Cinco Dias (RABIA)

By bark2020

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Quando o isolamento não deixa outra alternativa a não ser dar vida ao que se tentou evitar e mascarar, mas qu... More

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Dia 5, Pt. 1
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Rotina/V, Pt. 1
V, Pt. 2
Dezembro
Sente, Pt. 1
Sente, Pt. 2
Madrugada
Madrugada, Pt. 2
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Recomeço
Todo Carinho
Contraponto
Esconderijo
Peônia
Inquietação
Desorientação
Elucidação
[MIMO 2]
Descontrole
Calmô
Verde
Difícil
Oposição
Aliança
Sábado
Pressão
Distância
Colisão
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[MIMO 3]
Refazer
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[MIMO 4]
Chuva
Hipotético
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Junho
Chega
Ventura
[AGRADECIMENTO]
[BÔNUS]
[MIMO BÔNUS]
[BÔNUS 2]
[AVISO]
[BÔNUS 4: BAHIA]
[BÔNUS 4: NUVEM]
[BÔNUS 4: ROSA]
[BÔNUS 4: CINCO DIAS DE SOL]
[BÔNUS 4: GELO]
[PARÊNTESIS]

[BÔNUS 3]

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By bark2020


Alô, Alô!

Como é bom vir "falar" com vocês no domingo! 

Então...

O vilão de fic fez de tudo para nos tombar e cair a minha promessa de bônus - já que ele continua inutilmente naquela casa do BBB21 - mas ele não contava que eu tinha outros dois grandes motivos para estar aqui... Infinitamente maiores do que ele.

São eles:

1) Esse bônus eu dedico com quase uma semana de atraso para o aniversário de uma das pessoas que eu mais amo no fandom rabia: Mikaela, Julia, Julia Mikaela, Mika, jujubins ... Enfim, não importa como eu a chame, o fato é que eu sei que eu estou chamando alguém que eu já considero minha amiga e que eu amo muito! Portanto, corre aqui e receba com todo meu amor, !

2) Passamos de 408k de views, meu povo! Quando eu postei o Ventura e encerrei a história estávamos em 310k.  O que significa que vocês meteram quase 100k de views com Cinco Dias morto e com apenas três postagens bônus, quase tudo na base da releitura e de gente nova que chegou por aqui. 

Como diria minha filha mais nova: Como explicar vocês, Rabias? 

Não tem como e, por isso, o melhor que eu faço para celebrar esse marco é escrevendo e vindo comemorar aqui.

E foi o que eu fiz...

Escrevi muito e demais!

Lembram da enquete do Alerta? 

Pois é... Não são 30k, mas são 27k palavras.

E já que, como sempre eu dividi em muitas cenas, a minha sugestão é: leiam aos pouquinhos para não se cansarem e fazerem render.

Hoje nós não temos um surtinho gracioso como no outro, mas temos um pouco de quase tudo que me pediram tanto desde que eu encerrei nossa trajetória oficial.

Portanto, com todo meu amor a todo mundo que me pediu e que simplesmente lê, espero que gostem!



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RAFAELLA POV:

Pensando bem, sabe que eu acho que eu nunca comentei com ela especificamente sobre esses dias naquela casa?

Se a minha memória ainda está funcionando direito pra relembrar isso, eu penso que tudo começou na noite da terceira festa, em uma sexta-feira, e durou praticamente o final de semana inteirinho.

Era a festa "Gatos e Ratos" e o momento que deu início a essa sequência de momentos bons que ficaram na minha memória eu lembro como se fosse hoje, porque acho que foi a primeira vez na vida que eu senti uma corrente boa demais da conta percorrer meu corpo inteiro só com o toque gentil, respeitoso e quase envergonhado dela na minha pele.

Todas as meninas estavam sentadas juntinhas e alinhadas em um degrau do cenário da festa para uma foto, ela sentou bem ao meu lado e, na hora de fazermos a pose, colocou a mão delicada em meu ombro e encostou suavemente a cabeça dela na minha.

Foi tão pouquinho e tão rapidinho, mas sem dúvida nenhuma ficou marcado pra mim.

(Sorrio inevitavelmente com a lembrança ainda tão ricamente detalhada em minha consciência)


Eu fiquei tão surpresa com a proximidade inesperada e o gesto quase acolhedor dela que acho que nem soube muito bem como reagir na hora, fiquei parada e quase imóvel, mal conseguindo me concentrar na pose que queria fazer para a foto.

Felizmente, o contexto comportava muito bem a expressão blasé, porque se tivesse que entregar um sorriso largo, desses que mostram que a gente tá bem à vontade, sabe? Acho que ia ficar muito com Deus...

Depois que passa a gente ri, né?

(Suspiro longamente)

O que eu sei é que depois desse primeiro momentinho, a festa inteira foi diferente pra mim, porque eu não conseguia mais não deixar o meu olhar ser atraído pela presença hipnotizante dela.

Não foram poucas as vezes naquela noite em que eu me peguei sentada a pouca distância assistindo ela dançar, ou mesmo levantando para ir dançar ali por perto, só pra ter uma visão mais generosa e privilegiada do grande evento que era Bianca Andrade em uma festa no BBB20.

Aliás, uma coisa que qualquer um precisa saber é que até hoje ela rouba a cena de qualquer festa ou pista de dança, mas naquela época o encantamento coletivo era muito real e eu fui uma pobre vítima indefesa disso.

Mas nem tudo foram flores, porque naquela noite eu também me senti incomodadíssima de vê-la sendo perseguida e cercada por aquele trem inconveniente e desnecessário que atendia pelo nome Guilherme.

Eu não sabia bem o que estava rolando entre eles, mas a movimentação me incomodou muito, porque ela parecia perturbada com alguma coisa e ele cercando, tentando conversar enquanto ela claramente não queria conversar e eu sem poder fazer nada e, estranhamente, querendo fazer.

Seja lá o que foi a treta deles naquele dia, durou pouco porque logo eles já pareciam bem. Afinal, Boca Rosa não cultiva ódios, já sabemos bem e até nos aproveitamos disso vez ou outra, não é mesmo?

Pelo sim, pelo não, eu lembro de sentir quase uma necessidade irracional de continuar atenta observando. Até porque, os porres dela naquelas festas eram épicos e alguma coisa me empurrava a querer me manter por perto e vigilante para qualquer coisa que ela precisasse.

Foi assim até o final da noite, e nem quando a festa acabou e todas nós estávamos no banheiro nos arrumando para dormir eu conseguia tirar os olhos dela.

Eu escovava os dentes e a acompanhava pelo espelho, toda desajeitada tentando se enxugar depois do banho:


E como se disfarçar isso não tivesse sido uma batalha impossível o suficiente, eu ainda a presenciei vestindo a roupa de Tina do monstro, conversando com a Marcela e na fase Jenifer fofinha, cheia dos diminutivos.

"Minha roupinha tá ali, o sapatinho eu já devolvi e o brinquinho também".

Pensa no sofrimento que foi ouvir isso tendo que segurar o sorriso trouxa...

(Suspiro ainda mais contemplativa e com o tal sorriso no rosto, porque a memória auditiva ainda era muito perfeita)

Depois disso, eu fui para o quarto dormir e tentar abstrair aquele turbilhão de sensações desconhecidas, mas quem disse que eu conseguia?

Fiquei rolando na cama ao lado da Manuzinha um tempão, atenta a cada vez que a porta do quarto céu era aberta, e só sosseguei mesmo quando eu percebi o tilintar das panelas que ela carregava com a fantasia do monstro e que me deixaram claro que ela finalmente tinha entrado no quarto.

E imagina só a felicidade incompreensível da pessoa quando aquele pontinho azul e amarelo, de peruca loira, achou um espacinho justamente no chão ao lado da minha cama...

Eu estava deitada na lateral do meu corpo, com o rosto voltado para o lado esquerdo onde a Manu dormia, e esperei pacientemente ela se ajeitar no chão para, só então e muitos minutos depois, ter a coragem de cuidadosa e lentamente girar para o lado oposto, onde ela havia deitado.

As luzes já estavam desligadas, mas sempre tinha um feixe iluminado que acabava servindo para ajudar as câmeras a flagrarem os acontecimentos noturnos nos quartos e, naquela noite, isso acabou me ajudando a acompanhar um pouquinho do sono tranquilo dela.

Como haveria de se esperar, ela tinha deitado e capotado logo na sequência.

Um clássico de Bianca "bebum".

Observando um pouco mais, eu percebi que ela tinha se jogado de qualquer jeito no chão, nem coberta estava e, claro, isso me incomodou irremediavelmente.

Na cama em que eu dormia com a Manu tinha o edredom e uma mantinha lilás. Sem pensar duas vezes, eu tirei bem devagar a manta e a cobri com mais cuidado ainda, rezando internamente para que ela não acordasse.

E não sei nem por qual razão eu rezei, porque era tão óbvio que ela não acordaria...

Mas a certeza de que ela tinha apagado me fez também encontrar o sono pesado pouco tempo depois, mas não pesado o suficiente a não ter presenciado as vezes em que a música do monstro soou e ela teve que levantar contrariada e exausta para cumprir o castigo.

E foram tantas vezes que, assim que eu acordei, a primeira coisa que eu fiz depois do raio-x foi correr para a cozinha do vip e ver o que tinha disponível para o café da manhã.

Tinha pouco tempo que eu acordava na mesma casa que ela, mas eu já sabia que ela acordaria mal humoradinha e varada de fome.

B: Bom dia! – Não demorou quase nada para ela aparecer na cozinha.

R: Bom dia! – Respondi com a mesma nota de constrangimento, mas me forcei a continuar – Tem café ali e, se você quiser, tem uma tapioca aqui que eu acabei de fazer para a Manu, mas a Gi me disse que ela fez o raio-x e voltou a dormir, então...

Obviamente menti, porque é claro que eu tinha feito pra ela.

B: Nossa, tu jura que eu vou dar essa sorte? – Os olhinhos ainda inchados de sono insistiam em me espancar e nocautear, mas eu esquivava deles tal qual uma boxeadora profissional.

R: Prova primeiro e depois cê decide se é sorte mesmo. – Empurrei o prato no balcão com um sorriso tímido no rosto.

B: Com a fome que eu tô? – Ela avançou sem cerimônias no prato – Até se tu me servisse uma tapioca queimada e fria eu comeria amarradona e com gosto, tamanho é o meu desespero de fome nesse instante.

E, claro, o chiado do sotaque acrescentou um golpe de desnorteamento a mais.

R: Que bom que vou passar ilesa no julgamento então.

Sorri outra vez e, sem conseguir sustentar a interação – como sempre acontecia – virei de costas e fui lavar algumas louças.

Ela ainda tentou por mim:

– Acho que eu chapei tanto de sono que dormi no chão sem nada para forrar ele, acredita? Bem maluquinha!

R: Ainda bem que o carpete é bem macio, né? – Tentei participar.

B: Mesmo que não fosse, acho que eu teria apagado. Eu estava tão lesada que embaralhei tudo... Podia jurar que eu dormi com a sensação ruim de não ter encontrado nada pra forrar o chão e nem pra me cobrir, mas estranhamente acordei coberta... – Senti a voz dela se afastando porque ela caminhava até a mesa – Vai entender.

Gelei com o pequeno confronto, mas não me entreguei.

R: Você deve ter dormido com essa má impressão de estar deitada no chão sem forrar e acabou sonhando com um cenário pior, sem coberta e tudo mais.

B: É a minha cara mesmo exagerar assim. – Ela pronunciou conformada e eu quase me senti mal.

E digo "quase" porque acho que teria me sentido mal de verdade se tivesse que lidar com o que de fato tinha acontecido, então naquele momento eu me senti no lucro.

Tanto que não quis arriscar e permaneci em silêncio, e ela, sentada na imensa mesa redonda sozinha, também acabou não tendo condições de trocar qualquer outra palavra.

Ao longo do dia, fui percebendo a irritação e o incômodo dela crescer com a rotina do castigo do monstro e, por instinto, a cada vez que a música tocava eu fazia questão de estar por perto e interagir de alguma forma com ela e com a Mari, incentivando e sorrindo com as pequenas palhaçadas que, mesmo contrariada, ela ainda conseguia fazer.

E o impressionante é que o sorriso e o carisma com aquelas panelas irritantes na mão atraiam tanto, que em uma das vezes ela conseguiu até mesmo formar uma fila com quase todos os participantes atrás dela, apoiando e se divertindo enquanto o castigo mais irritante do universo era performado.


Confesso que eu fui orgulhosa demais pra levantar minha bunda da poltrona no jardim e me juntar à fila, mas foi uma experiência à parte observar ela toda pequenininha, mas barulhenta e cativante o suficiente a liderar a algazarra, que é o que melhor ela sabe fazer desde sempre.

Nesse sábado eu ainda me recordo que, no final da tarde, ela estava tão exausta do sadismo da produção que havia tocado aquela música infernal incontáveis vezes que, mesmo que todo o resto da casa estivesse na área externa na maior bagunça, ela acabou voltando para o interior da casa.

Sem muita paciência para os hormônios da juventude em um final de sábado, eu também tinha decidido que usaria aquele tempo para tomar banho e, por isso, enquanto eu separava o que precisaria para o banho, nós acabamos nos encontrando no quarto céu.

Com o semblante sonolento e coçando o olho direito adoravelmente, ela parou no meio do quarto e ficou olhando em volta.

Eu acompanhei de rabo de olho a cena por uns segundos, mas não consegui não meter meu bedelho:

– Tá procurando alguma coisa?

B: Tentando decidir se eu deito em alguma cama ou no chão mesmo.

R: Na cama, óbvio, você e a Mari estão exaustas. – Respondi sem olhar em sua direção, como de costume.

B: Essa roupa de monstro já está uma "nháca", não queria sujar nenhuma cama. – Ela falou já tentando se livrar das tampas de panelas, mas falhando bonito e se enroscando toda.

R: Deixa de bobagem, Bia. Faz parte e todo mundo tá ciente disso. – Levantei e caminhei para ajudá-la.

B: Obrigada. – Ela sorriu acanhada e eu entreguei pra ela as tampas que tinha conseguido desenroscar da peruca.

R: Mas, olha só... – Virei em direção à cama que eu costumava dividir com a Manu – Deita ali na que a gente usa então.

B: Imagina, Rafa, de jeito nenhum. Você e Manuzinha são as mais organizadinhas, nunca que eu ia fazer bagunça no cantinho de vocês.

"Diminutivos infernais".

Era só o que eu conseguia pensar junto com a vontade de fazer logo ela parar de teimosia.

R: Nem que a gente quisesse muito conseguiríamos ser organizadas aqui, Bi, então deita lá e descansa, vai. – Usei o tom mais persuasivo que fui capaz e já fui saindo do quarto para não constrangê-la.

Tomei meu banho, lavei meu cabelo demoradamente e, quando voltei ao quarto para me vestir, Bia já dormia sozinha na cama que eu sugeri, no lugar que comumente a Manuzinha dormia e com a frente do corpo voltada para a parede.

Sentei ao lado dela, porque era ali que eu mantinha minhas maquiagens e produtos de beleza, e passei a cuidar da pele.

Fiz tudo com gestos extremamente leves e delicados para não perturbar o sono dela e fiquei estática quando a percebi girando o corpo para mudar de posição e ficar de barriga pra cima, mas agora com o rosto voltado na direção que eu estava:


Permaneci sem me mexer ainda por longos segundos, só observando se Bia não tinha mesmo despertado, focada no rosto dela e, quando me dei conta, senti como se afogasse e tive que respirar profundamente.

Eu não entendi isso no dia e nem tão cedo assim, mas hoje eu sei que foi a primeira vez que ela me fez literalmente perder o fôlego.

E além de prender a respiração involuntariamente, eu senti uma revoada doida de borboletas no estômago que volta e meia eu ainda sinto, mas que também naquele momento eu não atinei.

São aquelas pequenas sensações que a gente deixa se perderem no caos das emoções e temperamentos flutuantes, e que anos depois repetem tanto que atormentam a nossa existência com o sentimento agridoce de tempo perdido misturado com sorte grande.

Tempo perdido porque a gente poderia ter vivido isso plenamente muito antes, e sorte grande porque, apesar dos tropeços, aquela pessoa esteve na sua vida tão cedo.

E não bastassem as sensações negligenciadas, eu ainda tive que lidar com o ciclo interminável de alternar o olhar entre as tatuagens de gatinho nos dedos, as outras no braço, o contorno da boca rosinha, o delineado perfeito dos olhos fechados, o narizinho bem desenhado e, como era o esperado, em pouco tempo eu me senti ridícula e pulei da cama.

Ia sair imediatamente do quarto, mas as tampas da Tina jogadas pelo chão me fizeram voltar e recolhê-las, deixando bem ao lado do corpo de Bia para que, quando a música tocasse, ela as encontrasse com facilidade.

Afinal, estalecas era o que ela mais perdia naquela casa e toda ajuda era bem vinda.

Fiz isso e, quando ia chegando perto da porta, reparei no montinho de roupas bagunçadas perto da mala dela e, sem nenhuma surpresa, meu corpo foi atraído como ímã para dobrar zelosamente cada uma das peças e alinhá-las perfeitamente em cima da mala.

Agora eu finalmente poderia sair do quarto, mas a câmera que se movimentou no cantinho perto da porta me deu o alerta que, por uns minutos de puro e incompreensível entorpecimento eu havia esquecido: eu estava sendo filmada.

Sendo assim, minha racionalidade me impulsionou a, pacientemente, caminhar novamente para o meio do quarto e procurar mais malas e bagunças que eu pudesse arrumar.

Leia-se: que me permitissem disfarçar o que eu tinha acabado de fazer.

E claro que eu achei, né?

Várias e incontáveis bagunças.

Arrumei uma por uma, paciente e incansavelmente...

Porque afinal de contas, naquela época eu só descansaria se o crime de "me importar com Bianca Andrade" fosse ocultado com perfeição.


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NOVEMBRO DE 2025:

R: Depois disso, meu amor, o dia na casa continuou sendo leve e agradável. O domingo seguiu o mesmo rastro, mas isso só aconteceu até depois do programa ao vivo...

A atriz inspirou outra vez e ainda mais profundamente, demorando-se na pausa.

R: Eu lembro que, depois que a votação daquele paredão aconteceu, virou uma confusão só. Ela entendeu umas coisas mal e meteu os pés pelas mãos, eu não gostei das reações dela, começou a dar tudo muito errado e foi só piorando. – Rafa mordeu o canto do lábio, incomodada com a lembrança – Isso fez a gente perder um tempão e se agredir um pouquinho pelo caminho até resolver tudo de novo, só muuuito tempo depois.

Outra pausa silenciosa se estabeleceu no ambiente, mas logo ela foi preenchida pela voz suave de Rafaella que voltou a soar.

R: Mas essa parte ruim não importa muito. – O olhar e o sorriso cheio de covinhas afogaram o ouvinte em ternura antes do complemento:

– Afinal, o combinado nesses momentinhos só nossos é eu te contar um pedacinho feliz da minha história de amor com a sua mãe, não é mesmo?

Rafa sorriu quando os olhinhos no tom de verde que ela já tinha aprendido que significava atenção e foco totais lhe encararam, e uma repuxadinha no canto da boca que ela tinha envolvendo seu seio esquerdo lhe deu a impressão de um sorriso concordante.

R: Cê gosta, né? – Expandiu ainda mais o próprio sorriso – Quanto mais trouxa é a mamãe Rafa em uma história que ela te conta, mais você dá risada e se diverte, né, trenzinho safado igual a sua m˜ãe?

Sem parar de mamar, o bebê apertou os dedos de Rafa que brincaram com sua mãozinha.

R: Às vezes eu sou exagerada assim mesmo, filho, me preocupo demais com ela e até peso um pouco, mas a verdade é que eu sempre faço com a melhor e mais pura intenção do mundo... – Uma nota discreta de tristeza em seu tom de voz a impulsionou a incrementar ainda mais sua defesa – A intenção nunca é pesar, mas cê já percebeu o quanto a sua mãe faz bagunça às vezes? Fica muito difícil ter sangue frio e levar tudo com um sorriso no rosto.

