Se a gente se casar domingo?

By thalytamartiins

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Para Danilo Torres não há ninguém no mundo mais adequado do que ele mesmo para assumir a presidência da empre... More

Oi :)
Se a gente se casar domingo?
Capítulo 01 - Danilo
Capítulo 02 - Leila
Capítulo 03 - Danilo
Capítulo 04 - Leila
Capítulo 05 - Danilo
Capítulo 06 - Leila
Capítulo 07 - Danilo
Capítulo 08 - Leila
Capítulo 09 - Danilo
Capítulo 10 - Leila
Capítulo 11 - Danilo
Capítulo 12 - Leila
Capítulo 13 - Danilo
Capítulo 14 - Leila
Capítulo 15 - Danilo
Capítulo 16 - Leila
Capítulo 17 - Danilo
Capítulo 18 - Leila
Capítulo 19 - Danilo
Capítulo 20 - Leila
Capítulo 21 - Danilo
Capítulo 22 - Leila
Capítulo 23 - Danilo
Capítulo 24 - Leila
Capítulo 25 - Danilo
Capítulo 26 - Leila
Capítulo 27 - Danilo
Capítulo 28 - Leila
Capítulo 29 - Danilo
Capítulo 30 - Leila
Capítulo 31 - Danilo
Capítulo 33 - Danilo
Capítulo 34 - Leila
Capítulo 35 - Danilo
Capítulo 36 - Leila
Capítulo 37 - Danilo
Capítulo 38 - Leila
Capítulo 39 - Danilo
Capítulo 40 - Leila
Capítulo 41 - Danilo
Capítulo 42 - Leila
Capítulo 43 - Danilo
Capítulo 44 - Leila
Capítulo 45 - Danilo
Capítulo 46 - Leila
Capítulo 47 - Danilo
Capítulo 48 - Leila
Epílogo
Agradecimentos :')

Capítulo 32 - Leila

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By thalytamartiins

Dona Roberta resolve que é hora de ir para casa no dia em que eu decido voltar ao trabalho. Os dias com ela foram divertidos, me senti querida e importante, e minha mãe que me perdoe, mas nunca comi tão bem na vida. Eu achava que as mulheres da minha família sabiam cozinhar, mas minha sogra dá um show na cozinha e eu adorei provar cada uma das receitas muito chiques dela.

Danilo ficou bem incomodado no começo, ele vivia resmungando e suspirando alto para mostrar que estava odiando a presença da mãe pela casa, só que os dias de convivência o fizeram aceitar a ideia e eu até o vi sorrindo para dona Roberta com mais frequência. Inclusive, no dia em que ela se despediu dizendo que era melhor voltar para casa, percebi que Danilo ficou estranho, meio calado e pensativo, provavelmente sentindo o vazio que a mãe deixou quando foi embora.

Sinceramente, achei que ia me estressar demais com a presença espalhafatosa de dona Roberta, mas fui surpreendida positivamente. Ri muito com as histórias da infância de Danilo, fiquei sabendo de detalhes da vida dele que sei que ele não me contaria em outra ocasião e, inevitavelmente, acabamos ficando mais próximos. Tirando o desconforto do começo de termos que dividir o mesmo quarto e a mesma cama, os outros dias foram tranquilos. Sei que sou uma péssima pessoa para dividir o colchão e por isso acabei ficando sensibilizada por ele não ter reclamado em nenhum momento.

Agora, já de volta ao meu quarto, quase sinto falta de acordar todos os dias com Danilo andando pelo quarto na ponta dos pés para não me incomodar. Às vezes eu ficava quietinha de propósito, apenas para assisti-lo se atrapalhar todo para pegar as roupas do guarda-roupa, tendo que saltar Sansão, que já acorda querendo brincar. A propósito, por causa da energia acumulada do cachorro, estamos tentando sair para caminhar todas as manhãs, o que eu passei a gostar de fazer depois de perceber que tenho estado mais disposta e mais bem humorada.

Danilo tem levado meio a sério a promessa que fez a minha tia sobre cuidar para que eu coma e descanse bem, e não bastando ter insistido em me levar para a E. M. todos os dias, ele envia mensagens me enchendo o saco para que eu não me esqueça de comer. As caixas de pizza sumiram da casa e passamos boa parte das nossas noites cozinhando as receitas da mãe dele. Acho que essas coisas pequenas do dia a dia estão nos levando aos poucos para uma rotina agradável, a qual não tenho nada para reclamar, pois estou vivendo dias de paz que eu não vivia há muito tempo.

