O Que Fizemos Naquele VerĂŁo

By escritora_biaaguiar

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[+18] đŸ„‡ 1Âș LUGAR NA CATEGORIA LGBTQIA+, NO CONCURSO BIGBANG. Naquele verĂŁo, elas estavam no lugar errado, na... More

Notas Iniciais
DedicatĂłria
EpĂ­grafe
PrĂłlogo
PARTE I
CapĂ­tulo 1
CapĂ­tulo 2
CapĂ­tulo 3
CapĂ­tulo 4
CapĂ­tulo 5
CapĂ­tulo 6
CapĂ­tulo 7
CapĂ­tulo 8
CapĂ­tulo 9
PARTE II
CapĂ­tulo 10
CapĂ­tulo 11
CapĂ­tulo 13
PARTE III
CapĂ­tulo 14
CapĂ­tulo 15
CapĂ­tulo 16
CapĂ­tulo 17
CapĂ­tulo 18
CapĂ­tulo 19
CapĂ­tulo 20
CapĂ­tulo 21
CapĂ­tulo 22
EpĂ­logo
Notas Finais
EXTRA!
Agradecimentos
Continue acompanhando!

CapĂ­tulo 12

98 14 0
By escritora_biaaguiar

Julia xingou ao notar que acordara cedo outra vez e coçou os olhos entediada. Sentindo o corpo pesado, ela se levantou devagar e desceu a escada do beliche para constatar o que já imaginava: June não estava. A cama vazia estava arrumada e com edredom cuidadosamente dobrado, o que a fez se perguntar internamente como sua colega de quarto conseguia ser tão organizada saindo tão cedo.

Fez sua higiene matinal e prendeu os cabelos em um rabo de cavalo mal feito do qual não se importou. Ainda bocejando pela preguiça, trocou de roupa e abriu a porta para ir tomar o café da manhã que já começava a ser servido. No entanto, quando chegou no final do corredor e virou-se para se encaminhar ao refeitório, trombou com uma figura robusta.

— Ai! Desculpe! – Balbuciou, ainda surpreendida pelo pequeno acidente, mas quando seus olhos se ergueram para fitar a figura alheia ela franziu a testa. – Diretor? O que está fazendo nos dormitórios femininos ?

O homem não respondeu, apenas virou de costas e voltou pelo mesmo caminho que tinha feito com passos rápidos, deixando-a confusa nos corredores. Alguns segundos depois, recuperada da situação estranha, a garota resmungou e seguiu o caminho até o refeitório, que já estava cheio. Enquanto se colocava na fila, ela escutou alguém gritar seu nome:

— Ei, Ju!

Ron, que já estava sentado em uma mesa, estava balançando os braços freneticamente. Julia respondeu o gesto sem empolgação e se apressou para pegar seu café, seguindo logo depois até a mesa onde o rapaz estava. Com um suspiro entediado, ela já imaginou o porquê de ele estar lhe chamando.

— Oi Ron, desembucha.

Ele simulou um olhar magoado dramaticamente, mas os lábios cheios não conseguiram segurar um sorriso largo.

— Bom dia pra você também, gatinha. – Provocou ele.

A garota apenas revirou os olhos, beliscando o sanduíche sem ânimo. Percebendo que não teria uma resposta, o rapaz soltou um riso estridente e mordeu um pedaço da maçã verde que antes estava na bandeja. Na luz amarelada do sol sua pele ficava dourada e Julia concluiu, mesmo em meio ao mal humor matinal, que ele era bonito.

— Bom dia, o que você quer?

— Queria saber da Jun, ela não atendeu nenhuma das minhas ligações hoje.

— Ron, eu já falei, sai dessa. – Murmurou, balançando a cabeça. – A Jun tá com outra pessoa e ela não é do tipo que curte relacionamento aberto.

— Ela disse isso? – Ron perguntou, parecendo desapontado. – Porra, eu achei que tinha chance.

— Deixa a garota viver o primeiro amor dela e para de encher o saco!

