Se a gente se casar domingo?

Oleh thalytamartiins

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Para Danilo Torres não há ninguém no mundo mais adequado do que ele mesmo para assumir a presidência da empre... Lebih Banyak

Oi :)
Se a gente se casar domingo?
Capítulo 01 - Danilo
Capítulo 02 - Leila
Capítulo 03 - Danilo
Capítulo 04 - Leila
Capítulo 05 - Danilo
Capítulo 06 - Leila
Capítulo 07 - Danilo
Capítulo 08 - Leila
Capítulo 09 - Danilo
Capítulo 10 - Leila
Capítulo 11 - Danilo
Capítulo 12 - Leila
Capítulo 13 - Danilo
Capítulo 14 - Leila
Capítulo 15 - Danilo
Capítulo 16 - Leila
Capítulo 18 - Leila
Capítulo 19 - Danilo
Capítulo 20 - Leila
Capítulo 21 - Danilo
Capítulo 22 - Leila
Capítulo 23 - Danilo
Capítulo 24 - Leila
Capítulo 25 - Danilo
Capítulo 26 - Leila
Capítulo 27 - Danilo
Capítulo 28 - Leila
Capítulo 29 - Danilo
Capítulo 30 - Leila
Capítulo 31 - Danilo
Capítulo 32 - Leila
Capítulo 33 - Danilo
Capítulo 34 - Leila
Capítulo 35 - Danilo
Capítulo 36 - Leila
Capítulo 37 - Danilo
Capítulo 38 - Leila
Capítulo 39 - Danilo
Capítulo 40 - Leila
Capítulo 41 - Danilo
Capítulo 42 - Leila
Capítulo 43 - Danilo
Capítulo 44 - Leila
Capítulo 45 - Danilo
Capítulo 46 - Leila
Capítulo 47 - Danilo
Capítulo 48 - Leila
Epílogo
Agradecimentos :')

Capítulo 17 - Danilo

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Oleh thalytamartiins

Após nos despedirmos da minha família, Leila disse que precisava voltar à casa por um segundo para pegar a bolsa. Bastou que ela se afastasse de mim para que Marcos me abordasse, com minha mãe a tiracolo, claro. Me recosto no capô do carro e os observo se aproximando, já podendo imaginar o que vão dizer. Nunca os vi tão calados quanto hoje, então é fácil imaginar o quanto os dois têm para comentar sobre meu recém-anunciado noivado.

Marcos para do meu lado, mas não encosta no meu carro, o que é inteligente da parte dele. Minha mãe se posta a minha frente, me impedindo de ver qualquer coisa além dos seus cabelos pintados de um castanho vivo, quase vermelho.

— Você deve estar feliz com o espetáculo que ofereceu ao vovô hoje. Quem é essa garota? Alguma atriz tentando ganhar a vida? — Marcos provoca.

— Marcos, você sabe que detesto suas ironias e que também detesto que dêem voltas para chegarem a algum lugar, portanto digam logo o que vocês querem, os dois. — Olho dele para minha mãe, arqueando as sobrancelhas em sinal de impaciência.

— Já que você quer ser direto, então vamos direto ao ponto. O que você pensa que está fazendo, Danilo? Resolveu brincar de casinha ou algo do tipo? — O tom que meu irmão usa desta vez se distancia da ironia de antes e se aproxima da hostilidade com a qual nós dois estamos habituados.

— Como assim? Só você pode se casar e ter uma família de propaganda de margarina, é?

— Ninguém está dizendo que você não pode se casar, estamos apenas tentando entender os seus motivos.

— Ah, e vocês descobriram que se interessam pela minha vida agora? — Eu deixo escapar uma risada de escárnio. — Não preciso da preocupação de ninguém.

— Claro que não precisa, até porque você sabe muito bem resolver seus problemas sem criar outros piores, não é mesmo? Porque você sabe perfeitamente lidar com as pessoas ao seu redor e porque você tem bastante responsabilidade, né, Danilo? — Marcos praticamente grita, perdendo qualquer resquício de paciência.

— E quem é você para falar qualquer coisa, Marcos? É meu pai, por acaso?

— Não fale assim com seu irmão! — Minha mãe finalmente resolve abrir a boca, conseguindo minha atenção e a de Marcos. — E você, Marcos, não precisa tratar Danilo como um menino, ele já tem idade para saber o que é certo e errado.