Finalmente, após dois meses de casamento, eu estou conseguindo me sentir bem ao lado de Danilo. Está se tornando fácil para mim contar detalhes aleatórios da minha vida para ele e posso arriscar dizer que estou confiando em outra pessoa de verdade pela primeira vez depois de anos. Sei que Danilo tem muitos defeitos, mas nunca mentiu para mim, ao passo que sempre pensei mal dele em todas as oportunidades. Eu sabia que uma hora eu teria que baixar minha guarda e recebê-lo melhor dentro da minha vida, e ao que tudo indica, essa hora chegou antes do que eu esperava.

Outra coisa que também chegou antes do que eu esperava é a inauguração da Electrical Measure. Estamos a todo vapor, nossas questões legais e burocráticas estão quase todas resolvidas e em breve poderemos trabalhar. Madu tem se dedicado dia e noite para que nosso nome chegue a quem precisa dos nossos serviços, enquanto Jonas e eu estamos fazendo tudo que está ao nosso alcance para que o aplicativo da E. M. seja o mais funcional e eficiente que existe. Assim que abrirmos as portas do nosso escritório, deixaremos de ser apenas três amadores para nos tornarmos profissionais de verdade, então nada, nada mesmo pode dar errado.

Diferente dos dias anteriores em que estávamos passando o tempo todo no escritório, hoje tivemos que ficar na garagem dos pais de Jonas por causa dos equipamentos. Nem nos mudamos completamente, mas já me sinto meio nostálgica por estar jogada no nosso sofá verde musgo, digitando sem parar no notebook. Aqui é pequeno e abafado, entulhado de coisas que nem nós usamos mais, no entanto ainda é nossa casa, onde plantamos os primeiros frutos que estamos colhendo agora.

Madu se joga no sofá ao meu lado, esfregando os olhos cansados. Se eu precisei cair de cama para começar a prestar atenção nos sinais do meu corpo, ela está quase na mesma situação que eu estava meses atrás. Não está sendo fácil para ela fazer todo o trabalho de programação sozinha, todavia essa cabeça dura não quer que procuremos ninguém ainda para auxiliá-la.

— Que tal dormir um pouco? — Sugiro, afastando meu notebook e fazendo sinal para que ela deite a cabeça na minha perna.

— Ai, Leila, eu estou adorando essa sua fase mais relax! — Madu coloca a cabeça no meu colo e respira fundo.

Tiro sua franja de cima dos olhos, desenhando suas sobrancelhas finas. Faz algumas semanas que Madu colocou um novo piercing no lábio inferior após um cara tê-la olhado meio torto quando ela se apresentou como uma das fundadoras da E. M. Se eu passo por situações péssimas por ser uma mulher negra galgando espaço em um mercado dominado por homens, Madu é recorrentemente constrangida pela forma como ela se veste e pelas tatuagens e piercings pelo corpo. Mas isso é Brasil e as pessoas nem mesmo fazem esforço para esconder o próprio preconceito.

Jonas entra na garagem com uma garrafa de café numa mão e uma vasilha de plástico com os famosos biscoitinhos de polvilho da mãe dele. Ele se senta no braço do sofá e puxa um puff velho que improvisamos como mesa, colocando as coisas ali.

— Sua mãe nem é gente, Jonas, é anjo! — Madu se senta de novo, atacando os biscoitos.

— Ela disse para vocês duas subirem mais tarde, que ela vai preparar alguns biscoitos para vocês levarem.

— Vou subir lá, sim! — Digo, já me imaginando amanhã de manhã comendo esses biscoitinhos acompanhada do café que Danilo faz, que inclusive é muito melhor que o meu.

Pensar nele me faz olhar o celular, procurando por alguma mensagem. Não nos falamos hoje, ele disse que teria uma reunião muito importante, mais importante do que as que ele costuma ter e me pediu para que o desejasse boa sorte quando me deixou aqui pela manhã. Sem querer, acabei ficando preocupada. Danilo tem reclamado muito do trabalho intenso na Eco Habitação, e como alguém que também lidera uma empresa, mesmo que pequena, sei o quanto é cansativo e estressante.

