Apenas Um Acaso...?

By BeatrizMoori

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"- Não, não, não não, não! - desesperei-me, apertando o botãozinho que tem ao lado da cama e indo em direção... More

Playlist AUA
Prólogo
01- O Momento da Desgraça
02- Histórias em Aviões
03- O Primeiro Confronto Com o Passado
04- Os Reencontros
05- O Convite
06- O Almoço

07 - Parte da Verdade

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By BeatrizMoori

O alarme tocou incessantemente ao meu lado e me virei para desligá-lo, bufando. Mais uma semana começando.

Sentei-me na cama para não voltar a dormir de novo e encarei o vazio. Ignorei Cecília o fim de semana inteiro pois sabia que insistiria para eu ir ao encontro, ao qual eu desmarquei logo na manhã do sábado. Não poderia encará-la e dizer que cancelei tudo por conta de um sonho. Ela já estava no meu pé com essa história, se soubesse disso logo quando desmarquei... eu não teria paz! Mas naquele momento não havia mais como evitá-la.

Giovanni reagiu bem. Achei que precisaria de mil argumentos para convencê-lo a me liberar, mas não... disse apenas que entendia. Acho que Ceci estava errada, no final das contas. Cíntia conseguiu sim o assustar... e acho que no fundo eu não reclamava.

Levantei da cama e fui tomar banho para poder despertar. Lavei minha cabeça tentando de alguma forma tirar toda a impureza e sofrimento que existia aqui dentro, mesmo sabendo que seria impossível. Preparava-me mentalmente para o que viria a seguir. Já tinha se passado uma semana, mas não criava a ilusão de que as coisas melhorariam, muito pelo contrário.

Terminei meu banho, fazendo minha higiene matinal e colocando meu uniforme logo em seguida. Penteei meus cabelos, peguei minha bolsa e desci para tomar café.

— Bom dia! — mamãe veio até mim, depositando um beijo em meu rosto e me entregando uma caneca de leite com achocolatado, a qual eu agradeci.

— Thali, vou ter uma entrevista de emprego perto da sua escola na hora do almoço, acho que vai acabar perto da hora de tu sair, quer ir almoçar comigo? — meu irmão perguntou, mordendo um grande pedaço de pão.

— Pode ser... — falei, desconfiada. Tudo bem que eu e o Rod nos dávamos bem, mas mesmo assim... ele não era tão legal assim, pelo menos não desse jeito comigo — Tu quer alguma coisa, né?

Meu irmão abriu a boca para protestar, mas lancei um olhar que ele conhecia muito bem, fazendo-o desistir e falar baixo:

— Quero, mas depois explico melhor.

— O que estás aprontando, Rodrigo? — minha mãe chegou por trás dele, assustando-o.

— Nada, mãe! — respondeu prontamente, o que me fez franzir as sobrancelhas.

Ele era um péssimo mentiroso.

— Filho, já tem a parcela do carro que tu quebrou e precisa pagar, sem contar que não tens trabalho ainda! Veja lá o que vai fazer — mamãe disse, sentando-se na cadeira, esgotada e dando-se por vencida.

Tinha certeza que mesmo com seu aviso, o guri ainda aprontaria alguma coisa.

— Relaxa, mãe, não vou fazer nada! Tu não tem confiança em mim não? — perguntou, tomando seu café logo em seguida.

— Não — ela falou com um pequeno sorriso e bebericando sua bebida.

Isso me fez gargalhar enquanto Rod a olhou de forma indignada. A moral dele não estava em alta naquela época.

O carro quebrado ao qual ele sempre era cobrado aconteceu há tres semanas. Ele e os amigos tiveram a brilhante ideia de apostar racha em uma rua deserta. Deu certo até meu irmão passar por um buraco grande de uma forma brusca, quebrando assim o amortecedor do veículo. Ainda bem que tinha sido apenas isso e não algo pior, como atropelar alguém que não tinha nada a ver com a história nessa brincadeira estúpida.

Rodrigo foi obrigado a contar para os meus pais o que e como aconteceu e, por isso, ele foi quase esfolado vivo. Tinha conseguido recentemente um emprego perto de casa e com o seu primeiro salário teve que pagar as custas do carro, coisa que meu pai o obrigou a fazer, pois não ia arcar totalmente com o estrago e idiotice dele, apenas cobrir o que faltasse, isso se fosse realmente necessário, o que eu dava total razão.

Apenas me contaram sobre quando cheguei em casa no dia seguinte, pois havia ido dormir na Stayce. Uma sábia decisão, pois foi o que me impediu de surtar fortemente com o Rodrigo e possivelmente chorar copiosamente de medo.