— É o que eu estou dizendo. Eu posso tranquilamente tomar conta da minha própria vida.

— Pode, sim. — Minha mãe concorda. — E é por isso que eu queria ter certeza de que você tem consciência de que está cometendo um erro.

Estava demorando... Minha mãe passou o dia todo de cara amarrada e fuzilando Leila com os olhos. Fiquei até bem surpreso por ela não ter começado um jogo de provocações como costuma fazer com Valéria para ver quem sai do sério primeiro.

— Mãe, não é porque Leila não é a nora que a senhora sonhou, que...

— Isso não tem nada a ver comigo, Danilo. — Ela me corta. — Não gosto de Valéria também, mas reconheço que ela ama seu irmão e é uma boa mãe para as meninas. Se você decidiu se casar pensando nos outros, você já começou isso errado. Não sei o que você tem em mente e nem o que quer provar com isso, mas sou sua mãe e te conheço o suficiente para ver de longe o quanto você está se equivocando.

— E mais — Marcos aponta um dedo acusador para o meu peito —, se você estiver fazendo isso para conseguir qualquer coisa do nosso avô, fique sabendo que você só vai conseguir decepcioná-lo, como sempre.

Fecho minhas mãos em punhos ao escutar aquilo. Quero responder Marcos a altura, mas vejo Leila a alguns metros de onde estamos conversando e desisto de qualquer ofensa que me vem à mente. Não tenho muita certeza de imediato se ela nos ouviu, porém a pouca dúvida que me restava desaparece quando nossos olhos se encontram e ela abaixa a cabeça para encarar os próprios pés.

Se eu já estava bravo antes de ver Leila, fico completamente enfurecido agora. Tudo que eu não precisava era que ela testemunhasse uma briga minha com a minha família. Evitei que isso acontecesse o máximo que pude, mas nem quando eu estou disposto a ficar em paz, Marcos e minha mãe me ajudam. Por essas e por outras que não venho com frequência nesses almoços de domingo que meu avô faz na tentativa de nos manter unidos. Nossa família foi enterrada há muito tempo e só ele não consegue aceitar que nada vai ser como antes.

— Acabaram? — Pergunto ao meu irmão e à minha mãe, que fazem questão de se fingirem de mudos ao perceberem a presença de Leila. — Então, se me dão licença.

Dou a volta no carro e abro a porta do passageiro para Leila, fazendo sinal para que ela venha até mim o quanto antes. Hesitando um pouco e sussurrando boa noite para Marcos e minha mãe, ela entra no carro e se afunda no banco. Me apresso para sentar atrás do volante e ligar o motor em seguida, sem me dar ao trabalho de sequer me despedir de ninguém. Não quero ficar mais um segundo aqui ouvindo as besteiras que Marcos e minha mãe estão dizendo e nem quero brigar com nenhum dos dois depois do estresse que passei durante todo o dia.

Não há o mínimo barulho no interior do carro conforme avanço pela pista, me distanciando rápido da casa do meu avô. Não liguei nenhuma música, não disse nada desde que estamos Leila e eu sentados aqui. Nunca fiquei tão grato por ela não falar comigo além do estritamente essencial, porque não sei o que eu iria acabar soltando se ela fosse o tipo de pessoa que quer saber demais sobre a minha vida.

Eu disse para Leila o que ela precisava saber e isso deveria bastar, porque não é como se nós fôssemos um casal de verdade que compartilha dores e traumas. Leila é quase minha sócia nessa empreitada, e assim como não conto para os acionistas da Eco Habitação que minha mãe e meu irmão me infernizam sempre que podem, não vejo motivos para dar qualquer satisfação pelo que ela viu. E ela nem deve estar muito interessada no assunto de qualquer forma, porque do contrário já teria me perguntado algo.

Eu a ouvi suspirar fundo algumas vezes desde que entramos no carro, mas já faz algum tempo que não ouço nenhum som vindo dela. Tiro os olhos da estrada por um instante para olhar para Leila no banco do carona. A testa dela está encostada no vidro e suas mãos seguram frouxamente o cinto de segurança. Não consigo ver direito seu rosto, mas pela respiração regular consigo perceber que ela está dormindo. Queria fazer o mesmo agora, só me encostar num canto e fechar os olhos. O dia exigiu de mim mais energia do que tenho no corpo e me sinto exausto mentalmente.

