecha. Estávamos sozinhos na praia, mas todo cuidado era pouco.

Olhei para cima e pude ver minha casinha na colina. O jardim do Éden, onde eu e Jeongguk podemos ser pecadores. Rodeados de maçãs e a serpente nada mais é do que nós mesmos. Interessante.

Antes do pôr-do-sol, precisamos voltar para a mansão de Jeongguk a fim de levar os cavalos, que já estavam bem cansados. Colocamo-os no estábulo e preenchemos o reservatório de água para eles beberem. Jeongguk me convidou para entrar na casa e, quando o fizemos, fomos surpreendidos por teus pais na sala de estar, sentados nas poltronas, bebendo chá.

"Mãe? Pai? Não esperava pela presença dos senhores", Jeongguk se curvou. A postura e a expressão dele se tornaram rígidas de imediato, como já era costume com  o pai dele por perto.

"Também não esperava que tu não fosses visitar os Parks hoje, Jeon Jeongguk", senhor Jeon disse com aquela voz grave e reprovadora. Colocou a xícara em cima da mesinha de centro. "Vim saber qual é esse imprevisto que me dissestes na carta. Ao meu ver, está tudo bem por aqui."

"Oh, p-pai, é que-"

"Senhor Jeon, peço desculpas", curvei-me diante dele. Ao me endireitar, dei de cara com tuas íris negras fulminantes, apenas assim ele notou minha presença ali. Não titubeei. "Jeongguk faltou por minha causa. Pedi que ele me ajudasse com algo na casa da colina."

Jeongguk me encarou confuso. Tinha os lábios entreabertos.

"Veja se não é o garoto Kim", teu pai soltou uma risada repleta de escárnio. Cruzou os braços. "Por que não estou surpreso com isso? Questiono-me se isto é coisa de Kims fazerem."

Franzi o cenho.

"Como assim?"

"Oras, tua mãe também tinha disso. De querer chamar a atenção. De causar encrenca."

Não pude contar uma risada incrédula.

"Desculpe-me, senhor, mas acredito que estejas se confundindo. Minha mãe é Kim D-"

"Kim Daehy, eu sei. E não estou enganado, criança. Sei muito bem do que estou dizendo", ele se pôs de pé, ainda com os olhos cravados em mim, os quais raiva transbordava. "É triste dizer isso, mas às vezes me pego pensando que ela só parou de fazer o que fazia quando deu o último suspiro."

Arfei perplexo com aquela sentença cruel. Ele definitivamente não tinha coração. Diário, não importa se eu ainda estava magoado com mamãe, era impossível não me afetar com as palavras dele. Isso é falta de empatia. É desumano!

Dei um passo para trás. O peito em pressa, ar já não chegava em meus pulmões. Ele deu um passo para frente. Por favor, fale algo, Jeongguk. Impeça-o de me machucar ainda mais, por favor.

"Desejo muito que o ditado popular 'filho de pássaro, passarinho é' esteja errado, garoto. Ou então não serás bem-vindo aqui."

Porém, nenhuma intervenção veio, e me restou apenas ir embora.

"Se vós me dais licença", curvei-me de novo, dessa vez sem erguer a cabeça para não ser possível do senhor Jeon flagrar meus olhos marejados.

Saí pela porta às pressas, praticamente correndo. Ouvi um "VOLTE AQUI, JEON JEONGGUK" vindo da mansão e segundos depois senti uma mão me segurar pelo braço.

"Tae, espere!"

"Não me peça para ficar um segundo a mais. Já ouvi o suficiente", funguei, incapaz de impedir as lágrimas. Voltei a caminhar, Jeongguk veio atrás de mim.

"Desculpe-me pelo meu pai, ele é muito cruel quando quer. E, e...", mais uma vez, ele me segurou para eu parar. "Desculpe-me também, por não ter falado nada e nem o impedido de dizer tantas maldades. É que... o medo me silencia."

"Nunca fui tão humilhado antes", solucei. "Agradeço as desculpas, mas no momento preciso ficar sozinho."

"Mas Taetae, enfrentar esses pensamentos sozinho é muito pior. Deixe-me ficar contigo", implorou, as íris cheias de desespero. Estava com medo de me perder.

"Que diferença faz? Não é como se eu não estivesse acostumado a estar sozinho", ri sem humor nenhum. "Entendo teu medo dele, mas não deixe com que esse sentimento sobreponha a paixão que sentes por mim, Jeongguk."

Foi a última coisa que falei a ele, Diário, e agora estou aqui te escrevendo toda a história após dois dias desde que aconteceu. Jeongguk ainda não veio me ver e confesso que também não desejo vê-lo tão cedo.

Adeus.

﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋﹋

É um cap um pouquinho pesado, né? Senti isso enquanto escrevia 😔

Se eu encontrar o pai do JK na rua, meto um pau nele >:( que ódioooo

Quero muito saber sua opinião sobre tudo que está acontecendo 👀

Obrigada por ter lido. Espero que tenha gostado, apesar de tudo! Não quero demorar a voltar hehehe

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