Faz dois dias. Exatamente dois dias que eu venho evitando ir ao trabalho por causa do meu parceiro.
A maneira como ele falou e como eu me rendi a ele me deixa completamente fora de mim.
Eu não estou acostumada a ter esse tipo de contato com as pessoas, não tão intimamente assim. E é por isso que eu não consigo olhar em seus olhos, porque eu sei, que dá forma que estou, sem controle das minhas ações, o deixarei fazer o que quiser, e isso não faz parte da minha natureza.
Eu sempre tive repulsa de imaginar qualquer homem me tocando, mas agora, é só eu sentir o cheiro dele que consigo imaginar coisas que não pensei serem possíveis de acontecer. Não comigo.
Por todas essas questões resolvi fingir que estava doente e marquei uma consulta com minha psicóloga. Ela vai me ajudar, ela sempre me ajuda.
— Phoebe Reed. — escuto ao longe a secretária dela me chamar.
Me levanto rapidamente, seguindo até sua sala.
Eu preciso de respostas, preciso entender porque não estou mais sendo como era, e porque tudo parece está indo contra mim.
— Achei que você tinha desistido das nossas consultas, tinha sumido por uns dias… — A senhora, que tem acesso aos meus segredos mais obscuros diz, com um sorriso simpático no rosto.
Por que para todo mundo é tão simples sorrir assim? — penso, afinal, eu sempre me pergunto isso.
Fazer isso para mim é como me obrigar a matar alguém, simplesmente não consigo.
— Só estava sem tempo… — respondo, me sentando na poltrona.
— Suponho que alguma coisa aconteceu, você está agitada… — diz, se sentando e puxando sua caderneta.
— Sim, eu não sou mais eu… É como se eu estivesse me perdendo, as vezes eu me olho no espelho e parece que estou vendo duas pessoas totalmente distintas uma da outra...
— Como assim? — indaga, parecendo realmente interessada.
— É como se a antiga Phoebe estivesse sendo substituída por outra, e o mais assustador, eu gosto, entende? Você já se sentiu assim?
São tantos pensamentos conflitantes, e tudo gira em torno de Axel Coleman. Ele é o culpado por isso. Ele me faz querer fazer coisas que não são certas. Coisas que não deveriam me fazer se sentir bem, mas eu me sinto.
— Você conheceu alguém? O que exatamente vem mudando?
Ela anota algo em seu caderno e volta a me olhar.
— Por que você acha que eu conheci alguém?
A ideia de achar que só estou mudando por ele é tão estranha. Porque eu não deveria me sentir assim. Principalmente por tudo que aconteceu. Inclusive, a promessa que fiz a mim mesma de não me envolver com ninguém.
— Porque eu venho te tratando a quatro anos, e nada disso tinha acontecido, sua vida é monótona, nada demais acontece, se está acontecendo agora é porque temos um novo personagem nela. E isso te deixa incomodada. Não é?
Como ela consegue acertar tão bem as coisas? Isso não é normal.
Respiro profundamente, porque é uma droga saber que ela me conhece tão bem assim.
— Axel Coleman... Esse é nome. Ele faz parte do meu passado, e eu achava que todos os toques íntimos fossem ruins, mas o dele não é… Eu gosto, mas não deveria gostar… Homens não prestam. Eu deveria sentir nojo de sentir as mãos dele passando pelo meu corpo, mas eu não sinto, e tudo que eu mais quero é sentir ele me tocando por debaixo das peças de roupas, é tudo que eu mais quero… Mas não deveria. E você sabe.
Desabafo tudo. Sem pensar exatamente no que estou falando, só deixo sair, sem medo, porque eu sei que posso confiar nela tudo da minha vida.
— Você nunca me falou sobre ele… — sussurra, querendo que eu explique de qual parte do meu passado ele faz parte.
