TEM ALGUÉM BATENDO NA MINHA CABEÇA. E COM UM MARTELO TIPO aqueles bem pesados que tem na casa de 'vô. É horrível. É ensurdecedor.
Ai, Jesus. Que ressaca do cacete.
Mesmo o mais suave dos gemidos que escapa dos meus lábios é o bastante para produzir uma agonia intensa nas minhas têmporas. E me ajeitar na cama causa uma onda de náusea que aperta minha garganta e faz meus olhos lacrimejarem.
Controlo a respiração. Inspiro. Expiro.
Só preciso segurar o mal-estar por tempo o suficiente para chegar ao banheiro e não vomitar nos lençóis limpos de...
Puta merda onde eu estou?
Não estou na cama do hotel que deixei minhas malas antes de ir pra boate na noite passada. Essa percepção me acerta em cheio no exato instante em que registro o som de alguém respirando. E não são os suspiros de "eu bebi demais" que saem da minha boca, mas o barulho suave e regular do cara ressoando ao meu lado.
Dessa vez, quando gemo, o som vem do fundo da minha alma. As memórias surgem nitidamente em minha mente como a porra de uma maldição prestes a me assombrar para o resto da vida.
A briga com o Veiga. Os copos de cerveja. A maconha na varanda. O... resto.
Eu transei com o Gabigol na noite passada.
Duas vezes.
Meu coração dispara enquanto olho para o teto. Estou num quarto de hotel caro pois, acreditem, eu aceitei a oferta de uma foda sem beijos mesmo que os beijos tenham acontecido antes e durante a foda. Deixei que o Gabigol me conduzisse até seu carro e depois até um hotel e depois... até o maldito quarto de hotel. Tem um pacote aberto de camisinha na cabeceira da cama. E... sim, estou nua.
Talvez tenha sido só um pesadelo, me assegura a voz em minha cabeça. A voz de Jesus, eu espero e rezo pra que seja.
Inspiro fundo de novo e reúno coragem para virar a cabeça.
O que vejo me faz perder o fôlego mais uma vez. Um Gabigol bastante nu, deitado de bruços. Seu corpo totalmente tatuado exposto o que me faz salivar. Sua bunda parece zombar de mim, e não só pela perfeição e nem pelos desenhos que, por incrível que pareça, também tem ali, mas por causa dos arranhões vermelhos nas nádegas musculosas. Foram as minhas unhas que deixaram aqueles arranhões.
Eu me lembro de como me senti ao ver seu corpo totalmente desenhado. Fui dominada pela luxúria e pelo álcool no meu sangue. Tocar não era suficiente, eu precisei afundar minhas unhas nele, principalmente enquanto... enquanto metia dentro de mim. Meu Deus, isso aconteceu mesmo?
Meu cérebro de repente jorra informações, uma atrás da outra. Lembranças surgindo como flashbacks doentios que não tem fim. Sei como Gabigol é quando está pelado. Sei como é tê-lo dentro de mim. Sei os sons que faz quando está gozando. Sei coisas demais.
Minha cabeça lateja mais forte. Porra. Porra, porra, porra, porra.
Meu olhar se afasta do corpo musculoso de Gabigol ou Gabriel, como eu o chamei durante toda a noite até pegar no sono.
Como isso foi acontecer? Por que fiz isso?
Sei muito bem lidar com o álcool. Não bebi até cair na noite passada. Não estava enrolando as palavras, tropeçando ou agindo feito boba. Sabia exatamente o que estava fazendo quando tomei a iniciativa e beijei o Gabigol mesmo dizendo que nunca ficaria com ele. Eu tomei a iniciativa. Qual é o meu problema?
Tudo bem. Tudo bem. Não é o fim do mundo.
Porra. Na verdade é, sim, o fim do mundo.
Estou falando do Gabigol, porra. Gabriel Barbosa do Flamengo. Eu sou palmeirense. Irmã de um jogador do Palmeiras. Minha família é fanática por esse time ao ponto de ser velada com a camisa do Palmeiras. Caralho. Se o Gustavo souber disso... Porra... Se o Veiga descobrir. 'Tô muito fudida.
Massageio as têmporas com a ponta dos dedos prestes a explodir e me forço a ignorar o homem dormindo ao meu lado.
