You Are A Cosmic Child | taek...

By mutacyon

45.5K 5.3K 9.3K

Jeon Jeongguk era muito novo quando decidiu percorrer o sonho americano. Ele conseguiu um restaurante, um apa... More

00; avisos
02. born to be wild
03. blue moon
04. renegades
05. je te laisserai des mots
06. a sunday kind of love
07. heartbreak warfare
08. coraline
09. nothing can change this love
epílogo. here comes the sun

01. young folks

7.1K 762 997
By mutacyon

NOTAS (abram os comentários)


tag no twitter #yacctaekook


não esqueçam de comentar e, se quiserem entrar na vibe da fic, coloquem para tocar a música que está na mídia <3


Em algum lugar da rota 66, o calor era simplesmente insuportável.

Jeongguk sentia o cheiro da poeira e da maldita gasolina que pingava do escapamento do seu carro. Em outras condições, se ele não estivesse intensamente focado em esquecer tantos problemas que surgiram em tão pouco tempo, estaria apreciando verdadeiramente a liberdade que a combinação desses dois cheiros proporcionava.

Ele tinha uma garrafa de energético na mão livre. Estava dando goles tão curtos que a garganta praticamente fingia que eles não estavam descendo. No rádio, alguma coisa country tocava, algo bem próximo das músicas que Alice, sua ex-namorada ruiva de sorriso encantador, costumava escutar quando estava deitada no chão da sala do apartamento que dividiam na Pensilvânia, anos luz de distância de onde estava agora.

Uma respiração frouxa e esganiçada escapou de seus lábios secos. Isso se chamava frustração. Jeongguk estava absurdamente frustrado e absurdamente desesperado para sentir alguma coisa diferente disso. A estrada, dividida entre laranja, amarelo e azul, pareceu uma boa ideia quando suas mãos começaram a preencher uma bolsa de couro com todas as suas roupas mais leves, decididas de que precisavam abrir a porta com uma rachadura em formato de estrela e apreciar um ar diferente e menos sufocante, ainda que toda a poeira que entrava pela janela fosse sufocante na mesma medida.

Mas sabe como é, seu ar-condicionado estava quebrado e Jeongguk também estava, sendo obrigado a dirigir de vidros abaixados para não desmaiar de tanto calor.

Seus olhos vagavam pelo cenário. Não era um bonito para a grande maioria dos moradores da Califórnia. Tinha muito cacto, muita planta morta, árvores secas e estranhas e estabelecimentos abandonados. Os postos de gasolina não tinham mais cor e era como se um tornado tivesse passado por ali e destruído tudo, deixando de brinde fissuras infinitas que fariam um pé — ou uma roda muito azarada —, tombar.

Entretanto, Jeongguk gostava daquilo. Ele gostava dos postos, mesmo que todos eles lembrassem um conto trágico do Stephen King, porque pareciam enormes e inabaláveis mesmo depois de tantos anos apenas parados. Ele também gostava dos cactos que mais se pareciam cinzas e não verdes, porque eles diziam que a vida nascia até mesmo em uma terra tão arenosa. Ele também gostava das árvores, porque todas elas pareciam acenar gentilmente.

Mas, principalmente, Jeongguk gostava do céu. Era um azul vibrante e sólido, com poucas nuvens vagando de um lado para o outro. O sol batia diretamente em seus olhos, mas isso não importava, não quando ele era um círculo brilhante bem no meio daquela infinidade azul e pacífica e trazia um conforto que Jeongguk não sentia desde que tivera a belíssima ideia de sair da Coreia para morar nos Estados Unidos.

Não estava vivendo o sonho americano e o céu sabia disso. Por achar que ele sabia disso, Jeongguk se achava menos recluso e mais aberto, mais sensível a desabafos e mais... Como Alice vivia dizendo, confiável.

Confiava seus segredos aos céus e isso era bom.

Em certo momento, entre uma última golada do energético e o início do pôr-do-sol, Jeongguk se questionou o que de fato estava fazendo ali, tão longe de sua casa. Ele não tinha uma resposta, não quando seu coração dizia que ele simplesmente precisava estar ali, olhando o cenário correndo loucamente pelas suas pupilas agitadas, sentindo a poeira grudando em sua testa repleta de suor, aspirando a gasolina que não parava de pingar e apertando o volante com raiva. Ele precisava apreciar essas coisas e perceber que o mundo jamais pararia de girar, muito menos empurraria seu corpo em direção ao sucesso.