Rafaella soltou o ar e, enquanto o bebê ainda terminava de se alimentar, ela jogou a cabeça no encosto da poltrona e ficou uns segundos encarando o teto, mas logo lembrou-se de remediar.

R: Tem hora que ela é mesmo uma mão cheia de tanta dor de cabeça e perturbação, filho. Não dá pra negar, mas... – Rafa baixou o rosto e encostou o nariz na cabecinha do neném para se entorpecer com o cheirinho dele e lhe deixou um beijo carinhoso antes do complemento imprescindível:

– Ela é o maior amor das nossas vidas e isso você não pode esquecer nunquinha.

No mesmo segundo, Bento se afastou do peito deixando claro que estava satisfeito e Rafaella sorriu ainda mais apaixonada quando ele esfregou o olhinho direito, com o semblante sonolento.

R: Ah nem... – Apoiou ele com as costinhas em suas coxas – E tem gente que ainda diz que só a genética é que conta, né? Olha essa preguicinha gostosa igual a da sua mãe. – Continuou o ataque de beijos – Não dou conta de vocês dois, não.

Distraídos nas risadas gostosas daquela interação, mãe e filho quase perderam, mas a voz que sempre seria notada preencheu o ambiente:

– Sempre deu.

Ainda sustentando um sorriso imenso, Rafaella ergueu o olhar em direção à porta e ele foi encolhendo até se transformar no riso discreto que saudou a presença acanhada de Bianca parada com o corpo apoiado no batente, incapaz de se aproximar, mas com o sorriso arrebatador no rosto.

Os olhares estabeleceram a conexão magnética e já tão familiar, e ela só foi quebrada pelo movimento persistente e impetuoso no colo de Rafa, que exigiu sua atenção.

R: Ouviu sua voz e tá esperneando. – A mineira pegou Bento nos braços, virou-o de frente para a porta e não conseguiu manter a discrição no sorriso por muito mais tempo, pois o gritinho adorável que ele soltou quando enxergou a outra mãe foi carga de fofura potente demais e só poderia mesmo merecer um sorriso completo.

B: E não é que ele já comemora mesmo quando eu chego? – Orgulhou-se irremediavelmente e finalmente caminhou para chegar mais perto.

R: É um mini falso, isso sim... – Caprichou no tom ameno e recebeu um selinho de Bia – Cinco meses mamando nas horas certas, feito um bezerrinho esfomeado e, mesmo assim, nem disfarça a preferência.

B: Aiaiai... – Pegou o bebê dos braços de Rafa com a interjeição e a voz que lhes eram tão características, encheu-o de beijos e cheiros, e emendou como se falasse pelo bebê – Não exagera no drama, mamãe boazuda, porque eu só gosto mesmo é de farra e me amarro quando a casa tá cheia.

R: Vou contar bastante essa versão para a minha autoestima. – Rafa arqueou as sobrancelhas e alcançou o lenço umedecido ao lado da poltrona para higienizar o seio.

B: Continua com o mamilo dolorido ou hoje foi um pouco melhor? – Cortou o tom de humor e se interessou.

R: Tá tranquilo. – Ajeitou o seio de volta no sutiã – Ele pressionou menos hoje, acho que está menos incomodado.

B: Será que esses dentinhos vão despontar um pouquinho antes da hora mesmo, cara? – Fez um carinho no cabelo castanho clarinho do bebê, que tinha desistido da empolgação e já tinha o rosto apoiado em seu ombro.

R: Acho que já é uma realidade. Mais cedo ele estava agitado que só, eu massageei a gengivinha dele e baixou o facho na hora.

B: Ainda bem! – Embalou o filho suavemente – Tá chumbadinho já, né?

R: Sim, já estava bocejando e tudo mais. – Sorriu fraco e não resistiu – Cê tava aí na porta faz tempo ou chegou agora?

B: Agora. – Respondeu lacônica e caminhou até a cômoda para pegar uma fralda para limpar a boca do filho.

R: Hum.

B: Corri bastante, mas graças a Deus cheguei em tempo de colocar ele pra dormir.

R: É verdade. – Apoiou as duas mãos na poltrona e ergueu o corpo – Bom, então vou aproveitar que você já assumiu o posto e ir tomar meu banho.

Rafaella ia passando por Bianca, mas a carioca não permitiu que ela saísse assim.

B: Não quer me esperar? – Segurou-a pelo braço com a mão livre – Eu também tenho que tomar banho e a gente pode fazer isso juntas.

R: Vai ficar muito chateada se eu for antes mesmo? – Fez uma careta amistosa – Tô me sentindo cheirando a leite tem um tempão e só queria me livrar disso.

B: Claro que não. Tu merece descansar e se sentir bem o quanto antes, vai lá! – O sorriso veio compreensivo, mas com um toque de tristeza que só Rafaella seria capaz de enxergar.

E foi por isso que, mesmo tendo passado tanto tempo contrariada naquele dia, Rafa não conseguiu reagir de outra forma e precisou se mostrar ainda mais receptiva.

R: Terminou o dia de trabalho bem? – Levou a mão ao rosto da esposa.

B: Terminei, sim. – Virou o rosto para beijar a mão de Rafaella – Com saudade de vocês dois, mas foi tudo em paz.

R: Que bom! – O sorriso amoroso acalmou um pouco mais a angústia de Bia – Aproveita seu momento com ele pra matar sua saudade do pequenininho e eu te espero no quarto, tá bom?

B: Tá. – O sorriso ainda desconcertado mereceu o beijo carinhoso que ensaiou a saída de Rafaella do quarto.

R: Vem ficar comigo, filha gatinha. – Abaixou e pegou Lua que, como de costume, estava ali por perto – Hora de te dar um colo também.

Bia sorriu com a cena, assistiu as duas saírem do quarto e depois sentou com Bento na poltrona de balanço, embalando os dois por um tempo.

Percebendo que os olhinhos verdes ainda a encaravam, não resistiu ao tom hilário:

– Achei que a gente era brother, mas tu não fez o que eu te pedi antes de sair, Ben. Não ajudou a limpar a minha barra e a mamãe boazuda ainda tá brava.

É claro que o mais provável é que ele não tivesse entendido uma palavra sequer, mas já era tão apaixonado pelo tom irresistível daquela mãe que levar a mãozinha à boca e sorrir foi inevitável.

B: Quem aguenta tu já me dobrando com essas esmeraldinhas e as covinhas ridículas da tua mãe, hein?

Bia não resistiu e ainda beijou mais vezes o filho, mas em seguida reduziu a marcha e tentou ter juízo para deixá-lo sereno para encontrar o sono.

Demorou ainda uns minutos, é verdade, mas ela conseguiu fazê-lo dormir.


-----


Quando voltou à suíte delas, Bia encontrou Rafa de costas para a porta, sentada na mesa de apoio e distraída com o laptop enquanto secava o cabelo com a toalha.

A carioca entrou sorrateira, ensaiou uma aproximação de surpresa, mas foi ela a surpreendida:

– Deu trabalho pra dormir? – Rafa nem tinha precisado girar o corpo para perceber a presença da esposa.

B: Nã-Não... – Perdeu o compasso e limpou a garganta – Ainda deu umas risadas, mas acho que ele estava cansadinho mesmo.

R: Ele espoletou demais da conta hoje, sabia que dormiria fácil. – A atriz girou sutilmente o rosto e barrou qualquer outro passo de aproximação de Bia – Vai tomar seu banho, deixei seu roupão pendurado ao lado do box.

B: Obrigada.

Bianca suspirou e não insistiu naquele momento.

Depois de um tempo, voltou de banho tomado e, percebendo que Rafa se mantinha na mesma posição e que dessa vez realmente não teve a presença notada, a carioca caminhou o mais silenciosamente que lhe foi possível e conseguiu surpreender a esposa com os braços tatuados que deslizaram em seus ombros e enveloparam seu peito.

B: Não sei se eu fico mais fraca com o cheirinho de neném ali do quartinho ao lado, ou com o cheiro maravilhoso da namoradinha boazuda me esperando. – Deslizou o nariz no pescoço de Rafaella, que reagiu ao arrepio encolhendo o ombro.

R: A comparação não é justa, e me deixa com pouca chance nessa vida. – O sorriso frouxo foi a resposta inevitável.

B: Tem razão, são coisas tão diferentes... – Suspirou e se manteve agarrada ao pescoço de Rafaella – Já tive meu pouquinho de neném gostosinho, e agora preciso do meu amor.

R: Eu tô aqui. – Acariciou os braços que cruzavam em seu peito, mas não conseguiu dizer mais nada.

Bianca respirou fundo e não quis enrolar mais.

B: Tá chateada comigo ainda, né? – Tentou amenizar com um beijo carinhoso na bochecha da esposa.

Rafa mordeu o lábio, teve o instinto ariano de manter a marra a todo custo, mas seus trinta e dois anos de vida e cinco de amor por Bianca lhe impediram de fazê-lo.

Por isso, ela puxou delicadamente o braço direito de Bia e a conduziu para o lugar que ela sentia ser o mais protegido possível para a esposa: seu colo.

Bianca se acomodou sentada nas coxas dela, elas ficaram se olhando por uns segundos, e a apresentadora insistiu:

– Não me respondeu.

R: O que é que você acha, Bi?

B: Eu não quero achar nada, amor, eu quero te ouvir. – Levou uma mão ao rosto da esposa.

R: Não tem muito o que dizer. – Deu de ombros – Eu preferia muito que as coisas não fossem assim, mas eu respeito a sua vontade. Só preciso de um tempo para processar isso, cê já me conhece.

B: Conheço e não gosto de te sentir assim. – Disse com angústia evidente no tom de voz – Eu sei que eu cheguei em cima da hora de ele dormir hoje, desculpa por isso, mas eu estou me esforçando muito para não perder nada e acho que se eu continuar me organizando direitinho isso não vai acontecer e eu vou conseguir estar por perto pra você e pra ele o máximo que eu puder, não vou descumprir o que nós combinamos.

R: Não tem nada a ver com o que nós combinamos, Bi. – Detestou ouvir as palavras quase atropeladas em um fôlego só e tentou logo esclarecer, mas foi impedida de prosseguir.

B: Por acaso eu tenho vacilado com vocês e tô falhando com alguma coisa?

R: Não, Bia, eu... – Coçou a testa impaciente e, outra vez, não conseguiu concluir.

B: Pode falar, que eu prometo que vou correr atrás de consertar.

R: Ei! – Segurou o rosto lindo entre as duas mãos e calou a tagarelice desenfreada com um selinho, iniciando o esclarecimento na sequência – Você tem sido impecável em fazer a sua parte e não tem nos faltado nada. Aqui nessa casa tem um bebê que esperneia de felicidade quando você chega de tanto amor que você dá pra ele; e uma esposa que constantemente se sente a mulher mais desejada e sortuda do universo, de tão bem que você faz pra ela.

Bia soltou um jato generoso de ar, deixando claro ter retido uma quantidade monstruosa dele nos pulmões antes de ouvir o esclarecimento, e encostou sua testa na de Rafaella.

B: Essas são as minhas maiores preocupações, não duvide nunca disso. – Sussurrou.

R: Eu sei e não duvido. – Afastou Bia e fez questão de ter o olhar dela de novo encarando o seu – A minha questão com seus projetos profissionais novos é justamente por saber que você não vai ser capaz de fazer nada pela metade, amor, porque você é perfeita em tudo que faz e, consequentemente, acumulando tanta coisa assim, vai levar seu corpo e sua saúde ao limite.

B: Eu vou saber dosar...

R: Cê sabe que não vai... – Repreendeu ela com o olhar – E vai se castigar, se prejudicar e, como se isso não fosse ruim o suficiente de assistir, quando a gente menos esperar, bebê e esposa estão sentindo falta desse amor todo que você dá pra gente, porque você vai ter que recuar e se cuidar. Então ninguém sai ganhando com isso, amor.

B: Mas eu queria tanto trabalhar nessa linha de produtos nova... – Fez uma careta fofa e se aconchegou ainda mais no colo de Rafaella – Quando me ligaram com a proposta eu fiquei doida e, desde então, só o que eu faço é quebrar a minha cabeça para encaixar tudo bonitinho e não prejudicar a nossa vida.

R: Eu sei... – Acariciou os cabelos longos da esposa – Mas esse prejuízo consigo mesma você não está computando, porque nunca enxerga e sou eu que tenho que ficar te lembrando que você é humana e não pode carregar o mundo inteiro nas costas.

B: Não é o mundo inteiro. – Contestou veementemente – São só delineadores, sombras, contornos, pó e iluminadores novos.

Rafa olhou indignada e a carioca seguiu sendo absolutamente sem juízo.

B: Ah, tem o lápis de olho também, mas é só.

O sorriso travesso beirou o insuportável e Rafaella atacou o pescoço de Bianca com beijos e mordidinhas indignadas.

R: Mas vê se eu dou conta desse trem cara de pau, meu Deus! – Firmou a cintura de Bia, tombou seu corpo e pressionou um beijo nos lábios dela.

B: Só reclama, reclama e reclama da gente... – limpou o rosto de Rafa das mechas de cabelo, ainda com o tronco curvado pra trás e o peso do corpo da esposa suavemente sobre o seu – Diz que não dá conta de ninguém e não sei o quê mais, mas sempre tem colo pra todo mundo nessa casa.

A mineira sorriu mais apaixonada ainda quando sentiu os braços de Bianca envolverem seu pescoço, endireitou novamente o corpo dela em seu colo e encaixou melhor o abraço.

R: E eu espero que você saiba que vai ter esse colo pra sempre mesmo... – Beijou docemente o ombro da esposa antes de dar continuidade na pequena bronca, ficando frente a frente novamente – Mas isso não significa que eu vou me perder nessas gotinhas fofas e bem desenhadas que enfeitam essa carinha travessa que eu amo, e te deixar aprontar todas. Vou reclamar e te enquadrar quando achar necessário, sim.

B: Eu te amaria menos se não fosse assim... – Suspirou resignada e completou a infamidade:

– Infelizmente, eu sofro da doença "tesão extremo a cada enquadrada de Rafa Kalimann".

R: Besta! – Apertou mais a esposa entre os braços, distribuiu alguns cutucões e divertiu-se com a gargalhada gostosa dela.

B: Para, amor! – Esquivou-se do ataque.

R: E é "Rafa Kalimann Andrade" pra você, tá? Já deu tempo de aprender. – Pronunciou fitando intensamente os olhos castanhos.

B: Aí eu gamo mais ainda...

Os sorrisos que trocaram resplandeceram as cores mais vibrantes e límpidas da sintonia delas e Bianca precisou completar o momento com o beijo calmo e apaixonado que, enfim, colocaria tudo no lugar para que encontrassem de vez o entendimento.

B: Eu amo demais ficar assim contigo, nesse climinha gostoso, mas eu só preciso entender o que você espera de mim nessa situação toda que te chateou pra saber se eu sou capaz de alcançar. – Depositou outro selinho carinhoso.

R: Eu? Por mais ariana que eu seja... – Sorriu de canto e brincou com a gola do roupão de Bianca – Eu espero que você não coloque a minha vontade antes da sua, mas que também tenha muita responsabilidade com a sua saúde física e mental, porque eu preciso de você inteira e bem do meu lado pra eu ser feliz.

Bia ficou encarando o olhar esverdeado por uns segundos antes de reagir:

– Carái, como joga baixo!

R: Ah, eu jogo baixo? – Gargalhou irônica – Desde que cê chegou cê tá com essa carinha de cachorro que caiu da mudança e eu que tô jogando baixo.

B: Tu joga baixo só de respirar sendo linda desse tanto... – Mordeu a bochecha dela divertidamente – Mas, no caso, tá jogando baixo sendo tudinho assim.

R: Fui sincera e racional, apenas isso. Porque se eu fosse sincera e emocional, eu ia era te prender nessa casa pra evitar de continuar fazendo as suas loucuras por aí. – Exagerou na sinceridade.

B: Ahhh, agora sim. – Sorriu vitoriosa.

Rafaella revirou os olhos e tentou ser mais eficiente na negociação.

R: Não tem como jogar esse projeto para o segundo semestre do ano que vem? No primeiro já vai ter tanta coisa acontecendo, minha linda... – Caprichou no tom persuasivo – Gravação da temporada do programa, suas outras linhas de produtos, preparação e início das gravações do meu próximo trabalho, todos os nossos outros assuntos profissionais que já existem e, principalmente, tudo que o Bento vai demandar da gente nesse primeiro ano completo de vida.

B: Se desse, é claro que eu faria, amor, mas a marca quer esses lançamentos para o próximo semestre mesmo. – Torceu os lábios.

R: E é isso tudo de importante pra você, né?

B: Eu já queria dar esse salto com a formulação e acabamento dos produtos há algum tempo, mas é claro que não é mais importante do que você se sentir confortável com isso e se, mesmo eu te garantindo que eu consigo, tu discordar de mim, eu vou recuar.

R: Ô, meu Deus... – Abraçou a esposa apertado – É muito errado eu amar você passivinha assim?

B: Errado não é, mas é uma mentira das grandes, porque nós sabemos bem o que é que tu curte.

R: Bobeou cê alopra mesmo, né, Boca Rosa? – Afastou do abraço com o tom repressor.

B: Tu me deu o passe redondinho, eu só chutei para o gol.

Rafa franziu o cenho.

R: Vou fingir que não ouvi a analogia podre de boleiro. – Balançou a cabeça negativamente – Mas voltando ao nosso assunto, a gente não consegue falar sério sem se implicar e se agarrar, mas não é da boca pra fora, tá?

B: O que? – Perdeu-se, como era o esperado.

R: O que eu disse sobre não querer que você coloque a minha vontade na frente. Se é isso tudo de importante pra você, eu quero te ajudar a achar um jeito de encaixar isso na nossa vida.

B: Eu não quero que tu se preocupe com mais nada, amor. – Foi sincera no incômodo – Quando eu falo que eu vou conseguir organizar, eu vou mesmo. – Fixou o olhar mais persuasivo que foi capaz no rosto.

Rafaella respirou fundo e passou a mão no rosto de Bianca.

R: Vamos amadurecer um pouquinho mais isso? Eu vou me esforçar mais e melhor para me acostumar com a ideia, e vai ficar tudo bem. – Beijou a pontinha do nariz de Bia.

B: Eu só não queria trazer nenhuma dificuldade desse tamanho todo entre a gente.

R: E não trouxe... – Sorriu amorosa e não economizou na sinceridade – Até porque, modéstia à parte, não é dificuldade nenhuma te fazer caçar rumo nessa vida.

B: Vou fingir que acredito, porque eu me amarro em uma mulher cheia de autoestima. – Foi a vez dela de atacar o pescoço da esposa.

R: Alá... – Tentou afastar a cintura da carioca e fugir daquele clima que as palavras até tentavam dizer o contrário, dando um colorido mais sóbrio e sério, mas a realidade é que um pouquinho mais de sua dignidade esvaía a cada manifestação encantadora da mulher que ela amava tanto. E ela evitaria se perder tão cedo assim. – Fui salva pelo gongo.

B: Que gongo, garota? – Não se deixou afastar.

R: A porta, não ouviu? – Forçou e conseguiu distância suficiente para fazer Bia prestar atenção.

B: Uai, o que é? – Franziu a expressão facial.

R: Nosso jantar.

B: Jantar? Que jantar? – Pulou do colo de Rafa.

R: Que o Guel me ajudou a produzir. – A mineira levantou irritantemente calma, alinhando o roupão que ela também vestia e caminhou até a porta.

Ainda desconcertada e atordoada, Bianca foi atrás, claro.

B: Eu nem sabia que você estava nessa casa hoje, Miguel. – Assim que a porta abriu, disparou a falar antes de todo mundo, ainda nas costas de Rafaella.

M: Fui convocado e aceitei a missão. – O amigo trazia com ele um carrinho lotado de coisas.

B: Eu esqueço que hoje em dia tu obedece mais ela do que eu. – Falou em tom levemente emburrado.

R: Dá moral para o pinscherzinho, não, Guel. – Afastou Bia facilmente com um braço só, mantendo-a atrás de si e impedindo que ela avançasse para bisbilhotar, como tentava fazer – Ai, obrigada, o que seria de mim sem você?