— Você é sempre assim de manhã? – Perguntou ele, levando na brincadeira o mal humor de Julia.

Ela, por sua vez, apenas lhe deu um tapa e voltou a comer o conteúdo da bandeja revirando os olhos ao notar que ele gargalhava alto, voltando a fazer piadas com ela.

****~****

June abriu os olhos e tudo o que viu foi o céu azul com poucas nuvens. Deitada na beirada da lagoa, suada e com os pés descalços parcialmente cobertos pela água azulada, ela descansava depois de mais um dia de buscas frustradas.

Em seu interior, já não havia tantas esperanças de encontrar a garota, que inclusive começara a frequentar seus sonhos. Agora, tinha pesadelos constantes com os olhos vidrados e sem vida da menina, que estariam cheios de terra, assim como as unhas, os cabelos e a boca, sufocando para sempre sua voz.

Desviando o olhar do céu, June sentiu o estômago revirar mais uma vez aquele dia e levou as mãos até o local, afagando de leve para expulsar aquela sensação. Estava se sentindo mais fraca do que o normal e assumiu que fosse cansaço, já que nos últimos dias dedicava todas as suas energias para caminhar na floresta e pedalar cada vez mais longe.

— Ei, vamos pular do penhasco de novo? – A voz de Madison a despertou.

June virou o rosto e a viu sentada não muito longe, abraçando as próprias pernas, ansiosa.

— Ah otária, eu tô cansada, não quero subir até lá cima hoje, mas se quiser ir tudo bem, eu fico com as bolsas.

Madison fez um bico, mas depois relaxou a postura, desfazendo o abraço nas pernas.

— Podemos pular amanhã então. – Concluiu, por fim.

— Tem certeza? – Perguntou June erguendo uma das sobrancelhas. – Pode ir se quiser.

— Amanhã nós duas pulamos.

June apenas concordou, cansada demais para iniciar uma discussão. Voltou a fitar o céu em plena tarde. Já fazia alguns dias desde que descobriram o penhasco e desde então, toda vez que finalizavam as buscas, davam um mergulho. Madison mirou a água azulada, tão convidativa, e suspirou.

— Acho que nós nunca vamos encontrá-la. – Confessou sem olhar June nos olhos. – Esse lugar é grande demais.

— Desistir está fora de cogitação, Madison. – Respondeu June, seguindo com os olhos estreitos um pássaro que cortava o céu azul. - Não podemos esquecer que ele não conseguiria adentrar muito a floresta com a garota e nós estamos indo cada dia mais longe. Uma hora vamos encontrá-la.

Madison balançou a cabeça afirmativamente, tentando não esgotar todas as suas esperanças. Alguns segundos depois, no entanto, ela se levantou e começou a se despir.

— A cada dia eu tenho mais certeza de que você roubou a mala de alguém. – Brincou June, observando Madison jogar na grama uma camiseta azul que usava. Dentro do sutiã não havia mais papéis.

Madison lhe mostrou o dedo do meio.

— Minha colega de quarto me emprestou essas roupas, mas isso nem é da sua conta!

June riu.

— Tudo bem, desculpe.

Madison ignorou e tirou a calça, ficando apenas com suas roupas íntimas.

— Bom, já que não vamos pular, podíamos só nadar um pouco, o que acha? 

June pensou por alguns segundos. Seu corpo não estava com muita energia.

— Melhor não.

— Vamos June, não seja chata! – Insistiu ela com olhos pidões.

June revirou os olhos. Estava realmente cansada para discutir e sabia que Madison poderia ser a pessoa mais teimosa do mundo, por isso, depois de alguns momentos fitando os grandes olhos verdes, entendeu a mão para Madison lhe ajudar a se levantar.

Com uma súbita tontura e visão escurecida, June vacilou um pouco, mas a outra não percebeu e correu em direção a lagoa com um sorriso largo. A mais nova ainda demorou alguns minutos para tirar as roupas e ajeitar suas coisas, mas logo caminhou em direção à lagoa, deixando o corpo ser acolhido devagar pela água fria.