Foi só uma noitada que eu me arrependo terrivelmente, mas arrependimento é coisa de gente fraca, como meu pai gosta de dizer. Hora de aprender com os erros e seguir em frente.
E é justamente isso que preciso fazer. Seguir em frente. Ou melhor, sair daqui. Sumir dessa cama, tomar um bom banho e fingir que a noite passada nunca aconteceu.
Armada com um plano, deslizo cautelosamente para fora do lençol jogado em cima da parte inferior do meu corpo. A cama range, e, imóvel, lanço um olhar de pânico na direção de Gabriel.
Ele ainda está morto.
Certo. Tomo outro fôlego e passo as pernas para fora da cama. Quando meus pés tocam o chão, Gabigol se mexe. Ele solta um meio gemido, meio suspiro. Então gira e, ai, meu Deus, eu vejo seu pau.
Um calor inunda meu rosto diante da visão.
Mesmo sem estar duro, é impressionante. É um pau e tanto. Grosso, grande. E eu pude tocar, lamber e senti-lo dentro de mim. O calor no meu rosto aumenta à medida que me lembro de tudo o que fiz com ele. Um gemido silencioso se forma em minha garganta.
'Tá bom, já chega de relembrar o que aconteceu. Preciso sair daqui. Não, primeiro preciso encontrar meu celular. Dou uma olhada ao redor e o vejo em cima da escrivaninha.
Digito a senha porque devo estar horrível demais para o Face ID não funcionar.
A culpa me atinge de todas as direções assim que vejo as mensagens não lidas de Veiga e Scarpa. Deus. Se eles soubessem o que eu estava fazendo enquanto me mandavam todas essas mensagens preocupadas ou até os pedidos de desculpa de Veiga.
— Volta pra cama, gata.
O susto me faz soltar um gritinho. Olho para a cama e vejo Gabigol se sentando, enquanto corre uma das mãos pelo cabelo de quem acabou de acordar, aqueles malditos cachos bagunçados mexendo com minha cabeça. Ele não parece nem um pouco grogue. Os olhos castanhos estão em alerta, e o corpo nu está... se transformando.
Sinto o rosto corar diante da visão de seu pau cada vez mais duro, então fito meus próprios pés descalços.
— Quer fazer o favor de se cobrir?
— Não foi isso que você disse ontem à noite... — O tom zombeteiro de sua voz me irrita.
— Não quero falar da noite passada — bufo, pegando o lençol de cima da cama e me cobrindo já que eu ainda estava nua e agora seus olhos estão me comendo. — Não aconteceu. Vamos esquecer.
Ele parece ainda mais divertido.
— Ei, relaxa. Foi só sexo.
E não faz um movimento sequer para se cobrir. Em vez disso, estica os dois braços acima da cabeça, chamando minha atenção para os músculos flexionados.
— Pra você pode ter sido só sexo — começo, alisando a própria testa enquanto tento não surtar e gemer de dor. — Mas pra mim foi um decreto de prisão.
— Fala isso como se não tivesse me implorado para te foder de novo depois da primeira vez.
Sinto outra onda de humilhação me inundando. Alguém me mata. Por favor.
— Não quero falar disso — digo, com os dentes cerrados. — Aconteceu, foi bom, e ninguém nunca mais vai tocar no assunto de novo.
— Foi bom? — Com um risinho convencido, Gabigol desliza uma das mãos por sobre o peito, os dedos compridos descansando bem em cima da cabeça de sua ereção. — Foi mais que bom, e você sabe disso.
— Por favor, você pode se vestir? — imploro.
— Não. — Ele arqueia uma das sobrancelhas. — Por que não volta logo pra cá e eu tento esquecer o que fizemos te fodendo ainda mais gostoso?
— Olha aqui — agarro o lençol que uso para me cobrir e aponto um dedo para ele, me esforçando para não olhar pro seu pau. — Foi um erro. Ouviu? Um maldito erro do caralho que não irá se repetir.
— Como você é chata, puta que pariu. Prefiro quando está bêbada.
— Eu estava bem consciente dos meus atos, Gabriel.
— Então está admitindo que transou comigo porque quis?
— É claro que transei com você porque quis, ainda não fiquei louca. E muito menos fui seduzida.