M: Fiz o melhor que pude com as suas instruções, meu amor! – Beijou o rosto de Rafaella e empurrou o carrinho em sua direção – Precisa de mais alguma coisa?

R: Claro que não, você já fez tudo. – Sorriu com gentileza – Agora corre e vai aproveitar sua noite!

Enquanto Rafaella foi entrando com o carrinho no quarto, Bia permaneceu parada na porta e não resistiu.

B: Foi por isso que tu me deu perdido desde o meio da tarde, Senhor Miguel?

M: Eu estava mesmo ocupado tentando ajudar sua esposa... – Disse displicente – Mas você deveria é me agradecer, Boca.

B: Ah, pronto, me abandona, ignora e eu ainda deveria te agradecer? – Soltou uma risada debochada.

M: Deveria, sim. Afinal, eu fiz tudo isso porque continuo preocupado.

B: Com o que? – Cruzou os braços na frente do corpo, como se pudesse antecipar que precisaria da defesa.

M: Aquela preocupação que não morre nunca em uma noite como essa, sabe? O sentimento de que toda ajuda é muito bem-vinda. – Bianca apertou os olhos e preparou-se para o que àquela altura já era uma certeza:

– Afinal, ainda é muito difícil acreditar que você dá conta daquilo tudo ali...

O cabeleireiro meneou a cabeça em direção a Rafaella e Bianca reagiu sendo Bianca.

B: Vaza daqui, Miguel! – Descruzou os braços para estapear de leve o ombro dele e saiu empurrando-o para longe dali.

M: Te amo, chefa! – Fechou a distância de novo, obrigou a amiga a receber o beijo estalado e saiu dali às gargalhadas.

R: A piada que não morre nunca entre vocês. – A mineira riu e só chacoalhou a cabeça negativamente.

B: Pois é, mas antigamente tu me defendia, né? Agora só ri.

Rafa deixou o carrinho perto da mesa na varanda do quarto delas, e antes de voltar ao interior do cômodo, parou frente a frente com Bianca.

R: Meu amor, eu realmente achei que a essa altura isso aqui era suficiente... – pegou a mão esquerda de Bia e beijou a aliança – Até um filho nós já temos juntas, então tá bem óbvio que cê dá conta e muito bem dado, né? Mas acho que fazer esse draminha também está incluído nessa dinâmica louca, ou não?

B: Talvez esteja! – O sorriso travesso foi inevitável.

R: Cara de pau toda vida, né? – Segurou o queixo dela, deixou um selinho e continuou entrando enquanto Bia foi até onde Rafa tinha deixado tudo.

B: O que você preparou pra gente? – Começou a descobrir as travessas de comida e abriu a boca em surpresa – Meu Deus, tem tudo que eu gosto aqui ou é impressão minha?

A carioca foi ainda mais surpreendida pelos braços carinhosos que enlaçaram sua cintura e o hálito morno em seu pescoço.

R: Parece que sim, não? – Apoiou o queixo no ombro de Bia e esticou o olhar para as travessas – Pelo que eu estou vendo, está tudo aí direitinho, como eu planejei: seu suco preferido, sua salada favorita, massa, peixinho, sobremesa... – E a mordidinha safada no pescoço precedeu a malícia final:

– Boatos de que eu não esqueci nem da mulher dos seus sonhos, sabe?

Bia fechou os olhos com a primeira onda de excitação boa que percorreu seu corpo antes de conseguir reagir com palavras.

B: E eu que vim do escritório até em casa morrendo de medo da bronca? Ah, se eu soubesse... – Acariciou os braços de Rafaella em sua cintura e sorriu mais ainda com os beijos em seu pescoço.

R: A bronca é pra levar muito a sério, mas ficou presa no nosso momento de uns minutos atrás... – Girou Bia delicadamente em seus braços, colocando-a de frente novamente para esclarecer – Preparei esse momento pra gente e nele não cabe bronca.

B: Contigo sempre cabe. – Continuava custando a acreditar.

R: Também não cabe drama, pode parar... – Sorriu e beijou a testa da esposa – Ou então eu vou achar que não gostou da surpresa.

B: Gostar? Muito pouco... – Estalou os lábios – Eu amei!

R: Ótimo! Vamos jantar então?

B: Vamos. – Desvencilhou-se da proximidade – Eu vou só trazer a babá eletrônica pra não ter risco de a gente não ouvir.

Bia foi deixando a sacada de volta para o quarto, mas foi impedida pela mão firme de Rafa que segurou seu pulso esquerdo.

R: Não tem babá eletrônica essa noite.

B: Amor? – Fez uma careta incrédula e tentou de novo ir até o quarto.

R: Tô falando sério, trem insistente! – Segurou mais firme ainda e puxou-a de volta – Sem babá eletrônica, porque o neném hoje vai ficar é por conta da babá humana e, se acontecer alguma coisa, ela bate na porta ou liga no meu celular.

B: Não sei se eu gosto da ideia. – Torceu os lábios.

R: Que bom então que, justo hoje, as ideias não são negociáveis, então pode tirar isso da cabeça. – Disse cínica e conduziu Bia para a mesa, puxando a cadeira pra ela – Senta que eu vou te servir!

B: Mas não vai atrapalhar se a gente só acompanhar de leve, sem ir lá e só tendo certeza de que está tudo bem. – Obviamente ignorou os gestos de gentileza e, principalmente, a parte de "não negociável".

R: Sei bem que cê já tem um vício no seu pay per view de Baby Bento, mas essa noite vai ter que se contentar só com a mãe dele mesmo.

B: Ele não estava febril ontem a tarde? – Continuou sendo chata.

R: Ontem, Bia, ontem. Esqueceu que eu disse que ele aprontou todas hoje? Tá ótimo! – Passou o prato já servido para a carioca – E outra coisa, vou fingir que não percebi que fui completamente ignorada na parte de se contentar só com a mãe dele mesmo.

B: Ai, amor... – Coçou a testa, frustrada – Eu só fico preocupada, mas é claro que não estou desdenhando nada e muito menos você.

R: Eu sei... – Deixou um beijo nos lábios de Bianca antes de sentar em seu lugar à mesa – Eu só estou tentando te relaxar mesmo.

B: Desculpa. – Pronunciou acanhada e suspirou – Vou colaborar, prometo.

Rafaella alcançou a mão de Bia no tampo da mesa, apertou com um sorriso doce nos lábios e deu início ao jantar que tinha planejado ali mesmo, na suíte delas.

Na verdade, quando mudaram para aquela casa em São Paulo um dos critérios de escolha mais relevantes tinha sido justamente a ampla e confortável varanda que tinha ligada àquela suíte, que elas decoraram e adaptaram para ser o lugarzinho de paz delas, mas que, com o nascimento de Bento, pouco vinham aproveitando.

Mas aquela noite tinha sido cuidadosamente projetada por Rafaella para ser diferente.

B: Eu não aguento mais rir, sério! – Depois de terminarem de comer, gargalhando, Bia despencou o corpo no enorme futon rasteiro que também havia no local, cheio de almofadas confortáveis.

R: Não sei qual é a graça. – Rafa desdenhou, levantou também da mesa e caminhou para perto do futon para acender umas velas que sempre ficavam na mesinha lateral, e que ajudariam a compor o clima gostoso que ela queria.

B: Ah, amor... – Ergueu o tronco com os cotovelos apoiados no acolchoado – Tu há de convir que ficou para a nossa história o show que tu deu na noite daquela festa, chorando porque eu não fiz nenhuma investida pra transar.

R: Realidade: eu chorei porque você não estava mais demonstrando que me amava como antes. – Disse séria, parada ao lado do futon.

B: Nááááhhh... – Pegou o braço da esposa e puxou-a para deitar também – Tu queria era que eu surtasse de ciúmes pra colocar na conta mais uma trepada cheia da pegada furiosa de reconciliação, confessa! – Fez Rafa se acomodar em cima de seu corpo e a atacou com beijos e apertos.

R: Não pode dar uma treguinha que cê já alopra no convencimento, né? – Fingiu a tentativa de esquivar do ataque, mas de fato não fez força alguma.

Estava amando.

B: Anda! – Apertou ela ainda mais e fitou os olhos verdes intensamente – É só confessar!

R: Negar que foi um tremendo desperdício de oportunidade de liberar a energia acumulada, eu não vou. – Pronunciou e mordeu o lábio na sequência.

B: Aceito a confissão da missionária pastora da igrejinha, mas esperava mais. – Continuou provocando, desceu a mão na bunda de Rafa e limpou o rosto dela das mechas de cabelo.

R: Ótimo, porque eu também esperava mais daquela noite. – Devolveu à altura.

B: Mesmo? – Arqueou uma sobrancelha, indignada e intrigada.

R: O amorzinho foi uma delícia e inesquecível também, amor, mas né? – Deu de ombros.

B: Pelo visto, gentileza e bons tratos com as grávidas são mesmo desvalorizados nos dias de hoje. – Deu um tapinha na bunda da esposa e a apertou entre os braços.

Elas ficaram na mesma posição se curtindo uns segundos, com Bia acariciando os cabelos de Rafa, mas claro, a carioca não conseguiu sustentar muito tempo.

B: E se a gente desse só uma espiadinha no meu parceirinho? – Lançou, fechou os olhos e segurou a língua entre os dentes, pois já imaginava a reação que de fato veio.

Rafa deslizou o corpo, saiu de cima dela e ficou de lado.

R: Seu parceirinho tá no quinto sono, Bia. – Censurou também com o olhar.

B: A gente pode não ouvir a porta quando a babá bater. – Continuou alucinando.

R: O celular tá aqui ao lado. – Apontou para a mesinha que acomodava as velas – É só ela ligar pra mim, foi esse o combinado.

Bianca suspirou e torceu os lábios.

R: Cê reparou que eu nem tentei te arrastar pra longe de casa pra essa noite, né? Não marquei restaurante, suíte em hotel e nem nada parecido, porque imaginei que o show seria maior ainda. – Seguia indignada – Planejei tudo pra acontecer aqui mesmo, pra você não reclamar de deixarmos ele "sozinho". – Desenhou as aspas no ar.

B: Eu não reclamo, só digo que ele ainda é tão pequenininho e não tem por que sair. A gente já saiu tanto nessa vida...

R: Desisto! – Jogou as costas no futon, abrindo distância, e bufou.

Bia se permitiu refletir por alguns segundos – e consequentemente, se amaldiçoar por ter pesado de novo – mas se esforçou para não demorar demais a reagir.

B: Desiste nada! – Fechou de novo a distância, jogou a perna esquerda sobre o quadril de Rafa, aconchegou-se melhor e puxou o queixo dela para alinhar os olhares antes de jogar mais baixo ainda, cheia de sotaque:

– Sou eu a esquisita, mas eu gosto do seu abraço.

Rafa tentou segurar o sorriso, mas como o esperado, não resistiu.

Usou o braço esquerdo para envolver o corpo da esposa ainda mais protetoramente dentro de seu abraço e também fez o esforço para retornarem à sintonia anterior.

Pra isso, e querendo que a frequência não fosse mais alterada, ela resolveu ser inequivocamente sincera.

R: Acho que cê não entendeu muito bem porque eu preparei tudo isso hoje. – Beijou os cabelos de Bia, suavizando ainda mais.

B: Não? – Ergueu o olhar.

R: Quero acreditar que não, né? – Riu dela – Porque acho que, se tivesse entendido, não estava me dando essa trabalheira toda.

B: Não é trabalho, é só saudade do "nenéim". – Usou toda a manha do mundo no tom de voz para continuar dobrando Rafaella.

R: Que seja! – Revirou os olhos e não se deixou desviar – Eu planejei tudo, diminuindo ao máximo o risco de você se preocupar por estar longe dele ou por qualquer outro motivo, porque eu tô morrendo de saudade de você.

B: Saudade de mim, amor? – Franziu o cenho – Eu não ando passando tanto tempo fora assim, tenho tentado reduzir o máximo que eu posso dos meus compromissos e...

R: Ei, sem entrar na defensiva! – Selou os lábios delas – Eu não estou te cobrando nada.

Bia manteve a expressão perdida no rosto e Rafa completou:

– Eu tô morrendo de saudade da gente, amor. De ficar assim com você, dando risada até doer a barriga e agarradinhas falando besteira. – Apertou mais ainda Bianca no abraço lateral – Têm sido os meses mais felizes da minha vida, casada com você e com o nosso filho crescendo lindo e saudável, mas hoje eu me peguei sentindo uma falta imensa disso.

B: Mas eu achei que, apesar da correria da nossa jornada tripla de boss, esposa e mãe, a gente vinha conseguindo se curtir na medida do possível, e manter a nossa rotina de amorzinho.

R: O amorzinho continua. No tempo lindo que dividimos com nosso filho ou gravitando em torno dele; em cada cuidado que a gente tem com a nossa rotina; no sexo delicioso que a gente continua fazendo, porque pra isso a gente sempre arranja um tempo... – Falou com malícia e encostando uma testa na outra – Mas eu tô sentindo falta do romance gostosinho e, principalmente, de cuidar de você.

B: Cuidar de mim? – Riu do que lhe pareceu quase uma piada...

Mas não era.

R: Sim. – Acenou afirmativamente com a cabeça – Hoje, quando você saiu daqui naquele clima ruim, depois de a gente ter se estranhado ontem a noite porque cê veio me contar desse projeto novo gigantesco, meu peito apertou demais da conta e eu me dei conta de que eu te deixei muito tempo sem supervisão, sabe?

B: Eu já disse que não queria que fosse essa perturbação toda.

R: E eu já disse que não é. – Cortou logo – O que me perturbou foi mesmo me dar conta de que você passou um ano e meio vivendo para cuidar de mim, de tudo que deu errado ou muito certo durante o processo todo até a gente ter o Bento e, ainda assim, depois que ele nasceu eu continuei mais focada nele e te deixei meio de lado.

B: Acho que é esperado que seja assim, não?

R: Dizem que sim, mas eu não quero que seja. – Puxou Bia para cima do corpo dela para encará-la rosto a rosto – Eu quero ter esse tempo pra gente falar esse tantão de bobagem que a gente falou no jantar...

B: E olha que eu bebi só um pouco e você não bebeu nada por causa da amamentação e, mesmo assim, só falamos merda.

R: Sim, e foi tão bom, não foi? – Bia balançou a cabeça concordando – Aliás, está sendo bom. E cada minuto que passa eu vejo mais nitidamente o quanto eu senti falta desse tempo com você, de te mimar, me dedicar só a ouvir as suas histórias, censurar seus exageros, planejar seu prato favorito, montar a playlist pra um jantar nosso, me derreter com seus dengos e suas manhas... – Abriu um sorriso rendido – Te fazer um carinho enquanto eu te tenho assim, amontoadinha em mim, e ter a certeza do tamanho da sorte que eu tenho por amar alguém tanto assim.

B: Tu já tinha me convencido quando disse que tava com saudade de mim, mas deixei rolar a listinha de paparicos, porque eu também gosto de ter a certeza do tamanho da sorte que eu tenho. – Desmanchou Rafaella mais ainda com o sorriso indecente.

R: Pois então, nós duas tiramos a sorte grande e, além de todas essas coisas, esse momento eu planejei pra te dizer que eu tô de volta, vigilante e atenta pra cuidar de você e te impedir de fazer merdinha sendo errada e errante, tá? – Tocou a pontinha do nariz dela.

Bianca sorriu de lado e resolveu não lutar mais.

B: Já que é assim, Baby Bento que se cuide com a concorrência então, porque eu faço manha quando percebo que não estou recebendo atenção, esperneio quando me acordam do sonho bom que é ter a mãe dele só pra mim, e também choro quando quero mamar.

R: Sua podre! – Firmou a cintura de Bia e derrubou-a com as costas no futon, pesando parcialmente o corpo sobre o dela.

B: Ih, nem vem censurar... Quem chora porque não teve a trepada de reconciliação não tem lugar de fala!

R: O respeito deixou lá no berço com seu filho, né?

B: Tu falou que tava com saudade de mim, não falou? – Levou a mão ao maxilar da esposa e completou – Eu sou isso aqui, agora é pegar ou largar!

R: É sempre pegar, meu amor.

Rafa avançou nos lábios de Bianca e elas se beijaram demoradamente.

Bia ergueu sutilmente a coxa direita, tentando encaixá-la entre as pernas da esposa, mas quando tentou procurar a fenda do roupão de Rafaella para explorar com a mão por baixo do tecido, a mineira descolou os lábios e voltou a deitar ao lado da apresentadora.

R: Vamos conversar mais um pouco pra fazer durar mais esse romance gostosinho, vai! – Respirou fundo, tentando baixar a excitação.

B: Esquentou, né? – Deu risada do desconcerto de Rafa e levou a mão ao interruptor ao lado do futon – Felizmente dá pra refrescar ainda mais.

Elas olharam pra cima e assistiram o teto retrátil se abrir.

R: Bendito seja o teto de motel que você mandou colocar nessa varanda. – Tentou debochar, mas tomou a invertida esperada.

B: Vou fazer o que se eu tenho uma esposa com fetiche em transar a céu aberto? Tenho que tentar agradar, né?

R: Até parece... – Ficou de lado e apoiou o rosto na palma da mão para olhar para Bianca – Seu discurso para justificar esse teto foi um pouco mais decente do que isso.

B: Foi? Não tô lembrada. – Pronunciou sem juízo e sorrindo travessa.

R: Não tá, não, né? – Apertou os olhos.


FLASHBACK:

SÃO PAULO, MAIO DE 2024:

Sentadas no banco traseiro do uber que as tinha levado ali, Bia observou a esposa com o olhar lateral, enquanto Rafaella fitava pela janela do carro, aprisionada nos próprios pensamentos.

A carioca hesitou um pouco, mas acabou se aventurando em resgatá-la da introspecção, com o máximo de carinho que foi capaz:

– Vamos, amor, ou precisa de mais um tempinho?

R: Vamos, sim. – A mineira pareceu recuperar o fôlego, pegou a mão de Bia que tinha em sua coxa e beijou.

O casal desceu do carro agradecendo o motorista com gentileza e, de mãos dadas, elas entraram naquela que, em breve, passaria a ser a casa nova delas em São Paulo.

B: Vem aqui, amor! – Sem dar muita brecha para a esposa pensar demais, Bia saiu puxando sua mão pela sala – Vê se tu gosta desse acabamento que fizeram no rodapé. Eu achei um pouco larga demais essa borda, gosto da mais estreita, mas o arquiteto disse que essa é a mais usada hoje em dia, então não sei.

R: Acho que tá bom assim, Bi. Parece com o da chácara. – Disse sem muita emoção, soltou a mão da apresentadora e foi observar outro ponto da sala.

A quase apatia, porém, só teve o efeito de fazer Bianca desembestar a falar e se esforçar ainda mais para explicar todo e qualquer detalhezinho novo das últimas semanas na obra, constrangendo Rafaella com o olhar e exigindo uma opinião em diversos momentos.

E o esforço era recíproco, porque a mineira também lutava muito para não deixar a esposa sem respostas ao menos minimamente aceitáveis.

No andar superior, quando entraram no corredor que conectava os quartos, Rafaella acelerou o passo para ultrapassar os outros cômodos e ir direto à suíte delas, no final do corredor.

Bianca assistiu a cena com uma nota de tristeza no olhar, mas ainda assim, não esmoreceu.

Respirou fundo e preparou o texto sobre os detalhes que ela precisava tratar com Rafa sobre tudo na suíte e em especial sobre o closet delas.

Afinal, não poderia dispensar a oportunidade que ela vinha tentando há tantos dias de ter Rafaella ali.

B: Se eu pedir para entregarem amanhã no teu escritório as amostras dos materiais para o closet, tu promete que vai olhar tudinho e pensar com carinho o que prefere pra gente decidir logo? – Abraçou a esposa por trás, tentando a todo custo descontraí-la e não pesar no tom de cobrança.

R: Eu já disse que confio em você, Bia, escolhe o que cê preferir e eu vou achar lindo. – Acariciou os braços em sua cintura e não parou o passo, já que, sem sair de suas costas, a carioca as conduzia em direção à varanda.