Madison já nadava livremente, absurdamente feliz, destoando completamente de sua postura minutos antes. June mergulhou e emergiu logo em seguida. Com os cabelos molhados, o corpo pareceu finalmente encontrar um equilíbrio suave entre sua própria temperatura e a da água. Observou Madison nadando para o centro da lagoa e a seguiu.

Moveu os pés continuamente para ter impulso e usou os braços para avançar lagoa adentro. Nadar era muito relaxante, apesar do enjoo que estava sentindo. Quando chegou bem perto da outra, a viu se virar e jogar água em sua direção, com um riso estridente.

June respondeu ao gesto e entrou na brincadeira, sem se importar com o cansaço. Madison parecia cada dia mais radiante, mesmo em meio àquelas constantes ameaças. Enquanto nadavam e se divertiam na água cristalina, percebeu que aquilo tudo acabaria quando o verão terminasse.

Pensar naquilo fez June parar de nadar. Por que recuperar o laço perdido com Madison se a perderia de novo em alguns dias? A ideia de voltar e simplesmente esquecer a floresta, a lagoa, o penhasco e viver às sombras dela outra vez lhe pareciam incabíveis.

— O que houve? – Madison perguntou, notando sua mudança de humor.

Os olhos verdes estavam com uma ligeira sombra de preocupação e os cabelos molhados seguiam grudados nas laterais de seu rosto e em toda a pele à mostra.

— Não é nada. – Respondeu, por fim. – Estava pensando sobre as buscas de amanhã.

Era uma mentira, é claro, mas era infinitamente melhor do que revelar para Madison o motivo de suas inseguranças. Interiormente, se perguntou se ela tinha esse temor também, mas concluiu que provavelmente não.

— Tem certeza? – Perguntou ela.

June assentiu, sentindo-se profundamente desconfortável por mentir para os olhos preocupados que lhe fitavam.

— Tenho sim, relaxa.

Madison estreitou os olhos, mas acabou deixando o assunto morrer ali. Com um suspiro, ela mudou de assunto:

— Vamos ver quem nada mais rápido até a parede de rocha? – Desafiou.

— Competindo igual nos velhos tempos? – Brincou.

— Exatamente. – Respondeu Madison, abrindo um largo sorriso no rosto molhado.

June assentiu solenemente e se prepararam para partir do mesmo lugar, virando-se na direção da parede rochosa que dava origem ao penhasco. Madison contou até três e ambas dispararam, nadando submersas o máximo que seus fôlegos permitiam.

Enquanto movia seus braços e pernas debaixo d'água, Madison viu June se movimentar em um nado ondulatório, impulsionando com força o corpo. Sorriu em meio ao azul da lagoa, sabendo que June se daria muito bem naquilo já que ela continuou treinando e se esforçando nas aulas, diferente de si mesma, que fez o oposto.

Depois de algumas ondulações, June emergiu nadando rapidamente. Madison relaxou um pouco mais, sem se importar de fato com a corrida. Ajeitou o corpo para subir para a superfície, mas uma luz prateada no fundo da lagoa lhe chamou atenção.

Por um instante, achou que a luz fosse apenas impressão, mas estreitando os olhos conseguiu enxergar melhor e realmente havia alguma coisa reluzindo perto do chão arenoso. Sentiu os pulmões protestarem pela ausência de ar e voltou para a superfície com alguns impulsos firmes.

Quando emergiu não demorou para escutar a voz de June:

— Ei, você tá bem? – Ela nadava em sua direção, aparentemente preocupada. – O que houve?

Madison deu um longo suspiro antes de responder, ainda achando estranho o que tinha visto.

— Eu vi uma coisa lá embaixo.

— Uma coisa? – Indagou June, já do seu lado.

— Sim, eu não sei o que é, mas brilha. – Respondeu. - Tá no fundo da lagoa. Eu não consigo guardar muito bem o fôlego, mas acho que você consegue chegar lá.

— Certo, consegue me mostrar onde viu?