Imagino que Leila também deva estar exausta. Ela não parou de conversar um segundo, brincou com as meninas e ainda teve aquela situação toda do noivado na sala. Só de pensar nas vozes da minha família entoando um pedido ordinário para que Leila e eu nos beijássemos, tenho calafrios. Na hora eu não achei que eles fossem pedir por tanto, porque, caramba, eu comprei um anel de brilhantes, me ajoelhei e tudo, então na minha cabeça aquilo deveria ser o suficiente. Mas no fim não foi o bastante e Leila e eu tivemos que quase nos beijar de verdade.

Quase, porque o raspar dos lábios dela nos meus não pode ser considerado nem mesmo um selinho. Entretanto agora, relembrando melhor a cena que tivemos que fazer e do tapa que Leila me deu mais cedo, acaba se tornando inevitável para mim não pensar no que ela estaria disposta a fazer para convencer minha família. Se uma das meninas não tivesse me atingido com aquele tabuleiro, até onde Leila iria?

Piso mais fundo no acelerador, sentindo uma urgência absurda de chegar logo ao bairro de Leila e depois ir para casa. Há coisas demais se passando pela minha cabeça, todas me incomodando mais do que o normal e eu preciso estar sozinho para pensar direito no que fazer. Meu plano era ter terminado tudo na casa do meu avô antes de escurecer, para a uma hora dessas eu estar descansando confortavelmente para uma das semanas mais intensas da minha vida, mas ainda estou nesse carro e é provável que eu pegue algum trânsito.

Preciso ligar para Marcinha, para que ela verifique a disponibilidade dos cartórios para que Leila e eu possamos nos casar o quanto antes. Preciso também pedir alguém para dar uma olhada no quarto de hóspedes, porque faz tanto tempo que não recebo visitas, que é possível que haja coisas a serem ajustadas. No meio disso tudo, ainda preciso fechar alguns contratos importantes para a Eco Habitação, inclusive o contrato com os alemães, que não pareceram tão dispostos a assinar com a minha empresa, e ainda ir a alguns jantares com acionistas do Grupo Torres. É bom que eles se acostumem desde já com minha presença, porque em menos de três meses eu estarei disputando a cadeira da presidência, e em menos de seis meses estarei sentado nela.

Em bem menos tempo do que eu esperava, chego ao cruzamento escuro da entrada do bairro de Leila. Encher minha cabeça com trabalho foi uma boa decisão, me ajudou a aliviar um pouco o estresse e me deu a energia que faltava para que eu finalizasse esse dia infernal.

Estaciono o carro nas sombras da rua quase deserta e desligo o motor, para enfim acordar Leila. Em algum momento, ela deve ter desencostado a cabeça do vidro e tentado endireitar o corpo, contudo o sono pesado fez seu pescoço pender para frente. Espero alguns minutos para que ela acorde por conta própria, já que não há mais o movimento constante do veículo e nem os ruídos do motor, e porque perco a coragem de sacudi-la para dizer que chegamos.

Todas as vezes que me encontro com Leila, ela parece tão cansada, que me pego perguntando se esse cochilo no caminho entre a casa do meu avô até aqui é o máximo que ela dormiu em dias. Essa menina perdeu o emprego, estava para desistir da empresa e eu ainda a meti no meio dos meus problemas. Só esses três eventos isolados seriam o suficiente para esgotar qualquer pessoa, todos juntos, então...

Seja apenas dinheiro ou por sei lá qual motivo que ela tenha para ter aceitado se enfiar nessa comigo, não deve estar sendo nada fácil para ela, e nós mal começamos. Não é problema meu, não a forcei a fazer isso, me repreendo mentalmente. Tiro o cinto e levo uma mão até o ombro dela com a intenção de acordá-la. Tenho mais o que fazer do que ficar aqui esperando que Leila desperte da terra dos sonhos.

— Leila. — Sacudo-a de leve. — Leila, chegamos.

O corpo dela estremece um pouco e imediatamente tiro minha mão de seu braço, afinal não quero correr o risco de ser estapeado de novo. Leila puxa o ar com força e boceja, despertando aos poucos. Ela passa as mãos pelo cabelo desarrumado e se vira para mim, piscando para ajustar a visão ao interior escuro do carro.

— Acho que acabei pegando no sono.

— Você devia estar cansada. — Puxo de volta meu cinto de segurança, me preparando para arrancar o carro assim que ela descer.