Entretanto, em vez de achar uma mensagem de Danilo, como eu esperava, acabo vendo uma mensagem estranha de Rafael. Cristo, por que ele continua fazendo isso? Fui ainda muito boazinha ao atendê-lo na semana passada e explicar algumas coisas que ele não tinha compreendido sobre os projetos que eu gerenciava na Solar, achei que depois da forma como o tratei na ligação ele iria desconfiar que não quero mais papo, porém aqui está uma mensagem dele perguntando se podemos nos ver e que é uma coisa meio urgente.

Reviro os olhos e bloqueio a tela do celular. Madu e Jonas me olham desconfiados e eu resolvo explicar antes que eles comecem a especular.

— É Rafael precisando da minha ajuda de novo.

Espero que meus amigos passem por cima desse assunto com a mesma facilidade com que esquecem qualquer coisa relacionada a Rafael por simplesmente o odiarem. Entretanto, os dois continuam me encarando, esperando por mais alguma coisa que eu tenha a dizer, mesmo que eu não tenha mais nada para falar sobre aquilo.

— O que foi? — Questiono, não entendendo o que eles querem de mim.

— Você está tão mudada, Leila. — Jonas quem me responde, deixando de lado um biscoito para prestar atenção às minhas reações.

— Eu? Por que você está dizendo isso?

— É que antes, mesmo depois de você aparecer namorando Danilo, a gente ainda te via tendo consideração demais por Rafael, mas agora você o ignora assim.

— Na verdade a gente não achou que viveria para ver você ignorando ele ou qualquer pessoa que torrasse o seu saco, entende? Você é sempre a boazinha da situação, por isso é estranho. — Madu completa.

— Eu não estou ignorando Rafael! — Me defendo. — É só que me incomoda ele estar sempre atrás de mim agora, depois de ter me ignorado por quase dois anos.

Madu aperta minha mão em sinal de apoio.

— E está tudo bem, Leila. Você é humana, poxa, e está aos poucos descobrindo o amor próprio, isso é ótimo!

Afasto a mão dela com um tapa. Isso não tem nada a ver com amor próprio, eu sempre gostei muito mais de mim do que de Rafael. Na minha cabeça, toda a birra que estou tomando dele tem a ver com a minha recente percepção de que ele foi um idiota durante nosso relacionamento, mas me fez acreditar que a única errada era eu. Agora, consigo ver que um namoro, um casamento e afins são coisas construídas por duas pessoas, então como eu poderia carregar sozinha a culpa pelo nosso fracasso? Será que só eu gostava dele sozinha? Se sim, eu realmente não fui quem cometi o erro entre nós dois.

Pego meu celular e respondo rapidamente a mensagem de Rafael, dizendo que estou na garagem, caso ele queira passar aqui antes das 17h00. Não sei o que ele tanto quer comigo, mas isso acaba hoje. Estou farta desta situação e preciso dizer que já chega. Se Rafael quiser ser meu amigo, tudo bem, o que não quero é que ele me use como escadinha para subir todas as vezes que precisa alcançar algo mais alto.

Madu cruza os braços, me lançando um olhar de reprovação.

— Caramba, Leila, não pode nem mais elogiar!

Dou de ombros e encho minhas mãos com os biscoitinhos de polvilho. Prefiro comer do que bater boca com ela. Madu resolve se levantar do sofá e passar a alça da bolsa preta cheia de franjas pelo ombro.

— Preciso ir a um caixa eletrônico, mas volto daqui a pouco. — Ela pesca alguns biscoitinhos da vasilha e enfia um na boca. — Deixem biscoitos para mim!

Jonas e eu assentimos, mas ambos sabemos que Madu só encontrará farelos quando voltar.

O problema de mentir é que qualquer passo em falso e desabamos numa poça de lama. Quando eu disse que Luís quem tinha sido nosso contato com o "investidor", eu não imaginava que iria vê-lo tão cedo, afinal eu fui despedida, no entanto ele está de pé na garagem, acompanhado de Rafael, e me enchendo de perguntas sobre o andamento da E. M.

Estou pisando em ovos enquanto conversamos, me borrando de medo de Jonas mencionar alguma coisa sobre o investidor secreto que supostamente nos tirou do buraco. Madu ainda está fora, o que está me deixando relativamente mais segura, mas ainda assim consigo vê-la chegando a qualquer momento e me desmascarando.