Madison concordou silenciosamente e ambas puxaram bastante ar antes de imergirem na água límpida outra vez. Nadaram alguns metros para baixo, mas Madison já sentia incômodo pela ausência de ar, então parou, fitando o fundo da lagoa, procurando o objeto que tinha visto. Quando, enfim, conseguiu ver a pequena luz prateada, apontou em sua direção, para que June também visse.

Com um olhar afiado, June assentiu uma vez antes de continuar nadando até o fundo da lagoa. Sem aguentar mais ficar sem respirar, Madison voltou para a superfície. June, por sua vez, sentia a pressão aumentando enquanto nadava mais para baixo. Sem tirar os olhos da discreta luz prateada, ela soltou seu último sopro de ar dentro da água, criando bolhas que dançavam em frente ao seu rosto. Sabendo que estava mais lenta do que o normal por conta da estranha fraqueza no corpo, agradeceu quando finalmente conseguiu tocar o objeto metálico que estava parcialmente enterrado na areia fina.

Ao seu lado, alguns peixes nadavam despreocupadamente, alheios à visita inesperada. June usou as mãos para desenterrar uma pequena caixa de metal que surpreendentemente estava leve, repleta de ar. A primeira coisa que a garota pensou é no porquê de aquilo não estar boiando e sim no fundo do lago, mas a resposta veio logo depois, quando tentou puxar.

Aparentemente, a caixinha de metal estava amarrada a uma pedra e June trincou os dentes, com as costas queimando, implorando por ar. Ela usou suas últimas forças para desfazer o nó que unia as duas coisas. Sem ter tempo de refletir mais a respeito, se ajeitou para voltar à superfície, mas quando virou, notou um segundo objeto, um pouco mais distante, camuflado. Não soube distinguir o que era e seus pulmões não lhe deram mais tempo.

Com firmes impulsos nas pernas e usando os braços para subir até a superfície, June viu Madison alguns metros acima olhando em sua direção, lhe esperando. As pernas queimavam pelo esforço contínuo e a sensação de mal-estar novamente apareceu. Com um último ímpeto desesperado ela emergiu tossindo e com dor nas costas, segurando com firmeza a pequena caixa retangular de metal.

Madison também voltou para a superfície.

— O que é? – Perguntou ela, notando o objeto nas mãos de June.

— Não sei, mas tem mais alguma coisa lá embaixo, eu vou voltar lá.

— O quê? E o que era? – Perguntou ela, confusa.

— Não sei ao certo, não deu pra ver. Me espera aqui tá bom? Vamos abrir isso juntas.

Madison assentiu e pegou a caixa das mãos de June. Trocaram um último olhar antes de June puxar o ar e imergir dentro da lagoa outra vez. Sabendo que precisava administrar melhor o ar, nadou mais rápido segurando ao máximo o oxigênio no peito.

Quando chegou na metade da profundidade, soltou uma parte do fôlego e procurou rapidamente o objeto escuro que tinha notado. Por sorte, viu a pequena sombra em meio a areia clara.

Mantendo o fôlego em um bom nível, June atravessou a segunda metade e só cessou o esforço quando os pés tocaram a superfície macia. Abaixou-se, encostando os joelhos na areia e espantando alguns peixes pequenos. Com uma das mãos, tocou no objeto escuro com cuidado, expulsando a areia.

Quando, enfim, conseguiu visualizar do que se tratava seu coração disparou e ela acidentalmente jogou fora o último sopro que mantinha no peito. Era um sapato. Pelo tamanho, podia assumir que era feminino, mas tentou não tirar conclusões precipitadas.

Isso tem que ser uma pista! Pensou, eufórica.

Percebendo que o sapato também estava amarrado a uma pedra, June se apressou para desamarrá-lo, começando a sentir o impulso de respirar novamente. Olhou ao redor, procurando qualquer outra coisa, mas não conseguiu encontrar nada que parecesse um vestígio. Com o sapato em mãos e sem tempo para pensar, June voltou a fazer o exaustivo percurso de subida, esforçando seus músculos ao máximo que conseguia.