Apesar da minha clara disposição para ir embora, Leila não se move. Deve ser o sono, o cérebro dela ainda deve estar lento e não deve ter entendido minha indireta. Giro a chave e ligo o motor, esperando que isso faça com que ela se toque que eu tenho pressa.

Porém, ao contrário do que espero, Leila solta um suspiro resignado e diz:

— Você não precisa me explicar nada se não quiser, não há necessidade nenhuma de ficar tenso desse jeito. Não é como se eu fosse te cobrar alguma coisa.

— Eu não estou tenso. — Rebato, relaxando os ombros no banco. — Só estou com um pouco de pressa.

— Ah, pressa. Tudo bem. — Leila sorri, pouco convencida com minha explicação. — Aqui, pegue. — Ela me estende uma mão aberta.

Uma curiosidade impossível de controlar toma conta de mim e eu até acendo a luz interna do carro para ver o que ela tem na mão. Contudo, mais confuso do que Leila me dando alguma coisa, é ela estar devolvendo o anel de brilhantes. Tenho um péssimo pressentimento com aquela súbita atitude dela. Durante todo o dia tive a impressão de que cometi sucessivos erros e não posso evitar achar que Leila quer jogar tudo para cima agora.

— Por que você está fazendo isso? Você não está desistindo, está? — As palavras saem abafadas da minha boca.

Leila balança a cabeça em negativa, esboçando um mínimo sorriso.

— Claro que não. Eu só não acho que você espera mesmo que eu fique com isso, né? — Ela estende o braço e puxa minha mão, depositando o anel nela. — E me desculpe de novo pelo tapa.

Ela passa a alça da bolsa pelo ombro e puxa o vestido para cobrir melhor as pernas, se preparando para descer do carro. Se Leila ao menos soubesse que fiquei até tarde ontem dentro de uma joalheria, atrapalhando todos os funcionários que queriam fechar a loja apenas para escolher esse anel, ela não pensaria duas vezes antes de aceitá-lo com um sorriso no rosto.

— Leila, nós dois ficamos noivos, é normal que a noiva use um anel de noivado, não?

Leila para com a mão na trava da porta do carro e olha para o anel, preso entre meus dedos indicador e polegar. Ela faz uma careta, comprimindo os lábios em desgosto. Trago o anel para mais perto dos olhos, analisando os pequenos brilhantes ao redor do arco de ouro branco e a pedra translúcida no centro. Parece um anel bonito para mim, e a vendedora me garantiu que qualquer mulher que ganhasse um anel desses iria gostar. É possível que eu tenha errado tanto assim ao escolher algo para Leila?

— Você não gostou do modelo? Dá para trocar se você quiser, eu só preciso pegar a garantia em casa e aí você vai até a loja e... — Paro de falar ao perceber que ela está rindo. — O que foi?

— Esse anel é mais bonito do que muita gente, Danilo. Como você pode achar que eu não gostei do modelo?

— Então por que você está me devolvendo?

— Porque não acho certo ficar com isso. Temos um contrato e ele é bem claro, então eu só vou aceitar de você o que está escrito no nosso acordo. E no mais, como eu vou andar por São Paulo com isso no dedo? Vou acabar ficando sem o anel e, de quebra, sem o dedo.

Dou de ombros, mesmo sabendo que ela tem razão.

— Venda isso depois e compre um carro popular, então você não vai precisar andar pela cidade de ônibus ou metrô.

— Você está me dizendo que isso é tão caro quanto um carro? — Leila arregala os olhos, inclinando-se para mais longe ainda do anel. — Agora que eu não posso mesmo ficar com isso!

— Não importa o preço. É um anel de noivado e minha família me viu colocando isso no seu dedo. E se um deles ver você por aí sem isso?

— Danilo, pelo que você disse, nos casamos domingo que vem. Nem tinha necessidade dessa formalidade toda, para começo de conversa. — Ela argumenta, mais uma vez com total razão.

Olho para o anel entre meus dedos e me vejo de volta à sala da casa do meu avô. Eu quis exagerar, fazer uma cena romântica, como meu avô provavelmente faria se pudesse voltar no tempo. Escolhi esse anel pensando em como minha família reagiria ao me ver completamente devotado à uma mulher e em como esse impacto iria refletir positivamente na minha escalada rumo a presidência. Entretanto, não posso ignorar que ao olhar modelo por modelo dos anéis de noivado na joalheria, me peguei pensando em Leila também. É que ela é sempre tão prática e simples, direta e igualmente reticente, que talvez minha maior dificuldade naquilo tudo tenha sido escolher um anel que combinasse com o estilo dela. Não que isso seja um presente, longe de ser isso, mas o que ela espera que eu faça com esse anel agora? Eu nem preciso de um carro popular!