— O pai dele trabalhava na minha casa e ele estudou comigo durante o colegial…Mas nunca tivemos contato direto… Até agora. — sussurro baixinho a última parte.
— Certo… Sabe o que eu acho? Você está com medo, por causa do seu trauma, mas eu já te disse que você deveria se dar uma chance de ser feliz… Deixar o passado para trás às vezes é necessário. Eu sei que o que você passou nunca será esquecido, mas talvez, com o tempo, e sendo amada, as coisas se tornem suportáveis — ela se levanta, indo até sua mesa — Você acha que todos os homens são ruins, mas não são. Você pode sentir prazer, ser feliz Phoebe. Talvez esse Axel tenha entrado na sua vida para te trazer de volta a vida. Por que você não se dar uma chance?
Falar e falar. É tudo tão fácil, quero ver se por no meu lugar e entender tudo que acontece.
Eu não queria que ninguém, em hipótese alguma passasse pelo o que eu passei. E provavelmente quando ele souber, vai querer se afastar, vai sentir nojo de mim, e essa ideia me deixa com medo, porque não sei se suportaria ver em seus olhos isso.
— Olha para mim… Você é uma mulher linda, jovem, inteligente, qualquer pessoa pode se interessar por você… Não deixe os pensamentos negativos te levarem para um caminho que não existe.
Queria conseguir acreditar nas suas palavras, mas é tão difícil, ainda mais para alguém como eu.
(...)
Assim que entro no meu apartamento, a solidão dele me atinge, me deixa aflita, como nunca me senti antes.
É tudo tão sem vida, sem cor, sem graça alguma, como eu.
As vezes eu queria conseguir seguir em frente, mas eu sinto algo, me puxando para baixo, como se estivesse me mostrando que eu não mereço sorrir, nem nada de bom.
Me jogo no sofá olhando para o teto, esse ato me faz recordar do que aconteceu a alguns dias... Meu celular sumiu e depois misteriosamente pareceu. Isso com certeza está me deixando muito nervosa.
Bufo, pensando sobre como eu queria ser normal. Se eu fosse normal, eu deixaria o que quer que fosse para acontecer entre eu e Axel rolar, mas eu não consigo, algo dentro de mim diz que eu vou sair machucada.
Ele é bonito demais.
Feliz demais.
Inteligente demais.
Tudo que pode me levar ao abismo. E eu não quero arriscar.
Meu celular toca no meu bolso, avisando que alguém está ligando, para me infernizar. Saco!
Assim que vejo que é um número desconhecido, estranho automaticamente.
— Alô…
— Oi amor… Estou aqui embaixo, será que você poderia liberar a minha entrada?
Ou eu estou muito doida ou ele realmente conseguiu meu número e meu endereço e está querendo entrar no meu apartamento? E porque porra ele está no meu prédio?
— Estou esperando você liberar… Beijos. — ele simplesmente desliga, sem esperar eu dizer mais nada.
Ok, isso realmente não é uma coisa que eu esperava e agora não sei o que fazer.
Devo deixar ele entrar? — me questiono, mas a resposta vem logo em seguida — Claro que não! Se eu deixar não terei mais controle de nada.
Alguns minutos se passa e meu celular toca de novo, vejo que é o número desconhecido. Só pode ser ele. Penso em não atender, mas algo me impede de fazer isso.
Respiro devagar vendo que vou fazer uma coisa que não queria.
Vou até o interfone e libero sua entrada, contrariando a mim mesma e não ouvindo meus instintos.
Poucos minutos depois escuto a campainha tocar.
Fico olhando para a porta sabendo que terei que enfrentar ele novamente, e o convencer que não quero nada com ele.
Me aproximo, abrindo a porta e quando eu o vejo tudo parece perder o sentido.
Seus olhos escuros me fitam tão intensamente que perco até um pouco do ar. Que ódio!
— Trouxe verduras para fazer uma sopa… — diz, levantando uma sacola na minha frente.