Finalmente, emergiu para a superfície, sem fôlego.

— Madison, vamos para a margem, tem algo errado nessa lagoa! – Exclamou, ofegante.

Madison lhe encarou confusa, ainda segurando a caixa, mas quando viu June nadando com um sapato nas mãos entendeu que a situação poderia ser mais séria do que imaginava. A ideia de estar nadando sobre o corpo da garota falecida apareceu em sua mente causando-lhe uma poderosa vertigem.

No momento em que chegaram à margem, June deixou o corpo descansar um pouco, aliviando os músculos tensos e os pulmões exauridos. Madison correu até sua mochila e pegou uma das garrafas com água, lhe estendendo logo em seguida.

— Você se esforçou muito, toma.

June se ergueu devagar, enjoada. Pegou a garrafa e bebeu quase todo seu conteúdo, conforme seu fôlego permitia. Demorou longos minutos para ela estar recuperada. Quando conseguiu ficar de pé, pegou seu canivete e se sentou ao lado de Madison, que fitava a caixinha e o sapato com apreensão.

— O que você acha que tem aí dentro? – Perguntou ela, gesticulando para a caixa.

— Eu não sei. – Confessou June, também apreensiva. Fitaram os objetos com mais atenção.

A caixa metálica brilhante parecia antiga e estava ligeiramente enferrujada nas laterais. Também não tinha estampa, apenas o brilho reluzente da prata. Já o sapato estava deplorável, com a cor preta desbotada e encharcado.

— Parece feminino....- Analisou June verificando o número do sapato. Madison lhe encarou, preocupada.

— Acha que pode ser da garota que vimos?

— Não faria sentido. – Respondeu, tentando relembrar aquela cena.

— Como assim?

— Ela tava só com calcinha e sutiã, não usava um sapato. Além do mais, não vi nada que parecesse um corpo lá embaixo.

Madison ainda não parecia convencida e June suspirou.

— Vamos abrir a caixa. – Ela pegou o objeto, constatando que estava muito leve. – Não entrou água. Isso é bom, eu acho.

Madison assentiu, encolhendo os ombros nus, ainda não tinham se vestido. June cravou as unhas na tampa retangular, tomando cuidado com a ferrugem nas laterais e puxou com força. A tampa se abriu com um "clac" seco e Madison mordeu o lábio, achando que alguma coisa poderia pular dali.

No entanto, nada pulou e o dia continuou ameno. June fitou a caixa e olhou para Madison.

— São fotos.

— O quê? – Perguntou ela, se aproximando e vendo uma pequena pilha de fotografias dentro da caixa metálica.

Elas tiraram as fotografias com cuidado, impressionadas por estarem completamente intactas. June pegou uma delas e a observou atentamente. Era a foto de uma garota que não deveria ter mais de vinte anos de idade. Ela usava um vestido florido e pousava timidamente perto de uma árvore com um sorriso no rosto.

Madison já analisava outra imagem, que também era da mesma garota, mas que agora estava com um vestido azul de gala e com os cabelos escuros presos em um coque muito belo. Apesar da extravagância das roupas, ela continuava com um semblante tímido e de sorriso leve, de ombros encolhidos.

— Tem alguma coisa muito errada aqui. – Murmurou June, observando rapidamente todas as fotos e confirmando que todas eram da mesma pessoa.

— Eu notei. – Respondeu Madison, franzindo o cenho.

— Essa garota.... June hesitou, tentando formar um raciocínio. – Não é a mesma que vimos aquela noite.

Se entreolharam em silêncio por alguns segundos. Os corpos seminus se arrepiaram, mas não sabiam dizer se era por conta do vento que tocava seus corpos molhados ou se era pelo que descobriram.

— E se ele tiver matado ela também? – Sussurrou Madison, verificando se havia alguma nota nas fotografias.  - Olha! Aqui está escrito: "Princesa Emi".