Por algum motivo esses pensamentos me deixam desconfortável de novo. Escolher aquela porcaria brilhante deu trabalho demais para que ela simplesmente se recuse a ficar com ele. Alcanço a mão direita de Leila, disposto a fazê-la ficar com o anel, ela querendo ou não.

— Eu dei para você, então ele é seu. — Abro a mão dela dedo por dedo.

— Para com isso! — Leila tenta livrar a própria mão.

Puxo-a de volta com um pouco mais de força, o que faz seu corpo inteiro se inclinar para frente, ficando a centímetros do meu. Ela me olha com aquela mesma expressão assustada do jardim, como se esperasse que eu fizesse qualquer coisa sem seu consentimento. Me sinto até ofendido pela quantidade de besteiras que essa mulher pensa ao meu respeito.

— Você que sabe se vai usá-lo, jogá-lo fora ou dá-lo a alguém. — Deslizo o anel por seu anelar, girando o aro para que a pedra fique perfeitamente centralizada. — É seu, se vira!

Solto a mão dela e volto-me para o volante, buscando manter alguma distância, por mínima que seja. Tivemos um dia cheio de mal entendidos e não posso correr o risco dela entender mais alguma coisa errada.

— Como eu disse, eu estou com um pouco de pressa. Sansão ficou sozinho o dia todo, deve estar sentindo minha falta e comendo meu sofá nesse momento. — Digo, me arrependendo um segundo depois. Sansão e meu sofá também são coisas que Leila não precisa saber e que eu não tinha necessidade de contar.

— Ah, claro, claro. Você deve ir logo, então. — Leila destrava a porta do carro e salta para fora. — Boa noite! — Ela se despede antes de fechar a porta com muita força de novo. Até o fim desse contrato eu terei que comprar outro carro.

Só quando Leila se distancia e começa a subir a rua que eu consigo respirar de novo. Acho que ela também tinha razão quando disse que eu estava tenso. Estou realmente muito tenso e isso é culpa da minha mãe e de Marcos. Não há uma única vez que eles não me tiram do eixo e me fazem duvidar até de mim mesmo.

Pelo menos o que eu disse sobre Sansão é verdade. Cachorros são animais carentes e Sansão tem mania de aprontar se passa muito tempo sozinho. A noite que passei com Simone Lisboa resultou em xixi de cachorro no meu carpete e não quero nem pensar no que ele pode estragar hoje se eu não aparecer em casa nas próximas horas.

Confiro se Leila ainda está por perto, não vendo nem sinal dela rua acima. Ela já deve estar em casa uma hora dessas e eu devia fazer o mesmo: ir para casa, tomar um banho e pensar.

Meu celular está vibrando sem parar no suporte do carro desde que saí do bairro de Leila para vir para casa. Dei uma espiada nele em um sinal, quando me lembrei de ligar para minha secretária verificar a disponibilidade dos cartórios amanhã bem cedo, e vi por alto que a vibração maluca do meu celular se trata de mensagens de Andressa, o que significa que não é importante. Estou decidido a deixá-la no vácuo pelo menos até amanhã, mas mais mensagens chegam e desta vez há mensagens de Tales também.

Deslizo o dedo pela tela assim que entro em casa, me abaixando para fazer um carinho em Sansão, que já corre pela sala ao meu encontro. Há 54 mensagens não lidas de Andressa e outras 13 de Tales. Os dois devem estar juntos agora, então tanto faz responder qualquer um deles, por isso abro as mensagens dela primeiro.

Quase caio de costas ao ver um verdadeiro álbum de fotos do meu pedido de noivado. Há de tudo entre as fotos, inclusive o momento fatídico em que Ana Clara me atingiu com o tabuleiro de damas e a minha cara vermelha por causa da dor. Passo as fotos, dando zoom no meu rosto e me convencendo de que não há uma única imagem que preste.

Algumas fotos estão borradas, outras não têm foco ou estão escuras demais. Estou para digitar para Andressa que como fotógrafa ela é uma ótima médica, quando passo por uma foto em que Leila está segurando meu rosto. Obrigada, você foi minha melhor escolha, foi o que ela disse nesse exato momento, como se ela realmente tivesse escolhido estar ali.