B: Eu vou ficar triste se for assim, Rafa. Eu já decidi mais do que eu gostaria sozinha e tô sentindo que tem tão pouquinho de você nas decisões dos últimos dias... – Já na varanda, Bianca girou-a entre os braços para tentar ser ainda mais incisiva – Eu sei que você tá desanimadinha, mas faz esse esforço por mim, vai!

Rafaella suspirou com o humor oscilando entre ligeiramente envergonhada e derrotada.

R: Eu não me importo mesmo de essa casa ter muito ou tudo de você. – Fez um carinho no rosto branco – Mas eu também não quero te deixar triste, então eu prometo que vou me empenhar mais.

B: No seu tempo, mas sem esquecer que eu tô aqui, morrendo de saudade de te ter comigo nessa. – O sorriso cheio de amor de Bianca arrasou Rafa ainda mais, mas só o que ela conseguiu fazer foi abraçar a esposa apertado e respirar fundo, mais uma vez.

Quando se soltaram, a mineira caminhou até o guarda-corpo da varanda, ficou observando os arredores distraída, mas tentou participar:

– Já entregaram alguns móveis daqui, né?

B: Sim, como a varanda foi o primeiro lugar que a gente definiu tudo, já começaram a chegar alguns. Pena que tá tudo coberto e ainda não dá pra ter uma noção.

R: Melhor assim... – Abriu um sorriso discreto e baixou os óculos escuros para protegerem os olhos agredidos pela claridade – Vai ser mais gostoso ver quando tudo estiver prontinho.

B: Isso é... – Pronunciou e o pequeno constrangimento silencioso outra vez assentou entre elas fazendo Bianca tentar achar outro assunto – Ah, tu viu que ficou pronta a coluninha que a gente precisava para a rede?

R: É mesmo? – Girou na direção que Bia apontou.

B: Sim, foi o melhor que eles conseguiram fazer pra criar o suporte que a gente precisava para o gancho, sem prejudicar demais a circulação. Aí o outro gancho vai mais ou menos aqui. – Mostrou na parede.

R: Vai ficar bom. No dia-a-dia, quando não quisermos usar a rede, a gente recolhe e aumenta ainda mais o espaço.

B: Essa é a ideia. – Inquietou-se quando o olhar de Rafaella vagou e estacionou outra vez na janela que ela sabia muito bem qual era.

Odiou demais o clima cada vez mais denso e percebeu que era mesmo hora de elevar o jogo.

Sem dizer nada, Bia caminhou até o futon que era um dos móveis que já tinham sido entregues e retirou o plástico que o cobria.

R: Bia! – Censurou imediatamente – Vai deixar descoberto por que? Pode sujar com o entra e sai de pedreiros, e toda a obra que ainda não acabou. Nem finalizaram a pintura aqui ainda.

B: Não vou deixar descoberto. – Jogou o plástico de lado – Só descobri agora, enquanto estivermos aqui... – Estendeu a mão e fez o convite – Vem deitar um pouquinho comigo?

Rafa ficou em silêncio e vacilou por muitos e angustiantes segundos, mas acabou não recusando.

Caminhou devagar e pegou a mão que por nenhum segundo Bianca recuou.

A carioca sentou primeiro, abriu as pernas e fez questão de encaixar Rafaella com as costas apoiadas em seu peito.

Demonstrando estar se sentindo acuada, a mineira abraçou com firmeza os braços de Bianca que passaram em sua cintura e soube que lhe competia dizer algo.

R: Eu sei que você esperava mais de mim hoje, desculpa!

B: Errou muito... – Beijou o ombro da esposa e completou em seu ouvido – Eu estou é orgulhosa de te ter aqui comigo, porque eu consigo enxergar em cada recortezinho dos seus olhos lindos o quanto está sendo difícil pra você.

R: Já era pra ter passado, né? Eu sei disso. – Suspirou.

B: Como eu te digo todos os dias, diversas vezes no mesmo dia: o tempo de cada um, é o tempo de cada um. Tu tem direito ao seu.

R: Eu sei, mas eu fico envergonhada, porque não aconteceu só comigo, né, Bia? Aconteceu com a gente e só eu continuo essa mula empacada que não supera.

B: Tu ser uma mulinha empacada faz parte do seu charme, amor. – Deslizou o nariz algumas vezes no pescoço de Rafaella e conseguiu extrair um sorriso.

R: Queria que você me entendesse menos e me situasse mais. – Jogou a cabeça no ombro de Bia e fechou os olhos.

B: Eu vou ter a vida inteira pra te situar, mas não vai ser agora que eu vou te pressionar a superar a expectativa frustrada com a nossa tentativa de engravidar, uma coisa tão importante pra gente.

R: Pois é, pra gente. – Enfatizou outra vez.

B: É normal que você sinta mais, minha linda. Você que foi entupida de injeções de hormônios, que se submeteu à coleta de óvulos e tudo mais que não deu certo. Não se cobra desse tanto.

R: Eu sei que eu vou te deixar triste dizendo isso, mas vir aqui parece que não tem mais o sentido que tinha antes, sabe? – Bia não precisou ver para ter certeza de que os olhos de Rafaella inundaram. A oscilação leve no tom de voz entregou – Passar pelas áreas de lazer, os quartos e principalmente o quarto que a gente reservou pra ele ou ela, tudo isso dói e faz as coisas mudarem de perspectiva, porque a gente planejou tudo nessa casa pensando na família que a gente ia começar.

B: Ia, não... – Puxou Rafa para sair da posição e deitar ao seu lado – Que a gente já começou.

R: Com a Lua, né?

B: Sim, com a Lua... – Tirou os óculos escuros da atriz e ficou com a metade do corpo por cima dela – E mesmo sem a Lua, eu e você sozinhas já começamos uma família.

R: Muito bonito e elevado da sua parte aplicar os conceitos modernos de família, mas no caso, eu sou uma mula empacada e tradicional mesmo.

Bianca sorriu apaixonada.

B: Empacada, tradicional e birrenta. – Estalou os pares de lábios.

R: Casou comigo, deve saber do que tá falando. – Soou mais birrenta ainda.

Bianca, entretanto, não se deixou levar porque tinha uma missão naquela tarde ensolarada e iria forçar o melhor que fosse capaz.

B: Por enquanto somos só nós duas e a Lua, amor, mas a gente só começou a tentar, vai dar certo quando tiver que ser. – Atou os olhares – Basta querer muito e o universo providencia, lembra?

R: Mais do que eu quis? – Os olhos verdes transbordaram e Bia sentiu seu coração estraçalhar.

B: Eu também quis muito... – Sussurrou e se emocionou junto – Mas a gente vai continuar querendo juntas e vai acontecer, de uma forma ou de outra.

R: De outra, com você tentando pra gente não perder mais o nosso tempo.

Bia sorriu fraco, mordeu o lábio e se concedeu o direito de esmorecer.

Vinha tentando animar Rafa há tantos dias que naquele momento ela sentiu como se seu corpo fosse entrar em colapso se ela não se desse aquela trégua.

Por isso, saiu de cima de Rafaella, deitou as costas no acolchoado e, tal qual a esposa, ficou encarando o nada por um tempo.

E foi olhando para o teto que ela encontrou forças e o caminho para continuar tentando.

B: Sabe que eu te trouxe aqui hoje porque tinha tanta opinião sua que eu queria em tantos pontos da obra, mas também porque eu tinha um surpresa pra você?

R: Surpresa? – Rafa olhou de lado, mas Bianca não encontrou seu olhar e continuou encarando o teto.

B: Uhum. Um detalhezinho besta que eu até achei que eu ia usar para tirar uma onda com a sua cara, mas acho que eu acabei de mudar de ideia.

R: Desistiu da surpresa? – Achou que tinha pesado outra vez o clima e sentiu-se mal.

B: Não. – Abriu um sorriso – Só recalculei a rota.

R: Não tô entendendo, amor.

B: Quando eu era pequena, sempre que a gente tinha um problema em casa, minha mãe me incentivava a rezar e dizia que oração de criança Papai do Céu sempre atendia. – Rafa estranhou a conversa sem nexo, mas não interrompeu – Eu acreditava tanto que, conforme eu fui crescendo, eu lembro nitidamente de me perguntar o que seria de mim quando eu fosse grande e minhas orações não fossem mais atendidas.

R: A sua cara distorcer o que a sogrinha disse com os seus dramas. – Debochou.

B: É, não tenho como negar... – Gargalhou leve – Mas sabe o que é mais a minha cara ainda? – Procurou o olhar de Rafaella.

R: Hum?

B: Traçar outra estratégia. Como eu disse agora a pouco, recalcular a rota. – Beijou a pontinha do nariz de Rafa antes de continuar – E foi o que eu fiz. Já que logo eu não teria mais o benefício de ser criança para ter mais credibilidade nas orações, por um tempo eu pensei que se eu adotasse um ritual, Ele veria meu esforço e continuaria me dando moral.

R: Tem razão, é muito a sua cara tentar ser malandra assim. – Riu mais largo ainda.

B: A gente vai para os corres com as armas que tem, né? – Deu de ombros e riu junto.

R: E qual era o ritual?

B: Durante um tempo, sempre que eu queria muito alguma coisa, eu me condicionei a sair de onde eu estava para procurar o céu e fazer meu pedido olhando pra ele. Dia, noite, chuva, sol... Não importava, eu só rezava por alguma coisa olhando para o céu, porque era como se isso fosse me garantir uma conexão mais direta com Ele. E se dava certo, eu não sei bem. O que eu sei é que fazer isso sempre aumentava a minha coragem para correr atrás e as coisas acabavam acontecendo.

R: Dava certo, sim, porque a coragem quem te dava era Ele, que estava te ouvindo, exatamente como você queria.

Bia sorriu contemplativa.

B: Foi assim por muitos anos, mas com a correria de ter começado a trabalhar tão cedo eu fui deixando esse hábito pra trás até esquecer completamente.

R: A gente vai aprendendo muitas formas de orar ao longo da vida, é natural que os rituais mudem.

B: Sim... – Girou o corpo de lado subitamente e apoiou o rosto na palma da mão, usando um tom mais empolgado – Mas e se eu te disser que tem um lugarzinho nessa casa onde a gente vai sempre poder ver o céu, sem precisar sair, procurar uma janela e nem levantar, tu acredita?

R: Espero que não seja na nossa cama e que não seja uma metáfora de conotação sexual. – Apertou os olhos.

B: Como não me respeita, meu Deus! – Revirou os olhos.

R: Sua imagem foi você mesma que construiu, meu amor! – Puxou ela e lhe deu um selinho.

B: Mas é sério... – Tentou retomar – É uma pergunta literal, sem conotação sexual. Tu acredita?

R: Uai, vindo de você, duvidar seria extrema burrice de minha parte, né? – Passou os dedos no cós da calça de Bianca e puxou ela para mais perto – Mas tô curiosa pra entender isso melhor.

Bia abriu um sorriso, usou a mão livre para alcançar o interruptor atrás de sua cabeça e, sem tirar os olhos do rosto de seu amor, esperou que ela se guiasse pelo barulho e pelos raios de sol que invadiram suas retinas para levantar o olhar e, enfim, perceber o céu se abrindo sobre elas.

Surpresa e extasiada, Rafaella acomodou a cabeça de volta no acolchoado, fixou o olhar no alto e o azul quase ofuscante (de tão cintilante) somou com a emotividade que ela vinha tentando conter naquela tarde, e essa combinação foi materializada na única lágrima que lhe escapou.

Bianca, por sua vez, também voltou à mesma posição, alcançou a mão esquerda de Rafa e trouxe-a junto de seu peito.

B: Gostou da surpresa?

R: Surpresa mesmo... – Abriu um sorriso, mas continuou olhando para o alto, como também fazia Bianca – Nunca que eu ia imagiar que você ia pedir pra colocar um teto desses de motel na nossa varanda.

A carioca sorriu inevitavelmente.

B: Como eu antecipei agora a pouco, eu até tinha planejado uma infamidade parecida com essa para introduzir a surpresa, digamos assim, mas isso mudou.

R: Redefiniu a rota, como você disse.

B: Sim... – Levou a mão de Rafa aos lábios e beijou – Eu mandei instalarem isso aqui pra deixar esse nosso lugarzinho ainda mais atrativo pra gente gastar nosso tempo livre aqui fazendo tudo que a gente ama fazer: observar as nuvens, namorar ao ar livre... – Girou o rosto para acompanhar a expressão sonsa que sabia que a esposa faria – Transar a céu aberto, como eu sei que tu gosta...

R: A difamação... – Sonsíssima.

B: Enfim... – Nem se deu ao trabalho de rebater – Muitas utilidades e conveniências.

R: A ideia perfeita da esposa perfeita. – Girou o rosto e beijou a bochecha de Bia.

B: "Esposa esforçada" eu aceito melhor... – Disse com inesperada humildade e retomou sua linha de raciocínio – Mas a verdade é que conversando agora com você eu lembrei desse meu antigo ritual e pensei que a surpresa poderia ser útil nesse momento pra gente. – Apertou a mão de Rafa em cima de seu peito e buscou o olhar dela.

A atriz correspondeu e lhe encarou de volta, dedicando a atenção que lhe foi exigida silenciosamente.

B: Eu sei que as últimas semanas foram bem difíceis pra gente, e mais ainda pra você. Sei também que você tem direito ao seu tempo de digerir e assimilar a pequena derrota que a gente teve, mas.... – Suspirou, mordeu o lábio discretamente e foi a vez de Rafa apertar sua mão e lhe incentivar a continuar – Eu queria insistir um pouquinho e te lembrar outra vez que você me tem do seu lado pra gente tentar de novo, do jeito que planejamos.

R: Você não precisa me lembrar, porque isso nunca sai da minha cabeça. – Disse suave e tentou alguma defesa – Eu só ando sem forças mesmo, um pouco confusa e sem coragem de correr o risco de passar por isso de novo.

B: Pois então... – Voltou a olhar para o alto e Rafaella fez o mesmo – A gente tem tempo, amor e esse céu inteirinho pra encher com os nossos desejos e pedidos, e Ele não vai ter outra alternativa a não ser nos ouvir e mandar muita coragem pra gente continuar correndo atrás do que a gente quer tanto.

O sorriso imenso que Rafaella abriu contraiu todas as linhas e músculos de seu rosto, e ele combinou perfeitamente com a serenidade que subitamente ela sentiu se instalar em seu peito, como há dias demais ela não sentia.

Sensível a essa percepção, a mineira girou outra vez de lado, trouxe Bianca para fazer o mesmo e quando se encararam desenhou o contorno da mecha de cabelo da esposa antes de quebrar o silêncio.

R: E há quem ache brega ou dê risada quando eu digo que você é a minha alegria.

B: Deixa acharem, "nóis" é brega mesmo, mas se pega gostosinho.

Rafaella expandiu ainda mais o sorriso, puxou Bianca e, com o clima completamente transmudado, mais uma vez elas redefiniram a rota.


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R: E como a boa cadelinha da lábia de Boca Rosa que sou, já no dia seguinte eu marquei consulta para começar a nossa outra tentativa, não é mesmo?

B: E provando que eu estava certa em tudo, como sempre... – Rafa revirou os olhos – Essa outra tentativa foi muito bem sucedida e trouxe a risada mais frouxa e gostosa do mundo para as nossas vidas.

R: Amém!

Elas se acomodaram e se mantiveram olhando para o céu que, diferente daquela outra ocasião, não ostentava o mesmo azul diurno e cintilante, mas tinha tantas estrelas quanto possível para o céu de uma grande metrópole imersa em poluição.

R: Lembrar disso me fez entender ainda mais a saudade que eu tô de você e da gente! – Puxou Bia e a encheu de cheiros.

B: Pois então eu posso te confessar uma coisa? – Encolheu-se e se encaixou melhor nos braços de Rafaella.

R: Sempre pode! – Olhou lateralmente.

Bianca chegou o rosto bem pertinho do ouvido dela e segredou:

– Eu também andava com saudade da gente, mas achei que era errado.

Gargalharam juntas.

B: Será que nosso filho um dia perdoa a gente por isso?

R: Se não perdoar, é só até dezoito anos que ele vai ter que aturar antes de pedir pra sair, porque isso não vai mudar! – Esmagou Bia ainda mais – A gente vai sempre dar essas escapadinhas e é bom ele ir se acostumando.

B: A frieza, meu Deus! – Continuou rindo da esposa e puxou-a para um beijo.

R: Hum... – Descolou do beijo subitamente – Inclusive, essa música... – Levantou o indicador da mão direita para chamar a atenção de Bia para o som que tocava.

B: O que tem?

R: Eu amo e é todinha esse meu momento de saudade imensa de você.

Elas ficaram em silêncio por um tempo prestando atenção na letra:

Quando é que você chega, amor?

Tô com saudade de você

Já me arrumei inteira pra te receber

Eu quero tanto passear contigo

Quando é que você vem, amor?

O coração chega a doer

Se tu demora, o dia acaba e faz chover

Eu tô querendo te abraçar faz tempo

(..)

Onde é que eu te encontro, amor?

Tô ensaiando pra te ver

Já procurei aqui e nada de você

Eu quero tanto me enroscar contigo

Me fala, que eu te acho, amor

E a gente pode se perder

Invento um canto, uma viagem com você

Tô te chamando pra mostrar meu mundo

E eu quero tanto levar você pro mar

Pra gente se banhar

Deixar minha boca no teu beijo e namorar pelada

Até o Sol cansar de ficar acordado

E você vai lembrar

Você vai lembrar de mim

Você vai pedir por mim

Vai se perguntar

Quando é que eu vou chegar...


B: Doida pra me levar pro mar pra namorar pelada até o sol cansar, né?

R: Sonhando com isso!

B: Missionária? – Olhou desacreditada com tanta sinceridade e riu mais.

R: Vai dizer que você não tá com saudade de reviver uma das nossas viagens pra praia em que a gente praticamente só fez isso?

B: Hummm, carnaval de 2021 em Ilhabela, lembra? – Olhou maliciosa.

R: E quem é que esquece a primeira vez? – Segurou a mão de Bia em cima de sua barriga e foi além – Dezembro de 2021, Vilanculos?

B: Seychelles, 2022.

R: Antes disso, Noronha, também em 2022. – Corrigiu.

B: Verdade... – Forçou a memória para a próxima lembrança – Ba-Bali? – Buscou confirmação no olhar da esposa e recebeu mais do que isso, pois a confirmação veio embebida em malícia – Ahhhh, Bali, Bali.

R: Dezembro de 2023, né? Nós tínhamos acabado de decidir que tentaríamos engravidar... – Brincou com os dedos de Bianca e continuou olhando para o céu – Estávamos felizes demais da conta.

B: Era passeio, porre, cama. Cama, comida, passeio. Cama, cama, porre...

R: E taca-lhe cama... – Gargalhou – Foi tanta cama que parecia que a gente tinha acabado de se conhecer.

B: Memorável... – Disse contemplativa – Depois ainda teve Angra em 2024, Bahia já com barrigão... E isso porque a gente citou só as viagens de praia, né?

R: Sim, tivemos ótimas viagens para as grandes capitais também... – Suspirou – A gente conseguiu viver um bocado nesses cinco anos. Sem gravidez, com gravidez... Sempre foi uma farra tão gostosa que eu duvido que a gente vá abrir totalmente mão disso. – Girou o corpo para ficar de lado e Bia fez o mesmo – Acho que a gente vai só aprender a identificar o melhor momento de fazer isso quando o Bento estiver maiorzinho pra deixar ele com alguém que a gente confie. Quer dizer, isso se a madame aí aprender a se separar dele um dia, né?

B: Prometo tentar, mas não garanto nada. – Disse bem humorada.

R: Vai conseguir, ou eu vou pegar tanto no seu pé que cê vai pedir misericórdia. – Apertou o nariz dela divertidamente.

B: Eu tô brincando. – Pegou a mão de Rafa e beijou – Eu mal vejo a hora de a gente viajar com ele, mas eu também quero que a gente continue tendo nossos momentos.