Afastei a bagunça sobre a nossa única mesa de trabalho e estou tentando explicar a Rafael e Luís alguns detalhes que tinham passado despercebido pelos dois no maldito projeto que nunca terminei. Por sorte, tenho tudo que usei para o projeto no meu notebook e nem preciso que eles se deem ao trabalho de me mostrar nada, porque sei de cor todos os cálculos que fiz ao projetar aquilo com o restante da equipe.

— Parece que o deslanche da E. M. não é a única novidade por aqui, né, Leila? — Luís aponta com o queixo para a minha aliança nada discreta.

Fecho minha mão em um punho, como se isso fosse esconder o fato de que sou uma mulher casada agora.

— Você se casou? Se casou mesmo? — Rafael pergunta em um tom que oscila entre a incredulidade e a surpresa. — Nem sabia que você estava namorando.

Viro meu rosto na direção dele, sentindo aquela faísca de irritação que ele tem me causado recentemente arder mais forte. Rafael achava o quê, que eu ficaria o resto da minha vida esperando por uma ligação dele?

— Pois é, me casei há pouco tempo.

— E quem é ele? — Rafael insiste.

Do outro lado da garagem, Jonas pigarreia. Eu poderia encerrar essa conversa e despachá-los o quanto antes, mas por puro reflexo acabo dando a Rafael uma satisfação que ele nem merece ouvir.

— Danilo Torres. Acho que você o conhece, Luís, ele é amigo de Tales.

— Ah, Danilo... — Luís nem esconde a surpresa. — O conheço, sim, Leila. Parabéns pelo casamento.

Eu sorrio para Luís em agradecimento, desmanchando meu sorriso em seguida ao ver a cara perplexa do meu ex-namorado. Ele não deve saber quem é Danilo ou não associou o nome à pessoa e isso o está incomodando, porque ele é o único a não saber com quem eu estou agora. Talvez em algum passado remoto eu realmente me sentisse feliz por vê-lo se doendo desse jeito, mas hoje eu só quero que Rafael suma da minha frente e que leve qualquer sentimento que ele acha que ainda sente por mim para o quinto dos infernos.

— Olha, pelo que vocês me disseram, não há mais nada a ser ajustado no projeto. Agora é só executar. — Explico depressa, ansiosa para que eles desapareçam daqui.

Luís se adianta um passo e estende a mão para mim.

— Obrigado mesmo, Leila! Se você não tivesse nos salvado mais uma vez, era provável que esse projeto nunca saísse do papel.

— Não precisa agradecer. Eu estive a frente do projeto por bastante tempo, me sinto na obrigação de ajudar como posso.

— Ainda assim, sou muito grato por tudo e nunca duvide do fato de que estou muito feliz por você estar finalmente realizando seus sonhos com a startup. No fim, ficar sem escolhas era o que você precisava. — Ele ri um pouco, como se isso amenizasse as coisas.

Eu fui negligente com meu trabalho, isso é um fato, e eu até aceito bem a minha demissão por isso, mas não consigo engolir a ideia de Luís ter feito isso para me ajudar. Eu fiquei sem dinheiro, desesperada e à beira de um abismo profundo. Minha situação era tão ruim, que eu acabei casada com um desconhecido por dinheiro, o que a qualquer momento pode se tornar um problema grande demais para que eu resolva sozinha.

— Bom, Jonas e eu estávamos trabalhando quando vocês chegaram...

— Claro, claro! Vamos deixar vocês trabalharem. Nos vemos por aí, Leila. Você sabe que te desejo todo sucesso do mundo. — Luís me dá alguns tapinhas cordiais no ombro.

Ele se afasta, pegando a pasta de couro de cima da mesa revirada. Rafael se demora mais alguns segundos, olhando para mim como se estivesse me vendo pela primeira vez. Espero que agora que ele sabe que estou casada, tenha um pingo de senso de hesitar em me ligar e comece a resolver seus próprios problemas sozinho. Ele é tão profissional quanto eu, tem que dar conta de pequenos imprevistos ou ser demitido, assim como eu fui.

— Sucesso, Leila. — Rafael força um sorriso para mim. — E parabéns pelo casamento, espero que você seja muito feliz.

— Obrigada! Eu estou mesmo sendo muito feliz. — Sorrio de volta para ele, me surpreendendo com a facilidade que aquelas palavras saem da minha boca.

Me dou conta de que aquilo soa sincero, porque é verdade. Eu estou feliz, tanto trabalhando quanto quando chego em casa. Me sinto bem depois de muito tempo, mesmo que Danilo não seja meu marido de verdade e nem me espere de braços abertos para uma noite romântica. Coisas assim podem até fazer falta na minha vida de vez em quando, mas eu estou muito bem com a tranquilidade que meu casamento de fachada tem me proporcionado por enquanto.