Detestava carros! Entendia o quão importante eles eram e sua necessidade, mas não importava, eu os detestava.

— Bom gente, — falei pegando minha bolsa ao meu lado e terminando meu leite — está na minha hora. Um beijo a todos.

Escutei as despedidas deles e o grito do meu irmão para não esquecer para não esquecer do nosso almoço. Caminhei em direção a escola pensando que talvez fosse a hora de tentar "seguir em frente" o máximo que desse. E isso envolvia não voltar com minhas antigas amizades, embora elas já não estivessem falando mais comigo.

Cheguei ao meu destino, cumprimentando o porteiro e comecei a procurar minha prima, preparando-me psicologicamente para enfrentar a fúria da baixinha enfezada. Vez ou outra algum aluno ainda me olhava com aquele olhar de pena, o que eu tentava ignorar, mesmo que meu coração apertasse toda vez que acontecia. Seguir em frente, eu precisava seguir em frente!

Encontrei Ícaro conversando com alguns de seus amigos em um dos corredores.

— Ícaro! — o chamei, fazendo-o se virar para mim com um pequeno sorriso — Tu viu a Cecília?

— Ela foi entregar um trabalho para a professora de química no laboratório — respondeu-me prontamente. — Deve estar lá ainda.

— Ah, muito o... — mas minha fala foi interrompida por um dos amigos do guri em minha frente, que me lançava um olhar curioso.

— Ei, tu é a Thalita, não é? A guria que...

— Vai atrás dela, Thali! — Ícaro virou-se rapidamente para mim, cortando o seu amigo — Se tu for agora, capaz de pegar ela lá ainda.

Assenti e saí dali a passos apressados. Seria impossível seguir em frente naquele colégio. Não quando todos continuavam insistindo em me lembrar de uma dor que eu só queria esquecer.

Fui em direção onde haviam me dito pois sabia que lá também era um lugar isolado e encostei na parede do lado de fora de um dos laboratórios. O corredor estava vazio e a luz que iluminava ali era a do Sol, que refletia contra uma grande porta transparente um pouco longe de mim. Tentava respirar mais devagar e desacelerar meu coração. Precisava me recompor antes de falar com Ceci, eu não queria ser um peso para ela com todos meus traumas e convicções.

Respirei fundo. Seja forte e corajosa... eu podia até não acreditar mais em Deus, mas essa frase até que vinha a calhar agora. Eu precisava dessa coragem para fingir que estava tudo bem. Precisava seguir em frente.

— Sejas razoável, pelo menos uma vez! — escutei alguém falar alto em uma das salas e logo abaixar o tom. Eu conhecia aquela voz... Cecília! — Ela acabou de voltar, pega leve, por favor!

— Foi-se o tempo em que eu me importava com os sentimentos dela — aproximei-me da sala, sem deixar-me ser vista e reconhecendo também a outra voz.

— Cíntia, entendo que em sua mente esteja certo reagires dessa maneira, mas sabe que está errada — ouvi um barulho como se ela fosse retrucar, mas minha prima foi mais rápida. — Eu não quero brigar, eu só estou te pedindo para que, por favor, deixe a Thalita em paz! Ela já está sofrendo, não precisa mais isso, por favor!

Espiei dentro da sala, tomando cuidado para não me verem. As duas estavam uma de frente para a outra, com Cíntia de braços cruzados olhando para Cecília de forma agressiva enquanto ela se posicionava tranquilamente em sua frente. Aquilo era muito estranho de se ver. Antigamente os papeis eram invertidos.

— Não dá, Cecília, será que não entende? Ela não pode simplesmente voltar e agir como se nada tivesse acontecido, como se ele nunca tivesse existido e não tivesse importância nenhuma para ela! — ouvi a voz dela embargar levemente — Como se não tivesse culpa nenhuma no que aconteceu! Ela foi embora e esqueceu o que viveu e o estrago que deixou para trás, mas eu não vou deixar isso continuar! Ela precisa arcar com as consequências do que fez e se não arcou ainda, eu mesma faço questão de fazer isso acontecer!

— Cíntia, se escute, olha o que estás dizendo! — minha prima falava meio desesperada. Acabara de ouvir no tom de voz da morena a sua frente exatamente o que eu percebi: ela queria vingança! E possivelmente não haveria limites para onde poderia chegar — Engano seu se acha que ela não sofreu o tanto que tu sofreu. Ela foi embora, mas isso não a impediu de se martirizar todos esses anos por algo que nem foi culpa dela! Tu quer que ela enfrente as consequências de algo que não fez, mas que as enfrenta sozinha todos os dias, quando ela não merecia.