R: Vão ser mais raros, mas vão existir. E esses momentos mais fáceis de viabilizar aqui, no nosso lugarzinho, a gente pode ter com mais frequência.

B: Assim vai ser. – Puxou a cintura de Rafaella e levou os lábios ao pescoço dela.

R: Eu ainda não esgotei as minhas surpresas pra essa noite. – Disse se defendendo da excitação dos beijos de Bianca que passaram a trilhar em seu corpo, ajeitou a gola do roupão que ela já tinha tirado do lugar e girou o corpo para pegar o celular.

B: Tem mais?

R: Uhum.

B: Então diz o que é. – Impacientou-se.

R: Hoje eu conversei mais com a equipe de produção do meu trabalho novo para o ano que vem, e eles me mandaram umas referências para a personagem.

B: Pra você ir estudando como vai compor?

R: Isso e também referências visuais, sabe? – Mordeu o lábio.

B: Pelas suas reações, eu tô com um pouco de medo do que isso pode significar. – Apertou os olhos.

R: As referências que eles me mandaram foram essas, vê aí e me diz você mesma se tem razão pra esse medo. – A mineira terminou de pronunciar as palavras e colocou o celular na mão de Bianca.


Bianca abusou do silêncio com o olhar fixo na tela do celular e Rafa, claro, impacientou-se:

– O gato comeu sua língua mesmo, foi?

B: Eu só estava aqui processando se até o semestre que vem eu consigo deixar tudo organizadinho na minha vida e curtir muito o meu filhão, porque de duas, uma: ou eu morro quando tu entrar aqui em casa com esse visual, ou eu vou presa porque vou descer o cacete em tanta gente que vai dar em cima de você que eu não gosto nem de pensar.

Rafaella gargalhou.

R: Ah nem, era pra ser uma surpresa boa... Olha o drama e a cara de sofrimento que cê tá fazendo! – Empurrou o ombro de Bia.

B: É piada, não é? – Entrou no estágio da negação – Tu escolheu essas fotos pra me zoar, não foi? Só porque eu falei demais desse cabelo nos últimos tempos, até escolheu as fotos que você tá usando vermelho...

R: Pior que não foi, olha aí... – Mexeu na tela do celular – É minha conversa no grupo de trabalho mesmo, eles que mandaram. Eu nem cheguei a opinar em nada, e eles já foram dizendo que pensaram assim pra essa personagem.

B: É... Cara e postura de vilã que vai destruir a vida do casal protagonista não vão faltar... – Continuou encarando as fotos, mas subitamente mudou de humor e com os olhos brilhando quis se certificar – Mas sério que tem chance de eu viver esse cabelo mesmo?

Rafa acenou afirmativamente, sem conseguir conter o sorriso no rosto.

B: Obrigada, meu Deus, eu pedi tanto por isso! – Soltou o celular, ergueu os dois punhos para o alto e olhou para o céu – Finalmente minha hora chegou!

R: Deixa de ser ridícula! – Puxou Bianca – Quem vê assim até acredita que cê não prefere ele castanho.

B: Eu sempre quis viver esse cabelo e você sabe disso.

R: Sempre, não, de uns tempos pra cá. – Censurou, mas em seguida aproximou-se mais – Mas de todo modo, falei ou não falei que até a sua mulher dos sonhos eu tinha providenciado pra essa noite?

B: O Paizinho me ouviu demais! – O sorriso convencido não saía do rosto.

R: É o que eu sempre digo, né? – Levou os lábios ao ouvido da esposa e completou em tom sussurrado:

– Você sempre consegue tudo o que quer.

B: Espera... – Bizarramente, não ouviu uma nota de malícia sequer e afastou sutilmente o corpo de Rafa para lhe encarar e ela soube imediatamente que boa coisa não viria.

E não veio:

– Tu tava com esse cabelo na época em que comia a Letícia, né?

R: Não tem analista que explique eu tentar te fazer uma surpresa dessas, no meio de um jantar romântico nosso, como há meses não temos um, e quase a primeira coisa que você menciona é a minha ex.

B: Uma das suas ex, meu amor, não seja modesta. – Devolveu à altura – Até por que, eu presumo que nessa época a concorrência era insana, né? Tanto que fui esnobada no convite para a festa de aniversário.

R: Ihhh, lá vamos nós... – Suspirou e ficou de barriga pra cima de novo. – Quando acabar com os delírios, me dá um cutucão e a gente volta a conversar.

B: Palhaça e cara de pau! – Movimentou-se rápido e sentou no quadril de Rafaella.

R: Cara de pau nada. Você adora uma treta e eu não vou te dar esse gostinho hoje, Boca Rosa. – Deslizou as mãos nas pernas da esposa, subindo até as coxas e por baixo do roupão.

B: Para o seu governo, não tinha nada de treta, tá? Eu só queria confirmar se você estava com esse cabelo quando a gente se encontrou no Prêmio e eu te fiz o convite.

R: Eu deveria estar ofendida por você precisar "confirmar" isso e deixar claro que não foi memorável, mas vou me ater a questionar esse seu jeito torto de fazer essa pergunta.

B: Mas acertei, não acertei? – Insistiu.

R: Não exatamente. – Bianca olhou perdida e Rafa esclareceu:

– Eu estava com esse cabelo na época em que a Letícia me comia.

B: Meu Deus, Rafaella, parabéns! Se era o que tu queria, parabéns, porque agora eu tô com mais ódio ainda dessa história. – Ameaçou sair de cima dela enquanto a mineira, obviamente, gargalhava.

R: Volta aqui agora, marrenta! – Puxou Bia pelo cinto do roupão e a fez despencar de volta a seu lado.

B: Não vem com beijinho, não, porque agora eu tô bem bolada! – Esquivou-se dos lábios fartos que tentaram deslizar em seu pescoço.

R: Uai, não entendi, não. – Continuou investindo com cinismo – E qual a diferença?

B: Tu sabe bem a diferença. – Continuou com o tom emburrado.

R: Aí cê falou uma coisa certa... – Deslizou o nariz no pescoço de Bianca – Eu sei bem a diferença e, inclusive, nunca mais larguei e até casei quando eu percebi a diferença surreal que faz quando é com você.

B: Truqueira que chama, né? – Continuou com a marra, mas curiosamente as pernas abriram para acomodar a investida da coxa de Rafaella.

R: Deixa de manha e volta pra parte em que eu sabia que cê ia amar a surpresa de voltar a levar uma loira pra cama.

B: Mal vejo a hora! – Rebateu sem juízo nenhum.

R: Nossa, mas tá tão mal servida assim? – Afastou o corpo indignada.

B: Mal servida não estou nunca, mas como dá pra melhorar, né, a gente mal vê a hora. – Deu de ombros.

Já que tinha sido atiçada com incômodo despropositado, pagaria na mesma moeda, com pouca maturidade e repleta de más intenções.

R: Quem sabe não dá pra melhorar hoje ainda? – Deslizou os lábios pelo pescoço de Bianca, afastando o tecido do roupão dela para liberar uma porção do ombro direito.

B: Será? – Arqueou o corpo quando sentiu a coxa da esposa pressionar entre suas pernas e atiçou no ouvido dela – Pois eu tô pagando pra ver.

R: E eu dobro a aposta.

O sussurro de Rafaella veio em modulação vangloriosa e operou o efeito de eriçar o corpo inteiro de Bianca.

Absolutamente ciente disso, a mineira afastou os corpos, ficou de joelhos no futon e se deliciou com a respiração descompassada que assistiu em Bia, completamente jogada no acolchoado.

Sem pressa e com o olhar predador, Rafa deslizou a ponta dos dedos na coxa exposta da esposa, pareceu que ia invadir o roupão dela, mas recuou e desnorteou a carioca quando levantou rápido.

De pé, a atriz instigou Bianca só com o olhar e a fez acompanhar, imóvel e vidrada, o movimento de suas mãos que desataram vagarosamente o nó do roupão e revelaram porção de lingerie suficiente à carioca perceber que o ardil de Rafaella para aquela noite ia muito além do que ela tinha suposto.

B: Isso não é dobrar a aposta, isso é trapacear mesmo.

R: Não entendi. – Pronunciou cínica, deslizando o indicador da mão direita entre os próprios seios antes de afastar mais o roupão e mostrar mais ainda da lingerie preta deslumbrante que ela usava.

B: Por isso que não quis que eu tomasse banho contigo, né? – A mineira apenas sorriu com o mais puro regozijo e desceu o roupão até o meio das costas enquanto Bia seguia indignada – Um dia eu ainda vou achar onde tu esconde essas lingeries indecentes novas que tu compra só pra me enlouquecer, bicha sonsa.

Rafa sorriu de forma ainda mais descarada, virou de costas, deu alguns passos, parou e olhou para trás antes:

– Cinco anos e ainda não achou... – Deixou o roupão deslizar todo para fora de seu corpo e finalizou – Continua tentando, meu amor!

Em um ímpeto, a atriz jogou a peça de roupa na direção de Bianca, que agarrou-a no susto e logo tirou da frente de seu rosto para continuar acompanhando a esposa desfilar só de calcinha e sutiã, ostentando as costas perfeitas e a bunda que ela nunca cansaria de admirar.

Bia ergueu mais o corpo com a ajuda dos cotovelos e assistiu Rafaella fechar as cortinas da varanda, caminhar até a mesa, servir mais vinho em sua taça e voltar sentindo o aroma do líquido.

B: Beber infelizmente você não vai poder, não. – Provocou.

R: Tem razão... – Chegou mais perto e sentou com uma perna de cada lado nas coxas de Bianca – Beber eu não posso quase nada por causa do leitinho do neném, mas você pode.

Com firmeza, Rafa segurou o queixo de Bia, levou a taça à boca dela e, assim que ela engoliu, pronunciou:

– E eu posso ter ao menos o gostinho beijando a sua boca.

O beijo veio quente, com os lábios e línguas ávidos na mesma medida, e alucinou tanto Bia que o sorriso sacana da atriz nasceu ainda no meio do beijo quando ela sentiu as mãos da carioca apertando sua bunda e puxando seu quadril cada vez mais.

R: Calma que eu dobrei a aposta, mas ainda não dei a cartada final. – Mordeu a orelha de Bianca antes de levantar novamente.

B: Começou a putaria! – Levou as duas mãos ao rosto, absolutamente frustrada, e despencou o tronco no futon.

Com o sorriso cada vez mais safado, Rafa se afastou e foi até o som trocar a playlist.

[MÚSICA DA CENA]:


Quando achou o que queria, voltou ao futon, parou na frente dele e chamou Bia com o indicador.

A carioca deslizou o corpo e sentou na ponta do acolchoado, hipnotizada pelo corpo da esposa bem a sua frente.

R: Bebe de novo! – Ordenou com o olhar autoritário, de cima para baixo.

Bia alcançou a taça, obedeceu sem questionar e se preparou para o outro beijo intenso que ela sabia que viria.

Quando o beijo cessou, Rafa mordeu o lábio da esposa e caminhou de costas, sem libertar Bianca de seu olhar e até bater com as costas na tal fina coluna que havia sido improvisada ali.

Não era o ideal, mas agora seria bastante oportuna para o efeito que subitamente Rafaella quis compor naquela noite: no caso, enlouquecer Bianca com uma performance sensual que ela não tinha planejado, mas que sentiu vontade de fazer.

Sem conseguir disfarçar seu estado boquiaberto, a carioca assistiu imóvel e quase sem piscar a esposa se mexer na batida da música, roçando o corpo na coluna de forma intoxicante.

Rafaella, por sua vez, sentiu-se mais vitoriosa a cada relance de desejo que ela enxergou em Bianca, fosse no lábio que ela segurou entre os dentes, ou nas pernas que ela cruzou na clara intenção de conter a excitação, tudo inspirava e ressaltava a sensualidade da mineira ainda mais, tornando a cena quase insuportável para a apresentadora.

Ela até lutou bravamente, porém, por longos e excruciantes minutos, até não aguentar mais.

B: Se tu não encerrar essa tortura agora eu vou começar sem você. – Descruzou as pernas e afastou o roupão para deslizar a mão direita entre as próprias coxas.

R: Achei que estivesse gostando? – Ainda insistiu na provocação.

B: Tô gostando tanto que não tô aguentando mais.

Rafaella sorriu devassamente e finalmente deu por encerrada a performance.

Caminhou ainda transbordando sensualidade, sentou rebolando no colo da esposa e enxergou tanto desejo no olhar castanho inundado de desespero, que só o que saiu de seus lábios foi a pequena provocação final:

– Truco!

Bia avançou nos lábios fartos, mas Rafa ainda esquivou, segurou a mão dela que ainda estava entre as pernas, deslocou-a para sua bunda e, sem desconectar os olhares, desatou o nó do roupão da esposa.

Enfim, beijaram-se fogosamente enquanto Rafa usava as mãos para tirar o roupão de Bia que, por sua vez, deslizava as suas para desatar o fecho do sutiã da esposa.

Jogaram as peças de roupa no chão e a mineira suspendeu o corpo para Bia tirar sua calcinha.

A carioca jogou essa peça também no chão e girou o corpo para voltar engatinhando para o meio do futon. Mantendo o instinto predador, Rafa lançou-se junto, puxou o quadril da esposa e a fez erguer o tronco, de joelhos no acolchoado.

Nas costas de Bianca, Rafaella afastou o cabelo dela e enquanto trilhava beijos desejosos na nuca e ombros, desceu sua mão direita pelo abdômen branco, até encontrar o sexo dela.

R: Gostou mesmo do meu showzinho de me esfregar no poste pra você, hein? – Deliciou-se quando sentiu seus dedos melarem com a excitação da esposa – Tá molhada demais!

B: Amei, e mais ainda porque me lembrou uma coisa.

R: O que?

Bia puxou o quadril pra trás, desfazendo brevemente o contato para conseguir responder como queria, girando o rosto de lado e encontrando o olhar da esposa.

B: Lembrei de você fazendo coisa parecida na mesma festa no BBB que tu narrou para o seu filho, ou pensa que eu também não olhei pra você naquela noite?

R: Ah, estava ouvindo atrás da porta então? – Indignou-se e voltou a mão ao sexo de Bianca, pressionando-a ali.

B: Talvez eu estivesse... – Mordeu o lábio, falhando em segurar a quantidade de tesão por sentir a esposa voltando a lhe masturbar ainda mais deliciosamente – Mas o que importa é que eu gosto mais ainda de você se esfregando em mim assim. – Deslizou a bunda no quadril de Rafaella e voltou a rebolar nos dedos dela.

R: É? – Mordiscou a orelha de Bia e sussurrou, sem parar o movimento da mão – Mas tem um jeito mais gostoso ainda de eu me esfregar em você, não tem?

Com o corpo e os sentidos totalmente tomados pela libido, Bianca só mordeu o lábio e acenou afirmativamente com a cabeça.

Rafaella parou de estimular a esposa, levou as duas mãos aos ombros dela e empurrou-a impetuosamente para cair deitada entre as almofadas.

Sem perder tempo, segurou firme as duas coxas de Bianca, e puxou seu corpo. Deitou o tronco sobre o dela e beijou-lhe de novo os lábios.

B: Você prometeu... – Descolou-se do beijo e resmungou quando tentou encaixar sua coxa entre as pernas de Rafa e ela não permitiu.

R: Assim, não. – Sussurrou e ergueu o corpo novamente para se posicionar encaixando as duas regiões genitais – É mais gostoso assim, ou não? – Deslizou vagarosamente um sexo no outro, com o olhar incendiando o de Bianca.

B: Muito mais. – Respondeu com a voz cortada e relaxando ainda mais o corpo para sincronizar o movimento de seu quadril com o de Rafaella.

Apertando a coxa de Bia e trazendo o corpo dela no ritmo delicioso que elas performavam tão bem juntas, a mineira não conseguiu desviar o olhar do rosto cheio de tesão da esposa e nem o foco dos gemidos que ela amava tanto ouvir, e que combinavam tão bem com a sensação táctil inebriante dos sexos deslizando um no outro.

E foi assim até descontrolarem o ritmo dos quadris e os sons de prazer que anunciaram os orgasmos quase simultâneos que tiveram.

Rafaella ainda rebolou mais algumas vezes na mesma posição, tentando absorver à exaustão a excitação do gozo que elas compartilharam e só quando sentiu o corpo inteiro ceder é que deixou-o tombar ao lado de Bianca.

Reflexamente, a carioca encolheu o ombro se afastando e Rafa encontrou forças para gargalhar.

R: Deixa eu adivinhar: tá dando choque?

B: Eu te odeio! – Continuou tentando se afastar e com a respiração ofegante.

R: Ah, eu te amo tanto... – Respirou fundo e girou o corpo de lado para continuar com cinismo – Por que você me odeia? – Deslizou as pontas dos dedos entre os seios de Bia, descendo pelo trio de tatuagens e linha de sua barriga.

B: Porque tu é boa em me enlouquecer e sabe disso.

R: Eu só faço uma ideia e sigo o meu instinto. – Mordeu o lábio e continuou descendo os dedos.

B: Pelo amor de Deus! – Pulou para fora do futon e ficou de pé – Deixa eu respirar!

R: Sua sorte é que tá cada dia mais deliciosa...– Foi a vez dela de sustentar o tronco erguido com os cotovelos para devorar a nudez da esposa com os olhos e seguir provocando – Porque, pelo visto, a maternidade te deixou isso tudo de frouxa, né?

B: Frouxa, fraca, devagar, capenga, inútil, broxa... Chama do que quiser, não caio na tua pilha, não. – Disse Bianca já pilhada e procurando uma garrafa d'água no frigobar que tinha na varanda.

Quando encontrou, de costas para a direção do futon, bebeu um gole e colocou o gelado do vidro em seu pescoço, tentando reequilibrar a temperatura de seu corpo que ainda queimava.

R: Já respirou o suficiente? – Rafa assustou Bia com o sussurro e já nas costas dela.

B: Ô, Paizinho... – Jogou a cabeça no ombro da esposa e se deixou enlaçar pela cintura – Manda uma forcinha, porque essa mulher hoje tá possuída pelo inimigo.

Bia forçou o corpo e caminhou de costas com Rafaella.

R: Ele não vai te ouvir. – Assoprou a nuca da carioca – Porque eu combinei com Ele que era pra concentrar o esforço nessa casa hoje só guardando o sono do neném, pra ele não atrapalhar a foda das mães. O que significa que você tá indefesa e por minha conta hoje.

B: É? – Continuaram se movimentando pelo espaço.

R: Uhum... – Mordeu demoradamente o pescoço branco.

B: Pois então... – Quando chegou na altura que queria, forçou o corpo para trás, girou com velocidade e cercou Rafaella perto da mesa:

– Aumenta o seu game, porque vai ter que lutar muito mais.

A mineira sorriu excitada e se deixou conduzir para cima da mesa.

Os beijos da apresentadora começaram a descer entre os seios de Rafa e em toda a extensão de sua barriga, fazendo o corpo da esposa curvar cada vez mais em direção ao tampo do móvel.

R: As coisas em cima da mesa, Bi... Vão cair! – Preocupou-se com o entorno.

B: Deixa cair! – Não parou o que fazia com os lábios e a língua, mas demorou perto do umbigo, na altura marquinha do piercing da esposa – O furinho que eu amo.

A atriz começou a sentir o corpo inteiro falhar e amolecer tanto que, quando percebeu, já estava com ele quase todo deitado e tinha a cabeça de Bia entre suas pernas.

Bianca sorriu vitoriosa quando percebeu a barriga de Rafaella trepidar de excitação com sua boca deslizando no interior da coxa direita dela.

B: Isso tudo é ansiedade pra eu te chupar? – Deslizou a mão pelo ventre da mineira até chegar no seio direito que ela apertou.

R: Muita! – Fechou as pernas, tentando pressionar a esposa.

Sem querer desperdiçar nada do tesão de Rafaella, Bia obedeceu e levou a boca aonde ela queria.

Massageou o clitóris com a sincronia perfeita da língua e sucção dos lábios, e não demorou muito a combinar a chupada com os dedos que penetraram a esposa e a enlouqueceram ainda mais.