— É bom ver você assim. Da última vez que nos vimos você parecia tão chateada e magoada... — Ele se interrompe, pensando melhor no que está prestes a dizer. — Fico feliz que tenha dado a volta por cima de... Você sabe, nós dois.

Quase dou risada daquilo.

— Volta por cima? Então para você eu estar bem significa dar uma volta por cima de você, é isso?

— Eu quis dizer que...

— Rafael — eu o corto, sem querer ouvir mais nenhuma palavra vinda dele —, eu espero de todo coração que um dia você seja feliz também, com ou sem alguém. Se for com alguém, que você faça bem a essa pessoa e que nunca faça ela se sentir insuficiente e indigna de ser amada. Eu espero também que a pessoa que você escolher para estar com você pelo resto da vida te ame inteiramente, que consiga confiar em você e se entregar de corpo e alma à relação de vocês. Agora, por favor, eu preciso trabalhar. — Indico a porta da garagem, onde Luís o espera.

Ele balança a cabeça de leve, desviando os olhos dos meus. Não nos despedimos formalmente, não há mais nada para ser dito entre nós e eu me sinto mais leve ao vê-lo caminhando para longe de mim. Finalmente, depois de dois anos, eu consegui colocar para fora todo o rancor que estava dentro do meu peito e consigo respirar sem sentir aquilo apertar minha gargan ta.

Eu os vejo descer pela entrada da garagem e atravessarem a rua para entrarem no carro. Luís tira a chave do bolso e destrava o alarme, levando uma mão à maçaneta da porta, no entanto para de repente ao ouvir a voz de Madu. Meu coração acelera no peito e eu não consigo me mover por segundos demorados demais. Eu a avisto se aproximando depressa de Luís, com sacolas de supermercado nas mãos e um sorriso enorme no rosto.

— Faz tanto tempo que quero ver você, Luís! — Madu exclama, saindo estrelinhas pelos olhos de animação.

— É mesmo? Por que?

O desespero que aquela cena me causa é o suficiente para fazer minhas pernas obedecerem ao meu cérebro e começarem a correr. Disparo pela garagem, saltando nossas quinquilharias e gritando por Madu, mas não chego a tempo de impedi-la de dizer:

— É que eu queria agradecer por ter nos indicado para o nosso "investidor secreto" — Ela faz pequenas aspas com os dedos, radiante por estar diante de Luís.

— Investidor? — Luís coça a nuca, sem entender. — Como assim investidor?

— Madu! — Minha voz soa urgente, agoniada. — Madu, eu...

Ela olha assustada de mim para Luís e eu consigo enxergar em seu rosto o exato momento em que minha mentira cai por terra. Madu sorri sem graça para Luís, que agora também olha para mim sem compreender nada do que está acontecendo.

— Ai, Luís, me desculpa! Eu quis dizer que sou grata por você ter chutado Leila da sua empresa, porque se não fosse isso a gente nunca ia ter conhecido um investidor.

— Que nada, eu acabei de dizer para Leila que só dei um empurrãozinho. — Ele acena para mim e depois se volta para Madu. — Vou indo. Foi bom ver você, Madu!

— Igualmente.

Madu deixa Rafael e Luís entrarem no carro, para só então caminhar até onde estou e me olhar tão fundo nos olhos, que eu sinto que vou começar a chorar ali mesmo.

— Leila, é melhor você dizer a verdade.

Sou péssima mentirosa, por isso nem tento enrolar meus amigos com alguma conversa fiada. Despejo de uma vez sobre eles o segredo que tenho guardado com minha própria vida há meses, falo sobre como tudo começou, sobre a proposta, sobre os termos do nosso contrato, deixando de fora apenas a doença de Dr. Fausto, porque Danilo me pediu segredo.

Me sinto mais leve depois de desabafar, embora meu rosto esteja queimando de vergonha e meu coração palpitando descontrolado, pois não sei qual será a reação de Jonas e Madu. Eu espero muito que eles me entendam, já que fiz o que fiz pela nossa empresa, entretanto conforme os segundos se arrastam e nenhum dos dois diz nada, menos esperança eu tenho de que eles serão compreensivos com as minhas escolhas.