— Pare de defendê-la! — Cintia virou as costas para Cecília e se controlou para não chorar. — Apenas pare!

— Ela não queria voltar, Cíntia, foi obrigada! — a loira continuou em minha defesa, enquanto a outra se segurava na cadeira a sua frente, a fim de encontrar algum equilíbrio — Ela foi embora e me ignorou todos esses anos pois não queria consolo, pois se sentia culpada. Eu perdi minha melhor amiga durante esses dois anos pois ela não queria ajuda! Ela queria que esse sofrimento continuasse vivo dentro dela, pois era uma forma de se punir por algo que não fez...

Foi interrompida pela guria a sua frente:

— Como não, Cecília? Como não? — virou-se para minha prima com os olhos vermelhos — Como ainda tens coragem de dizer que não?

Ceci respirou fundo e pude perceber que ela estava tentando escolher as melhores palavras para se dizer no momento. Ela podia ser realmente cabeça quente, mas sabia exatamente o que e quando dizer em cada situação e, naquele caso, ela não estava lá para brigar. Eu havia percebido isso desde que comecei a ouvir a conversa pois, caso contrário, aquele cenário que se encontrava em minha frente seria completamente diferente. E para pior.

— Olha, — começou de forma suave, como se pisasse em ovos — o que aconteceu com seu irmão foi...

— Culpa dela! — interrompeu de forma grosseira.

— Não, Cíntia, tu sabe que não foi bem assim... — Cecília tentou intervir em meu favor.

— Tu estava lá, Cecília! Tu, mais do que ninguém, sabe o que aconteceu! — lágrimas escaparam dos olhos dela, mas a morena continuou séria — Ela é tua prima e tu não vai admitir nunca, mas foi culpa dela sim! Nada teria acontecido se ele não tivesse feito aquilo! Para protegê-la! Se alguém tivesse que ter ido, era ela!

Lágrimas escorreram pelo meu rosto e coloquei a mão em minha boca para impedir que algum barulho saísse dali. Vi que minha prima fez uma cara de total desaprovação com a última frase dita.

— Entendo o que estás sentindo, Cíntia, mas... — Ceci tentou falar novamente.

— Não, não entende, ninguém entende nada! — bateu a mão forte em uma mesa ao seu lado — Tudo bem, tu pode continuar dizendo que a Thalita sofreu com tudo o que aconteceu, que nada disso foi culpa dela, mas eu sei que foi! Eu vi isso quando fui eu a pessoa que teve que ficar aqui e pegar os cacos de todo mundo enquanto sua priminha fugiu para sofrer nos Estados Unidos! Eu que tive que ficar e ver minha mãe entrar em um estado de depressão profunda e meu pai desesperado sem saber o que fazer, enquanto ele também vivia seu luto! Eu que tive que ficar e tentar passar algum conforto para todos os amigos dele enquanto eu mesma não podia chorar a morte dele! Eu repeti de ano por causa disso e fui parar na mesma sala que ele estava para sempre receber olhar de pena desse povo que nunca se importou de fato! E justo no meu último ano desse inferno, o ano que finalmente eu iria seguir em frente, aquela guria tem que voltar e trazer de volta todas as memórias de uma tragédia que foi culpa dela! Foi culpa dela...

Ela desabou lentamente no chão enquanto chorava copiosamente o que vinha segurando a tanto tempo. Minha prima se ajoelhou ao seu lado e a abraçou, tentando lhe oferecer algum consolo. Eu estava vivendo aquele pesadelo ao qual tentei fugir todo de novo.

— Eu sinto muito, Cíntia... — Ceci acariciou seus cabelos enquanto ainda a abraçava e a guria chorava — Coloca para fora tudo o que guardou, eu estou aqui! Deus vai confortar seu coração...

— Não... — sussurrou chorando ainda — Ele não está nem aí para mim... e se estiver, eu não acredito mais! Ele tirou meu irmão de mim! Eu quero meu irmão de volta, eu quero ele de volta...

Cecília assentiu e abraçou mais forte, fazendo suas lágrimas se intensificarem. Isso fez meu coração se estraçalhar dentro do meu peito. O que havia restado dele, pelo menos.

Apressei-me a sair dali e ir embora daquele colégio. Eu nunca conseguiria seguir em frente pois o que aconteceu sempre foi e sempre será culpa minha! Aquele era um fardo que eu carregaria para sempre e não havia nada que pudesse mudar isso!

Era tudo culpa minha!

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