Depois de um tempo investido na combinação, Bia subiu a boca pelo ventre de Rafaella, sem parar o movimento da mão, e forçou o tronco da esposa a erguer para lhe beijar a boca enquanto ela continuava metendo.

Quando a mineira perdeu o ritmo do beijo porque não conseguiria mais segurar a excitação, a apresentadora aumentou o ímpeto das estocadas e sentiu as unhas de Rafa cravarem em suas costas antes de gozar em seus dedos.

Pacientemente, Bianca aguardou o ritmo da respiração da esposa desacelerar e foi retirando os dedos devagar à medida em que também desgrudava os corpos.

B: Dois orgasmos a um, passivinha. – Sussurrou a quase nenhuma distância do rosto de Rafaella e mordeu o lábio dela.

Ainda zonza, a mineira assistiu Bia sair de perto sorrindo travessa, pegar a garrafa de vinho e caminhar rebolando para dentro do quarto.

Rafaella apertou o tampo do móvel com as duas mãos, aumentou a dose de malícia no sorriso que ela falhava em segurar, respirou fundo e pulou da mesa.

Quando chegou no quarto, Rafa encontrou Bia em pé em cima da cama, tomando o vinho direto do gargalo e dançando e cantarolando a música que era audível ali também.

R: Eu espero que seja exatamente assim que as meninas que gostam de meninas sejam recebidas no céu... – Bianca ergueu o olhar confusa e Rafa esclareceu – Com a sua imagem pelada, dançando em cima da cama e bebendo vinho direto da garrafa.

Rafaella chegou mais perto e parou bem em frente à cama. Bia, por sua vez, parou de dançar e também se aproximou.

B: Bom, se for, acho melhor tu apreciar muito bem enquanto pode... – Passou o peito do pé entre os seios da esposa antes de concluir – Porque para o céu eu tenho certeza que tu não vai.

Em um movimento rápido, a mineira surpreendeu passando um braço pela cintura de Bia e, com o outro, pegou o pé que tinha em seu peito e a desestabilizou para fazê-la despencar no colchão.

B: Enlouqueceu, garota? – Manteve o braço que segurava a garrafa erguido – Quase caiu tudo na cama!

R: Deixa cair! – Deitou em cima do corpo da esposa.

Bianca a recebeu abrindo as pernas e sorrindo embriagada pelos beijos que vieram em seu pescoço.

B: Que sexo com potencial para o desastre esse nosso hoje! – Concedeu-se um pouco mais da sensação inebriante de ter a esposa atritando o corpo nu em cima do seu e os lábios quentes e macios em sua pele, mas logo se forçou a recobrar o juízo – Mas vinho no colchão já é um pouco demais, né?

A apresentadora movimentou o corpo e fez Rafa se afastar o suficiente para lhe permitir deixar a garrafa no móvel ao lado da cama.

Quando voltou, a mineira outra vez segurou firme suas coxas e lhe fez deitar de novo.

B: Gosto assim, cheia de pegada! – Atiçou e levou as mãos aos cabelos de Rafaella que já tinha voltado a descer beijos em seu pescoço.

Os lábios aveludados desceram para os seios de Bianca e se dedicaram ali por deliciosos instantes nos quais a carioca lutou muito para não perder completamente o controle, se contorcendo de prazer, mas ainda focada.

Tanto que, quando Rafaella subiu para beijar sua boca novamente, na primeira brecha que Bia sentiu, enlaçou as pernas no corpo da esposa e girou os corpos para ficar por cima.

B: Falei ou não falei que ia ter que lutar muito? – Sentou na barriga de Rafa e nem conseguiu completar o sorriso vitorioso, porque a mineira ergueu de novo o tronco e ficou com ela no colo.

R: Eu amo a sua coragem... – Encheu a mão direita com os cabelos da nuca de Bianca, alinhando os olhares – Você sabe que se eu fizer só uma forcinha eu te derrubo de novo nessa cama, não sabe?

B: E não fez ainda por quê? – Devolveu o olhar insultante.

R: Porque eu não vou te foder deitada.

B: Não? – Mordeu o lábio quando sentiu a outra mão de Rafa apertar sua bunda.

R: Você vai se apoiar na cabeceira da cama.

Bia sorriu maliciosa.

B: Era só dizer que quer me comer olhando pra minha bunda, amor. – Sussurrou e mordeu a orelha dela antes de se afastar para seguir o comando.

Quando Bia se posicionou, Rafaella se aproximou e o primeiro que fez foi deslizar a ponta dos dedos na extensão da coluna da esposa, puxar seu corpo e beijar as costas nuas.

A mineira foi descendo a boca, beijou e deu pequenas mordidinhas nas nádegas enquanto estimulava o clitóris com a mão direita, mas estranhou quando Bianca parou de movimentar o quadril.

R: Que foi? – Subiu novamente na altura do ouvido dela – Parou de rebolar por quê? – Apertou forte a bunda branca.

B: Tô guardando energia na esperança de que vai chegar o momento em que tu vai parar de amorzinho e me foder forte, como eu gosto.

Rafaella sorriu desacreditada, com o rosto escondido no ombro da esposa, respirou fundo e voltou a boca perto do ouvido dela:

– Não esquece que foi você que botou essa pilha.

As palavras foram acompanhadas do tapa que estalou na nádega esquerda de Bianca e do comando autoritário:

– Afasta as pernas e empina pra mim.

A carioca mordeu o lábio e obedeceu, como esteve louca para fazer desde o início daquela sequência.

Sem mais retardar, Rafa levou os dedos à entrada da esposa e penetrou gentilmente só enquanto quis se certificar que ela já estava excitada o suficiente a receber a sequência seguinte das estocadas.

Bianca não admitiria jamais, mas essas, sim, vieram precisas e com mais força do que ela tinha projetado.

Ela quase se entregou na exasperação dos gemidos, é verdade, mas acabou conseguindo acompanhar o ritmo e até pedir mais enquanto Rafaella metia impetuosamente.

Tentando reter a excitação o máximo possível, Bia não suportou mais quando, além dos dedos lhe invadindo, sentiu a outra mão de Rafa circular seu quadril para acessar seu clitóris, e o duplo estímulo acabou acelerando o orgasmo que jorrou potente o suficiente a fazer a carioca sentir os joelhos apoiados no colchão falharem.

R: Eita! – Foi surpreendida com o corpo de Bianca despencando no colchão antes mesmo de conseguir tirar os dedos de dentro dela.

A carioca se acomodou de barriga pra cima e com os braços cruzados sobre os olhos.

R: Tá tudo bem aí? – Deitou de bruços ao lado da esposa e lhe encarou com um sorriso realizado no rosto.

B: Vou admitir que tá quatro a dois pra você, porque esse valeu por três. – Respondeu ofegante e liberando só uma brechinha na frente dos olhos para encontrar o rosto sapeca da esposa.

R: Quatro a dois, é? Tá tão generosa que tô até estranhando. – Forçou os braços de Bia para liberar completamente o olhar dela.

B: Sou sempre justa.

R: É mesmo? – Puxou a cintura de Bianca e a fez ficar colada de lado com ela – Ainda que bem que você é justa e eu paciente então.

B: Por que?

R: Paciente pra te dar um tempinho maior pra se recuperar, porque afinal... – Mordeu a orelha da esposa antes de concluir o sussurro ainda em tom obsceno:

– Cinco é o nosso número.

Bianca só expandiu o sorriso e, outra vez, achou que melhor ela faria se poupasse energia, porque Rafaella também sempre conseguia o que queria e naquela noite não seria diferente.


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Na manhã seguinte, Rafaella acordou antes do despertador que ela ajustava próximo da primeira mamada de Bento e comemorou a pequena conquista.

E comemorou imensamente mais quando percebeu que nem precisou do gesto de todas as manhãs de deslizar a mão esquerda no colchão, pois Bia tinha dormido a noite toda agarradinha nela:


Ter a esposa apagada e em paz em seus braços, provavelmente sem ter se mexido a noite toda, era sinal de que seu plano tinha alcançado a finalidade de tirá-la completamente do foco dos negócios e da dedicação extremada que ela direcionava à família delas, e isso era mais um motivo para comemorar.

A mineira tentou se movimentar o mínimo possível para alcançar o celular e evitar o disparo do alarme e, percebendo que tinha conseguido não despertar Bianca, respirou fundo para ter sua primeira dose do cheiro dela lhe serenando os ânimos enquanto passou a trilhar um carinho sutil em seus cabelos.

Em outros tempos, ela faria o que gostava tanto de fazer – esperar Bia acordar no ritmo dela – mas a realidade agora era outra e ela precisava mesmo dividir a atenção entre seus dois bebês.

Por isso, com extrema relutância, mas transbordando a felicidade da vida que ela quis tanto ter, Rafa foi soltando Bianca devagarzinho e sorriu mais largo ainda quando percebeu o pequeno resmungo que a esposa liberou antes de se esparramar de bruços, sem demonstrar ter recobrado um mísero traço de consciência.

Olhou novamente o celular para dessa vez conferir se tinha alguma mensagem da babá e, como não tinha, deu-se também o tempo para tomar banho sem pressa, e se preparar para o dia.

Quando concluiu tudo o que queria, foi para o quarto do filho, trocou algumas palavras com a babá sobre a noite dele e nem precisou esperar muito, pois logo em seguida ouviu o chorinho que anunciou que ele tinha acordado e cheio de fome.

R: Agitar os bracinhos e esperar a mamãe dar cinco passos até o berço não quer, né? – Pegou-o no colo – Precisa abrir o berreiro pra chamar a atenção dela.

Bento parou de chorar quando Rafa sentou com ele na poltrona, tirou-o do ombro para encontrarem os olhares, e o pequeno sorriso que ele abriu indignou a mãe mais ainda.

R: Que você adora fazer uma manha a gente já sabe, mas se continuar sonso assim a gente também sabe que a mamãe Bia vai pegar no nosso pé, então vamos ter que cuidar disso, hein? – Deu o primeiro beijo estalado do dia nele e recebeu um sorriso maior ainda – Bom dia, meu pedacinho!

Sem enrolar mais, alimentou o filho, trocou a fralda que ele encheu logo depois e, dando-se conta de que tempo suficiente já tinha passado, foi com ele nos braços até o quarto delas.

Sorriu adicionando mais uma parcela de vitória em sua conta quando confirmou que Bia ainda estava desmaiada, agora com a perninha levantada e tudo mais.

Sussurrando para Bento não fazer nenhum barulho... – assim mesmo, do jeito ridículo dos pais que juram que o filho de cinco meses entende tudo – Rafa se aproximou, sentou com cuidado na cama, e com mais delicadeza ainda, colocou o bebê deitado de bruços em cima das costas de Bianca, firmando-o com uma das mãos.

Foi além e, por gestos, incentivou-o a bater as mãos e as perninhas para acordar a mãe.

Incentivou de forma tão contagiante que ele se empolgou e, durante o movimento desordenado, acabou agarrando e puxando um punhado de cabelo de Bianca que acordou da forma mais Bianca possível:

– Carái, joga um balde de água fria logo!

A carioca reagiu já olhando para Rafaella, mas ainda bastante desorientada.

R: Olha a boca! – Apontou para as costas de Bia, ajudando-a a se situar.

E o sorriso da carioca, claro, veio instintivo e irrefreável.

B: Ahhhh, mas foi esse molequinho que puxou meu cabelo então? – Levou a mão direita às costas para estabilizá-lo e Rafaella ergueu o filho para Bianca girar o corpo de barriga pra cima.

R: Amei que ele já nasceu sabendo que os métodos pra você acordar precisam ser enérgicos. – Deu risada da esposa e colocou o neném em cima da barriga dela – Faz é hora que eu acordei, tomei banho, me vesti, dei a primeira mamada dele, troquei fralda, e você aqui ainda.

B: Pô, cara, tá melhor do que eu mesmo. Já até ganhou a primeira ma...

R: Não ouse, Bianca! – Interrompeu imediatamente.

B: Tua mãe é chata assim mesmo, pode nem brincar. – Ergueu o filho com as duas mãos e trouxe-o de novo junto a seu corpo para enchê-lo de beijos.

R: Palavrão, obscenidade e não tem dois nem minutos que cê acordou, assim fica difícil. – Bufou exausta.

B: Ele mal entende o nome dele ainda, mamãe boazuda, para de ser implicante! – Sentou na cama com o filho no colo.

R: A gente que pensa... – Não se convenceu – Ele está absorvendo todos os estímulos desde que nasceu, então eles já precisam ser educativos.

B: Tudo bem, da próxima vez eu faço uma introdução educativa sobre os diferentes tipos de mamadas pra ele.

R: O que aconteceu com você, hein? – Ralhou indignadíssima – Era tão cuidadosa quando a gente ficava com a Sosô... Agora virou essa desbocada incontrolável!

B: Sei lá, acho que é porque era filho dos outros... – Colocou-o deitado com as costinhas na cama – Só sei que eu olho pra cara safada desse aqui e não consigo ser séria assim, não.

R: Sei... – Observou Bia fazendo o neném rir atacando a barriguinha dele – Acho bom cê encontrar essa seriedade logo então, daqui a pouco ele passa a entender muito mais do que a gente imagina.

B: Seremos muito sérias na hora certa. Especialmente na parte de explicar que puxar o cabelo da mamãe não é legal... – Rafa riu – Aliás, a gente vai pegar muito, muito, muito nesse pézinho... – Mordeu justamente o pézinho – Até tu ser um cavalheiro com todos e principalmente com as meninas por aí, viu? Já vai decorando essa parte.

R: Ah, agora ele entende, né? – Censurou a contradição descarada.

B: Pode não entender agora, mas vai ter que entender rapidinho. Aliás, duas mulheres criando um menininho... – Pegou o filho de volta no colo – A gente precisa abusar dessa vantagem e colocar um homem decente pra circular por aí.

R: Concordo muito, e é exatamente por isso que eu pego no seu pé... – Pressionou o indicador no ombro de Bia – Pra ver se mima menos ele, pra não ficar mal acostumado.

B: É, essa parte realmente vai ser um problema, mas vamos tentar. – Rebateu travessa.

R: Vem cá... – Não aguentou e teve que choramingar – Só ele que ganha beijo de bom dia agora? Tô sentada nessa cama tem um tempão e nada.

B: Ô, meu Deus, acordou querendo dengo! – Segurou o filho com um braço só e puxou Rafa para selarem os lábios – Bom dia, minha manhosa gostosa!

R: Bom dia, minha dor de cabeça deliciosa! – Rebateu e beijou-a de novo.

B: Tá vendo, cara? – Percebeu o neném atento e voltou-se pra ele quando se soltaram – Observa direitinho com esses "zoião" seu, porque é assim mesmo: eu tendo que me virar em mil pra ser sempre fofa e ela me acabando.

R: Não seja injusta, porque eu estou bem fofa com você desde ontem, vai... Mesmo você me dando dor de cabeça. – Ressaltou a ironia.

B: Não tenho mesmo do que reclamar. – Puxou a esposa para encaixar um abraço lateral e beijar a cabeça dela.

Em seguida, Bia colocou Bento sentado entre elas, deixou Rafa sustentando o corpinho dele e virou-se para pegar o próprio celular.

R: Ih, conheço essa torcidinha de lábio como ninguém. – Continuou apoiando o filho, mas não desviou o olhar do semblante de Bianca – Pode ir soltando logo o que rolou.

B: É o Guel... – Torceu mais ainda os lábios – Antes de dormir, eu enviei uma mensagem pra ele tentar mudar uma reunião que eu teria no escritório essa tarde, mas ele não conseguiu.

R: E qual o problema de ter essa reunião?

B: É sobre a proposta nova, seria meu único compromisso hoje e eu pensei que, se eu conseguisse eliminar, ia poder passar o dia todo grudadinha em vocês. – Beijou a cabeça do bebê, que já se entretinha com um brinquedo que Rafa tinha trazido.

R: Você se sentiu obrigada a desmarcar por causa da noite que a gente teve? – Juntou as sobrancelhas.

B: É claro que eu não me senti "obrigada", amor, mas a noite que a gente teve foi tão boa que eu senti vontade de fazer isso, sim.

R: Não precisa mudar nada dos seus planos, Bi, a gente se desentendeu um pouco sobre o assunto, mas é claro que eu entendo todas as etapas e demandas dos seus projetos novos. – Tentou soar o mais convincente possível.

B: Ei... – Percebeu que estavam a um passo de pesar o assunto e quis esclarecer – Eu disse que fiz porque era uma vontade genuína minha, não tem a ver com o nosso desentendimento.

R: Espero mesmo. – Pronunciou as palavras e ficou pensativa uns instantes, observando Bia brincar com o filho delas.

E perdeu-se tanto na imagem de seus dois amores ali, tão pertinho dela naquela cama, interagindo e se divertindo que, quando se deu conta, sentiu como se afogasse e teve que respirar fundo...

E dessa vez a reação não passou despercebida.

B: Tá tudo bem, amor? – Ergueu o olhar.

R: Tudo, sim. Só perdi o fôlego de tanto amor que eu senti assistindo vocês dois juntos. – Foi extremamente sincera.

B: Perder o fôlego de amor é tão bom, meu filho, um dia você vai passar por isso. – Disse sorrindo para a esposa.

R: Ele é tão apaixonado por você que eu acho que ele já passa por isso... – Acariciou os cabelos do neném, que tinha os olhinhos vidrados no rosto de Bianca – Mais uma evidência de que não tem nem como negar que é um pedacinho meu.

B: Assim quem morre de amor sou eu. – Esticou-se toda para beijar de novo Rafa.

R: Não morre, não. – limpou o lábio dela – Mas vem cá, eu tenho uma proposta pra te fazer.

B: Proposta? – Estranhou.

R: É... – Pegou o filho e colocou-o de pé, pareando seu rosto com o dele – E se nós dois fôssemos trabalhar com você hoje, mamãe?

B: Como assim?

R: Trabalhar, uai... – Bento forçou para sentar de novo – A gente vai com você para o escritório e ficamos quietinhos na sua sala te esperando, enquanto você vai para a sala de reuniões, que tal? Assim a gente passa o máximo de tempo juntinhos.

B: Meio sem cabimento isso, não, amor? – Ainda não tinha conseguido visualizar o contexto inteiro da ideia de Rafaella.

R: Sem cabimento por quê? Ele vai passar um pedaço da tarde dormindo mesmo e, nesse tempo, eu fico trabalhando nos meus assuntos lá na sua sala e, sempre que cê conseguir uma brechinha, cê corre lá pra dar um beijo na gente, que tal?

B: Não vai ser cansativo pra vocês? Você sabe como ele é sociável e gosta de ver gente... Vai ficar todo espoleta e depois vai dar trabalho pra dormir.

R: Vai nada, a farra vai acabar fazendo ele dormir mais ainda. – Insistiu – E pra mim tanto faz, é até bom que estando lá eu me forço a colocar em dia vários assuntos meus que eu enrolo pra dar vazão quando estou em casa.

B: Não sei... – Ainda não tinha se convencido.

R: A gente só não vai se for te atrapalhar, mas pra gente ia ser bom ficar mais pertinho de você.

B: Claro que não me atrapalha, tá louca? – Percebeu que estava mandando os sinais equivocados – Eu só não quero mesmo te sacrificar com nada, porque sua rotina com ele já é tão cansativa.

R: Deixa de besteira... – Deitou e obrigou Bia a fazer o mesmo, deixando o bebê entre elas, mas focando no rosto da esposa – Eu te disse que estou com saudade de você, não disse?

Bia assentiu.

R: Pois então, você sabe que eu não vou fazer nada que prejudique a rotina dele... – Esticou o braço e fez um carinho no rosto de Bia – Só aceita, porque é um gesto de carinho e vontade de ficar com você.

B: Já está aceito! – Segurou a mão de Rafa e beijou.

Elas sorriram uma para a outra e, a partir dali, focaram em brincar um pouco com o filho e fazer tudo juntas para saírem de casa assim que foi possível.


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B: Tá quase explodindo. Daqui a pouco ela senta, tu vai ver só.

Uns segundos se passaram nos quais só o que era ouvido no ambiente era a voz impaciente que falava ao telefone e os passos inquietos, mas a confirmação logo veio.