Jonas se senta mais perto de mim no sofá velho, enquanto Madu continua andando de um lado para o outro da garagem, girando os brincos de argola nas orelhas. Ela quer gritar comigo, sei que quer, mas está sem saber como começar o sermão. Eu a entendo, porque se a situação acontecesse ao contrário, eu estaria chocada demais até para iniciar uma discussão.

— Leila, então nada disso do casamento é verdade? É só uma farsa entre você e Danilo? — Jonas pergunta, cautelosamente. Sinto que ele está esperando que eu diga que tudo que acabei de confessar não passa de uma brincadeira.

— Sim, é tudo falso. Tudo.

— Por que ele iria fazer isso? É algum fetiche ou coisa do tipo? — O tom cauteloso do meu amigo se torna subitamente preocupado.

— Não é nada disso. Danilo tem os motivos dele, mas temos um contrato e eu não posso falar muito sobre isso.

— Pois rasgue a porra do contrato! — Madu diz de repente, soando tão furiosa que eu me encolho no sofá.

— Madu, eu não posso faz...

— Eu não quero saber, Leila! — Ela me interrompe. — Você não é um brinquedo que aquele babaca pode comprar. Não me importa nada disso, devolva o dinheiro dele e saia daquela casa hoje ainda.

— Devolver o investimento? Nós gastamos uma boa parte dele, lembra? — Argumento.

— Devolva o que resta, daremos um jeito de pagar o que gastamos depois. Apenas saia daquela casa e de perto daquele homem, Leila!

Apoio meus cotovelos nos joelhos e esfrego o rosto, procurando formas de vencer a resistência de Madu. Se eu for fazer o que ela quer, Danilo e eu teremos problemas maiores do que uma dívida que eu nunca vou conseguir pagar.

— Eu não posso fazer isso, eu assinei um contrato e se passaram apenas dois meses do casamento. Eu não posso simplesmente dar as costas para Danilo justo agora, me entende?

— Dar as costas para ele? Você tá maluca?! O cara praticamente te comprou, te enfeitou como uma bonequinha e agora você vem me dizer que não pode dar as costas para ele?

— Madu, dá um tempo! — Jonas esbraveja. — Parece que você não consegue enxergar a situação direito. Leila está presa a um contrato, ela pode ser processada se quebrar o acordo e todo mundo aqui sabe que não temos como devolver um real do investimento.

— E você quer o quê, Jonas? Você quer que Leila continue naquela casa à mercê das vontades daquele cara?

— Madu, por favor, as coisas não são assim como você pensa. Danilo e eu não temos esse tipo de relação, ele me respeita muito e tem se tornado um bom amigo. Não há nada, nada mesmo entre nós dois.

— Não há nada ainda, você quer dizer. — Madu retruca. — E se ele resolver que quer ter? O que você vai fazer?

— O contrato impede esse tipo de aproximação.

— Um pedaço de papel não impede nada, Leila.

Abro a minha boca para dizer mais alguma coisa, mas a verdade é que eu não tenho argumentos. Um papel não impede mesmo que nada aconteça entre Danilo e eu, o que sempre nos impediu foram nossos propósitos e a completa falta de atração um pelo outro. Contudo, não estou mais certa faz algum tempo de que sou tão imune assim ao charme dele, principalmente depois de passarmos alguns dias dividindo a mesma cama, acordando e indo dormir com o cheiro dele no meu corpo. É complicado, é tudo muito complicado e eu dou graças a Deus todos os dias por Danilo nem mesmo parecer considerar o fato de que sou uma mulher, porque do contrário... Prefiro nem pensar muito no assunto.

— Está vendo só, nem você mesma parece ter convicção das coisas que fala, Leila. — Madu me acusa, mas suas palavras estão repletas de preocupação. — Por que você fez uma burrice dessas sem falar nada com ninguém?

— Leila, preciso dar razão para Madu. A E. M. não é só sua, é uma coisa nossa, nós três tínhamos que ter decidido a melhor forma de arranjar um investidor e, em qualquer hipótese, um casamento por dinheiro estaria fora de cogitação.

— Sim, mil vezes sim! — Madu concorda, fazendo um gesto na direção de Jonas. — Agora me diz com que clima vamos começar a operar sabendo o que você teve que passar para conseguir dinheiro? Pelo amor de Deus, meu estômago está revirando só de olhar para essa sua aliança.