O cenário correria para sempre, a poeira grudaria até mesmo em seus olhos e a gasolina sufocaria seu olfato. Enquanto isso, restava a Jeongguk continuar e continuar, pisando sempre no acelerador e não deitado no sofá xadrez que foi levado por Alice semana passada. Era isso, Jeongguk aprenderia a lidar com essa nova perspectiva com o tempo, quando terminasse a rota e descesse no porto de Santa Mônica.

Dirigindo tranquilamente pela estrada vazia, Jeongguk escutou um pássaro grasnando ao longe e, quando o pássaro grasnou, o carro diminuiu a velocidade sozinho, parecendo murchar em cima das rodas.

— Só pode estar de brincadeira comigo — resmungou, desesperado, arregalando os olhos e sentindo os óculos derretendo pelo nariz. — Não, não, não... Deus, por favor, não faça isso comigo!

O céu passou de laranja e lilás para laranja e azul oceano em um piscar de olhos, deixando Jeonguk completamente sozinho e encrencado no meio do nada. Ele dirigiu o máximo que conseguiu, balançando o volante de um lado para o outro e tentando fazer o que quer que tivesse dado errado evaporar, mas isso só não funcionou, porque aparentemente o destino odiava Jeon Jeongguk.

O carro parou em certo momento. Jeongguk deu a partida e pisou na embreagem, mas nada aconteceu, o motor apenas roncou e morreu, fazendo o suor escorrer mais grosso pela sua nuca.

— Filho da- — Parou, respirando fundo e massageando a ponta do nariz com os dedos trêmulos. Jeongguk não desistiria da tentativa de não se estressar, ele não fracassaria em mais uma missão, não mesmo. — Filho de uma belíssima mãe!

Saiu do carro e bateu a porta, analisando a situação. Saía muita fumaça do capô e Jeongguk deu alguns passos para trás, temendo uma explosão. Ele olhou ao redor, vendo pequenos pontos de luz mais adiante.

Não sabia o que era, mas além de tentar fazer uma ligação, o que mais Jeongguk poderia tentar?

O ar abafado, em conjunto com uma irritação latejante, fez Jeongguk mentalmente agradecer por pelo menos estar usando uma roupa confortável. Não que estivesse acostumado a usar regatas e muito menos que algum dia considerou que um estilo assim combinaria com seus óculos de aro redondo e preferências clássicas. Mas, sinceramente, não era como se o mundo estivesse seguindo seu curso natural de sempre. Jeongguk tinha idealizado uma boa vida, com aspirações valiosas, porque foi desse jeito que seu pai havia lhe ensinado a pensar grande. Então, depois dos inúmeros banhos de água fria, esperar que, ao menos um pouco do que tinha, pudesse voltar, era sonhar demais. Era ser estúpudo e Jeon Jeongguk não era estúpido. Pelo menos isso, não caindo em completo desespero, ele tentava segurar entre os dedos.

Ainda existiam chances por ali. A vida não poderia se resumir a isso, a todo esse desgaste emocional regado a dramas familiares e corações partidos.

Sim, Jeongguk tinha um coração partido batendo dentro do peito e ele sabia o como podia doer, no entanto, respirando realmente fundo, se esforçou para pensar que nada naquele momento seria capaz de estragar sua fagulha de esperança e bom humor. Do que adiantaria se estressar, bater o pé no chão e gritar aos quatro ventos que a vida era uma porra miserável e que o universo inteiro poderia se enfiar em um buraco de lixo e desaparecer? Nada. O que também era triste. O mundo deveria ser mais fácil de ser compreendido. Se fosse, talvez o peito de Jeongguk não estivesse tão apertado.

Olhando o celular, tentando por igual enxergar a tela no brilho máximo, porém apagada pelo sol forte do dia quente, Jeongguk procurou pela internet o número de um mecânico que pudesse resolver seu problema. O sinal era péssimo e, portanto, sua internet se tornava por tabela quase inútil. O símbolo em círculos significava "carregando" e depois de cinco minutos torcendo para que realmente carregasse, Jeongguk desistiu.