— Isso não diz muita coisa. Não podemos concluir nada. Não sabemos quem é ela e nem se o diretor fez isso. Nunca vimos essa garota. Além do mais, não tem data nas fotos, não tem como saber se são recentes.

June suspirou e mirou a lagoa, se perguntando se havia algo mais em suas profundezas. Logo após seu momento de reflexão, ela continuou:

— Alguém pode ter vindo aqui esconder isso no lago, pode ter sido ela. Não dá pra saber.

— Mas por que ela faria isso? – Indagou Madison. - E o sapato?

— Eu não sei. – June passou a mão pelos cabelos molhados. – Talvez esse lugar tenha sido bastante frequentado antes, nós vimos a trilha! Quem sabe se a pessoa que escondeu isso na lagoa é a mesma que jogou o sapato? 

— June, isso seria muita coincidência. E você sabe disso.

— Eu sei! – Exclamou June. – Eu só não quero acreditar que podemos estar envolvidas em algo muito maior!

A dona dos medrosos olhos verdes inicialmente não respondeu, mas depois pareceu compreender.

— Mas que porra...

June não respondeu e por fim, o silêncio se colocou sobre elas naquele fim de tarde turbulento. Sem ter o que dizer, ambas levantaram e colocaram suas roupas, ignorando os objetos recuperados. Sabendo que já estava tarde e que precisavam voltar, June colocou as coisas na mochila e acenou para Madison lhe acompanhar na caminhada que teriam de volta.

Adentrando a floresta de árvores espaçadas, June sentiu o corpo ficando pesado e associou aquilo ao esforço que fizera mais cedo. Com sua lentidão, Madison assumiu a frente, surpreendendo com seu senso de direção, que não era tão ruim quanto imaginavam.

June vez ou outra se apoiava em algumas árvores e colocava a mão no estômago, que voltara a revirar com mais intensidade. Mesmo tentando focar nas estranhas pistas que encontraram, ela não conseguia se concentrar por muito tempo. O simples ato de pensar e manter a linha de raciocínio lhe cobrava muita energia.

Madison soltou um gritinho de euforia quando encontrou a bicicleta que tinham escondido. June sorriu de leve, sentindo-se enjoada. Notando que Madison lhe estendia a bicicleta em um convite para pedalar, assumiu a posição de sempre e se sentou no banco, enquanto a outra se encaixava no quadro.

Tentando ao máximo ignorar seu mal-estar, June pedalou enquanto escutava Madison cantarolar animadamente e quase perguntou como ela conseguia esquecer com tanta facilidade os momentos de tensão que tinham passado há tão pouco tempo.

Apesar de tudo, aceitou de bom grado aquele momento leve e pedalou pela estrada de terra enquanto observava pela visão periférica, os cabelos castanhos da outra esvoaçarem com suavidade e o sorriso fácil que ela tinha enquanto cantava baixinho.

No entanto, acabando com a magia daquele momento, sua visão falhou e com um solavanco, June parou o veículo que acabou tombando. Madison se desequilibrou, mas conseguiu saltar para a estrada. June, no entanto, acabou caindo junto com a bicicleta. O forte impacto a fez rolar.

— June! – Gritou Madison, empurrando a bicicleta para longe e tocando seu rosto. – O que houve!?

June sentia as pernas moles e muito enjoo, contudo, o que mais a assustava era a aparente cegueira que lhe acometia aquele momento.

— Minha visão tá escura.... – Sussurrou.

— Você se esforçou demais e nós só estamos comendo porcarias, sua pressão deve ter baixado!

A mais nova não respondeu, sentia que toda a água que havia em seu corpo estava sendo expelida pelos poros, tamanho suor gelado. Por sorte, Madison já lhe estendia sua própria garrafa d'água.

— Bebe! Você tá suando muito! 

Obedeceu prontamente.

— Eu não tô enxergando.... – Balbuciou, aflita.

— Você precisa comer! – Exclamou Madison, colocando um dos braços de June ao redor de seu pescoço. – Acha que consegue aguentar um pouquinho de pé? Eu vou pegar a bicicleta.