— Será que não? Você disse que não ficaria comigo e logo em seguida me deu um beijo. O que te fez mudar de ideia? — ele estreita o olhar, querendo roubar uma explicação a qualquer custo mesmo que seja com provocação. — Talvez a nossa proximidade? Ou você sempre se sentiu atraída por mim e não gosta de admitir.
— Vai se foder — mostro o dedo do meio pra ele e olho pro chão vasculhando minhas roupas. — Eu preciso me vestir.
— Fique à vontade. Ou pode ficar pelada e vir me montar. Eu prefiro a segunda opção e você?
— Prefiro que você cale a boca — bufo, achando minha calcinha e meu shorts e não demorando para vesti-los. — Cadê a minha camiseta?
Me viro pro Gabigol de novo quando ele não responde a minha pergunta, o qual continua parado na mesma posição, uma cara séria no rosto e os olhos fixos nos meus seios exposto. Uso o braço para cobri-los.
— Dá pra você me responder, porra.
— Pensei que era para eu calar a boca.
— Preciso da minha camisa do Palmeiras.
— Pra quê? — ele faz uma careta de nojo. — Joga aquela porcaria fora e veste o manto do Mengão.
— Nunca! — olho no chão de novo, mas não a acho em lugar nenhum. Porra, o quarto de hotel nem era tão grande, como consegui perder essa joça? — Que merda, não 'tá aqui.
— Deve ser um sinal de Deus pra você voltar pra cama.
Reviro os olhos e quando estou pronta para xingá-lo, meu celular começa a vibrar na minha mão. Olho para tela e me arrependo na mesma hora.
Ah, que porra. É meu irmão. Meu Deus.
— Cala boca, ouviu — ordeno a Gabriel antes de atender a ligação com a voz mais natural que eu posso fazer. — Oi, Gu. Como 'cê 'tá?
— Luana, caralho, onde você se meteu?
— 'Tô bem, daqui a pouco apareço aí no hotel.
— Porra. Onde você 'tá? Eu te liguei a noite toda. Você sumiu na festa...
— Fala o que eu te falei, cara — escuto uma voz de fundo e sei que é o Veiga. Mas que inferno.
— O Veiga me disse que você 'tava com o Gabigol.
— Manda o Raphael ir se foder, na moral.
— Ela mandou você ir se foder — Gustavo dá o recado, fazendo as palavras de Veiga soarem logo depois, mas não de uma forma que eu pudesse entender. — 'Tá bom, cara. Briga de casal depois, preciso saber onde minha irmã está. Então cala a boca. Luana, cadê você?
Merda, eu não faço ideia de que hotel seja esse. Olho pro Gabriel, que me encara com curiosidade esse tempo todo, talvez se perguntando com quem diabos estou conversando.
— Que hotel é esse?
— Windsor Marapendi.
— De quem é essa voz? — pergunta Gustavo, suspeitando. — Não me fala que você realmente dormiu com o Gabigol. Luana, caralho, cadê a sua dignidade?
— Ela dormiu com o Gabigol? — ouço Veiga questionar em tom raivoso, mas meu irmão caga pro que ele diz.
— Luana, pelo amor de Deus, estou muito envergonhado disso, mas preciso de você de volta, inteira de preferência e sem filhos na barriga.
Dou uma risada abafada por ele estar sendo tão extremo. Não vou engravidar na primeira noite com um cara, isso nunca aconteceu e nem vai acontecer. Há pacotes de camisinha abertos pelo quarto e eu me lembro de ter usado. Além disso, meu DIU sempre foi bem eficaz.
— Já pensou meus sobrinhos ter o sangue do Gabigol, porra? — continua Gustavo já criando a fanfic. — Deus que nos livre, os moleques vão ser marrentos demais.
— Ô, Gustavo, volta pra realidade! Não viaja, não. 'Tô bem e inteira. Vou me encontrar com você daqui a pouco, só me passa o endereço do hotel.
— 'Tá doida, mano. 'Tô indo aí agora.
— Mas nem que me matem eu vou deixar você me buscar.
— Ué, por que não?
— Porque é constrangedor demais receber carona do meu irmão depois de uma noitada. E não quero ver a cara do Veiga também.
— Qual é o nome do hotel, Scarpa!? — ouço a voz elevada de Veiga e minha cabeça dói só em ouvi-lo.