Estava quente e o suor acumulado em seu pescoço e têmporas foi o suficiente para tirá-lo de lá. Não foi difícil, ainda bem, encontrar onde descansar e se refrescar.

Definitivamente não era o lugar que o Jeongguk de meses atrás escolheria para frequentar e gastar dinheiro. Ele curtia um clima mais moderno e higiene rígida e aquele bar, de beira de estrada, repleto de vigas de madeira comidas e cheiro de óleo, não pareciam nada com isso. Todavia, aquela era sua única opção perto e água é água, certo? Ele poderia conferir a garrafinha e se ela estivesse totalmente lacrada, então estaria tudo bem. Fácil. Assim esperava.

Ajeitou a mochila nas costas, a que levava para todo lado, somente com os pertences pessoais e dinheiro.

Passando pelas portas estilo velho-oeste, Jeongguk primeiro notou a quantidade exagerada de mesas dispostas. A quantidade era mesmo absurda e elas estavam tão perto umas das outras que quando um dos homens, de bigode russo, balançou o copo gigante de cerveja, o líquido conseguiu respingar quase três mesas adiante. Jeongguk tremeu e tentou ignorar o incômodo abrasivo que lhe subiu pela espinha. De todo jeito, o balcão parecia a melhor opção.

Jeongguk levantou os óculos de sol do rosto e os deixou pendurados na parte de dentro da camisa, pela borda da gola. O suor salpicado em seu rosto foi rapidamente limpo. Ele puxou a ponta inferior do tecido e o levou até as bochechas, limpando os rastros molhados. Por mais feio que isso pudesse parecer a quem olhasse, Jeongguk não estava mais na sua antiga cidade e nem sob os mesmos costumes educados até demais. Sem falar que, fora sua regata, não havia mais nada que pudesse fazer o trabalho.

O barman andava preguiçosamente de um lado para o outro, com um pano quase cinza de tão sujo nos ombros, um sorriso hostil e olhos duros de velhice. As garrafas de vidro escuro brilhavam pouco atrás dele e quando o sol batia sobre elas, as luzes soavam coloridas por toda a bancada e parede. De certa forma, olhando de uma perspectiva feliz, era uma visão bastante agradável de ser vista.

Várias das banquetas estavam vazias, elas se formavam em linha, quase nada reta, mas talvez assim, despojadas, fosse mais fácil de se mover. Jeongguk escolheu uma de espuma amarela. Era a que menos parecia estragada pelo tempo.

Foi um alívio se sentar. Jeongguk até soltou a respiração e puxou de novo o ar, aliviado por descansar as pernas e se permitir sentir o arzinho do ventilador de teto. Ainda que fosse difícil admitir, aquele combo nada típico tinha brilho e despertava um interesse incomum. Ele borbulhava de uma maneira intensa, quase como se Jeongguk fosse uma criança de novo, com sonhos cheios de cores e alegrias inocentes. Era como se, pela primeira vez nos últimos dias, Jeongguk pudesse sorrir com sinceridade.

Usando do otimismo recém adquirido, levantou a mão esquerda e chamou pelo barman. Ele o olhou de volta, se aproximando lentamente, mostrando sua cicatriz no rosto, naquele caso, fora das sombras do bar. Jeongguk tentou não analisar ela demais ao coçar a garganta e pedir.

— Uma água com gás e duas rodelas de limão, com gelo, por favor. — O barman franziu as sobrancelhas e riu rouco, numa voz claramente de alguém que havia fumado durante toda uma vida. Jeongguk se sentiu humilhado pela risada e o deboche claro que o corpo dele estava demonstrando através de seu pedido, quase como se dissesse em silêncio, nós não temos água com gás, garoto. Por isso, apertando os lábios, Jeongguk balançou a cabeça e disse, novamente, com uma entonação ainda mais alta. — Esquece, prefiro uma cerveja, bem gelada.

Dessa forma, levantando os ombros em rendição, ele se virou, pegou um dos copos compridos e grandes do armário de vidro, se aproximou do barril de madeira, levantando a alavanca. O líquido amarelado saiu aos montes, preenchendo quase por completo o espaço disponível, tirando pelo começo, que logo em seguida, virou espuma branca e brilhante. A boca de Jeongguk salivou.

O vidro suava de tão gelado.