Ainda assim acho uma foto boa, ela é bem convincente e pode ser útil. É esse o tipo de foto que os casais colocam na tela dos celulares e talvez seja bom que Leila e eu façamos isso em algum momento, até porque tirando essas fotos horrorosas que Andressa tirou, nós dois ainda não temos nenhuma prova da nossa vida como casal.

Encaminho a foto para Leila, explicando que Andressa tirou outras e que, caso ela queira, posso enviá-las também, apesar de estarem péssimas. Um segundo após ter clicado em "enviar", ouço um som de notificação desconhecido vindo de um dos meus bolsos da frente da calça. Não, não é possível! Exalo o ar dos pulmões, me sentindo o ser humano mais estúpido da face da Terra.

Puxo na memória os momentos antes da confusão com o não-beijo no jardim e percebo que eu me esqueci completamente de devolver o celular para Leila. Pego o aparelho do bolso, que brilha com uma notificação de "Dr. Danilo Torres" na tela rachada. Franzo a testa para aquilo. Se alguém pegar o celular dela vai achar que sou seu patrão, não seu noivo.

Deslizo o dedo pela tela do celular de Leila, que rapidamente muda para que eu insira a senha. Isso é o suficiente para que eu me lembre que tenho uma consciência e que não devo mexer no celular dos outros. Bloqueio a tela, porque é o certo a se fazer, mesmo que eu queira ver a foto do papel de parede sem nenhum ícone que atrapalhe. Percebi que são inúmeras lâmpadas penduradas em uma sala escura, iluminando parcialmente alguém sentado no chão. Aperto o botão de ligar/desligar para acender a tela novamente e ter certeza de que é Leila a pessoa na foto da tela. Porém, assim que faço isso, o celular começa a tocar com uma ligação.

Não sei se devo atender, não parece o correto, principalmente porque o nome que aparece na tela é de uma tal "Bruna prima", e pelo que eu pude ver pelas notificações haviam outras ligações perdidas do mesmo número. Leila não queria que a família dela soubesse de nós dois e eu não quero causar mais problemas.

Mas pensando bem, se esse número que está ligando é de uma parente dela, pode ser essa a única forma de avisá-la de que o celular está comigo.

— Alô? — Digo, atendendo a ligação por fim.

Danilo? Ai, graças a Deus! — A voz de Leila soa do outro lado da linha. — Você já chegou em casa?

— Acabei de chegar e de descobrir que o seu celular ficou comigo.

Droga! Eu precisando dessa porcaria e o esqueço com você. Droga!

— Se você quiser, posso levar para você.

Ah, não, não precisa! Amanhã quando eu for trabalhar eu dou um jeito de pegar com você na Eco Habitação.

— Ou eu posso levar para você na E. M. A que horas você vai estar lá?

Não precisa... — A voz dela é cortada momentaneamente pelo alerta do celular de que a bateria está para acabar.

— A que horas, Leila? — Insisto. — Não vai me custar nada fazer isso.

Ela deixa escapar um suspiro resignado.

A partir das dez da manhã, se eu não me atrasar. Você sabe onde fica ou quer que eu te passe o endereço?

— Eu pesquiso na internet! — Solto uma risadinha, me lembrando de todas as vezes que ela fez questão de ressaltar que sabia muito da minha vida por causa das pesquisas na internet.

Ah, certo, então. — Leila ri também, provavelmente se lembrando da mesma coisa que eu. — Só me faz mais um favor?

— O quê?

Não atenda meus pais se eles ligarem. Eles vão achar estranho um homem que não seja Jonas ou o filho da minha tia atendendo meu celular e isso vai se tornar uma bagunça.

O tom hesitante dela liga um alerta na minha cabeça. A confiança dos pais é uma coisa importante para Leila e ela já deixou isso bem claro para mim mais de uma vez. Tudo bem que eu já esperava que ela fosse me dar algum tipo de recomendação, mas ainda assim ouvir que de tudo que não posso fazer estando com esse celular, o fundamental é não atender a ligação da casa dela, me deixou meio incomodado, especialmente depois do bate-boca que tive com a minha própria família.

Limpo a garganta e abro um sorriso, consciente que ela não pode vê-lo.