A aliança de ouro no meu dedo parece pesar uma tonelada quando Madu diz aquilo. De alguma forma, as palavras dela fazem com que eu me sinta vazia e suja, e não consigo medir o quanto me dói na alma ter aquela percepção.

— Eu fiz isso pela gente, pelos nossos sonhos... — Minha garganta aperta e eu sinto as lágrimas cada vez mais próximas.

Jonas se levanta do sofá e passa as mãos pelo cabelo castanho claro que não vê um corte há meses. O olhar que ele me lança chega a me sufocar de tão doloroso e eu preciso desviar os olhos para os meus tênis para não ter que encará-lo.

— Não foi pela gente, foi por você, porque se fosse pela gente, você saberia que nós nunca iriamos apoiar essa sua decisão.

— Eu, de verdade, não sei como vamos continuar com isso aqui. — Madu balança a cabeça, desapontada. — Não sei se consigo ter estômago para seguir com a E. M. depois disso.

— Se vocês ainda fossem um casal de verdade, Leila, e Danilo quisesse nos apoiar, mas essa coisa de contrato, de acordo, é demais para a minha cabeça também. — Jonas diz.

— Vocês não podem desistir, é o nosso sonho... — Minha voz falha pelas lágrimas presas na minha garganta.

— Leila, não. — Madu estende uma mão, me afastando antes mesmo que eu consiga me levantar e ir até ela. — Se você quer continuar brincando de casinha com aquele riquinho mimado, você quem sabe, só deixa Jonas e eu fora disso. É o seu contrato e se você não quer abandoná-lo, tudo bem, faz o que você quiser, só faz sozinha, como você fez quando assinou essa merda sem dizer nada para ninguém!

Madu passa a bolsa pelo ombro, caminhando para fora da garagem sem olhar para trás. Tento impedi-la, correr até ela e continuar tentando dar as minhas melhores explicações, mas Jonas me detém.

— Chega por hoje, nós três precisamos de tempo. Vá para... — Ele hesita um pouco, procurando pelas palavras certas. — Para casa. Isso, vá para casa.

Casa, a palavra que o fez hesitar. Jonas e Madu não enxergam mais a casa de Danilo como minha casa, assim como não conseguem sequer enxergá-lo como um ser humano agora. Por essas e por outras que eu queria evitar que ele tivesse contato com as pessoas que me cercam, porque se um dia a verdade viesse à tona, muita gente sairia machucada.

No fim, acabo fazendo o que Jonas me pede e indo embora. Envio uma mensagem para Danilo dizendo que vou mais cedo para casa e, assim como Jonas, hesito ao escrever aquela palavra no campo de texto do meu celular, porque estou começando a me questionar também se não me iludi demais achando que alguma coisa dentro da vida e do apartamento de Danilo poderia ser minha também.

Na entrada do prédio, o porteiro me entrega um pacote enorme com o meu nome e o de Danilo como destinatários, que descubro mais tarde ser o álbum do casamento. A empresa de fotografia enviou um vinho de brinde e eu o coloquei para gelar enquanto tomava um banho e tentava inutilmente não pensar no quanto eu estava feliz de manhã e agora estou à beira de uma crise de choro.

Eu não ia abrir o álbum, mas depois de algum tempo acabei cedendo. A caixa de veludo azul petróleo é um luxo, com uma tranca finíssima em prata, que me dá a impressão de que dentro de todo esse embrulho há uma jóia muito preciosa. O caderno do álbum é enorme, há a inicial do nome de Danilo e a minha entrelaçadas de um jeito elegante na capa e a primeira foto que vejo ao virar a primeira página é do exato momento em que o escrivão nos declarou casados.

Aquela maldita foto quebra minha última barreira e eu me permito chorar sozinha no chão da sala. Sansão não faz ideia do que está havendo comigo, por isso começa a dar voltas ao meu redor, ganindo baixinho para chamar minha atenção. O carinho que aquele cachorrinho demonstra ter por mim me deixa ainda pior e eu continuo chorando copiosamente, como se fosse impossível parar.

Não sei como consegui fazer aquilo, mas sozinha eu perdi tudo em menos de um dia: a empresa pela qual tanto trabalhei e a ilusão sutil de que eu pertencia a algum lugar pela primeira vez. Eu sabia que esse dia chegaria, mas nem nos meus piores pesadelos eu poderia imaginar que doeria tanto.

Oie! Hoje as postagens são duplas, então corram pro próximo capítulo :3

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