B: Olha lá, não disse? – Gargalhou baixinho e continuou segredando – Agora que sentou, ela vai passar a mão no cabelo nervosa e morder o bocão, bem no cantinho. E quando ela fizer isso é sinal de que já vai desligar, porque se não segurar a onda, vai falar o que não deve. Espia mais um pouco...

E ela até tentou esperar em silêncio, mas não conseguiu não pontuar o óbvio.

B: Ah, antes disso, lembra quando eu te disse que ela ia ser a coisa mais linda que tu veria aqui fora? Pois então, tá dando pra perceber isso direitinho agora. Olha só como é ridícula de tão gata.

Depois do deslize de cadelice, o que foi narrado realmente se concretizou e, quando isso aconteceu, Bia se agitou.

B: Ih, ferrou, desligou mais rápido do que eu imaginei. Esconde, finge que não viu e que não está nem aqui, porque tá uma fera!

Rafaella realmente tinha desligado a ligação, e ao erguer o olhar deu de cara com a esposa aos risos, comicamente terminando de usar o capuz de sua blusa para cobrir sua cabeça, e fazer o mesmo com o filho delas.

R: Qual é a piada, mamãe sem juízo? – Levantou da cadeira que era de Bianca na sala do endereço profissional da empresária/apresentadora, já apertando os olhos e caminhando para chegar mais perto.

A carioca, que estava sentada no chão emborrachado com Bento, rodeada de brinquedos, ergueu o olhar cheio de malandragem e desarmou instantaneamente o mau humor de Rafa.

B: Nada, não, só estava ensinando para o meu parceirinho os sinais claros de quando a mamãe boazuda tá bem brava. – Sorriu mais travessa ainda.

R: Mas não perde uma oportunidade de se juntar com ele pra falar mal de mim. – Despencou o corpo no chão, tirou o capuz dele e atacou o pescocinho do filho, que a encarava atentamente.

B: Que absurdo, eu só falo coisas lindas de você! – Puxou a esposa e mendigou um beijo também – Mas o que tá rolando?

R: Nada demais, besteiras de trabalhos que não se conectam e fazem minha agenda virar um caos. – Suspirou frustrada e não hesitou em ir parar com a cabeça no colo da esposa.

B: Que dengo, meu Deus! – Reclinou e beijou a testa de Rafa, sem descuidar do bebê, que ainda não se sustentava sozinho – A gente sempre dá um jeito de organizar tudo. Relaxa, final de ano é assim mesmo!

R: Eu deveria ter te ouvido e ficado ao menos até o final do ano de licença-maternidade, mas fui indo, fui soltando a mão, fui abrindo as pernas, né? Deu nisso.

B: Por mais entusiasta que eu seja do grande evento que é você abrindo as pernas, de fato, deveria ter me ouvido.

E claro, foi levemente estapeada.

B: Nem vem, tu não colabora e me entrega de bandeja assim... Eu sou humana, pô! – Gargalhando, não abandonou a feição sem juízo.

R: Sua mãe é caso perdido e você também, seu espoletinha, pode voltar aqui! – Puxou Bento que, aproveitando a distração das implicâncias das mães, mexeu-se desengonçado para sair do cerco de Bianca, mas não conseguiu driblar o olhar vigilante de Rafaella.

B: Não pode descuidar um segundo com esse trapaceiro aqui! – Ajudou Rafa a colocá-lo sentado em cima da barriga dela.

R: Não era você que queria que ele fosse espoleta? – Debochou – Taí, agora aguenta, porque só está começando!

B: Eu também deveria ter te ouvido. – Confessou e reclinou de novo para encostar uma testa na outra.

Elas ficaram um tempo ali interagindo com o bebê, mas logo Bia foi avisada de que já estava tudo certo para a reunião e que, antes disso, precisavam que ela revisasse uns detalhes.

Com dor no coração, Bianca deixou Rafaella se preparando para fazer o filho pegar no sono da tarde e foi para a sala de reuniões.

Sozinha no cômodo e na frente da tela de seu computador, ela revia algumas planilhas e dados para ter a certeza do que abordariam naquela reunião. Afinal, ela seria decisiva para que, no tempo certo, Bianca pudesse enfim decidir sobre o que fazer com a proposta que recebera uns dias antes, e que vinha tirando seu sono.

Entretanto, por alguma armadilha de seu subconsciente, ela se percebeu encarando a ampla janela de vidro que tinha naquele cômodo, perdida no inconfundível visual paulistano.

[REFERÊNCIA DO FUTURO ESCRITÓRIO REAL DA BOCA ROSA]:


E foi nessa armadilha que ela se viu aprisionada e arrastada para um fragmento de vida inesquecível.


FLASHBACK:

OUTUBRO DE 2024:

No final daquela tarde, Bia chegou ao escritório com a irritação exalando por todos os poros de seu corpo e perceptível a qualquer mortal que cruzasse seu caminho.

Miguel e sua amiga Andreza conversavam na área de lazer do espaço e perceberam Bianca passar feito um tiro por eles, sem parar nem para um "oi".

M: Shiii, acho que você ganhou uma das apostas, a chefa chegou muito mais furiosa do que eu imaginei. – Levantou acelerado da mesa que ocupavam.

A: Eu tinha certeza... – Bebeu rápido o resto de sua xícara de café e levantou também – Tem milênios que eu conheço essa daí.

M: Eu acreditei quando a Rafa disse que ela estava vibes, né? – Ainda tentou a defesa.

A dupla apertou o passo e conseguiu chegar à sala de Bianca a tempo de vê-la atirar em cima da mesa alguns papéis sem qualquer delicadeza.

A: Dormiu com a gente, foi? – Não se curvou ao humor da amiga e enfrentou – Passou sem dar boa tarde ou um aceno de cabeça que seja...

B: Desculpa, mas eu não tô boa, Andreza. – Soltou tudo e caminhou até a janela para firmar o olhar em outro ponto qualquer que não lhe colocasse sob escrutínio.

Estava exausta demais para policiar as próprias reações.

M: A reunião não vai ser essa perturbação toda, Bia, rapidinho você resolve isso e tá liberada da chateação. – Tentou aliviar a angústia tão evidente na amiga.

B: Eu falei di-ver-sas vezes que eu não estava interessada nessa reunião, Miguel. – Pronunciou as palavras pausadamente, tentando dosar o ímpeto combativo – O problema é que, outra vez, vocês não conseguiram contornar e sobrou pra mim.

A: A insistência foi impossível de contornar, Bia. – Tentou modular mais serenamente a voz – Eles estão fazendo muita questão de te apresentar isso que eles chamam de "seu novo grande projeto".

B: Eu não estou interessada, caralho! – Impacientou-se mais e se aproximou deles – Já tenho projetos suficientes em andamento e nesse exato momento o que eu queria era estar a caminho de casa para ficar com a minha mulher.

M: Vai te matar se você ouvir, conhecer o produto novo que eles disseram que já vai vir prontinho e formatadinho pra te convencer? – Cruzou os braços, tentando medir forças com a chefe na impetuosidade – Eles já entenderam que esse ano você se afastou um pouco do criativo dos novos produtos, vai vir tudo mastigadinho, não precisa se preocupar.

B: Como se o trabalho investido em um produto novo se limitasse a criar, né, Miguel? Faça-me o favor... – Passou a trilhar passos nervosos na sala – Com o lançamento vão vir mil obrigações e responsabilidades que eu não quero assumir agora. Não enquanto a Rafa está precisando tanto de mim.

A: A gente vai cuidar do máximo que pudermos, Bia, eu te prometo. – Caminhou até a amiga, pegou nas mãos dela e a conduziu para sentar na cadeira de trabalho que era dela – Agora tenta baixar a guarda e relaxar para essa reunião, porque eu tenho certeza que você ainda vai nos agradecer, quando esse seu mal-estar passar.

B: Eu só não saio por aquela porta e vou pra casa porque eu sei que já dei muito perdido neles esse ano, senão é o que eu faria. – Bufou.

M: Meu amor, que desespero louco é esse? – Achou o desconforto um pouco passado do ponto – Eu tenho falado com a Rafa e ela está tão em paz e tranquila, me disse que você também tem estado, o que rolou?

B: É claro que eu tenho estado, Guel, ÓBVIO! – Fechou os olhos e tentou reduzir o tom, mas não adiantou muito. Descarrilhou mesmo assim – Eu tenho me esforçado com ela e dado o meu melhor, mas vocês que são meus amigos de anos, me permitam surtar, porque é o que eu tô precisando fazer e, se eu não puder fazer na presença de vocês, eu não sei mais onde e nem com quem fazer!

A: Ei, calma! – Agachou e apertou a mão dela – Pode surtar, tudo bem, você tem razão. A gente deveria ter tido mais empenho em contornar isso, mas agora já foi. Respira fundo, descansa porque ainda falta um bom tempo, e prepara seu melhor sorriso pra receber a novidade de braços abertos, como você sempre fez.

B: Eu vou tentar! – Bia inspirou profundamente, fechou os olhos e jogou a cabeça no encosto da cadeira.

Andreza aproveitou a brecha para encontrar seu olhar com o de Miguel e, silenciosamente, eles acordaram que precisavam suavizar um pouco aquela trapalhada, antes que virasse uma grande tragédia.

Foi por isso que Bia nem precisou esperar o tempo total previsto, pois, alguns minutos antes, ela foi chamada para ir para a sala de reuniões.

B: Eles já estão subindo? – Colocou seu planner na mesa e sentou.

M: Sim, quase aí.

B: E a gente precisa mesmo desse circo todo? – Perguntou apontando para o equipamento de filmagem e abrindo a tela de seu laptop.

M: Você sabe que eles e você também...– O amigo fez questão de enfatizar – Gosta de registrar quando um produto novo é apresentado, para poder usar o material em algum vídeo ou retrospectiva do ano.

B: Sem saco pra isso hoje, desliga! – Ordenou em tom pouco usual – Até porque, nós não vamos fechar negócio. Só o que vai ficar registrado vai ser o mico quando eles levarem um "não" bem redondinho.

Miguel respirou fundo e caminhou até o equipamento, pois já tinha entendido que contrariar a amiga não era uma opção.

Depois disso, Bia ficou sozinha na sala, tentando se concentrar em algumas anotações e assumir a postura profissional que estava lhe escapando tão irremediavelmente naquele dia.

Felizmente, não demorou muito para a porta ser aberta.

Bianca armou-se de toda a simpatia que detinha, levantou da cadeira pronta para recepcionar os executivos, mas o estranhamento que lhe arrebatou desfez seu sorriso.

B: Amor? O que você está fazendo aqui? – Caminhou apressada até ela, inspecionando-a dos pés à cabeça – Aconteceu alguma coisa?

R: Tá tudo bem, deixa de ser esse trenzinho afoito! – Neutralizou as palavras e os gestos ansiosos com um selinho.

B: A gente não ia se encontrar em casa? – Seguiu inquieta.

R: Sim... – Pegou Bia pela mão e a levou de volta à cadeira que ocupava na extremidade da mesa – Mas me disseram que cê tava muito relutante, sabe? Sem querer assumir responsabilidades novas e eu vim aqui usar meus métodos de persuasão. – Rafa sentou comodamente na cadeira mais próxima de Bia e cruzou as pernas charmosamente, ressaltando a coxa torneada no vestido curto que ela usava.

E Bia, claro, mesmo contrariada, teve muita dificuldade em desviar o olhar do movimento sedutor.

Quando fez, porém, teve a atenção retida na pequena caixa retangular que Rafa segurava nas mãos, com o logotipo da Payot.

Desacreditada, a carioca jogou as costas na cadeira e soltou uma risada irônica.

B: Eles te pagaram quanto pra você entrar com esse protótipo aqui hoje?

R: Me prometeram um caminhãozão cheio de alegria. – Sorriu imenso, deixou a caixa em cima da mesa e puxou a cadeira de Bia para deslizar mais perto dela e ficarem frente a frente – Porque é o que eu vou sentir quando cê parar de ser cabeça dura e aceitar conhecer a novidade.

B: Rafa... – Respirou fundo e tentou não descompensar com a esposa, que claramente tinha a melhor intenção do mundo – Eu não preciso lançar uma máscara de cílios nova, eu gosto da que está no mercado agora. Inclusive, é o meu xodó, porque eu vou querer outra?

R: Porque vai revolucionar tudo e você não vai se arrepender. – Enfrentou o olhar castanho sem titubear.

B: Ah, vai? – Cruzou os braços e olhou cheia de sarcasmo para a esposa, caprichando no sotaque imitado – E eu posso saber que latim bom demais da conta foi esse que usaram pra te fazer se interessar em saber detalhes desse produto tão revolucionário? Sim, porque pra estar falando com essa convicção toda é porque o briefing foi bom, né? – Ergueu as mãos espalmadas para ressaltar a surpresa.

R: Não seja injusta, porque eu não me desinteresso tanto assim pelos seus negócios... – Tinha ido ali apaziguar, é verdade, mas não engoliria o pequeno desaforo – Eu ouço e absorvo tudo que cê me conta.

B: Não é sempre que dá pra notar isso, não.

R: Eu apenas opto por não me misturar com os seus assuntos profissionais para separarmos bem as coisas, só isso. – Arqueou a sobrancelha pra ela e Bia se arrependeu imediatamente da pequena rusga.

B: Eu sei, amor, me desconsidera... – Alcançou o tronco de Rafaella e enlaçou seu pescoço – Eu estava irritada porque já queria estar em casa amontoadinha em você, e agora estou mais incomodada ainda por eles terem feito você vir até aqui me convencer... Acho que passaram do limite.

R: Sempre que você estiver dando trabalho por aí, ou irritadinha precisando de mim, é pra me chamar mesmo... – Afastou as mechas de cabelo do rosto da esposa – É esse o meu combinado com o pessoal aqui.

B: Como é? – Olhou indignada – Vocês têm um combinado nas minhas costas?

R: Um, não, vários. – Sorriu travessa e levou o tapinha no ombro esperado.

B: Que coisa feia, hein?

R: Nenhuma nota de arrependimento, cuido muito bem do que é meu! – Deu um selinho carinhoso na esposa, fitou o rosto dela com devoção e seguiu matando a gay:

– Você tá tão linda!

B: Tu joga baixo demais, eu não tenho estrutura! – Adoravelmente acanhada, escondeu o rosto no ombro de Rafaella.

Saboreando o jeitinho de Bianca que ela amava tanto, Rafa deu-se uns segundos, mas se esforçou para não desperdiçar o gancho do clima mais leve:

– Vamos voltar ao que me trouxe aqui?

B: Me enquadrar. – Descolou da esposa e voltou as costas na cadeira.

R: Te fazer enxergar que nem tudo é tão ruim quanto parece e não tem por que essa relutância toda. – Também se endireitou na cadeira e assumiu a postura de negociadora.

B: Eu já pesei todos os prós e contras, amor, e isso não cabe na minha vida agora. Aliás, na nossa vida.

R: Ah, tem que caber. Mas onde é que já se viu isso? – Repousou o braço na mesa.

B: É só um lançamento, Rafa, muitas outras novidades virão na hora certa.

R: Mas você nem se deu ao trabalho de querer entender melhor sobre essa novidade e já está recusando? – Sorriu incrédula – Sempre te achei mais curiosa e até destemida do que isso...

B: Minhas prioridades são outras agora, e tu sabe bem disso, então não estou entendendo muito bem porque tá caindo em cima de mim com esse tipo de redirecionamento agora. – Falou tão desconfortável que não conseguiu olhar a esposa nos olhos.

Percebendo que a brecha dos ânimos leves estava prestes a ser fechada, Rafa resolveu atalhar e ser mais direta.

R: Eu só acho que às vezes a vida parece que está redirecionando a gente contra a nossa vontade, mas se a gente se nega a atender o comando dela assim, logo de cara, pode perder a oportunidade de compreender que era nesse redirecionamento que estava tudo que a gente vinha buscando.

Bianca ficou em silêncio uns segundos, encarando a mão de Rafaella cair sobre a caixa retangular que repousava em cima da mesa e ainda tentou desviar o foco.

B: Engoliu um livro de coaching antes de sair de casa, amor?

R: Não vou cair nessa... – Apertou os olhos devolvendo a afronta e empurrou a caixa com o emblema da Payot sobre o tampo da mesa, na direção de Bianca – Anda, vai! Dá uma olhada primeiro e depois você me diz se não cabe mesmo na sua vida agora.

Bia levou a mão direita para repousar sobre a de Rafaella, sem desconectar os olhares. A mineira sorriu amorosa, recuou a mão dela suavemente e deixou a caixa por conta da esposa.

A carioca ainda torceu os lábios tentando manter a marra – ou talvez pirraça – mas pegou o objeto com as duas mãos, abriu a tampa e ficou uns segundos estudando o objeto no interior dela.

Quando achou que alinhou tudo o que precisava dentro de sua cabeça, ouviu a voz doce de Rafaella:

– Gostou da novidade?

Bia ergueu o olhar e deu de cara com a emoção que ela quis tanto ver, durante infindáveis meses de angústia e expectativa.

E essa emoção estava todinha ali, concentrada no verde vibrante que ela enxergou nas íris da mulher que ela amava tanto e no sorriso frouxo, cheio de covinhas, que sempre endireitaria qualquer aflição do seu dia, e foi imensamente mais do que ela tinha sonhado.

Sem soltar o que tinha nas mãos, Bianca sentiu sua visão embaçar e fez o inevitável: chorou igual um bebê.

E tanto que chegou a desfazer o sorriso em Rafaella.

R: Ei! – Arrastou sua cadeira para ficar mais perto de Bianca – Chorar é esperado, mas desse tanto, não, pelo amor de Deus! Quem não tem estrutura sou eu! – Desesperou-se a limpar as lágrimas que caíram fartas.

B: É real isso? – Olhou de novo para dentro da caixa e finalmente tirou o objeto lá de dentro.

R: E cê acha que eu ia brincar com isso? – Segurou o rosto branco entre as mãos e fitou intensamente os olhos castanhos.

Bia desconectou os olhares, olhou outra vez para o objeto, mais uma vez para os olhos verdes e, enfim, permitiu que tudo explodisse dentro de si, no melhor sentido possível.

Abriu um sorriso imenso, impulsionou o corpo para fora da cadeira e, em um movimento rápido, foi parar no colo de Rafaella.

B: Eu vou mesmo te ver buchudinha daqui uns dias?

Rafa sorriu derrotada.

R: Se esse teste que tá na sua mão não te confirmou o suficiente e cê quer ouvir de mim, então... – Ajeitou a esposa no colo antes de concluir:

– Sim, eu tô grávida do nosso filho!

Os sorrisos sintonizaram a mesma quantidade de alívio e felicidade e, antes que os olhos também transbordassem em sincronia, Bia se lançou nos lábios de Rafaella e elas trocaram um beijo apaixonado.

Não durou muito, porém, pois Bianca logo retomou a frequência alucinada.

B: Hum... – Desgrudou do beijo – Porra, eu pulei em você igual uma louca. Pelo amor de Deus, eu sou uma mula! – Desceu rápido do colo de Rafa e ajoelhou no chão – Que falta de noção a minha! – Encheu de beijos a barriga ainda chapada de Rafaella.

R: Calma, amor... – Deu risada do jeito dela e acariciou seus cabelos – Tá tudo bem! Se você não pulasse de alegria no meu colo, esse momento não teria sido completo.

B: Não, eu tinha que ter tido cuidado. — Ainda soava exasperada.

R: Ei, respira e levanta. – Forçou a esposa a sair daquela posição – Senta um pouco!

Bianca obedeceu e, outra vez, ficou encarando o teste de gravidez em sua mão.

Percebendo que precisava ir situando seu amor aos poucos, Rafa pegou a mão livre dela e falou com carinho.

R: Eu sei que a gente tinha combinado de fazer isso juntas, quando completassem quatro semanas da implantação, mas eu não aguentei e quis antecipar uma semaninha pra te fazer essa surpresa. – Apertou a mão dela e completou quase dengosa – Não fica chateada comigo.

B: Chateada? – Ainda não conseguia focar e a pergunta nem foi retórica, pois precisou mesmo de uns segundos para processar – Claro que não, eu amei a surpresa!