Não entendo bem o motivo dele dizer isso mas logo depois me lembro que a minha desculpa para não ir trabalhar foi que estava com um resfriado.
Ele realmente veio até aqui para cuidar de mim? — penso, sem acreditar nisso.
— Não vai deixar eu entrar? — pergunta, sorrindo. E se ele tivesse alguma noção de como seu sorriso parece iluminar tudo ao meu redor, faria isso muitas vezes. Porque meu Deus, é a coisa mais linda do mundo. E ainda por cima tem covinhas!
— Acho melhor não, só deixei você subir por educação…
E sem esperar ele dá um passo na minha direção, me fazendo dar um passo para trás, e por fim, ele está dentro do meu apartamento.
— Você está pálida, porque não se deita enquanto eu faço a sopa? — insiste, como se fôssemos alguma coisa.
— Você é surdo? Eu disse que não quero você aqui Axel… — falo, tentando não ser muito ignorante.
— Minha audição é perfeita amor… Mas você não está em condições de escolha, vim cuidar de você… Onde é a cozinha?
Bufo fechando a porta, pelo visto não será sendo ignorante que o farei ir embora, e dizer que não estou doente com certeza está fora de cogitação.
— Você parece ser bem enxerido, por que não procura sozinho? — falo, me afastando dele.
Escuto seus passos atrás de mim e assim que me sento no sofá, ele faz a mesma coisa, se sentando ao meu lado.
— Não quero te deixar estressada, você tomou remédio? — sua pergunta me pega desprevenida.
Eu realmente não estou acostumada com esse tipo de atenção, e eu nem estou doente, me sinto até um pouco culpada por achar que estou enganando ele.
Foco meu olhar em seu rosto, observando sua expressão atenta.
Sou considerada a melhor detetive de Detroit, mas ainda assim, esse homem na minha frente é o maior enigma que já tive o prazer de por os olhos. Ele me intriga, e o pior, me instiga a querer saber mais e mais sobre ele.
— Tomei Axel, agora se afasta, não gosto dessa proximidade… — sussurro, tentando empurrar sua mão do meu rosto, mas ele a segura, impedindo de parar o contato.
— Uns dias atrás não parecia que você não gostava… — diz, se aproximando mais.
Esse movimento dele me faz tentar me afastar mais, o grande problema é que eu termino me deitando no sofá. Meu Deus.
É impressão minha ou o ar está sumindo dos meus pulmões?
— Você não está doente né? — pergunta tão baixo, que sua voz sai mais como uma melodia suave para os meus ouvidos.
Tento formular uma frase mas ele não deixa, porque avança na minha direção, me beijando novamente. E sem me dar conta, levo minhas mãos até seu pescoço o puxando para mais perto – indo contra tudo que eu disse que não faria – apenas sentindo a maravilha que é o seus lábios nos meus. Parece até uma dança indecente, mas que é muito bonita.
— Se você tivesse noção de como eu sonhei com isso a minha adolescência inteira… Não fugiria nunca mais de mim. — sussurra, passando seus dedos gélidos pelos meus lábios.
Eu vejo nos seus olhos um sentimento tão bom… Eu me sinto desejada, e eu gosto disso, mais que qualquer coisa na minha vida. E isso é extremamente assustador.
E antes que eu deixe os pensamentos atrapalharem esse momento, eu aproximo meu rosto do seu, agora, tomando a iniciativa do beijo.
Ele se assusta com meu ato, mas logo retribui, me devorando como um lobo que finalmente conseguiu ter a sua chapeuzinho nas mãos e eu não sinto medo, não mais, pelo menos não nesse momento.
Tudo que eu mais quero é sentir.
Tudo que eu mais quero é que ele me faça esquecer.
Tudo que eu mais quero é que ele me mostre o que é ser amada de verdade.
E eu sinto que ele, com seus olhos escuros, que demonstram devoção por mim, vai fazer exatamente isso.