Assim que depositado em sua frente, e antes que Jeongguk pudesse dar o primeiro gole, um riso baixo e carinhoso passou raspando delicadamente seu ouvido. Ao olhar para o lado, Jeongguk se deparou com um homem, olhando em sua direção, com o rosto apoiado nas mãos.

— Olá. — Ele disse.

Jeongguk piscou meio confuso e fascinado.

— Olá...? — Olhou para todos os lados sem mover a cabeça, desconfiado de que pudesse estar sendo enganado. Deu um gole na cerveja, fazendo uma careta. Jeongguk não gostava de cerveja. — Argh.

O homem sorriu, tranquilo. Jeongguk não quis reparar tanto nele, mas acabou reparando, porque aqueles olhos pequenos e puxados eram muito charmosos e estavam perigosamente grudados dentro dos seus.

Jeongguk pensou que ele era bonito. Muito bonito, para ser sincero. Ele tinha lábios marcantes com formato de coração e uma pele dourada que brilhava tentadora sob a luz fraca do bar. A expressão daquele rosto era pacífica, mas um pouco alcoolizada, e Jeongguk sentiu o cheiro de vodca nele, os reflexos singelos da bebida deslizando pelas curvas do queixo. Alcoolizado ou não, ele continuava sendo muito bonito, um dos homens mais impressionantes que Jeongguk já tinha visto na vida.

— Você quer trocar de bebida? — Ele sussurrou ao se inclinar, apontando discretamente para o barman de costas para o balcão. Tinha uma sobrancelha grossa erguida em malícia, uma malícia infantil. — Aposto que ele nem vai perceber.

Jeongguk olhou para a própria mão segurando a garrafa de cerveja e depois para o copo do desconhecido. Era um líquido rosa bem forte e Jeongguk preferia os destilados, mas era um copo que tocou a boca de uma pessoa qualquer, Jeongguk jamais aceitaria beber ali, sem saber se estava livre de doenças.

— Não, obrigado — disse. — Eu vou ficar com a cerveja mesmo.

O homem riu baixinho, balançando de leve a cabeça. Jeongguk reparou que o cabelo dele era em um tom de mel chamativo. O corte parecia com o do grande galã James Dean, só que mais moderno.

— Suco de cereja é muito bom. — Ele se aproximou sorrateiramente, pulando uma banqueta para ficar ao lado de Jeongguk. O homem apoiou os cotovelos no balcão e observou seu rosto com fascínio, parecendo distraído nos detalhes dele. — Não sabe o que está perdendo. O nome dessa bebida aqui é Cosmic Child.

Jeongguk não disse nada, e quando não disse nada, o homem deslizou uma das mãos para o próprio peitoral, abrindo um botão da camisa amarela repleta de desenhos de cactos coloridos. Ele estava usando uma jaqueta de couro sintético que não fazia sentido no meio de todo aquele calor e Jeongguk se perguntou o porquê de ele simplesmente não tirar a jaqueta, ao invés de abrir o botão, mas seus olhos caminharam pelo pedaço dourado de pele e seus pensamentos julgadores se calaram.

— É sim. — resmungou, ligeiramente afetado.

— Taehyung. — O homem estendeu uma mão em sua direção, exigindo um cumprimento. — Taehyung. Kim Taehyung. — Ele lhe lançou uma piscadela, assumindo um tom de voz mais grosso e profundo. — Como o James Bond, sabe?

— Ahn... — Jeongguk franziu as sobrancelhas, mas não pegou na mão do, agora, Taehyung. — Jeon Jeongguk.

— Jeongguk... — Taehyung saboreou seu nome na língua e foi só então que Jeongguk percebeu como a voz dele era atraente. — Jeongguk, sabe no que eu estava pensando mais cedo?

Jeonguk pensou em levantar e sentar em alguma mesa bem nos fundos. Ele até colocou um pé no chão e apertou o copo de cerveja com força entre os dedos fracos para poder sair sem deixá-lo escorregar, mas então Taehyung assumiu olhos de um cachorrinho pidão e Jeongguk bufou internamente, sentindo dó de um completo desconhecido.

Voltou ao lugar, fazendo esforço para não deixar o rosto assumir a carranca de sempre.

— No que você estava pensando, Taehyung?

Ele abriu um sorriso iluminado, girando de um lado para o outro na banqueta.

— Em como o Shakespeare poderia ser um escritor de novelas mexicanas!

