SEIS | ETERNA CRIANÇA
"Nari andou receosa até o refeitório da escola. Aquele era o seu primeiro dia de aula e ninguém tinha ido falar com ela. E todos riram do seu sotaque quando ela se apresentou, também teve um garoto que puxou três vezes sua chiquinha.
Ela ficou parada encostada na porta do refeitório olhando para todas aquelas crianças que estavam brincando e rindo sem perceber a presença dela. Todos ali pareciam estar se divertindo, menos um garoto que estava sentado comendo sozinho e tinha uma enorme carranca. Parecia ser uma boa pessoa na visão da Nari. Reunindo uma coragem que não tinha, Nari se desencostou da porta e caminhou em passos hesitantes até o menino.
– Eu posso sentar aqui? – Perguntou Nari com um sorriso doce. O garoto olhou para ela de cima a baixo com desprezo.
– Não. – Disse apenas. Nari ficou surpresa com a recusa, mas decidiu insistir.
– Por que não? Por favor, me deixe sentar aqui. Meu nome é Nari e hoje é meu primeiro dia. – Ela ainda tentava ter alguma resposta positiva do menino.
– Eu não quero saber seu nome. Só quero que saia daqui. – Ele disse com uma careta ainda pior que a primeira, mas Nari não sentiu medo, apenas riu dele. Ela achou a expressão muito parecida com a do seu velho vizinho rabugento. O menino bufou e desistiu de tirar Nari dali. – Eu deixo você se sentar se você ficar calada.
– Eu prometo. – Disse Nari animada por ele ter a aceitado. Ela se sentou, abriu sua lancheira da Princesa Maravilha¹ e passou a comer alguns gyeongdan² e yaksik³. Ela começou a ficar incomodada, não conseguindo controlar a boca. – Qual o seu nome?
– É Paul. Agora fica quieta. – Respondeu mal-humorado.
– Mas eu quero conversar. Se você não quiser falar nada tudo bem, eu falo o suficiente por nós dois. Minha eomma⁴ fez essa comida para mim, está muito saborosa. Gostaria de experimentar? – Perguntou ao Paul, que olhou para a comida esquisita. Ela pegou um yaksik³ e colocou na boca dele quando ele ia começar a dizer algo. Ele fez uma careta estranhando o gosto. – Muito bom, né? Ela faz a mesma comida para o meu primeiro dia de aula desde que eu tinha cinco anos. Falando nisso, quantos anos você tem? – Nari novamente não o deixou responder, falando em cima da pergunta. – Eu tenho oito. Já sou uma moça crescida, mas às vezes ainda brinco de boneca. Só não conte ao meu abeoji⁵, ele está brigando muito com a minha eomma⁴. Se ele descobrir que eu ainda brinco de boneca, ele vai brigar comigo e com a eomma⁴. – Nari olhava para a comida agora triste, Paul estava sem entender nada do que ela dizia. Ele só queria ir embora e nunca mais ve-la. Do nada Nari volta a sorrir. – Você não é muito de falar, né?
– Você que não cala a boca. – Respondeu Paul voltando a comer ignorando totalmente a presença da garota á sua frente que voltou a falar desparadamente. – Ai. – A menina reclamou, Paul olhou a tempo de ver Zack – um garoto repetente que Paul odiava –, puxar uma das chiquinhas de Nari. Paul levantou já se jogando em cima de Zack. Paul em cima do rival acertou um soco de direita no rosto de Zack, que tentava com todas as forças tirar o Lahote de cima de si.
Paul estava possesso. Aquele menino tinha pertubado-o desde o início do dia, mas mexer com uma garota que estava com ele já era demais. Paul não se importava com a garota. Ele se importava com o fato de Zack mexer com ela, querendo o provocar. Zack conseguiu o que tanto queria. O Lahote fazia questão de dar uma surra que ele nunca esqueceria.