R: Jura?

B: Claro, né? – Pareceu se dar conta do outro aspecto – Mas confesso que ia detestar se tu tivesse feito isso sem mim e desse errado sem eu estar por perto pra te dar colo.

R: Eu sabia que não ia dar errado. – Disse cheia de si.

B: Eu amo tanto te ver assim... Feliz e positiva! – Soltou o teste em cima da mesa e levou a mão ao rosto de Rafa – Mas vamos manter a nossa alegria sob controle, porque é só a terceira semana, ainda tem um chãozão pela frente até estabilizar. Lembra do que o médico disse?

R: Eu sei que cê foi cautelosa esses meses todos, e foi maravilhosa nisso... – Beijou a mão que tinha em seu rosto – Mas acredita em mim quando eu digo... – Fez Bia não desviar o olhar – Eu sei que já deu certo, eu te disse isso desde que a gente saiu da clínica... – Levou uma das mãos à própria barriga e baixou o rosto:

– Tem três semanas que eu sinto o nosso filho e sei que ele vai sair lindo e saudável daqui de dentro pra completar a nossa felicidade.

B: Deus te ouça! – Disse com o olhar ainda emocionado.

R: Eu sei que já ouviu. – Fez um carinho na bochecha da esposa – Mas vai ser ele ou ela, né?

B: Ele... – Sorriu travessa – Essa parte sou eu que sei.

R: Se ele ou se ela, saberemos em breve. O que importa mesmo é que é bom esse neném já vir preparado e ficar bem ciente, porque vai ter duas mães que sempre sabem tudo.

Parecendo não ter ouvido uma só palavra, Bia segurou o braço de Rafa e puxou delicadamente.

Elas levantaram juntas e caminharam até a ampla janela que tinha naquela sala.

Rafaella deu risada quando percebeu os olhinhos que ela amava tanto vagando inquietos pelo ambiente, porque sabia exatamente o que viria.

B: Não era pra ser assim, eu não tenho nada preparado pra esse momento. – Finalmente choramingou o fato de ter perdido o controle da narrativa.

R: Enfim, o sabor delicioso de ter conseguido te pegar de surpresa em um dos momentos importantes da nossa vida juntas.

B: Amei muito, mas odiei fortemente essa parte. – Resmungou.

R: Pois eu estou amando cada segundo. – Segurou o rosto de Bia entre as mãos e beijou.

B: Eu tinha tudo planejadinho na minha cabeça.

R: Eu tenho certeza que sim, mas esse momento é meu e seu, pra ser vivido assim... – Pegou as duas mãos dela e encarou seu olhar – Com muito olho no olho. Porque só nós sabemos o quanto percorremos até chegar aqui e a conquista imensa que essa gravidez é pra gente. – Soltou uma mão para limpar a lágrima que escapou em Bianca – É por isso que a gente não precisa de mais nada.

B: Tem razão. – Expandiu o sorriso e deixou mais lágrimas caírem.

R: A única coisa que eu fiz questão foi de ter o momento registrado... – Apontou para o equipamento de filmagem.

B: Errr... – Olhou de lado – Eu mandei o Miguel desligar.

R: Ô, meu Deus, que bonitinha... – Abraçou a esposa e beijou o topo de sua cabeça – Jura muito que alguém a obedece. Acho fofo demais, sô!

B: Ele não fez? – Indignou-se outra vez.

R: Claro que não. – Gargalhou – Ele e a Andreza são os únicos pra quem eu precisei contar pra me ajudar, e eles estão ansiosos pra ver a sua reação. Tem até bolão rolando pra saber se você ia desmaiar ou surtar.

B: Mas ninguém me respeita mesmo. – Revirou os olhos.

R: Eu respeito tanto que o bolão é meu... – Deslizou um nariz no outro – Eu tinha certeza que você só ia chorar, só não imaginava que seria tanto e tão automaticamente.

B: E tem como reagir de outro jeito? – Bia enlaçou a cintura de Rafaella e ficou olhando da barriga para o rosto da esposa, ainda extasiada.

R: Tá difícil desse tanto de acreditar? – Embalou suavemente os corpos unidos.

B: Sim, porque... – Engasgou as palavras, mas os olhos verdes cheios de amor a incentivaram a continuar – Eu estava tão angustiada, com tanto medo de te ver triste de novo daquele jeito.

R: Eu tenho te dado muito trabalho, né? – Soou constrangida – Queria dizer que isso acaba hoje, mas algo me diz que a estrada ainda é longa demais da conta e eu não posso prometer muito a partir daqui.

B: E eu digo que vou saber rodar essa estrada de olhos fechados e com o maior sorriso no rosto, tu vai ver só! – Soou uma criança empolgada – Tu só precisa sentar, gestar o nosso pequenininho com todo amor e aproveitar a vista, porque vai ser lindo!

Rafaella sorriu diante da vista de São Paulo testemunhando o amor imenso que elas irradiavam naquele momento, e sentiu-se exorbitantemente apaixonada quando outra vez Bia ajoelhou e beijou sua barriga.

Sem pressa e sem qualquer intenção de interromper, a mineira acariciou os cabelos castanhos e manteve-se atenta para a declaração que ela sabia que viria:

– Obrigada por me surpreender e me provar que, do seu lado, sempre tem uma camada a mais de felicidade que eu ainda não vivi...


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Com o semblante apaixonado ainda mais realçado pela realização de que bem ali, na sala ao lado, ela tinha Rafa ninando o filho tão amado e desejado delas, Bia respirou fundo e teve que lutar muito para conseguir se libertar daquela reminiscência ardilosa que tanto tinha lhe tirado o foco.

Felizmente, depois da maratona que tinha sido aqueles quase dois anos dedicados ao não apenas "novo" como, sem dúvida alguma, maior projeto de sua vida, Bianca enfim vinha conseguindo reativar o seu lado boss com a mestria de antes, e foi isso que a recolocou de volta aos trilhos naquela tarde.

Os executivos da Payot chegaram na hora prevista e a reunião correu por algum tempo densa e com o pulso firme de Bianca sobressaindo como antes, mas foi só ela ouvir batidas na porta para sua armadura de super empresária ceder imediatamente.

Afinal, ela já reconhecia até a cadência das batidas de Rafaella em qualquer porta.

B: Um segundinho só porque a patroa solicita a minha atenção... – Dirigiu-se aos outros presentes e, ironicamente, saiu da posição de patroa na extremidade da mesa e foi até a esposa – Tá tudo bem, amor? Alguma coisa com o pequenininho?

R: Tudo ótimo! Ele dormiu e o Guel ficou trabalhando lá na sua sala para ficar de olho nele. Aí eu vim aqui dar uma espiadinha na reunião, posso? – Pegou na mão de Bianca – Prometo que fico calada.

B: Cla-claro! – Perdeu-se completamente, como era o esperado, mas não teria porque negar.

Rafaella apenas sorriu e as conduziu à mesa.

R: Boa tarde, todo mundo! – Puxou a cadeira da esposa pra que ela sentasse – Vou ficar aqui com vocês, mas não se incomodem com a minha presença.

Todos cumprimentaram de volta e Rafa foi até o canto da sala pegar uma cadeira extra e, sem cerimônias, arrastou-a para perto da esposa.

A reunião retomou seu curso e chegou ao final sem novas interrupções, pois a mineira cumpriu sua palavra e apenas assistiu a tudo calada, com olhos curiosos e atentos.

Quando a pauta prevista esgotou e todos foram embora, o casal passou na sala de Bia e percebeu que o bebê ainda dormia, o que as levou ao espaço de lazer do escritório para tomarem um café.

Sentadas sozinhas em uma mesa com canto alemão – dessas posicionadas no vértice de um ambiente e com sofás servindo de assentos – elas gastaram alguns minutos debatendo banalidades da rotina doméstica e só depois de ensaiar muito é que Bia teve coragem de abordar o que lhe estrangulava há tempo demais.

Mexendo despretensiosamente o café, ela disparou:

– Vai me contar qual a sua impressão sobre a nossa reunião?

R: Por Deus, Bianca! – Levou a mão ao peito dramaticamente – Meu coração agora quase saiu pela boca?

B: Por que? – Arregalou os olhos.

R: Por um segundo eu tive certeza absoluta que a sua pergunta incluía "amiguinha" e acabava com "tu comeu".

B: Sei... – Apertou os olhos – Por que? Alguma executiva na mesa de reuniões é amiguinha de ex sua?

R: Claro que não, né, Bia? – Revirou os olhos – Que ideia! O início da sua pergunta só me gatilhou mesmo.

B: "Rabo preso" que chama, né? Tá sempre esperta. – Continuou com o olhar cerrado.

R: Posso responder a pergunta, ou não?

B: Pode, encantadora de avião, dona e proprietária do chá mais lendário desse país!

R: BIA! – Censurou com o olhar insultado.

B: Prossiga, amor da minha vida. – Corrigiu com cinismo evidente.

Rafa revirou os olhos, mas não desperdiçou a brecha de recolocar o assunto no rumo certo.

R: A minha impressão sobre a reunião de vocês é que, como eu imaginei, é um caminhão de trabalho que vem por aí, não é mesmo?

B: Acho que ficou claro que não tem nada fechado, não ficou? – Voltou a mexer o café sem encontrar os olhos da esposa.

R: Claríssimo. Afinal, tá tudo uma grande bagunça ainda, né?

Bia franziu o cenho e ergueu o olhar enquanto Rafaella disparou a falar.

R: Eles não sabem se te oferecem uma linha inteira nova, ou se mudam tudo da que já está no mercado. Nem sobre a data provável de lançamento eles conseguiram chegar em um acordo.

B: Eu quis dizer que ainda não está certo nem que eu vou aceitar, amor. – Pegou a mão dela em cima da mesa e tentou ser mais clara – Eu amei que tu apareceu lá, porque assim fica mais fácil a gente conversar e definir o que vai ser melhor agora para a nossa família.

Rafa respirou fundo, jogou as costas no sofá e sentiu vontade de encher de beijos a carinha preocupada de Bianca.

Poderia ter feito, é verdade, mas optou por manter a seriedade para resolver aquilo de uma vez por todas.

R: O melhor para você eu não posso dizer, mas o melhor para mim e para o Bento eu posso, pelos poderes que me foram investidos no contrato de aluguel de barriga...

B: Então diz. – Sorriu de canto com o tom gracioso da esposa.

Rafa chegou mais perto e segurou as duas mãos de Bianca.

R: O melhor pra mim e pra ele é ver a pessoa que a gente mais ama nesse mundo cheia de gás, falante, "adrenada" pelo universo que ela domina, e transbordando felicidade... Exatamente como eu te vi dentro daquela sala uns minutos atrás!

B: Não é só isso que conta, amor.

R: Pra mim, é. Porque poucas coisas me fazem mais feliz do que te ver alegre e cheia de vida desse jeito... – Beijou as mãos da esposa sobre o tampo da mesa – E o irônico é que eu nem precisava ter visto nada disso, porque quando eu entrei lá foi só porque eu queria acompanhar para tentar entender um pouquinho e, quem sabe, conseguir te ajudar pra gente conciliar tudo.

B: Você? – Estranhou imensamente – Vai me ajudar e cometer a heresia de se misturar aos meus lançamentos novos?

R: Cinco anos e meio de relacionamento já, amor, uma hora eu vou ter que engolir o choro e parar com essa pirraça, não é mesmo? As nossas vidas já se misturaram tanto que tem até um pedacinho meu, que por obra do destino sabe ser insuportável de tão atentado igual você, dormindo na sua sala nesse momento.

B: E esse é o maior orgulho da minha vida. – Apertou as mãos da esposa, com os olhos brilhando.

R: Pois então, você vai aceitar essa proposta e eu vou te ajudar no que eu puder para estar mais pertinho de você e facilitar o nosso próximo semestre.

B: Eu fico lisonjeada, mas não sei se eu concordo, porque tu tem as mesmas responsabilidades que eu como profissional, administradora da nossa casa, esposa do caralho... E ainda se desdobra pra ficar por conta do bezerrinho esfomeado. Então não tem cabimento somar na sua conta preocupação com os meus negócios.

R: O que você não pode dar em leite, você dá em amor e cuidado excessivo com ele e comigo, desde o "dia um", quando o Bento ainda era só um sonho bom. Então sua planilha não está batendo com a minha, Boss. – Disse levemente debochada.

B: Conheço tão bem esse olhar... – Sorriu genuinamente derrotada – Sei que não vou ter a menor chance na argumentação, então vou me poupar.

R: Gosto assim! – Segurou o queixo dela e emendou empolgada – E sabe o que é melhor? Eu já tenho a minha primeira contribuição.

B: Como assim?

R: Cês enrolam demais e enquanto estavam rodeando e rodeando em torno do mesmíssimo assunto, eu pensei quando e como lançar as novidades.

B: Ah, pensou? – Cruzou os braços – Fácil assim?

R: Facílimo, amor... – O tom convencido divertia Bianca cada vez mais – É para o primeiro semestre, não?

B: Uhum.

R: Então... Data melhor do que o dia das mães não há, e campanha mais foda do que uma com as duas mães do ano e diria mais... – Exagerou na empolgação – Da década, não vai haver.

B: E essas mães seriam... – E não foi nem meme a lerdeza.

R: Eu e Gabriela Fonseca.

B: Oi? – Caiu finalmente na real – Pelo amor de Deus, gelou meu corpo inteiro só de ouvir isso!

R: Só assim pra você acordar pra vida, né? – Revirou os olhos – Eu e você, trem lerdo!

B: Você vai aceitar fazer uma campanha Boca Rosa Beauty comigo??? – Deu um pulo no assento.

R: Uai, se a ideia é minha, sou mãe e até um pouco bonitinha pra sair em foto, eu quero participar.

B: Alô, alô, todo mundo! – Simulou um megafone com as duas mãos e subiu no sofá para chamar a atenção dos colaboradores dela que trabalhavam ali ao lado – Parem agora o que estão fazendo para saberem que Rafa Kalimann finalmente se assumiu uma Andrade, e vai aceitar entrar no marketing da nossa humilde marquinha!

R: Deixa de ser ridícula e não me faça me arrepender! – Levantou também e agarrou a esposa pela cintura para fazer ela descer, constrangida com a pequena festa que as pessoas fizeram.

B: Vai arregar? Jura? – Provocou – Olha aí, tá todo mundo na expectativa agora!

R: Desde que eu passei a te amar não tem um só dia nessa vida em que eu tenha arregado, meu amor, meu "game" é sempre alto do seu lado. – Devolveu na mesma medida a provocação – Então pode começar com os easter eggs porque as mamães do Bento vendendo batom juntas já é uma realidade.

B: E o mundo vai ser todinho nosso! – Beijou e abraçou a esposa apertado, completamente alheia aos olhares que recaiam sobre elas.


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Quando terminaram o momento delas na cafeteria, Rafa ficou retida conversando com Andreza no estúdio e Bia seguiu para sua sala para encontrar Miguel afoito com o bebê no colo.

B: Eita, que berreiro é esse aqui?

M: Graças a Deus você chegou, eu já estava indo lá procurar vocês! – Foi logo passando Bento para os braços de Bia – Achei que eu ia conseguir fazer ele parar de chorar, mas parece que as minhas tentativas fizeram foi piorar. Até música eu liguei, mas o choro foi só aumentando.

B: Ele tá de barriguinha cheia e não está de fralda suja! – Apalpou a região – Acho que só te estranhou mesmo.

M: Pois é, mas ele ainda não parou, então boa sorte aí, porque eu tenho que correr com aqueles assuntos antes de acabar o dia. – Saiu recolhendo seus papéis e computador em cima da mesa.

B: Nenhuma novidade você fugindo de criança chorando, né? – Revirou os olhos e continuou tentando acalmar o filho.

Tentou, tentou, alguns minutos passaram, e nada...

Bento continuava chorando.

Já sem muito saber o que fazer, Bia foi resgatada daquela sinfonia quase enlouquecedora pela voz calma da esposa.

R: Ei, o que aconteceu? – Pousou a mão delicadamente no ombro de Bianca.

B: Não sei, já tá quase roxo de tanto chorar e não para.

R: Posso tentar? – Esticou os braços.

B: Claro!

Com cuidado, a carioca passou o bebê para os braços de Rafaella e ela o acomodou com o rostinho em seu ombro.

R: Pronto, pronto! – Passou a dançar suavemente o corpo – Pra que esse choro todo, meu amor? Lembra o que eu sempre te digo? – Acariciou a cabecinha dele – Sem choro a mamãe te escuta e te entende muito melhor.

Bianca se afastou um pouco e, com o sorriso indisfarçável no rosto, assistiu Rafaella demorar não mais do que alguns segundos para controlar o choro do filho.

R: Passou? – Desgrudou o rosto do bebê de seu ombro e lhe obrigou a encarar seu olhar – Era manha, não era? – Sorriu apaixonada quando ele praticamente confirmou com o sorriso safado.

A carioca se mantinha em silêncio e com a expressão indecifrável.

R: Acho que ele acordou assustado com o lugar que ele não reconheceu e abriu o berreiro. – Beijou o rosto do filho que tinha agarrado até a gola de sua blusa de tão grudado que estava nela.

B: E só fechou o berreiro quando voltou a se sentir seguro, no colo da única pessoa capaz de dar essa segurança pra ele.

R: Não é assim, amor, ele só está mais acostumado comigo pelo tempo a mais que a gente passa junto.

B: É assim, sim, e tá tudo bem. – Chegou mais perto de seus dois amores na frente da janela – Ficou claro que você erra muito quando diz que ele não disfarça a preferência por mim, mas acerta demais quando diz que nós dois somos parecidos.

R: É mesmo? – Puxou Bia com a mão livre para ela ficar grudada neles.

B: Sim, porque exatamente como ele... – Fez um carinho nos cabelos do filho – Desde que você entrou na minha vida, não tem lugar no mundo que me faça sentir mais segura, bem cuidada e confiante do que pertinho de você.

E outra vez diante da vista da cidade, Rafaella fez um carinho nos cabelos de Bianca e sorriu ainda mais apaixonada pela confirmação de que, juntas, elas dobrariam sempre a aposta e fariam a vida expandir e multiplicar cada vez mais.

[IMAGENS DO PASSEIO DA FAMÍLIA, CEDIDAS PELA FOTÓGRAFA OFICIAL DO MUNDINHO CINCO DIAS]:

PS: Obrigada, thisthaix por mais esse carinho! <3



💗💗💗💗💗



Ufa!

Se você chegou até aqui, parabéns!

Como eu sabia que uma das maiores vontades de vocês - senão a maior - era ler algo em 2025, com o Bento, eu usei  essa linha temporal para mostrar a dinâmica delas mamães, tentando se encontrar na realidade nova, mas ao mesmo tempo forcei ganchos para preencher lacunas passadas.

E também, eu quis que esse Bônus 3 fosse complementar ao Bônus 2. 

Focando agora na preocupação da Rafa, eu quis deixar claro que, como a Bia disse no Bônus passado, elas vão trocar de posição sempre que for necessário para cuidarem uma da outra. 

Enfim, como sempre digo, espero que tenha funcionado!

Foi uma delícia ir escrevendo isso aos pouquinhos e é sempre incrível voltar aqui.

Vou confessar que não tenho mais "vontades minhas pendentes" para a nossa história amada, mas se um dia surgir, quem sabe não nos encontramos de novo? 

De todo modo, podem deixar aqui registrado se ainda quiserem ler algo específico, talvez me inspire...

Por fim...

Queria dizer que a quarentena voltou a nos estrangular com angústia e medo e, por isso, eu quero aproveitar essas últimas linhas para mandar meu incentivo e agradecimento para as Rabias que seguem criando as fics ainda em andamento e adaptando tantas histórias lindas.

Obrigada por continuarem cuidando tão bem do nosso Fandom amado e não desistam, vocês são incríveis!

E cuidem-se, meus amores, como eu já disse, cada uma de vocês é importante para mim em algum nível, e eu espero que todas se mantenham saudáveis e bem nesse momento ainda mais crítico do que jamais vivemos

É isso!

Meu amor sempre!

Beijos!



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