Assentiu e conseguiu manter as pernas no lugar, mesmo com a fraqueza. Madison assumiu o comando da bicicleta e ajudou June a se sentar no quadro.

— Eu vou levar você de volta. – Falou, ajeitando com cuidado June entre seus braços. – Segura em mim pra não cair, tá?

Concordou silenciosamente, ainda de olhos fechados e envolveu os braços na cintura larga de Madison, que não perdeu tempo e pedalou em direção ao acampamento. No entanto, apesar da postura firme, os olhos verdes não conseguiam esconder a preocupação com a pequena silhueta que se agarrava em sua cintura, frágil de uma forma que nunca tinha visto.

****~****

Com o dia dando lugar a noite, Jessica caminhava com passos firmes pelos corredores do dormitório feminino. O rosto maquiado impecavelmente estava franzido. Se lembrando de sua última conversa com June e da forma como foi tratada, tinha certeza de que precisavam resolver as coisas. Por isso, caminhava até o quarto da amiga.

Quando chegou, bateu na porta, rude. A mesma se abriu, revelando Julia, que estava secando os cabelos.

— Posso ajudar?

— A June ta aí? – Perguntou Jessica, arrogante. Julia ergueu as sobrancelhas.

— Não, querida. Ela não está. – Respondeu e logo depois acrescentou: - Devia tentar ser mais educada, pirralha.

— Eu não quero falar com você, sei que ela tá aí! – Grunhiu Jessica, ignorando as provocações da mais velha.

— Não, ela não tá.

—  Então eu posso entrar pra ver? – Retrucou. Julia deu de ombros.

— Faz o que quiser, garota. Mas é bom dar o fora daqui depois.

Julia abriu a porta e Jessica entrou, com uma postura pomposa. A ruiva varreu o quarto minúsculo com os olhos. Vazio. Olhou o banheiro, cuja porta estava aberta e não tinha ninguém também.

Julia cruzou os braços, incomodada com a presença dela.

— Satisfeita, princesa?

— Não me chama assim! – Grunhiu , se encaminhando até a porta e puxando a maçaneta.

Porém, ao dar um passo para sair, a ruiva viu June logo à sua frente, com o rosto pálido. Mas o que mais lhe chamou atenção na cena, foi a presença de uma outra silhueta, que segurava June com firmeza. Madison teria revirado os olhos ao vê-la se não fosse o desespero para colocar June em sua cama.

— Dá pra sair da frente!? – Cuspiu ela, passando com June enganchada em seus ombros.

— Ei, o que houve!? – Exclamou Julia, ajudando-as. – Jun, você tá bem!?

— Tá tudo bem. – Sussurrou June, com os lábios finos sem cor.

— Não, não tá tudo bem. – Madison a repreendeu, depois direcionando o olhar para Julia. – Ela precisa comer.

— Beleza. - Julia se ergueu prontamente. - Eu vou no refeitório pedir um jantar antecipado!

Ela correu para fora do quarto antes de receber uma resposta, deixando apenas as três ali.

— Mas que merda é essa, June!? – Gritou Jessica, por fim, ao notar a presença de Madison. – O que você tá fazendo aqui, Madison? Achei que vocês não conversavam!

Madison abriu a boca para responder, mas June foi mais rápida.

— O que você quer aqui, Je? Se for sobre nossa última conversa....

— Sim, é sobre nossa última conversa! – Interrompeu Jessica, incomodada. – Você diz aquelas coisas e depois some? Achou que eu não diria nada?

Madison se levantou, furiosa.

— Será que você não tá vendo que ela não tá bem!? – Vociferou, fuzilando a ruiva com o olhar. – É sério que quer encher o saco agora?

— E quem você pensa que é pra se meter?

Madison estava prestes a explodir em palavrões, mas de repente, aquela estranha identificação com Jessica surgiu de novo.

— Cai fora daqui. – Disse, friamente. – Se quiser continuar seu show, faça isso lá fora. A June não pode conversar agora!