— Pode deixar, vou cuidar bem do seu celular.

Perdi as contas de quantas vezes o alarme do meu celular disparou e silenciou sozinho, sem que eu movesse um dedo para me levantar. Sansão está encolhido como uma pequena bola aos meus pés, e apesar de eu saber perfeitamente que já é hora de me levantar e começar o dia, continuo deitado de bruços com os olhos bem fechados.

Não sonhei durante a noite e nem mesmo gastei mais do que dois minutos para pegar no sono, entretanto ainda me sinto pesado e cansado. Há uma voz implicante na minha cabeça insistindo para que eu acorde logo, porque as coisas não vão se fazer sozinhas, mas eu simplesmente a ignoro, como ignoro o alarme do meu celular.

As pausas entre um alarme e outro são substituídas pelo toque irritante de chamadas. Afundo o rosto nos travesseiros e aperto as mãos sobre as orelhas, para ignorar o som estridente. Tudo bem que já deve passar das 8h00, mas isso não quer dizer que eu já esteja disponível. Todavia, seja lá quem for que esteja me ligando a essa hora, a pessoa não parece muito a fim de desistir. Que inferno, eu sei que preciso trabalhar! Há os contratos com os alemães para fechar e eu preciso dar o aval no último projeto que Alexandra deixou sobre a minha mesa, além de ir até a E. M. devolver o celular para Leila.

Leila! Pensar nela me lembrou de algo urgente que tenho que resolver o quanto antes. Somente Marcinha tem coragem de me ligar tantas vezes assim e ela deve estar me ligando desesperada depois de ter visto a mensagem que enviei ontem à noite pedindo para que ela verificasse a questão dos cartórios.

Rolo de um lado para o outro e estendo minha mão para pegar o celular sobre a mesinha ao lado da cama. Ainda sonolento, deslizo o dedo pela tela e atendo:

— Espero que você tenha ligado para dizer que está tudo certo para meu casamento com Leila no domingo!

Casamento? — Ela responde estranhamente rouca.

— É, criatura! Você não leu minha mensagem? — Esfrego os olhos, sentindo os passinhos de Sansão se afundando no colchão.

Sento-me com as costas apoiadas na cabeceira da cama e abro os braços para que meu cachorro se aninhe no meu colo. Ele fez o favor de não estragar nada em casa ontem, por isso fiz a besteira de deixá-lo dormir aqui por gratidão. Minha mãe não está tão errada quando diz que eu mimo demais esse cachorro.

— Como assim casamento com Leila? Quem está falando? — A voz rouca de uma mulher responde de novo. Agora mais desperto, consigo identificar que o tom sequer se assemelha à voz de Marcinha que ouço há anos.

Tiro o celular vagarosamente da orelha, para ter a confirmação do tamanho da merda que acabei de fazer. O toque do celular nem mesmo era o que eu uso, a tela do aparelho na minha mão está trincada e a chamada é identificada com o nome "mãe" seguido de um coração. Eu já cometi alguns erros na vida — alguns muitos erros, na verdade —, mas nunca me senti tão idiota em toda minha existência como agora.

Alô? Quem está falando? — Ouço a voz da mãe de Leila soar pela saída de som do celular.

— Eu sou... Sou... — Não sei o que dizer. Não sei nem o que sou de Leila para me apresentar à mãe dela, principalmente depois de ter soltado sem querer sobre o casamento.

Quem é? Onde Leila está? Por que você atendeu o celular dela?

— Eu sou um amigo dela. Leila esqueceu o celular comigo ontem...

Como assim esqueceu o celular com você? O que você é dela para falar de casamento?

Aperto meus olhos, sem saber o que fazer.

— Casamento? Não, senhora, eu não disse casamento, a senhora se equivocou. O sinal de celular aqui é meio ruim... shhh... shhh... — Emito alguns sons ridículos, sacudindo o cobertor, para dar a impressão de que a ligação está prestes a cair. — A senhora vai poder falar com Leila depois das dez. Eu digo que a senhora ligou, certo? Tenha um bom dia! — Disparo, apertando o botão de desligar em seguida, ainda ouvindo a mãe dela gritar "alô? O que está acontecendo?!".

De todas as coisas que Leila poderia ter me pedido para não fazer estando com seu celular em mãos, ela me pediu para não atender as ligações da família dela e foi justamente o que eu fiz. Meu Deus, eu estou ferrado! Tão ferrado!

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