Jeongguk não entendeu. Se foi uma piada, ele definitivamente não entendeu.

— O quê?

— Romeu e Julieta parece com Pérola Negra, uma novela que eu assistia quando criança. — Taehyung parou de girar, olhando para cima como se pensasse profundamente. — Era o único canal que funcionava na minha casa e na época eu não entendia nada, mas aprendi a dizer "estou com fome" em espanhol.

A carranca finalmente apareceu, fazendo Taehyung rir.

— Eu sei sim! — Ele continuou, animado de um jeito estranho. Quer dizer, estava calor, o bar era fedorento e a cerveja não era boa, então de onde vinha todo esse bom humor? — Se diz "tengo fomita". Legal, né?

E foi aí que Jeongguk gargalhou pela primeira vez, porque Taehyung definitivamente não sabia nem o básico do espanhol.

— Não, não — repreendeu, balançando de leve a cabeça. — Não é assim, é "tengo hambre". Entendeu?

Taehyung não se abalou, ele deu mais um gole na Cosmic Child e prendeu o lábio entre os dentes, tentando disfarçar que não conseguia parar de se aproximar.

— Eu passei tão perto que nem deu para notar a diferença. — Ele suspirou, dramático, e segurou o peito com uma mão. — Você só deve ser muito observador, como as formigas costumam ser quando fazem trilhas.

Jeongguk fez outra careta, mas seu sorriso não diminuiu.

— Elas literalmente andam no meio da calçada, são pisoteadas todos os dias.

Taehyung arregalou os olhos, afetado, e recuou um pouco.

— Tenho certeza que você era o tipo de criança que queimava as formigas com uma lupa!

Jeongguk sentiu as bochechas queimando, porque ele era exatamente esse tipo de criança. Certa vez, durante um ápice de curiosidade, queimou o próprio joelho para descobrir se a luz atravessando a lupa era realmente quente como diziam. Ele nunca mais matou as formigas depois disso, traumatizado demais com a marquinha que ficou em sua pele.

Pensou em contar isso para Taehyung, mas ficou com medo de ser feito de chacota.

— Você é um ativistas de formigas, Taehyung?

Taehyung empurrou Jeongguk de leve com o ombro e o toque foi gostoso, mesmo sendo de um desconhecido.

— Não, só de golfinhos roxos.

Jeongguk ficou confuso enquanto observava Taehyung tirando a jaqueta. Os braços dele eram repletos de tatuagens, todas coloridas demais e sem sentido nenhum. Taehyung apontou para um golfinho roxo mostrando a língua no antebraço. Abaixo dela, a frase "demitido sim, hétero não".

Abriu a boca para perguntar o que significava, mas o couro voltou a cobrir tudo. Jeongguk encarou Taehyung, notando um brilho triste dentro dos olhos amendoados. Quis saber o que tinha acontecido, pensou em fazer uma piada sobre, mas Taehyung abaixou um pouco a cabeça, cutucando o copo de suco de cereja com as unhas bonitas.

— Gosto de Shakespeare. — Ele disse, mudando de assunto. — E gosto de Romeu e Julieta.

— E de Pérola Negra também, imagino?

Taehyung soprou um riso sem humor, então Jeongguk se calou, observando-o em silêncio.

O que tirou Jeongguk e seu olhar perdido de Taehyung e todas as peculiaridades intensas e vibrantes que o rondavam, foi o barulho expansivo da buzina do lado de fora do salão. O som, alto ao ponto de fazer o corpo do barman, comumente carrancudo e irritado, pular para o lado em espanto, ativou todas as terminações nervosas do cérebro paranóico e tenso de Jeongguk. Ele sempre fora maníaco, cheio das manias mais absurdamente irritantes possíveis. Como passar desodorante duas vezes só porque não tinha certeza se tinha passado da primeira. Ou, limpar a borda de todas as travessas de comida, porque é nojento puxar a tampa e sentir os restinhos nos dedos. E definitivamente, ele odiava com todas as forças quem lambia a tampa do danone. Céus, ele podia contar nos dedos as vezes que quase morreu internamente quando Alice resolvia fazer isso, com o maior sorriso de satisfação do mundo. Então, definitivamente aquele chiado estrondoso o fez imaginar um milhão de cenários horripilantes envolvendo morte e seu carro amassado.