— Pelo amor de Deus, manda esse filho da puta se foder — peço, irritada, levando os dedos a têmpora e alisando a fim de conter a onda de dor que me atinge, o que é inútil.
— Ela 'tá no Windsor Marapendi — Gustavo ignora o que eu digo e responde a pergunta de seu amigo. — Vê quanto é o uber até lá.
— Não! — berro, nervosa. — Gustavo, se você aparecer aqui, eu juro por Deus que nunca mais olho na sua cara.
— Luanna, você sumiu a noite inteira e provavelmente 'tá grávida do Gabigol. Então fica quieta que eu daqui a pouco 'tô aí pra te dar um tapa na nuca.
— Eu vou contar pra Sarah o seu pior podre, filho da puta.
Ouço a risada específica de Scarpa e eu nunca senti tanto ódio na minha vida.
— Suas ameaças não vão funcionar comigo, Lu. Desista.
— 30 reais o uber, Scarpa.
Solto um suspiro longo de raiva e digo uma última vez:
— Gustavo, por favor, pelo sangue que corre em nossas veias. Por todo o choro da mamãe em cada merda que a gente fazia na adolescência. Pela vez que eu te defendi mesmo você sendo culpado de ter quebrado o vaso de flor favorito da mamãe. Por tudo, eu te imploro, não apareça nesse hotel.
Scarpa bufa e posso até imaginar que está balançando a cabeça, inconformado.
— 'Tá — ele finalmente diz, trazendo certa paz pro meu coração. — Mas vem pra cá logo! 'Tá ouvindo, Luanna?
— Sim — solto um suspiro de alívio. — Já 'tô indo embora.
E dito isso, eu finalmente desligo.
Me viro na direção do Gabigol só pra informá-lo.
— Tenho que ir embora, então pode me ajudar a procurar minha camisa.
— 'Pera um pouco aí — ele ergue uma mão em sinal de pare na minha direção. — 'Cê é irmã do Scarpa, parça?
Assinto.
Gabriel suspira, batendo uma mão na própria testa.
— Mas que porra!
— Qual foi? — pergunto em dúvida por sua reação repentina.
— Eu peguei a irmã de um dos caras do Palmeiras.
Solto uma risada, ainda desconfiada de seu tom e não entendendo bulhufas.
— Meus parabéns? — digo com deboche e ignorando suas palavras sem noção.
— Isso acabou de manchar a minha honra, Luana, caralho!
— E desde quando você tem honra?
Ele ergue o dedo do meio pra mim e eu faço o mesmo.
— Agora larga mão de mimimi — aviso abaixando a mão e voltando a minha caçada. — Preciso da minha camisa.
— Desiste disso — ele diz, me deixando ainda mais irritada. Só pode estar de sacanagem. — Você não vai achar!
— Eu te odeio com todas as minhas forças — bufo. — Eu tenho que ir embora.
— Pega minha camisa do Flamengo aí — ele indica a própria jogada no chão bem aos meus pés.
— Nem fodendo que vou vestir essa blusinha.
— Se quer ir embora vai ter que vestir isso ou pagar peitinhos, o que escolhe?
Fico em silêncio, sem saber como responder ou como argumentar o que o faz continuar falando:
— Ainda prefiro que fique nua e volte pra cama. Podemos fingir que você não é a irmã do Scarpa e a gente transa de novo.
Com raiva e o rosto vermelho, pego a porcaria da camisa, sem ter outra escolha a não ser usá-la. Pagar peitinho estava fora de cogitação. Me obrigo a vesti-la para meu próprio bem, contendo todo meu incômodo de fazer tal coisa e trair toda minha família e a mim mesma por isso.
Pai, estou usando essa camisa por um bem maior. Não me mate.
Um cheiro familiar satura os meus sentidos quando a camisa do Gabigol está em meu corpo. Um perdurem forte e masculino. O mesmo cheiro que senti ontem quando meus lábios estavam brincando sobre o peito nu de Gabigol. E quando meu rosto estava enterrado em seu pescoço, enquanto eu chupava sua pele.
Afasto a imagem da minha cabeça e declaro meu ódio eterno por esse filho da puta pelado com a porra de um sorrisinho orgulhoso no rosto. Babaca.
NOTAS DA AUTORA:
Essa capítulo tem eita atrás de eita!
Mas essa confusão não acaba por aqui.