Zack estava se debatendo. Ele fazia de tudo para se livrar do Paul, que irritado pegou a cabeça de Zack levantando, só para em seguida soltar com tudo no chão. Zack ficou zonzo com a pancada. Ele parou de se mexer aceitando a surra que iria levar.
– Jungji⁶. – Paul parou com a sua mão a centímetros de Zack. Algo naquela doce voz o fez parar. Provavelmente o tom desesperado e choroso. O garoto Lahote olhou ao redor vendo um amontoado de pirralhos em cima de si, mas uma garotinha em especial se destacava. Apesar de não acreditar em Deus e toda essa coisa sobrenatural, Paul jurou que naquele momento ele estava vendo um anjo.
Ela era tão linda!
O Lahote se esqueceu da raiva que sentia das provocações de Zack, se esqueceu da raiva que sentia do abandono da mãe e se esquece do que era sentir raiva.
Aquela garotinha só podia ser a porra de um anjo! O seu anjo.
Ele se sentiu culpado ao perceber que seu anjo estava chorando, e o pior: era culpa exclusivamente dele. Querendo acabar com às lagrimas, e devolver o sorriso perfeito da garotinha, Paul se levantou abrindo espaço por entre os curiosos, foi até ela, que estava encolhida soluçando e o olhando.
– Não quero que chore de novo. Você não fica bonita chorando. – Mentiu. Para Paul aquela garotinha ficaria linda de qualquer forma.
Nari engoliu o choro, mas ainda continuava soluçando um pouco.
– Eu não quero que você fique brigando. Você é meu primeiro amigo, e eu não gostaria de ter que te encher de baendeu eideu⁷. – Ela voltou a sorrir. Bem que Paul queria dizer que não era amigo dela, mas não queria ver ela parar de sorrir. Por isso ele deu seu sorriso de lado sarcástico. Infelizmente Zack se intrometeu na conversa ainda um pouco zonzo.
– Valeu, garotinha. Se não fosse pelo seu chororô eu teria acabado com o Paul. – Disse nervoso por ter apanhado do rival.
– O máximo que você machucaria wm mim seria a minha mão por tanta cabeçada. – Só isso bastou para que Zack saisse dali humilhado e jurando vingança. – Ele é mesmo um panaca, né Garotinha? – Nari franziu a testa incomodada com o apelido.
– Eu não sou uma garotinha, sou quase uma "adolescence". – Ela fez um biquinho irritado que quase fez Paul suspirar.
– Na verdade é adolescente que se fala. E com certeza você não é uma. "
Na casa Lahote, um jovem acorda assustado. Era como se o dia que conheceu sua Garotinha, fosse no dia anterior. Ele se lembrava de cada detalhe daquele dia. Mas também, como poderia se esquecer da primeira vez que viu seu anjo?
Nari mostrou a ele que não era apenas a aparência que tinha de anjo, mas o coração também. Ela foi a única que o aceitou sendo estressado como era, ela o aceitou mesmo que ele fosse errado. Ela o mostrou que raiva não era a resposta para tudo. Ela o ensinou a ter empatia, paciência, delicadeza... Ele até poderia não praticar muito essas coisas, mas sabia o que era por causa dela.
Ele voltou a dormir se lembrando que teria que estar muito bem disposto no dia seguinte para levar sua Garotinha em um encontro.
¹Corra, Princesa Maravilha (날아라 원더 공주) é um filme de super-herói coreano de 1978.
²Gyeongdan são bolinhos de arroz doce enrolados em canela, gergelim preto ou pó de soja.
³Yaksik é arroz doce com nozes e jujuba. O arroz é cozinhado com castanhas, jujuba, pinhões e canela com mel e molho de soja tempero.
⁴ "mamãe".
⁵ "pai".
⁶ "pare".
⁷ "curativo"
Espero que vocês tenham gostando. Quis mostrar um pouco dos dois como eram quando crianças.
Já estou escrevendo o próximo capítulo, eu pessoalmente estou bem ansiosa para terminar e compartilhar com vocês o primeiro "encontro" deles.
Até mais, bjss.