Jessica riu e voltou-se para June, que assistia a cena da forma como podia deitada em sua cama.

— Então é isso, June? Você vai se aproximar dela de novo? Já esqueceu que ela te largou pelos cantos igual lixo antes?

— Mas que porra! SAI! – Berrou Madison, empurrando a outra para fora, sem se importar com os protestos.

Quando finalmente fechou a porta, ela se permitiu dar um longo suspiro, que acalmou a raiva, mas não a sua culpa. Caminhou até o banheiro em silêncio, pegando a caixinha de primeiros socorros e algumas gazes.

Sentando-se ao lado dela na cama, Madison limpou com cuidado os arranhões nos braços alheios, decorrentes da queda. Ao mesmo tempo, repassava a discussão em sua cabeça. Um pensamento em específico matutava em sua mente, mas ela não conseguia acreditar nele.

— Desculpe por isso. – A voz frágil de June quebrou o silêncio. Ela abriu os olhos, mas ainda via a silhueta de Madison muito escurecida e se entristeceu por não conseguir fitar os olhos verdes. A sensação de fraqueza ainda a consumia.

Acordando dos pensamentos intensos, Madison hidratou os lábios antes de responder:

— Não precisa pedir desculpas por ela, June. Você não fez nada e.... - Hesitou. – Ela tá certa. Eu realmente fiz aquilo com você.

— Isso não importa mais pra mim.

Madison suspirou, ainda com uma mão sobre o braço de June, deslizando a gaze fina sobre a pele.

— Importa sim.

— Mas nós consertamos isso. Está tudo bem agora.

O pensamento incômodo se recusava a sair da mente de Madison e ela acabou baixando o olhar até chegar em uma das mãos de June, contendo o ímpeto de tocá-las.

— Posso te perguntar algumas coisas? – Indagou, ainda mantendo os olhos verdes sobre os dedos finos da outra.

— Pode.

— Você se tornou amiga da Jessica depois que eu fui embora da escola?

Como se já tivesse entendido onde Madison queria chegar com aquelas perguntas, June fechou os olhos.

— Sim. – Sussurrou.

Mais um momento de silêncio.

— E você se tornou amiga dela porque descobriu algo que têm em comum? - Perguntou Madison.

— Não, nós não temos nada em comum.

Madison mordeu o lábio. Em seu interior, tudo era um turbilhão. Ela notou, ainda muito atenta, os dedos de June tremerem. Queria mesmo tocá-los, mas agora iria até o fim.

— Você se aproximou dela por minha causa, não é?

June não respondeu de início, como se aquela resposta envolvesse muitas outras coisas, mas não conseguiu conter os lábios por muito tempo.

— Sim. - Admitiu finalmente.

A maior suspirou, com os olhos ardendo. O nó que se formou em sua garganta a impediu de fazer mais perguntas, que a essa altura já não eram necessárias.

Notando que não teria uma resposta, June se pronunciou:

— Ela me lembrava você.... – Sussurrou. – E mesmo que lembrasse a sua versão que me odiava, ainda parecia com você. E eu sentia sua falta.

June não precisava de sua visão para saber que Madison estava chorando. Com cuidado e ainda de olhos fechados, tateou a cama suavemente, procurando algo que encontrou bem próximo: a mão dela. Afagou devagar o dorso macio da mão alheia, em um singelo conforto para acalentar Madison e seu silencioso choro de culpa.

Porém, mesmo naquele momento, June pensou no conteúdo da sua mochila e o que aquilo significava. A ideia de estarem envolvidas em algo maior a fez tremer, segurando com um pouco mais de força as mãos macias da Madison.

De repente, entendeu que invadir a sala do diretor e talvez seu quarto era algo que precisava fazer.

Mas sem ela, pensou.

Com um suspiro suave e sem quebrar o contato das mãos, June concluiu seus pensamentos, decidida a seguir aquele caminho perigoso sozinha para proteger aquela pessoa, que era tão importante.

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