Taehyung se inclinou para trás assustado com a movimentação brusca de Jeongguk. Depois disso, a única parte que ainda o lembrava de que tinham tido aquele momento juntos, era o corpo com cerveja ainda quase cheio e seu perfume limpo e cítrico misturado de suor.

Jeongguk correu para fora, com os pés dormentes e deslizantes pelo sapato molhado. Seu coração tinha voltado a bater rápido, e quebrado, dentro do peito. A melodia que a pulsação fazia era de pura agonia e pesar.

Entretanto, certamente nada nesse mundo superaria o choque no rosto de Jeongguk ao se deparar com seu carro, o seu carro, sendo rebocado sem o menor cuidado. As correntes, presas a um caminhão grande, puxavam a borda da lataria por guinchos maldosos e perfurantes. Jeongguk poderia infartar só de pensar nos arranhados que aqueles movimentos bruscos estavam fazendo na pintura novinha preta e polida.

Jeongguk correu até a porta semi-aberta do caminhão, se deparando com um homem barrigudo e de boné azul, estampado com o logo de algum time de futebol americano.

— Ei! — gritou. — O que estão fazendo? Esse é o meu carro!

O segundo homem, que até então Jeongguk não tinha notado, apareceu dentro do caminhão também, sem boné e com um cabelo bastante comprido.

— Só estamos fazendo nosso trabalho, campeão.

Jeongguk riu totalmente descrente. — E qual é o trabalho de vocês?

Era impossível de imaginar o quão ruim sua vida poderia ficar em questão de segundos. Além de um carro quebrado, Jeongguk agora teria de aturar essa falta de respeito tremenda.

— Seu carro estava estacionado em local proibido. — O homem de boné puxou um cigarro do bolso e o acendeu. — Só estamos rebocando ele.

Só estamos rebocando ele?!

Jeongguk teria uma síncope. Isso não era nem mais uma suposição. Era um fato.

Jeongguk teria uma síncope.

— Vocês não podem fazer isso! Meu carro emperrou, eu estava esperando um mecânico! — Ainda que parte disso fosse verdade e a outra mentira, porque Jeongguk não tinha chamado mecânico nenhum. Mas quem poderia culpá-lo? Ele tinha se esquecido, totalmente perdido nos olhos de Taehyung e sua conversa viciante e sem sentido.

— Vamos, Chester. — Ignorando Jeongguk, os dois deram partida, arrastando o carro sem cerimônias para longe.

Jeongguk ficou para trás, com a boca aberta, mãos na cintura, bufando até não aguentar mais, sem ter certeza do que faria. Ele sequer sabia para onde estavam levando seu carro. Era tão absurdo.

Demorou um segundo e meio para Jeongguk gritar um grande "vai se foder" ao vento quando tomou consciência de que suas malas tinham ido junto do carro e ele só tinha agora sua mochila nas costas.

Sentindo uma frustração além do comum, Jeongguk passou as mãos pelo rosto, praguejando, sendo incapaz de sentir Taehyung se aproximando. Ele abaixou o corpo, para falar bem rente ao ouvido de Jeongguk.

— Eu posso te dar uma carona, se quiser.

.

As pessoas costumam desaparecer, ninguém irá me surpreender a menos que você o faça.


NOTAS (abram os comentários)


Continue Reading

You'll Also Like

1.2M 67.8K 84
Grego é dono do morro do Vidigal que vê sua vida mudar quando conhece Manuela. Uma única noite faz tudo mudar. ⚠️Todos os créditos pela capa são da t...
5.6K 755 12
Por mais que você espere que seja só outro dia normal, sempre há aquela possibilidade de um cometa estar de passagem pela órbita da Terra e proporcio...
1.1M 157K 48
POLICIAL | AÇÃO | MISTÉRIO | DRAMA [LIVRO FÍSICO PELA EDITORA EUPHORIA] Taehyung era considerado muito novo para o sucesso que alcancara tão depress...
1.1M 65.6K 47
Atenção! Obra em processo de revisão! +16| 𝕽𝖔𝖈𝖎𝖓𝖍𝖆 - 𝕽𝖎𝖔 𝕯𝖊 𝕵𝖆𝖓𝖊𝖎𝖗𝖔| Fast burn. Mel é uma menina que mora sozinha, sem família e s...